quinta-feira, janeiro 31, 2008

A democracia cristã chilena está em decomposição

A democracia cristã chilena está em decomposição

Juan Guillermo Tejeda
Santiago, Chile

A expulsão do senador Adolfo Zaldívar, que veio a calhar devido às atitudes provocadoras que ele vinha adotando, terminou por demonstrar que, sem esse baluarte da direita, a Democracia Cristã do Chile está a caminho de se esfacelar. Gabriel Valdés, um dos militantes patriarcais do partido, que foi ministro, senador, diretor de muitos órgão públicos importantes e agora se tornou embaixador, reconhece, de maneira quase psicanalítica, que seu partido demonstra interesse demasiado por cargos mas não muitos ideais, o que o torna um pouco parecido com a Máfia. De maneira ainda mais audaciosa, Marcelo Trivelli acrescenta que é preciso acabar com a hipocrisia, o nepotismo e a mediocridade na agremiação.

A Democracia Cristã está sofrendo e se desfazendo, e com ela sofre igualmente a alma do Chile, porque o país era muito mais democrata cristão do que imaginamos. A Democracia Cristã soube encarnar durante décadas o senso comum do país, a tendência ao meio termo, a não se definir demais por qualquer posição e a manter o bom relacionamento com todos, essa coisa mais ou menos que tanto caracteriza o Chile.

Antes da Democracia Cristã, cabia aos radicais acolchoar a sociedade, eliminar as arestas de crueldade da vida coletiva. Às complexidades do século 20, com suas guerras mundiais, a ameaça do fascismo e do comunismo, a luta entre oligarcas e operários, e crises econômicas, o Partido Radical opunha a beleza serena das tradições do país. Um belo assado acompanhado por um purê picante e um bom vinho tinto bastava para descontrair qualquer ambiente. Os radicais eram mais amorenados, mais provinciais, mais adeptos dos usos e costumes tradicionais, gente cordial, adepta da camaradagem. Republicanos autênticos, eles foram a ferramenta que o Chile encontrou para evitar a ditadura e a guerra civil, que mesmo assim aconteceram tantas vezes. Os radicais se identificavam com a causa da educação pública, com a promoção das ferrovias, com as instituições burocráticas da república, nas quais os cargos eram conquistados exatamente em jantares, banquetes e conversas. Apesar de todos esses pequenos vícios, o sistema respirava e funcionava.

Mas aconteceu com os radicais a mesma coisa que está acontecendo agora com os democratas cristãos. O idealismo deles começou a se desfazer, em parte porque realizaram os propósitos que haviam levado à criação do partido: transformar a sociedade chilena em um espaço menos dado ao culto à aristocracia, mais laico, com mais jeito de classe média. A comida gordurosa caiu em desgraça por conta do colesterol e do culto à boa forma física, os casacos de pele de camelo saíram de moda, o tanto e o bolero foram substituídos pelo rock, as famílias tradicionais do radicalismo se dividiram e as pessoas deixaram de reagir à retórica tradicional das homenagens e dos brindes.

A Democracia Cristã foi uma invenção católica e de escola de padres que surgiu para disputar com os radicais a afeição da classe média, nos anos 60, batalha da qual terminou por sair vitoriosa. O sentido profundo da Democracia Cristã era o de que, em lugar do comunismo e do capitalismo - ambos ruins, especialmente o comunismo-, o melhor era que desenvolvêssemos nosso modelo próprio, de casinhas modestas, comida simples e veraneio em El Quisco para almoçar frango em companhias das crianças - de preferência, muitas crianças-, desfrutando de pêssegos em calda como sobremesa.

Durante decênios os democratas cristãos representaram essa postura amena e vagamente conservadora, a posição do "gosto mas faz mal", "quero mas não devo", a mistura peculiarmente chilena de austeridade, timidez, arrivismo e devoção pelos padres, concursos de miss colégio e pelos carabineiros chilenos. A democracia Cristã conseguiu, com sucesso e sempre de acordo com as circunstâncias, se posicionar como antidireitista, antiesquerdista, pró-direitista e pró-esquerdista. Trata-se de um partido que teve todos os ódios e muitos carinhos mornos.

Mas hoje, quando o comunismo deixou de existir e o capitalismo parece dominar tudo aquilo que encontramos no mundo, os democratas cristãos já não sabem bem a que se dedicar. Parecem cansados, e suas roupas têm um jeitão interiorano. O papel que desempenhavam era o de mediar, moderar, baixar o volume, oferecer uma terceira via em um mundo bipolar. O cardápio que o mundo hoje nos oferece parece mais uma praça global de alimentação, com inúmeras opções e combinações possíveis, e a Democracia Cristã nada tem a acrescentar a essa refeição. O partido ficou órfão de projeto, portanto, e talvez seja por isso que Valdés sinta falta dos ideais, sempre mais importantes que os cargos. Como ninguém mais luta por ideais, resta a briga de foice por cargos, embaixadas, indicações. Magos do clientelismo político, grandes formigas da vida local e regional, do mundo do trabalho, eles hoje vivem como que em suspensão dentro da nuvem digital. A erotização dos costumes, o desprestígio dos padres, a felicidade obscena do mercado: tudo isso os incomoda. Falta-lhes horizonte, ainda que lhes reste o estilo. A tradição comunitária do partido não se enquadra ao liberalismo ou à transparência. A sociedade se tornou menos hipócrita, e as manobras episcopais da Democracia Cristã sempre precisaram das sombras, de zonas obscuras.

A mutação global sem dúvida porá fim aos democratas cristãos. Mas a queda não será rápida, por mais espetáculos dolorosos que tenhamos de assistir. No fundo de nossas almas castigadas, chilenos e chilenas trazem uma miniatura de carabineiro, um microclima interno composto por paróquia, casinha modesta comprada a prestação, cunhado que tem amigos no ministério, roupa que não é nem da moda e nem fora dela, bem como um colégio particular mas não muito sofisticado, para que as crianças se enquadrem bem. Talvez ninguém mais seja democrata cristão, mas é um alívio ter um vizinho que o seja.

Texto do Terra Magazine.

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terça-feira, janeiro 29, 2008

Dois séculos de soberania

Nesta semana completaram-se 200 anos da chegada ao Rio de Janeiro da família real e da Corte portuguesa. Mais de 20 livros sobre a época foram publicados para celebrar a data, algo incomum num país de pouco hábito de leitura, como o Brasil. Ainda na graduação, li o excelente “D. João VI no Brasil”, de Oliveira Lima, que matou minha curiosidade pelo período. Contudo, vale aproveitar a ocasião para refletir um pouco sobre o que significou a transferência da Corte para nosso país.

Produções populares para cinema e TV consolidaram no imaginário brasileiro a idéia de D. João como um débil mental governando uma sociedade corrupta e decadente, e retrataram sua fuga de Lisboa como um episódio patético e inesperado. A realidade é mais matizada e interessante. Desde a Restauração de 1640, quando Portugal libertou-se do jugo da Espanha, o país tornou-se dependente da aliança com a Inglaterra para defender sua precária segurança e seu império marítimo ainda mais frágil. Já naquela época o padre Antônio Vieira propôs a mudança da capital, e no século XVIII o influente diplomata d. Luís da Cunha reforçou a idéia.

D. Luís havia representado Portugal em Londres, Paris e Madri e estava consciente do atraso lusitano diante da França e da Inglaterra, e assustado diante dos riscos militares nas crises do antigo regime, em particular a Guerra de Sucessão Espanhola. Os terremotos da Revolução Francesa e das guerras napoleônicas apenas agravaram as circunstâncias, colocando Portugal na situação insustentável de escolher entre enfrentar a coligação França-Espanha ou romper a aliança inglesa.

Não conheço outro império colonial que tenha sido governado de uma de suas colônias, embora algo assim tenha sido discutido na França quando o país foi invadido pela Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial. D. João foi mais sábio do que o marechal Pétain, preservou a monarquia e expandiu seus domínios para territórios americanos (os atuais Uruguai e Guiana Francesa) pertencentes a seus inimigos europeus. E pelo de Rio de Janeiro foi ficando, aqui foi aclamado rei e talvez por cá tivesse morrido, não fosse a Revolução Liberal do Porto e a indignação de seus súditos portugueses a exigir o retorno do soberano.

O principal legado da estada da Corte no Brasil foi ter lançado as bases para a construção do Estado nacional, com estadistas de primeiro porte, como d. Rodrigo de Sousa Coutinho, criando os primeiros estabelecimentos de ensino superior, eliminando o monopólio metropolitano do comércio exterior, estimulando a ciência e trazendo para o Rio de Janeiro a célebre “biblioteca dos reis”, que hoje conhecemos por Biblioteca Nacional. Tesouro tão importante que rendeu enormes disputas quando da independência brasileira, menores apenas do que as negociações da dívida externa.

Um olhar mais crítico veria que as bases desse Estado eram terríveis: patrimonialismo, nepotismo, escravidão, atraso econômico. Em grande medida, representavam o que havia de pior na Europa Ocidental naquele momento. Concordo. É destes cacos que estamos tentando construir um país.

Texto do Blog Todos os Fogos o Fogo.

