sábado, abril 28, 2007

Reeleição

Este blog apóia o fim da reeleição. É difícil distinguir o governante do candidato, quando chega o período eleitoral. Este é o argumento básico. Nos termos atuais, a eleição com candidato à reeleição é um plebiscito para os eleitores confirmarem se dão quatro anos a mais para o governante, ou como disse alguém, o cidadão se candidata a um mandato de 8 anos com um plebiscito no meio para ver se o eleitorado gostou dos primeiros quatro anos.
Pois o Terra Magazine trás um texto e uma entrevista sobre a reeleição. O texto é do ex-governador de São Paulo, Cláudio Lembo, onde ele rememora que os constituintes de 1891, no início da república, se questionaram sobre a reeleição, e acabaram por estabelecer que não haveria reeleição na primeira constituição da república. Esta tradição se manteve no Brasil, e foi respeitada inclusive pela sucessão de generais-presidentes do ciclo de 1964-1985, no regime de exceção. E a tradição foi quebrada pelo ex-presidente FHC, no golpe constitucional, que lhe permitiu reeleger-se em 1998, na onda do real. O senhor Lembo coloca que foi um erro, mas que outro erro agora seria encaminhar o fim da reeleição em uma possível reforma política. Não haveria nenhuma necessidade de priorizar tal assunto, a não ser, talvez viabilizar a sucessão de candidaturas de José Serra e Aécio Neves, pelo PSDB. Resolver um problema do PSDB.
O filho do prefeito do Rio de Janeiro, o deputado Rodrigo Maia, em entrevista à Terra Magazine afirma que a reeleição foi feita de maneira errada. Pois é, agora é tarde senhor deputado! Mas ele também reafirma que não prioridade para discutir o fim da reeleição agora. Seria mudar a constituição para resolver o problema do choque de candidatos do PSDB. Para resolver o choque de candidatos, segundo ele, há as convenções partidárias.
Este blogueiro acredita que a relativa estabilidade política dos últimos anos é uma conquista. Mas reafirma que a reeleição sem desincompatibilização deveria ser abolida no Brasil. Contudo pensando no texto do ex-governador Cláudio Lembo, seria bom que, se os nossos congressistas tratarem do assunto, e acabarem com a reeleição, fariam bem se convocassem a população a um referendo para ratificar a decisão, ou rejeitá-la.

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Da Agência Carta Maior: Organização de Trabalhadores Diminui Violência no Campo



CONFLITOS NO CAMPO 2006

‘Sem-terra organizado’ ajuda a reduzir violência, diz CPT

Amazônia manteve liderança no ranking da violência. O fato de que as organizações sociais são menos articuladas no Norte do que no Centro-Sul demonstra, segundo a CPT, que processo organizativo protege os trabalhadores e ajuda a reduzir a violência.

Verena Glass - Carta Maior

Data: 17/04/2007

SÃO PAULO – Lançado nesta segunda-feira (16) em Brasília, o relatório anual da Comissão Pastoral da Terra (CPT) sobre conflitos no campo, referente a 2006, detectou uma pequena queda nas ocorrências relacionadas à posse, ao uso, à resistência e à luta pela terra em relação ao ano anterior. Mas a permanência das condições estruturalmente geradoras de violência, como a concentração da propriedade da terra e o avanço do modelo agroindustrial e das monoculturas de commodities, comumente vetores de violações dos direitos trabalhistas, não deve alterar as tensões que atingem tanto trabalhadores rurais quanto populações tradicionais.

Segundo a CPT, em relação a 2005, o ano passado teve uma diminuição de 12,13% nos índices de ocupações, 25,56% no surgimento de acampamentos e de 2,06% nos confrontos conflituosos. Também diminuíram as ameaças de morte contra trabalhadores, as torturas, e as denuncias e ações de libertação de trabalhadores escravos, bem como o número de pessoas resgatadas.

Por outro lado, houve um aumento na porcentagem de tentativas de assassinato (176,92%), assassinatos (2,63%) e prisões (251,34%) de trabalhadores rurais, envolvendo 72 pessoas no primeiro, 39 no segundo e 917 no terceiro caso. Também aumentou o número de trabalhadores superexplorados (96,12% maior do que em 2005, envolvendo 7.078 pessoas). Já quanto ao desrespeito à legislação trabalhista, as ocorrências registradas foram 62,50% menores (27 em 2006, contra 72 em 2005), mas aumentou em 167,05% o número de trabalhadores envolvidos. As mortes em acidentes de trabalho também aumentaram em 100%.