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sexta-feira, janeiro 25, 2008

BLOG CRIADO ESPECIALMENTE PARA AMEAÇAR JORNALISTA DE MORTE

Essa é a foto que está na capa de um blog criado especialmente para ameaçar de morte o jornalista Ricardo Santos, do Maranhão, que é integrante do SIVUCA, o Sistema de Muvuca na Internet, uma reunião informal de blogueiros cujo único compromisso é o de combater o pensamento único. O grupo foi criado por sugestão minha, no ano passado, e é uma espécie de espaço comunitário. Os integrantes dele não têm qualquer compromisso político ou ideológico uns com os outros. Eu nem sei quantos são os matizes político-ideológicos representados no SIVUCA, pelo simples fato de que não perguntei e não pergunto quando aparecem novos candidatos. O Ricardo Santos, por exemplo, dedica seu blog a divulgar informações que não são do agrado político do grupo ligado ao senador José Sarney. Fui "informado... Leia aqui o restante da matéria!




O texto sobre uma ameaça de morte a um blogueiro maranhense continua no Vi o Mundo.

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quarta-feira, janeiro 23, 2008

A Linguagem do Preconceito

A Linguagem do Preconceito

Virou moda dizer que “Lula não entende das coisas”. Ou “confundiu isso com aquilo”. É a linguagem do preconceito, adotada até mesmo por jornalistas ilustres e escritores consagrados

Por Bernardo Kucinski

Um dia encontrei Lula, ainda no Instituto Cidadania, em São Paulo, empolgado com um livro de Câmara Cascudo sobre os hábitos alimentares dos nordestinos. Lula saboreava cada prato mencionado, cada fruta, cada ingrediente. Lembrei-me desse episódio ao ler a coluna recente do João Ubaldo Ribeiro, “De caju em caju”, em que ele goza o presidente por falar do caju, “sem conhecer bem o caju”. Dias antes, Lula havia feito um elogio apaixonado ao caju, no lançamento do Projeto Caju, que procura valorizar o uso da fruta na dieta do brasileiro.

“É uma pena que o presidente Lula não seja nordestino, portanto não conheça bem a farta presença sociocultural do caju naquela remota região do país...”, escreveu João Ubaldo. Alegou que Lula não era nordestino porque tinha vindo ainda pequeno para São Paulo. E em seguida esparramou citações sobre o caju, para mostrar sua própria erudição. Estou falando de João Ubaldo porque, além de escritor notável, ele já foi um grande jornalista.

Outro jornalista ilustre, o querido Mino Carta, escreveu que Lula “confunde” parlamentarismo com presidencialismo. “Seria bom”, disse Mino, “que alguém se dispusesse a explicar ao nosso presidente que no parlamentarismo o partido vencedor das eleições assume a chefia do governo por meio de seu líder...” Essa do Mino me fez lembrar outra ocasião, no Instituto Cidadania, em que Lula defendeu o parlamentarismo.

Parlamentarista convicto, Lula diz que partidos são os instrumentos principais de ação política numa democracia. Pelo mesmo motivo Lula é a favor da lista partidária única e da tese de que o mandato pertence ao partido. Em outubro de 2001, o Instituto Cidadania iniciou uma série de seminários para o Projeto Reforma Política, aos quais Lula fazia questão de assistir do começo ao fim. Desses seminários resultou um livro de 18 ensaios, Reforma Política e Cidadania, organizado por Maria Victória Benevides e Fábio Kerche, prefaciado por Lula e editado pela Fundação Perseu Abramo.

Clichês e malandragem

Se pessoas com a formação de um Mino Carta ou João Ubaldo sucumbiram à linguagem do preconceito, temos mais é que perdoar as dezenas de jornalistas de menos prestígio que também dizem o tempo todo que “Lula não sabe nada disso, nada daquilo”. Acabou virando o que em teoria do jornalismo chamamos de “clichê”. É muito mais fácil escrever usando um clichê porque ele sintetiza idéias com as quais o leitor já está familiarizado, de tanto que foi repetido. O clichê estabelece de imediato uma identidade entre o que o jornalista quer dizer e o desejo do leitor de compreender. Por isso, o clichê do preconceito “Lula não entende” realimenta o próprio preconceito.

Alguns jornalistas sabem que Lula não é nem um pouco ignorante, mas propagam essa tese por malandragem política. Nesse caso, pode-se dizer que é uma postura contrária à ética jornalística, mas não que seja preconceituosa. Aproveitam qualquer exclamação ou uso de linguagem figurada de Lula para dizer que ele é ignorante. “Por que Lula não se informa antes de falar?”, escreveu Ricardo Noblat em seu blog, quando Lula disse que o caso da menina presa junto com homens no Pará “parecia coisa de ficção”. Quando Lula disse, até com originalidade, que ainda faltava à política externa brasileira achar “o ponto G”, William Waack escreveu: “Ficou claro que o presidente brasileiro não sabe o que é o ponto G”.

Outra expressão preconceituosa que pegou é “Lula confunde”. A tal ponto que jornalistas passam a usar essa expressão para fazer seus próprios jogos de palavras. “Lula confunde agitação com trabalho”, escreveu Lucia Hippolito. Empregam o “confunde” para desqualificar uma posição programática do presidente com a qual não concordam. “O presidente confunde choque de gestão com aumento de contratações”, diz o consultor José Pastore, fonte habitual da imprensa conservadora.

Confunde coisa alguma. Os neoliberais querem reduzir o tamanho do Estado, o presidente quer aumentar. Quer contratar mais médicos, professores, biólogos para o Ibama. É uma divergência programática. Carlos Alberto Sardenberg diz que Lula “confundiu” a Vale com uma estatal. “Trata-a como se fosse a Petrobras, empresa que segundo o presidente não pode pensar só em lucro, mas em, digamos, ajudar o Brasil.” Esse caso é curioso porque no parágrafo seguinte o próprio Sardenberg pode ser acusado de confundir as coisas, ao reclamar de a Petrobras contratar a construção de petroleiros no país, apesar de custar mais. Aqui, também, Lula não fez confusão: o presidente acha que tanto a Vale quanto a Petrobras têm de atender interesses nacionais; Sardenberg acha que ambas devem pensar primeiro na remuneração dos acionistas.

Filosofia da ignorância

A linguagem do preconceito contra Lula sofisticou-se a tal ponto que adquiriu novas dimensões, entre elas a de que Lula teria até problemas de aprendizagem ou de compreensão da realidade. Ora, justamente por ter tido pouca educação formal, Lula só chegou aonde chegou por captar rapidamente novos conhecimentos, além de ter memória de elefante e intuição. Mas, na linguagem do preconceito, “Lula já não consegue mais encadear frases com alguma conseqüência lógica”, como escreveu Paulo Ghiraldelli, apresentado como filósofo na página de comentários importantes do Estadão. Ou, como escreveu Rolf Kunz, jornalista especializado em economia e também professor de filosofia: “Lula não se conforma com o fato de, mesmo sendo presidente, não entender o que ocorre à sua volta”.

Como nasceu a linguagem do preconceito? As investidas vêm de longe. Mas o predomínio dessa linguagem na crônica política só se deu depois de Lula ter sido eleito presidente, e a partir de falas de políticos do PSDB e dos que hoje se autodenominam Democratas. “O presidente Lula não sabe o que é pacto federativo”, disse Serra, no ano passado. E continuam a falar: “O presidente Lula não sabe distinguir a ordem das prioridades”, escreveu Gilberto de Mello. “O presidente Lula em cinco anos não aprendeu lições básicas de gestão”, escreveu Everardo Maciel na Gazeta Mercantil.

A tese de que Lula “confunde” presidencialismo com parlamentarismo foi enunciada primeiro por Rodrigo Maia, logo depois por César Maia, e só então repetida pelos jornalistas. Um deles, Daniel Piza, dias depois dessas falas, escreveu que “só mesmo Lula, que não sabe a diferença entre presidencialismo e parlamentarismo, pode achar que um governante ter a aprovação da maioria é o mesmo que ser uma democracia no seu sentido exato”.

Preconceito é juízo de valor que se faz sem conhecer os fatos. Em geral é fruto de uma generalização ou de um senso comum rebaixado. O preconceito contra Lula tem pelo menos duas raízes: a visão de classe, de que todo operário é ignorante, e a supervalorização do saber erudito, em detrimento de outras formas de saber, tais como o saber popular ou o que advém da experiência ou do exercício da liderança. Também não se aceita a possibilidade de as pessoas transitarem por formas diferentes de saber.

A isso tudo se soma o outro preconceito, o de que Lula não trabalha. Todo jornalista que cobre o Palácio do Planalto sabe que é mentira, que Lula trabalha de 12 a 14 horas por dia, mas ele é descrito com freqüência por jornalistas como uma pessoa indolente.

Não atino com o sentido dessa mentira, exceto se o objetivo é difamar uma liderança operária, o que é, convenhamos, uma explicação pobre. Talvez as elites, e com elas os jornalistas, não consigam aceitar que o presidente, ao estudar um problema com seus ministros, esteja trabalhando, já que ele é “ incapaz de entender” o tal problema. Ou achem que, ao representar o Estado ou o país, esteja apenas passeando. Afinal, onde já se viu um operário, além do mais ignorante, representar um país?

Fontes: João Ubaldo Ribeiro, O Estado de S. Paulo, 2/9/2007. Blog do Mino Carta, 16/11/2007. Blog do William Waack, 2/12/2007. Texto de Lúcia Hipólito no UOL, 24/07/2007. José Pastore, artigo no Estadão, 11/12/2007. Carlos Alberto Sardenberg, “De bronca com o capital”, Estadão, 10/12/2007. Filósofo Paulo Ghiraldelli, Estadão, 29/8/2007. Rolf Kunz, “Lula, o viajante do palanque”, Estadão, 29/11/2007. José Serra, em Folha On Line, 1º/8/2006, em reportagem de Raimundo de Oliveira. Gilberto de Mello, escritor e membro do Instituto Brasileiro de Filosofia, no Estadão de 2/8/2007, reproduzido no site do PSDB. Everardo Maciel, na Gazeta Mercantil de 4/10/2007. Rodrigo Maia, em declaração à Rádio do Moreno, 6/11/2007, 17h20. César Maia em seu blog, 12/11/2007. E Daniel Pizza em texto do Estadão de 2/12/2007.

Bernardo Kucinski é professor titular do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA/USP. Foi produtor e locutor no serviço brasileiro da BBC de Londres e assistente de direção na televisão BBC. É autor de vários livros sobre jornalismo.

Eu vi no Blogoleone.

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terça-feira, janeiro 22, 2008

Religião?

Em que medida o sr. compartilha a percepção de Walter Benjamin de que o capitalismo é uma religião?

Em O Capital, Marx comparava o capitalismo a uma religião. As mercadorias são percebidas como ídolos, que têm vida própria e decidem o destino dos homens. Esse argumento foi utilizado pelos teólogos da libertação, como Hugo Assmann, Franz Hinkelammert, Jung Mo Sung, para desenvolver uma crítica radical do capitalismo como religião idólatra. A teologia do mercado, de Thomas Malthus ao último documento do Banco Mundial, é ferozmente sacrificial: exige que os pobres ofereçam suas vidas no altar dos ídolos econômicos. Walter Benjamin, ao escrever sobre isso em 1921, não havia lido O Capital. Ele se inspira no sociólogo Max Weber para analisar o caráter cultual do sistema. Na religião capitalista, a cada dia se vê a mobilização do sagrado, seja nos rituais na Bolsa, seja nas empresas, enquanto os adoradores seguem com angústia e extrema tensão a subida ou a descida das cotações. As práticas capitalistas não conhecem pausa, dominam a vida dos indivíduos da manhã à noite, da primavera ao inverno, do berço ao túmulo.

Trecho de entrevista do sociólogo Michael Löwy ao jornal O Estado de São Paulo, de 13 de janeiro de 2008, vista no Diário Gauche.

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Precisamos ser protegidos a todo custo!

O UOL Jogos informa que o Procon do estado de Goiás conseguiu uma medida judicial para proibir e apreender os jogos Counter-Strike e Ever-Quest. A medida começa a ser cumprida em Goiás, mas, em tese, é expansível a todo território brasileiro.
O Procon alerta que os "considerados impróprios para o consumo, na medida em que são nocivos à saúde dos consumidores, em ofensa ao disposto nos artigos 6, I, 8, 10 e 39, IV, todos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor". A decisão foi proferida pelo Juízo da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais e publicada no site oficial do Procon/GO.", conforme noticiado pelo UOL Jogos.
Counter-Strike já é dirigido ao consumidor com mais de 18 anos, mas o Procon deseja a proibição total do game.
Eu diria que é mais uma vez a aparição da velha senhora, a censura.
Mas provavelmente o Procon de Goiás apenas quer que possamos dormir mais tranqüilos, sabendo que este serviço ao cidadão zela por nós.

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A "Bolsa Casa Branca" do guru do tucanato

A "Bolsa Casa Branca" do guru do tucanato


Agora que a crise está na economia do país dele, Larry Summers converteu-se à heresia

QUEM VIVEU, VIU: Lawrence Summers, o prepotente ex-secretário do Tesouro Americano, propôs a criação de uma "Bolsa Casa Branca" para que os Estados Unidos se livrem da ameaça de uma recessão. Sua idéia é simples. Deve-se distribuir incentivos (leia-se dinheiro) para as empresas e, sobretudo, para a patuléia que preservou seu nível de consumo endividando-se no cartão de crédito ou jogando na roleta do mercado imobiliário. Ele propõe uma ação seletiva, buscando favorecer temporariamente a população de baixa renda. A "Bolsa Casa Branca", pode chegar a US$ 500 por pessoa, sob a forma de rebate no Imposto de Renda, aumento do salário-desemprego ou mesmo em cheque. O ex-secretário do Tesouro acredita que o custo do programa fique entre US$ 50 bilhões e US$ 75 bilhões. Para se ter uma idéia do tamanho desse ervanário, sem que se possa comparar uma coisa com a outra, em 2008 todos os programas sociais brasileiros custarão US$ 15,8 bilhões.
A idéia é simples, mas vai na direção oposta a tudo o que Summers pregou aos apóstolos que dirigiram as economias do Terceiro Mundo nos anos 90. No caso brasileiro, se alguém fizesse uma proposta parecida como essa aos seus discípulos da ekipenômica tucana, seria chamado de populista, dinossauro e perdulário. Eles sustentavam que, fosse qual fosse a crise, o mercado seria capaz de resolver o problema. Afinal, não existe almoço grátis.
Também não existe jejum sem custo. Quando ele ameaçou a economia dos Estados Unidos, foram às favas os escrúpulos de consciência monetária.
Summers e seus discípulos chamaram os tailandeses de irresponsáveis porque deflagraram a crise asiática de 1997, com a explosão de uma falcatrua imobiliária irresponsável. Tinham razão, mas a bolha americana foi maior. Quando milhões de pessoas foram para o desemprego, preservando a prosperidade dos Estados Unidos, era o jogo jogado. Agora que o calor da crise está na economia do seu país, Summers converteu-se à heresia. Deixou mal, muito mal, seus apóstolos.

Texto da coluna de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo, dia 13 de janeiro de 2008 (para assinantes).

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segunda-feira, janeiro 21, 2008

Democracia: Livre, Aberta e Gratuita

E a CartaCapital teve sua semana de Veja (ou quem sabe Contigo?) - 2

Vi no saite Comunique-se, que o repórter Paolo Manzo se enganou, e que o sr. Mendroni, na verdade, é promotor de justiça.
Isto reforça minha impressão de um promotor querendo se destacar, e usando uma celebridade para isso. E a revista CartaCapital deu ampla cobertura ao promotor.
Mino Carta, diretor da revista, em seu blog, afirma que a reportagem é relevante, e de interesse público, tendo sido acolhida em outros veículos de comunicação mundo afora. Então tá.

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sábado, janeiro 19, 2008

E a CartaCapital teve sua semana de Veja (ou quem sabe Contigo?)