Na avaliação das ocorrências do ponto de vista regional, a CPT destaca alguns dados como indicativos importantes para a análise política do Relatório. A Amazônia – e em especial o Pará – manteve a liderança no ranking da violência, com o Centro-Sul na outra ponta. Já no tocante às mobilizações e ocupações, no geral a relação se inverte. O fato de que as organizações sociais são menos articuladas no Norte do que no Centro-Sul, aponta a CPT, demonstra que, por um lado, o processo organizativo é um mecanismo de proteção dos trabalhadores. Por outro, desmonta o argumento de que são os movimentos e suas ações os geradores de conflito e violência.

Responsável por acompanhar os conflitos no campo em nome do governo, a Ouvidoria Agrária Nacional, ligada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, não contradiz os dados da CPT, apesar de apresentar números diferentes em seus levantamentos semestrais. “É uma diferença metodológica. Para medir os casos de assassinatos,por exemplo, nos baseamos estritamente em dados oficiais da Justiça e das delegacias. Já a CPT faz levantamento de dados a campo”, diz o ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino José da Silva.

Questionado sobre os mecanismos adotados pelo governo para combater os conflitos agrários, o ouvidor apontou iniciativas como o Plano Nacional de Combate à Violência no Campo e o Programa Paz no Campo, que prevê a capacitação de mediadores de conflitos sociais, atendimento de denúncias, mediação de conflitos agrários e a implantação de ouvidorias agrárias nos estados.

Segundo o advogado do MST Patrick Mariano, iniciativas como a criação de órgãos ou comissões de negociação são válidas, mas funcionam apenas como paliativos. “Ao mesmo tempo também atestam a inoperância e incompetência do governo em solucionar a questão da má distribuição de terras que, no nosso ponto de vista, é o centro do problema. Enquanto o governo não avançar concretamente na reforma agrária, a violência no campo será uma constante e novas e outras formas paliativas de amenizar o grave quadro de conflito social no campo haverão de ser criadas, com nomes diferentes é claro”.

http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13874&boletim_id=267&componente_id=5084


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sexta-feira, abril 27, 2007

Rotulagem de transgênicos

quarta-feira, abril 25, 2007

Hambre Cero

Do Terra Magazine: o presidente da Nicarágua, recém empossado lançou o "Hambre Cero", ou na língua brasiliana, "Fome Zero", um projeto visando a segurança alimentar das famílias mais frágeis economicamente do país. Serão 15.000 famílias, ou 100.000 indivíduos atendidos pelo projeto ao longo dos próximos 5 anos.
É o presidente Lula fazendo escola mundo afora. :)

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Emir Sader Recebe Medalha na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro

O sociólogo Emir Sader recebeu(*) hoje, dia 25, a Medalha Tiradentes, da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, ofertada a partir de proposição do deputado Gilberto Palmares (PT). A informação está no blog dele, na Agência Carta Maior.
Provavelmente a homenagem é um desagravo à condenação em primeira instância do sociólogo, em processo movido pelo ex-senador Jorge Bornhausen (DEM, ou Democratas, antigo PFL)(**), devido a um artigo que o professor Emir Sader escreveu respondendo a uma manifestação do então senador na sede da FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, onde indagado sobre se se sentia infeliz com a crise política que acabou apelidada de mensalão, o Bornhausen disse que, pelo contrário, estava feliz, pois a partir da crise, "a gente se veria livre desta raça". Raça ali poderia se referir aos petistas, ou aos esquerdistas em geral, ou talvez o senador estivesse dando vazão a algum sentimento íntimo de superioridade que ele sentia, ou sente, a relação a algum grupo de brasileiros que ele considerasse como uma sub-raça.
A condenação em primeira instância foi particularmente forte, pois o juiz condenou o sociólogo por injúria a pena de um ano, convertida em prestação de prestação de serviços à comunidade, como ainda à perda da cátedra de professor na Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Emir Sader recorreu da sentença.
(*) No seu blog, Emir Sader informou, no dia 21 passado, que iria receber a Medalha dia 25 próximo, às 18 h 30 min. Como este blog é atualizado à noite, acredito que ele tenha a recebido.
(**) Processando o sociólogo, o ex-senador demonstrou que é um grande "Democrata". O antigo PFL demonstrou grande coerência ao alterar o seu nome.

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Do Observatório da Imprensa: Debate sobre Transgênicos

Edição 423 de 6/3/2007
www.observatoriodaimprensa.com.br
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DEBATE EMPERRADO
Mídia omite decisões judiciais sobre transgênicos

Maurício Tuffani

Apesar do gancho oferecido pelo confronto entre a CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) e o Greenpeace Brasil, a chamada grande imprensa brasileira não fez, ao longo dos últimos dez dias, referência alguma a uma importante reportagem veiculada pela revista norte-americana Science em sua edição de 23 de fevereiro: três tribunais federais dos Estados Unidos exigiram estudos de impacto ambiental para plantios experimentais de sementes transgênicas.