- Qual é seu grau de amizade e que relação tem com as pessoas acusadas?
- Os acusados costumam frequentar sua casa na Itália e no Brasil?
- O senhor costuma frequentar a casa deles no Brasil e nos Estados Unidos?
- A partir de 31 de julho de 2006, quando teve início a acusação por crime de lavagem de dinheiro, quantas vezes os acusados frequentaram sua casa?
- O senhor tem conhecimento do fato que Estevam Hernandez e Sônia Haddad Moraes Hernandez tiveram prisão decretada?
- Durante o período do decreto de prisão, as duas pessoas ficaram hospedadas em sua casa, na Itália ou no Brasil?
Acima a primeira bateria.
A segunda bateria:
- O senhor contribui com a Igreja do ponto de vista financeiro?
- Desde quando?
- Com dinheiro ou com outros bens?
- Quanto deposita por mês?
- Quanto já depositou desde que começou a colaborar com eles - nos dê um total ainda que aproximado?
- De que forma fez suas doações?
- O senhor tem conhecimento do destino que foi e é dado ao dinheiro que deposita?
Há mais:
- O senhor se dirigiu à imprensa brasileira (primeira página do jornal Folha de São Paulo, do dia 12 de setembro [de 2007, eu suponho]) para defender a Renascer. O senhor sabe de suas atividades e do que é acusada?
Eis o interrogatório encaminhado pelo juiz da 1a. Vara Criminal de São Paulo, Marcelo Batlouni Mendroni, ao jogador Kaká, do Milan. E amplamente divulgado pela revista CartaCapital em texto assinado por Paolo Manzo, o qual, por sinal, não consegui localizar no quadro da redação da revista, localizado na página 81, desta edição, n. 478. Como a reportagem informa que a revista "teve acesso", e o interrogatório foi produzido por um juiz só posso pensar que foi o mesmo juiz que "deu acesso" às perguntas. E por quê? Onde está o "segredo de justiça" que levou a justiça do Mato Grosso do Sul, por exemplo, a proibir veículos de comunicação daquele estado de divulgarem o nome de jovens acusados de estupro? Na minha vã ignorância só posso pensar que o Sr. Mendroni queira se promover em cima do craque do Milan.
E por conta do "momento Quem" da CartaCapital, a revista ainda divulga as diferenças de fé e os conflitos decorrentes entre Kaká e sua sogra, a bonita e elegante (no vestir) Rosângela Lyra. Como leitor de CartaCapital, fiquei pensando qual o interesse do público em saber que Caroline, esposa de Kaká, e filha de Rosângela, teve uma discussão ríspida com sua mãe a respeito da veneração de Santa Maria por parte dos católicos, e a quase indiferença dos protestantes com relação à santa?
Fiquei pensando, eu, protestante e evangélico, respondendo ao questionário proposto pelo senhor juiz:
"Qual é seu grau de amizade e que relação tem com as pessoas acusadas? Bem, excelência somos amigos íntimos e fraternos, nos visitamos quando podemos e trocamos telefonemas"; "Os acusados costumam frequentar sua casa na Itália e no Brasil? Como eu disse, excelência, somos amigos íntimos e fraternos, quando temos a oportunidade nos encontramos"; "O senhor costuma frequentar a casa deles no Brasil e nos Estados Unidos? Excelência, acho que aqui cabe repetir a resposta anterior"; "A partir de 31 de julho de 2006, quando teve início a acusação por crime de lavagem de dinheiro, quantas vezes os acusados frequentaram sua casa? Isto faz cerca de um ano e meio, não excelência? Eu só poderia responder diversas"; "O senhor tem conhecimento do fato que Estevam Hernandez e Sônia Haddad Moraes Hernandez tiveram prisão decretada? Sim, excelência, a imprensa deu ampla divulgação ao decreto de prisão deles"; "Durante o período do decreto de prisão, as duas pessoas ficaram hospedadas em sua casa, na Itália ou no Brasil? Não tenho certeza, excelência, mas é possível que sim"; "O senhor contribui com a Igreja do ponto de vista financeiro? Sim, excelência"; "Desde quando? Desde que comecei a frequentar a igreja, há ene anos atrás, excelência"; "Com dinheiro ou com outros bens? Com dinheiro certamente, excelência. Que tipos de outros bens o senhor pergunta?"; "Quanto deposita por mês? O equivalente a 10% de meus rendimentos mensais, excelência. Isto é variável. A minha mais recente contribuição foi de tantos euros"; "Quanto já depositou desde que começou a colaborar com eles - nos dê um total ainda que aproximado? Não sei excelência, são muitas contribuições através dos anos. Seria melhor pesquisar na contabilidade da Igreja"; "De que forma fez suas doações? Sempre que posso ir a um templo, entrego lá minha oferta, excelência. Às vezes faço transferência bancária"; "O senhor tem conhecimento do destino que foi e é dado ao dinheiro que deposita? Excelência, a Igreja tem contador e contabilidade, mas tenho certeza que o dinheiro é usado para divulgar a fé"; "O senhor se dirigiu à imprensa brasileira para defender a Renascer. O senhor sabe de suas atividades e do que é acusada? Excelência, não li o processo, mas como eles são meus amigos e alegam sua inocência, confio neles, até porque eles ainda não foram condenados pela justiça brasileira".

Não sei o que o jogador Kaká responderá. O que vai acima é apenas a minha cogitação.

E por que eu penso que o juiz Mendroni quer se promover? Porque a Igreja Renascer em Cristo deve ter milhares de fiéis, por todo o Brasil, certamente alguns milhares somente no estado de São Paulo, que é onde acredito que fique a comarca onde corre o processo contra os líderes da Igreja Renascer. Toda esta gente está perfeitamente ao alcance do juiz. Muitos desta gente devem colaborar financeiramente com a Igreja. Por que, então. enviar um questionário para um membro da igreja que está na Itália? Pelos supostos milhões doados por Kaká? Ou seja, uma testemunha é mais importante que outras pela quantidade de dinheiro que fornece? Não sei. Só especulo.

Com o que escrevo aqui não quero dizer que os casal Hernandez seja inocente. Perante a justiça brasileira são inocentes até que sejam condenados em última instância. Nos Estados Unidos eles já estão cumprindo pena por contrabando de dinheiro. Uma pena leve, que aqui no Brasil, se chegassem a ser condenados pelo mesmo motivo, provavelmente seria convertida em prestação de serviços à comunidade, pois não temos penitenciárias adequadas para o cumprimento de penas para crimes, digamos, de pequena monta.

Talvez o casal Hernandez venha a ser culpado por contabilidade ilegal (se não tiverem uma contabilização adequada das entradas, saídas e bens pertencentes à Igreja), falsidade ideológica (se usaram outras pessoas ["laranjas"] para abrir empresas), e quaisquer outros delitos que venham a ser provados contra eles. Por enquanto ainda não.

Anos atrás a revista Época fez uma reportagem sobre o casal, relatando o caso de ex-membros da Igreja que foram prejudicados por se tornarem fiadores em aluguéis de prédios que a Igreja utilizava, e deixou de pagar. Se a história é verdadeira, e o casal Hernandez for condenado será um caso de estelionato. Mas só quando forem condenados.

E por que escrevo isto? Bem, o primeiro motivo é que não esperava ver isto na capa da CartaCapital, revista que assino e tenho por honesta. A reportagem me parece sensacionalista demais para a revista, mas, pelo jeito, como dizia a propaganda, terei que rever meus conceitos.

O segundo é que sou protestante e evangélico, e todas as igrejas protestantes e evangélicas funcionam mais ou menos da mesma maneira com relação às suas finanças. Todas elas dependem das ofertas de seus membros, e estes membros normalmente confiam na direção da Igreja para lidar com isto. O que acontece é que com a população evangélica crescendo, e estas igrejas neopentecostais têm crescido com bastante vigor, o valor das ofertas vai se tornando muito grande, de maneira que o valor arrecadado é muito mais que suficiente para a manutenção de templos e sustento do seu, digamos, clero. O que elas fazem com o dinheiro que sobra? Investem em comunicação. Um exemplo acabado disso é a Igreja Universal do Reino de Deus. Não esqueçamos que tempos atrás o bispo Edir Macedo foi preso sob a acusação de charlatanismo, e outras sandices. Acusações das quais acabou inocentado. Pois quando o canal de notícias Record News foi inaugurado, recentemente, com a presença do presidente da república e do governador do estado de São Paulo, lá estava, apresentado pelo jornalista Paulo Henrique Amorim, o agora "empresário" Edir Macedo. O que mais? Compram imóveis com os quais edificam templos, por vezes com amplos estacionamentos, para conforto dos membros da igreja. Também provêem confortos para a sua liderança: automóveis, combustível, moradia, coisas que vão do simples ao luxuoso, dependendo da quantidade de dinheiro que uma igreja consiga arrecadar, e que, por conta disso, gera a velha questão: isto é uma maneira de facilitar a vida da liderança da igreja, ou uma mordomia imerecida? Cada igreja tem a sua maneira de avaliar isto. Algumas têm colegiados de bispos, algumas decidem por simples assembléias, mais ou menos como reunião de condomínio, embora tendendo a ser um pouco mais pacatas. Nem sempre.

Por fim temos a velha pergunta do protestante: por que não investigam as entradas da Igreja Católica? Por que não informam como a instituição se sustenta aqui no Brasil? Por que é a da maioria? Bom, mas o estado de direito não deve servir para oprimir minorias. Não que eu aqui esteja dizendo que a Igreja Católica tenha algo errado. Longe disso. A Igreja Católica nos oferece belos templos, verdadeiros tesouros arquitetônicos. E os tesouros do Vaticano, esculturas, pinturas, manuscritos antigos, eu sempre advogo que permaneçam por lá, abertos à visitação e à pesquisa.

Mas acho o interrogatório do juiz Mendroni totalmente impróprio, uma desnecessária invasão à privacidade do jogador Kaká. E achei também um imenso desperdício da capa da revista CartaCapital.

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"A guerrilha não é louca"

"A guerrilha não é louca", diz Consuelo

Em entrevista à Folha, ex-congressista conta como é a relação entre cativos e os membros das Farc

Refém libertada no último dia 10 estreitou laços com guerrilheira que esteve a seu lado em caminhada de 20 dias na selva até a soltura

DO ENVIADO A BOGOTÁ
DA COLABORADORA DA FOLHA

No momento de sua libertação, na semana passada, imagens mostraram a ex-congressista Consuelo González se despedindo de forma efusiva de uma das quatro guerrilheiras que a entregaram à comitiva liderada pelo governo venezuelano. Ao explicar o gesto, González disse que, durante os 20 dias de caminhada entre o acampamento e os helicópteros, pôde se aproximar dessa guerrilheira, apesar da proibição expressa do comando das Farc desse tipo contato.
"Tive a oportunidade de conversar com uma delas, exatamente da qual me despedi de forma muito mais emotiva. E a verdade é que, ao ouvi-la, me dava uma profunda tristeza", lembra González. A ex-deputada conta que, apesar dos mais de seis anos com a guerrilha, ela pouco interagiu com os guerrilheiros no cativeiro.
"Eu me atrevo a dizer que a guerrilha não é louca [longa pausa]. Os militantes com quem tínhamos trato eram muito distantes, pois é proibido conviver com reféns. A troca de comunicação, de idéias, é pouca. Mas, no que se podia acessar deles, a maioria segue de forma muito estrita o determinado pelos chefes", conta.
"A primeira pergunta foi: "Há quanto tempo está na guerrilha?". Ela me disse: "Sete anos". "Por que ingressou na guerrilha?" Ela me disse: "Consuelo, porque, quando era menina, dois ou três anos, mataram o meu pai". "Quem matou os seus pais?" "Os paras". "O que aconteceu com a sua mãe?" "Teve de fugir." "Quanto eram?" "Seis ou sete." "E o que aconteceu com vocês, com todas as crianças?" "Fomos a viver com uma avozinha que tinha uns 80 anos. Eu tive de trabalhar numa casa de família para que a minha avó conseguisse comprar um pouco de arroz. Não podia estudar, não tinha como". Era uma pobreza que me golpeava terrivelmente ouvir", afirma.
E continua a história: "Ela disse: "Não tive alternativa à guerrilha". "E os seus irmãos?" "Três das minhas irmãs estão na guerrilha também'".
"Ou seja, quatro da mesma família estão na guerrilha por causa da violência, pela falta de oportunidades. Mas, além disso, isso me produz uma enorme tristeza, porque eu passo essa situação ao meu caso particular. Eu prefiro fazer a reflexão: e se isso tivesse ocorrido às minhas filhas?", indaga González, mãe de duas jovens e e avó de uma menina, nascida quando ela estava em cativeiro.
E continua: "Eu via que, no fundo do seu coração, ela tinha algo de humano, toda hora ela me dizia: "Consuelo, estou fazendo um esforço para que a liberação não dê errado. Estou fazendo um esforço para que vocês saiam, para que Clara encontre o seu filho, para que você se reúna com suas filhas, seu neto. E todo dia me dizia, de longe: "As coisas vão bem'".
Segundo González, as Farc buscam dar o mesmo tratamento aos guerrilheiros e guerrilheiras, que basicamente têm as mesmas obrigações.
"Nós às víamos transportando sobre seus ombros troncos de tamanhos impressionantes. Elas têm muita disciplina, a maioria tem o cabelo longo, muito longo. Para cortar, é preciso ter autorização do chefe."
A maternidade é coibida pelo comando das Farc, segundo relatos de ex-guerrilheiras, que dão conta de que combatentes grávidas são muitas vezes forçadas a fazer o aborto.
Por outro lado, diz a ex-congressista, as mulheres seqüestradas recebem um tratamento mais brando em comparação com os homens, que dormem todas as noites acorrentados nos pés ou no pescoço.
"Em nenhum momento me colocaram correntes. Enquanto eu estive com mulheres companheiras, nunca se acorrentou nenhuma. Ouvi que, quando se tenta escapar, acorrentam ou dão um tiro. Mas nenhuma de nós tentamos escapar", conta.
A ex-refém Clara Rojas, libertada junto com González, disse que foi acorrentada por vários dias junto com a ex-candidata à Presidência Ingrid Betancourt depois de uma tentativa frustrada de fuga.
González conta como terminou o relacionamento de vários dias com a guerrilheira: "No dia em que nos entregaram, eu já ia ao helicóptero, e ela disse: "Consuelo, adeus". Eu não havia me despedido dela. Voltei, lhe dei um beijo e disse: "Obrigado e reflita'". (FM e JC)

Texto da Folha de São Paulo de 17 de janeiro de 2008 (para assinantes).


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sexta-feira, janeiro 18, 2008

Declínio Ocidental?

DAVOS E O DECLÍNIO
No "Wall Street Journal", uma primeira reportagem sobre o Fórum Econômico de Davos, na semana que vem, anuncia que o evento vai "refletir a mudança no poder".
A saber, "poder e riqueza saíram do Ocidente ao Oriente, das companhias de petróleo aos governos petroleiros, dos bancos americanos" aos fundos soberanos e aos Brics. É o "declínio da influência dos Estados-nações ocidentais".

NA ESTRUTURA
E o "boom" das commodities não vai parar, deu o "New York Times". "É mudança fundamental na estrutura global", diz um estrategista. "Ao redor do mundo, bilhões enriquecem e consomem."

Textos da coluna Toda Mídia, na Folha de São Paulo, de 16/01/2008 (para assinantes).
Comentário pessoal: é cedo para saber.

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Complexo Industrial-Militar

Quando deixou o poder, em 1961, o presidente Dwight Einsenhower fez um famoso discurso em que alertou os americanos para o perigo do que definiu como "complexo industrial-militar".

Disse Einsenhower, então: "Fomos forçados a criar uma indústria de armamentos permanente de vasta proporções. Além disso, três milhões e meio de homens e mulheres estão engajados diretamente no establishment da defesa. Nós, anualmente, gastamos com segurança militar mais do que o lucro líquido de todas as corporações dos Estados Unidos. A conjunção de um imenso establishment militar com uma grande indústria de armas é uma nova experiência americana. A influência total - econômica, política, mesmo espiritual - é sentida em toda cidade, todo estado, toda casa, todo escritório do governo federal. Reconhecemos a necessidade imperativa desse acontecimento. Mas não podemos deixar de compreender as suas graves implicações. Nosso trabalho, nossos recursos e nossas vidas estão envolvidos, tanto quanto a própria estrutura de nossa sociedade. Nos bastidores do governo, precisamos nos guardar contra a aquisição de uma influência indesejada, pretendida ou não, por parte do complexo industrial-militar. O potencial para a ascensão desastrosa de um poder indevido existe e vai persistir. Não podemos deixar o peso dessa combinação colocar em perigo nossa liberdade ou o processo democrático."


Quase meio século depois, os interesses políticos e econômicos ligados à Defesa estão representados em quase todos os distritos eleitorais do país. Não é incomum ver um democrata que se opõe à ocupação do Iraque protestar quando um possível corte no Orçamento ameaça empregos gerados pelo "complexo industrial-militar" na região que representa. Está aí o verdadeiro limite que qualquer ocupante da Casa Branca, seja ele republicano ou democrata, não quer, não pode ou não consegue atravessar.

O texto acima é parte de um texto maior do Luiz Carlos Azenha, no seu saite, o Vi o Mundo.


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quarta-feira, janeiro 16, 2008

Mafalda e a Democracia

terça-feira, janeiro 15, 2008

Sobre maio de 1968

Já escrevi e falei sobre o movimento de maio de 1968. Como disse na entrevista a Ricardo Musse publicada pela Folha em 1998, eu estava em Paris e entendi tudo errado (há uma gralha no texto da reportagem: eu cheguei na França em 1966 e não em 1996). Também já disse aqui mesmo, no ano passado, que tô fora do narcisismo geracional meia-oiteiro.
Há duas semanas, o jornalista Amauri Barnabe Segalla, da revista Época, pediu-me uma entrevista sobre 1968. A reportagem saída agora na
revista cortou minhas respostas, aumentando a confusão entre o sentido das manifestações do 1968 brasileiro, onde havia a ditadura, e o sentido dos movimentos de 1968 dos EUA e da Europa Ocidental.
Por isso, retomo aqui o texto integral de minha entrevista à Época

- Que legado os movimentos de 1968 deixaram para o mundo de hoje?

R. O historiador Fernand Braudel fala do período histórico chamado “longo século XVI”, cujas mudanças começam antes de 1500 e terminam bem mais tarde, em meados do século XVII. Penso que que há também um “longo 1968” que começa antes de 1968 nos Estados Unidos com as primeiras manifestações contra a guerra do Vietnã e com o Black Power, com as manifestações estudantís lideradas por Rudi Dutschke na Alemanha, e a Internacional Situacionista de Guy Debord, na França. Da mesma forma, as consequências políticas e culturais do movimento de 1968 adentram pelas décadas de 1970 e 1980.

-Há quem diga que as principais mudanças não aconteceram nas ruas, mas dentro de casa, nos valores. A vida social tornou-se mais tolerante. Por exemplo: a divisão de papéis entre homens e mulheres foi recalculada. Os pais perderam a autoridade sobre os filhos. Você concorda que a única herança é de caráter social?

R. – É verdade que as mudanças culturais foram importantes. Mas as mudanças políticas também foram. Nos Estados Unidos, a guerra do Vietnã terminou em 1975 (mesmo se o país retomou guerras de agressão mais tarde), o regime de quase apartheid que mantinha os negros americanos numa situação de infra-cidadania foi desmantelado. Agora até Bush venera Martin Luther King. Na Alemanha, o Partido Verde é herdeiro direto do movimento dos sixties. O tema da ecologia tornou-se uma reinvidicação universal e agora é encampado pela ONU e o direito internacional.

Como seria o mundo hoje se a juventude, e não a repressão, tivesse vencido?-

R. Na França não houve repressão propriamente dita. Apesar das batalhas de rua do mês de maio, a polícia nunca atirou nos estudantes. Como noutros lugares, o movimento lançava reinvidicações e protestos, mas não planejava tomar o poder ou transformar-se em governo porque sabia que era minoritário eleitoralmente. Na América Latina era diferente porque havia ditaduras em toda a parte. No México, houve em outubro de 1968 o “massacre de Tlatelolco” onde mais de 300 estudantes e manifestantes foram assassinados pelo Exército. Isso relativizou as coisas e escancarou a truculência da direita latino-americana.

- Afinal, 1968 transformou o mundo?

R. Acho que as correntes políticas e culturais desta época mudaram as sociedades contemporâneas. Todas as manifestações anti-autoritárias de massa dos anos seguintes - no Chile em 1973, em Portugal em 1974, no Brasil em 1984 (as Diretas Já!), na China em 1989 – filiam-se ao movimento de 1968.

Por que hoje nenhum movimento é capaz de mobilizar os jovens como antigamente?

R. Não é bem assim. Na Sorbonne, em Paris, na França, sempre há manifestações estudantís e sindicais. Faz parte da cultura política do país. Há no mundo todo um sentimento pacifista que também saiu de 1968. Na Inglaterra e na Espanha houve nos últimos anos manifestações de massa importantes, contra a invasão do Iraque, que acabaram por derrubar Tony Blair e Aznar.

Texto do professor Luiz Felipe de Alencastro, no Seqüências Parisienses.

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Charles Taylor, lições para a África e perguntas ao Brasil

Se alguém por aqui assistiu ao filme "O Senhor das Armas" deve lembrar do personagem André Baptiste, o tirano africano que era um dos melhores clientes do traficante de armas interpretado por Nicholas Cage e que funcionava como uma espécie de espelho no qual o protagonista via refletidos seus piores defeitos. Numa cena, após matar um soldado que lhe havia irritado, Baptiste lamenta: "A juventude de hoje é muito desregrada. Para mim, a culpa é da MTV."

Baptiste é inspirado no ex-ditador da Libéria, Charles Taylor. Durante os anos 90 ele comandou um grupo rebelde contra outro ditador, Samuel Doe. Ambos os lados cometeram atrocidades no conflito e em 1997 concordaram em resolver a disputa por eleições. Taylor concorreu com o slogan mais infame de todos os tempos: "Ele matou minha mãe, matou meu pai, mas votarei nele." Na realidade, o candidato ameaçava retomar a guerra se perdesse. Ganhou.

Taylor rapinou a Libéria como presidente, entre 1997 e 2003, e não satisfeito resolveu intervir na guerra civil do país vizinho, Serra Leoa, apoiando duas facções rebeldes com armas, dinheiro e soldados, em troca dos diamantes do país - o filme "Diamante de Sangue" é um retrato ficcional melodramático, mas razoavelmente preciso, daquele conflito.

Até aí temos os clichês habituais sobre a África. Mas o jogo mudou no contiente: a guerra civil em Serra Leoa acabou com uma bem-sucedida intervenção dos britânicos e das Nações Unidas e foi formado um interassante tribunal misto, com juízes estrangeiros e locais, para julgar as violações de direitos humanos no conflito. Por ordem dessa instituição, Charles Taylor - já fora do poder na Libéria - foi encarcerado.

Ele se tornou o primeiro ditador africano a estar em julgamento por seus crimes. O processo começara no ano passado, mas fora interrompido, e recomeçou nesta semana. Está sendo marcado por depoimentos emocionantes, como não poderia deixar de ser numa guerra que envolveu mutilações de civis, recrutamento forçado de crianças-soldados e trabalho escravo em minas de diamantes.

Os governos africanos sempre foram muito relutantes em aceitar intervenções humanitárias, mas a maré começou a virar após o genocídio em Ruanda, em 1994. O tribunal de Serra Leoa confirma a tendência e é significativo que a atual presidenta da Libéria, Ellen Johnson-Sirleaf, tenha sido das pessoas que mais colaboraram para a prisão de seu antecessor, que estava exilado na Nigéria. Johnson-Sirleaf é a primeira mulher a ser eleita para chefiar um Estado na África, e trata-se de respeitada economista educada em Harvard, com longo histórico de millitância pró-democracia.

A África está mudando, mas será que o Brasil percebe isso? A política externa brasileira para o continente tem sido marcada por gafes inacreditáveis no que diz respeito à democracia e aos direitos humanos. Lula visitou e abraçou alguns dos piores tiranos da região, como os ditadores do Gabão e de Burkina Faso (que também interveio em Serra Leoa, aliás junto com Kadafi, da Líbia), com freqüência fazendo piadas sobre o longo tempo que eles ocupam o poder. Fora a apatia brasileira diante do genocído de Darfur, em contraste com as posições firmes defendidas por outros países latino-americanos, como a Argentina.

O Brasil poderia - e deveria, a meu ver - ter uma agenda diferente, procurando destacar a importância de líderanças renovadoras como as de Johnson-Sirleaf.

E aqui temos outro ponto delicado. Em todo o planeta, autoridades que violaram direitos humanos em ditaduras e guerras estão sendo julgadas e presas. Isso ocorre na América do Sul (Argentina, Bolívia, Chile, Peru, Uruguai), na África (Serra Leoa, Libéria, Ruanda), na Europa (Ex-Iugoslávia). Mesmo Estados que proclamaram anistias passaram por amplas comissões de verdade e reconciliação, ajudando na tarefa de passar a limpo um passado difícil - caso da África do Sul, da Guatemala, de El Salvador.

O Brasil optou pela impunidade e pelo silêncio, ficando na incômoda companhia das piores ditaduras da Ásia e do Oriente Médio, as únicas que se comportam assim. Os contrangimentos internacionais a que o Brasil está submetido ficam claros nos processos que juízes europeus, como da Espanha e da Itália, movem contra militares brasileiros por conta de seqüestros, torturas e assassinatos a nacionais daqueles países.

As leis brasileiras concederam anistia aos crimes da época e proíbem a extradição de cidadãos nacionais. No entanto, os processos europeus contribuem para colocar em evidência as posições vergonhosas assumidas pelo Brasil. O mundo mudou. Soberania não é mais um escudo que se possa usar para esconder erros e crimes. Seu novo sentido é o conjunto das obrigações que garantem a vida civilizada, assumidas perante seus próprios cidadãos e a sociedade internacional. Isso vale em Monróvia, Freetown, Kigali, Lagos e até em Brasília.

Do blog Todos os Fogos o Fogo.

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sábado, janeiro 12, 2008

Leituras Atrasadas: Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano

MENDOZA, Plínio, Apuleyo. Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano / Plínio Apuleyo Mendoza, Carlos Alberto Montaner, Álvaro Vargas Llosa. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil : Instituto Liberal, 1997.

Com mais de dez anos de atraso enfrentei o panfletão do filho de Mário Vargas Llosa e associados, com prefácio do falecido Roberto Campos ("Bob Fields"), e apresentação do consagrado escritor peruano. Acredito que este título sui-generis seja uma peça de humor filo-americano, pois nos Estados Unidos da América encontramos séries de livros chamadas "for dummies" (algo como para retardados, ou para atrasados), ou "the complete idiot guide to" (o guia do completo [perfeito?] idiota para...) A propósito, é justo Mário Vargas Llosa, na apresentação quem afirma que o livro é um panfleto.
É qual a propaganda que o panfleto divulga? As bênçãos do liberalismo, ora!
O livro é não muito mais que isso. Uma peça de louvor ao livre-comércio e à livre-iniciativa. Para isso ele tenta fazer troça das reflexões acontecidas no subcontinente, nos últimos 50 anos, disparando contra os estudos feitos pela CEPAL, a Comissão para o Desenvolvimento da América Latina, organismo da ONU, a partir da década de 1940, disparando contra a Teoria da Dependência, formulada por Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto na década de 1960, disparando contra a Revolução Cubana e a Revolução Sandinista, disparando contra as medidas estatizantes tomadas por diversos governos da região.
Embora sejam corretos nas citações factuais, o fato do livro ser um panfleto dificulta a aceitação de suas teses. Os autores conhecem mais a América de língua espanhola que a de língua portuguesa. Talvez aí o passar despercebido pelo livro que sem a ditadura de Getúlio Vargas, e as suas medidas estatizantes não haveria desenvolvimento industrial no Brasil, ou ele teria sido muito mais lento.
Os autores gostam de citar o suposto sucesso do novo sistema de previdência do Chile, não citando que ele foi imposto a ferro e fogo pela ditadura do general Pinochet. Também, como o livro foi escrito há dez anos atrás, pode-se desculpar os autores por não saberem que o sistema previdenciário privado chileno está pagando as primeiras pensões agora no início do século XXI, e que estas pensões são menores que as pagas pela previdência estatal chilena, e, em muitos casos, insuficientes para o sustento dos pensionistas. Também não citam que parte da atual prosperidade chilena é possível em parte devido ao regime militar ter "exportado" parte da população, primeiro parte da oposição como exilada política, depois muitos dos cidadãos que saíram do país quando o país enfrentou uma brutal recessão no final dos anos 1970.
Eles também disfarçam mal a sua simpatia pelos Estados Unidos, e desculpam as diversas intervenções realizadas pelo Grande Irmão do Norte na América Latina ao longo do século XX, seja diretamente, como Haiti, ou República Dominicana; seja indiretamente através de suas agências de inteligência e propaganda com a colaboração de parte das oligarquias locais, como no Brasil, ou no próprio Chile.
Quando eu pensasse em questionar o que os autores pensam sobre o liberalismo que houve na América Latina no início do século XX, quando esta se tornou uma grande fornecedora de produtos primários para a Europa e os Estados Unidos (pense no café do Brasil, no trigo e nos derivados bovinos da Argentina, nos minérios da Bolívia, ou do Chile), eles colocam que desde o final do século XIX e in´cio do XX, no subcontinente, a autêntica era do "laissez-faire" era, na verdade, uma época de caudilhismo e patrimonialismo. Curiosamente, muitos dos que eles dizem hoje como patrimonialistas, gostavam de se ver como liberais naquela época. Assim fica parecendo que os autores professam um tipo de "liberalismo ideal", ou 'liberalismo platônico". Ele é um ideal, que quando aplicado a algumas condições históricas determinadas, como o início do século XX, deixa de ser liberalismo para se transformar em outra coisa. É uma contraparte interessante para o comunista-marxista idealista, aquele para o qual os regimes do "socialismo real existente", inaugurado pela União Soviética a partir de 1917 nunca foi comunismo, e, portanto, os abusos ocorridos nos países do socialismo existente não podem ser debitados na conta do comunismo ideal de Marx.
Também é digno de se notar que os autores, enquanto professem fé na livre iniciativa e no livre comércio, não incentivem muito a livre movimentação de pessoas também. O comércio e a iniciativa são bons. Mas se você acha que onde você está não há oportunidades, eles não lhe incentivam a ir buscar oportunidades em outro lugar. Talvez para não associar que, até o momento, as nações que mais prosperaram com o livre comércio, e se tornaram as mais desenvolvidas economicamente, sejam as mesmas que tentam de todas as maneiras impedir a entrada de migrantes indesejados, mas como a demanda existe, se formam quadrilhas que fomentam o tráfico internacional de seres humanos.
O livro não tem boas qualidades? Sim, tem, mas como ele é um panfleto, e não uma obra comprometida com a busca de alguma verdade, ela quer transmitir a sua verdade já consagrada, as qualidades da obra podem ser encontradas em outros estudos de caráter liberal mais sérias.

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sexta-feira, janeiro 11, 2008

160 Bilhões de Juros

Em 2007 pagamos 160 bi só de juros

O Brasil gastou menos com o pagamento de juros em 2007. Os economistas celebraram o percentual de pouco mais de 6% do Produto Interno Bruto (PIB) – que é a soma de toda riqueza produzida pelo país - gasto com o pagamento de juros. O percentual é o menor desde 1997 quando o país gastou aproximadamente de 5% do PIB. No entanto, apenas em 2007, foram gastos mais de R$ 160 bilhões com pagamento de juros.

O gasto com a quitação de juros está ligado com o valor da Taxa Selic, regulada pelo Banco Central, e que hoje está em 11,25%. O economista e presidente do Instituto Desemprego Zero, José Carlos de Assis, afirma que há espaço para maiores cortes no seu valor.

“Há muito espaço para uma queda maior, porque os nossos juros são extravagantes. Ela [a Selic] ficou muito tempo alta e pode cair”.

O valor da Selic está diretamente relacionado com o acesso ao crédito. Quanto menor os juros, maior a facilidade para se conseguir crédito e conseqüentemente, mais dinheiro circula na economia do país.

Se a capacidade de produzir bens de um país é menor que a quantidade dinheiro circulando, tem-se conseqüentemente uma desvalorização desse dinheiro, fato que leva à inflação.

O Banco Central teme que um corte maior na taxa de juros gere inflação no país. No entanto, José Carlos, afirma que a política conduzida pela instituição é restritiva.

“Quanto à questão do espaço para cair sem afetar o controle da inflação, eu digo que certamente existe este espaço. Quem diz que é preciso aumentar ou manter a taxa de juros elevada para combater a inflação, em geral é aplicador em títulos públicos e está sendo remunerado por essa taxa de juros alta”. A informação é da Radioagência NP.

Do Diário Gauche.

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E por falar em violência policial...

...O que aconteceu com o policial que matou um sindicalista na região de Igrejinha no governo Rigotto (por "acidente", segundo se alegou na época)?

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Parabéns Atrasados

A governadora Yeda Crusius e o secretário da segurança José Francisco Mallmann merecem todo apoio ao trocaram a cúpula da Brigada Militar na serra, após o episódio em que um grupo de policiais se viu envolvido em práticas de violências e torturas contra alguns moradores de Flores da Cunha.
Esta medida é digna de todo apoio, e espera-se que as punições não fiquem apenas em transferências para regiões longínquas do estado até que o caso caia no esquecimento. É necessária a apuração de responsabilidades e punição de culpados perante a justiça.

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quinta-feira, janeiro 10, 2008

Charge do Bier



Recebida via correio eletrônico.

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CPMF - 2

Morreu mesmo

NO INÍCIO de 2008, o Brasil pode comemorar não apenas resultados bastante bons no campo econômico mas também o fortalecimento das instituições democráticas inscritas na Constituição de 1988.
A rejeição da continuidade da "provisória" CPMF pelo Senado e a naturalidade com que o Executivo a absorveu demonstram claramente que estamos num outro patamar institucional: a independência entre os Poderes começa a produzir os seus efeitos equilibradores. Do ponto de vista da construção de uma sociedade decente, o resultado, por mais perturbador que seja, transcende às conseqüências de uma redução imediata da receita sobre os programas do Executivo.
Estas serão certamente graves, mas a decisão do Legislativo é definitiva. Não há contestação possível. A CPMF morreu. Agora é refazer a peça orçamentária com a cooperação do Congresso para saber como se procederá ao ajuste.
Talvez a grande surpresa da oposição tenha sido a reação tranqüila do presidente. Dele ela esperava a manifestação do "furioso apetite de vingança", de que nos fala Montaigne, ou o "não importa que o Universo pereça, desde que eu me vingue", de Cyrano de Bergerac.
Para sua desilusão, Lula engoliu a amarga pílula e foi logo avisando o essencial: "Vamos cumprir o que determinou o Legislativo, mas protegeremos os gastos sociais e não violaremos o equilíbrio fiscal. O déficit nominal não será maior e o superávit primário não será menor do que os atuais". Era exatamente isso o que o público precisava ouvir no momento em que as coisas vão bem internamente, mas nuvens escuras se formam no horizonte externo. De acordo com os compromissos que precederam à aprovação da Desvinculação da Receita da União (a DRU), os dois Poderes sentarão à mesa para determinar como se fará o dramático ajuste orçamentário.
A grande questão que a oposição vai enfrentar -e que não será surpresa para ela, que foi governo durante uma década- é que não existe problema, por mais complicado que seja, que, quando analisado sob o ângulo correto, não fique ainda mais complicado... Isso, entretanto, não será desculpa.
Governo e oposição têm de chegar rapidamente a um acordo explícito e transparente sobre o que e quanto cortar. Uma conseqüência não esperada desse evento talvez seja o início da criação de um novo mecanismo de orçamentação que exija uma cooperação mais íntima e mais eficaz entre o Executivo e o Legislativo, principalmente no acerto prévio da estimativa da receita global.
O Executivo sempre a subestima, e o Legislativo sempre a superestima para os seus propósitos.

Coluna de Delfim Netto, na Folha de São Paulo (para assinantes), de 9 de janeiro de 2008.

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quarta-feira, janeiro 09, 2008

CPMF

A queda da CPMF é, talvez, o mais emblemático dos exemplos: foi derrubada pelos partidos que a criaram e foi defendida pelo partido que, quando era oposição, a ela se opunha ferozmente. Não foi criada nem extinta em função de ser um bom ou um mau tributo, mas em função de dar ou retirar dinheiro do governo de turno.

Clóvis Rossi em sua coluna da Folha de São Paulo(para assinantes), de 9 de janeiro de 2008.

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Cidadania: um olhar sobre o futuro


A cidadania há de ser conquistada através da luta individual e através da luta coletiva.

Há situações concretas onde o cidadão tem de travar uma luta individual para conquistar seus direitos.

Esta luta individual, solitária, que o cotidiano da vida às vezes exige, é sempre dura e difícil.

A luta individual é mais penosa, mais longa, com possibilidade de êxito menor. Porém, se uma situação concreta reclama a luta individual, não devemos recuar diante dos obstáculos. Devemos buscar nossos direitos, custe o que custar.

Podemos renunciar a um direito por generosidade, jamais por comodismo ou apatia. Dou o exemplo: posso rasgar um documento de crédito, de que sou titular, se o devedor encontra-se numa situação aflitiva, porque o homem não pode ser lobo de outro homem. Neste ponto discordamos humildemente do grande jurista Rudolf von Ihering que, na sua obra clássica “A luta pelo Direito”, não admite a renúncia a direitos.

Sempre que for possível, devemos recorrer à luta coletiva.

Imaginemos uma situação na qual várias pessoas têm um mesmo interesse a defender perante a Justiça. Ora, será muito mais prático que se juntem para uma ação em comum do que cada um lutar separadamente.

Pela Constituição de 1988, os sindicatos, as entidades de classe, as associações, os partidos políticos podem ingressar coletivamente em Juízo em favor de centenas ou milhares de pessoas.

Para a luta coletiva, em seus diversos níveis, a sociedade tem de aprender a organizar-se. Os pleitos que se formulam de maneira atabalhoada não são vitoriosos. O planejamento, a discussão, a partilha dos problemas, a montagem de uma estratégia de luta – este me parece ser o caminho para o bom encaminhamento das causas que envolvem muitos.

Se a organização autônoma da sociedade é indispensável aos avanços sociais e às pugnas em prol da Cidadania, nem por isso o Poder Público está dispensado de fazer sua parte.

Numa sociedade democrática, os Poderes Públicos estimulam, encorajam e apóiam todo o esforço que se desenvolva no sentido da consolidação da Cidadania. Daí a importância da criação de Conselhos de Cidadania e Direitos Humanos, por iniciativa governamental, no âmbito federal, estadual ou municipal.

Também quando se trata de uma luta extrajudicial (isto é, uma luta fora da Justiça), será sempre mais eficaz a luta coletiva.

Um provérbio popular resume tudo isto que estamos dizendo: “Uma andorinha só não faz verão”.

As classes dominantes desencorajam as lutas coletivas. Com freqüência, os líderes das lutas coletivas são perseguidos, presos e até mesmo assassinados.

Também os meios de comunicação social, freqüentemente a serviço das classes dominantes, estimulam o individualismo. Citemos, por exemplo, as novelas de televisão. Com raras exceções, as histórias das novelas são simplesmente histórias individuais. Poucas vezes as novelas apresentaram as lutas coletivas, as lutas do povo. (Há honrosas exceções, por parte de alguns novelistas.)

Mesmo sendo a novela um entretenimento, pode também educar. As novelas e outros programas de televisão, com muita constância, transmitem a mensagem do individualismo. Assim atuando, dificultam o avanço político do povo. (Aqui também é preciso que se registrem as exceções, que merecem todo aplauso.)

O povo tem de aprender a vencer seus desafios, com suas próprias forças. Mesmo que o ambiente envolvente seja adverso, mesmo que a luta coletiva não seja valorizada e enaltecida, é a união que faz a força.

João Baptista Herkenhoff é professor do mestrado em Direito da Universidade Federal do Espírito Santo e membro emérito da Comissão “Justiça e Paz” da Arquidiocese de Vitória.

E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br



Texto do Correio da Cidadania.

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domingo, janeiro 06, 2008

A Violência no Quênia

O Quênia é um dos países mais desenvolvidos da África mas a imprensa está errada ao afirmar que era conhecido por sua estabilidade. O país passou por três surtos de violência étnica nos últimos 15 anos, e o atual sequer é o pior. As raízes do conflito estão na corrupção e no mau gerenciamento do Estado por parte de políticos da etnia dominante, os kikuyu.

O atual presidente, Mwai Kibaki, foi eleito em 2002 em substituição a quase 25 anos de ditadura de Daniel arap Moi. A vitória de Kibaki despertou muitas esperanças nas instituições de cooperação internacional, que investiram bastante no Quênia. Meus amigos nas fundações partidárias alemãs me contaram que apostaram muito em seu projeto de conciliação e combate à corrupção, mas que logo se decepcionaram com os resultados.

Kibaki havia se aliado a Raila Odinga, da etnia luo, e falado na necessidade de superar os conflitos étnicos. A parceria entre os dois durou poucos anos e desde então se tornaram rivais. Odinga era o favorito para vencer a eleição presidencial de dezembro e fez sua campanha ressaltando que a corrupção dos kikuyu deixava os mais pobres em péssima situação. Quando Kibaki foi reeleito sob fortes suspeitas de fraude, a violência explodiu em mais de 300 mortos, principalmente por conflitos entre kikuyus e luos, mas envolvendo também outros grupos como kalenjin (muitos dos famosos velocistas quenianos são dessa etnia) e luhyas. O episódio mais chocante foi a queima de uma igreja na cidade de Eldoret, com mais de 50 pessoas assassinadas. Muitas cenas lembram os acontecimentos trágicos do genocídio em Ruanda, com milícias armadas de facões em busca de seus inimigos.

Há muita pressão internacional e dos líderes empresariais kikuyus para que o presidente Kibaki decrete um “governo de união nacional” e dê postos de importância a Odinga e seus aliados. Provavelmente será um arranjo precário, mas é a melhor alternativa existente no momento. Os desdobramentos externos da crise atingem a própria eleição presidencial nos Estados Unidos: o pai de Barack Obama era um queniano da etnia luo. O político americano prega a necessidade de conciliação.

No ano passado o Fórum Social Mundial aconteceu em Nairóbi, a capital do Quênia. Conversei com muitos ativistas brasileiros que foram para lá e todos, em especial os negros, ficaram desapontados com os ódios existentes entre as diversas etnias. O racismo não ocorre só entre pessoas de diferentes cores de pele, a estupidez humana é bem mais abrangente.

Muitas pessoas pensarão no Quênia como mais um exemplo de conflito étnico “tipicamente africano”, mas não é bem assim. Uma enorme quantidade de Estados reúnem pessoas de etnias diferentes e o convívio entre elas está longe de ser pacífico. Isso ocorre em países tão distintos entre si quanto Bolívia, Bélgica, Rússia e Sérvia, para citar apenas alguns.

Os Estados africanos têm demonstrado notável capacidade de sobreviver às artificiais fronteiras oriundas da partilha colonial, mas é claro que a presença de grupos étnicos espalhados por vários países cria um elemento de instabilidade no cenário de recursos escassos e crises políticas. Na hora do desespero, as pessoas se voltam para seus parentes. Se você é um tutsi, por exemplo, pode ter primos em Ruanda, Burundi, Uganda. Isso faz com que conflitos étnicos que comecem em um país se alastrem com rapidez, na medida em que há fugas, migrações em massa e pedidos de socorro. O caso mais trágico atualmente é a guerra civil na República Democrática do Congo, que envolve diversos Estados vizinhos. O risco também está presente no Quênia: há relatos de tropas de Uganda intervindo no país.

Texto do blog Todos os Fogos o Fogo.

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quinta-feira, janeiro 03, 2008

Retrato Capital - 26/12/2007

quarta-feira, janeiro 02, 2008

Think Tanks e a Política Externa dos Estados Unidos

Como você muda o mundo? Bem, existem os caminhos óbvios, como tomar o poder, ser absurdamente rico ou trabalhar pesado por meio do processo eleitoral. E existem os atalhos, como o terrorismo ou formar um think tank.
Steve Waters


Minha amiga Tatiana Teixeira acaba de lançar o livro “Os Think Tanks e sua influência na política externa dos EUA” (Editora Revan). O texto recebeu o Prêmio Franklin Roosevelt 2007 da embaixada americana no Brasil como melhor dissertação de mestrado brasileira (defendida no program de Relações Internacionais da UFF) sobre Estados Unidos. Não é para menos: o excelente estudo da Tatiana examina de maneira brilhante a interlocução entre meio acadêmico, consultorias e a política externa americana, concentrando-se na ação dos neoconservadores no governo George W. Bush.

Os thinks tanks são instituições muito importantes em qualquer debate sobre políticas públicas nos Estados Unidos. Contudo, o termo não tem definição clara. Tatiana nos ensina que a expressão nasceu das salas onde se discutiam planos de guerra e foram utilizadas para denominar organizações que se dedicam à pesquisa, estudo e consultoria, visando a influenciar a opinião pública e os líderes políticos americanos. São cerca de 1.500, só nos Estados Unidos. Produzem análises e informações, realizam debates e procuram pautar a imprensa. Empregam acadêmicos, jornalistas, políticos que deixam o governo e funcionam como rede de contatos pessoais entre as elites de determinados setores políticos.

Os primeiros think tanks surgiram após a I Guerra Mundial e Tatiana conta a história de sua expansão, examinando os momentos principais de crescimento e transformação, como a Grande Depressão e os anos 1970. Ela ressalta o papel que as crises políticas tiveram nessas mudanças e mostra os diversos tipos de think tanks e sua vinculação com as principais correntes de opinião dos EUA – conservadores, liberais, centristas - tais como Council on Foreign Relations, Brookings Institution, RAND Corporation.

O governo Bush é um estudo de caso particularmente interessante pela grande influência desempenhada pelos think tanks dos neoconservadores, como Project for the New American Century, Heritage e American Enterprise Institute. Sua influência pode ser medida pelo discurso do presidente num jantar desta última organização: “Vocês fazem um trabalho tão bom que minha administração pegou emprestadas 20 destas mentes.” Na foto do post - Bush cumprimenta membros da organização.

Tatiana analisa as distinções entre os necons e a direita tradicional dos EUA – aprendi muito com seu estudo, ignorava vários dos pontos que ela destaca, sobretudo na área de política econômica. Ela examina com brilhantismo o casamento de conveniência entre neocons e setores como a direita cristã, do governo Reagan em diante e como os necons conquistaram poder após os atentados de 11 de setembro, ao oferecer uma agenda pronta para a diplomacia americana no Oriente Médio.

A autora é uma jornalista experiente com passagens pelo Globo, Agência Efe e atualmente na France Presse. Isso significa, além do texto claro e objetivo, muitas observações pertinentes sobre as relações entre imprensa e think tanks. Como repórteres apressados por prazos curtos freqüentemente recorrem aos “suspeitos de sempre” como entrevistados e como a obsessão de muitos think tanks com presença na mídia os leva a simplificações perigosas, transformando análises em slogans políticos facilmente memorizáveis e empobrecendo o debate democrático. Alerta importante que merece consideração de jornalistas e de acadêmicos.

Do blog Todos os Fogos o Fogo.

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