Não é o caso de desconhecimento geral da reportagem "U.S. Courts Say Transgenic Crops Need Tighter Scrutiny" [Cortes dos EUA afirmam que sementes transgênicas precisam de exame mais rigoroso] (Science 23/2/2007: Vol. 315. no. 5815, pág. 1069). Editada pela AAAS (American Association for the Advancemente of Science), a revista, que é semanal e se dedica especialmente à publicação de artigos de cientistas, mantém a seção de reportagens "News of the week", cujos textos são compreensíveis pelo público não-especializado.

Além do website da Science, a reportagem foi divulgada no Brasil, na quarta-feira (28/2) - dessa vez com o texto integral - para jornalistas, ambientalistas e especialistas em meio ambiente por e-mail do atento David Hathaway, da ONG AS-PTA (Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa), ferrenha opositora dos transgênicos. Nem assim teve repercussão.

Plantios experimentais

Assinada pelo jornalista Dan Charles, a matéria comenta as decisões de cortes federais distritais em San Francisco, na Califórnia (12/2/2007), na capital Washington (5/2) e no Havaí (agosto de 2006), todas elas referentes a ações propostas pela organização não-governamental Center for Food Safety contra aprovações de plantios experimentais de sementes transgênicas pelo USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o ministério da agricultura do país).

A primeira sentença suspendeu a aprovação pelo USDA do plantio da alfafa Roundup Ready, desenvolvida pela Monsanto e pela Forage Genetics International, destinada a dar resistência ao herbicida glifosato. Em sua sentença, o juiz federal distrital Charles Breyer afirmou, segundo a reportagem, que o USDA violou o National Environmental Protection Act (Lei Nacional de Proteção Ambiental) por não ter exigido previamente estudo de impacto ambiental e que essa missão se agravara pelo fato de já existirem plantios de soja e de milho transgênicos resistentes ao glifosato.

Will Rostov, procurador da ONG e autor das três ações, qualificou a decisão como "mais um prego no caixão" da abordagem omissa do USDA em relação à regulamentação. O advogado Stanley Abramson, que trabalha para diversas empresas de biotecnologia, anunciou que vai recorrer das três decisões em cortes superiores.

O segundo veredicto, diz a matéria, anulou a aprovação do USDA de plantios em uma área de 163 hectares em Madras, no Oregon, de sementes para gramados (turf grass), e a terceira sentença referiu-se ao licenciamento pelo ministério de plantios, também experimentais, de variedades de cana-de-açúcar e de milho desenvolvidas para produzir fármacos "sem considerar as numerosas espécies ameaçadas do estado".

Equilíbrio e bom senso

Para quem vem acompanhando a questão dos alimentos transgênicos na mídia, não é estranha a omissão a essa reportagem, pois o tema se tornou uma guerra de desinformação. Com o perdão pela autocitação e pelo comodismo de não querer escrever a mesma coisa com outras palavras, quase nada mudou desde que eu disse quatro anos atrás, em outro artigo:

"Dependendo da fonte, o leitor, telespectador ou ouvinte estará convencido de que já está provado que os produtos transgênicos são inofensivos à saúde e ao meio ambiente, ou justamente do contrário; também estará convencido de que o Brasil pode `perder o bonde da História´ para impulsionar sua agricultura e ganhar mercados se não cultivar esses alimentos, ou de que o país poderá se beneficiar da preferência de consumidores europeus que rejeitam essa inovação da genética.

"Diversas metáforas e comparações têm sido usadas por ambos os lados: os contrários aos transgênicos sendo mostrados em pé de igualdade àqueles que em 1904 promoveram a grande revolta contra a vacina da varíola no Rio de Janeiro; e os favoráveis a esses alimentos comparados como os pesquisadores otimistas que apoiaram o uso do inseticida DDT, hoje proibido em vários países por seus efeitos danosos à saúde e ao meio ambiente." ("Os transgênicos e a guerra da desinformação", 13/4/2003, Boletim Galileu)

Raros têm sido na mídia os apelos ao bom senso e ao equilíbrio nesse tema. Raramente são publicadas reportagens ou artigos elaborados com consciência da complexidade que ele envolve, em seus aspectos científicos, ambientais, econômicos, sociais e até geopolíticos. Na contramão dessa tendência, a Folha de S.Paulo publicou no domingo (4/3), no caderno "Mais!", duas ótimas resenhas do seu colunista Marcelo Leite, que estão disponíveis na web no post "Transgênicos na estante", em seu blog Ciência em Dia.

Ausência de participação

Uma importante contribuição para um verdadeiro debate sobre os alimentos transgênicos no Brasil está disponível desde junho do ano passado. Trata-se do artigo "Transgênicos e percepção pública da ciência no Brasil" (Ambiente & Sociedade, vol.9, nº 1, Campinas, jan/jun 2006), de Julia S. Guivant, professora do Departamento de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina e coordenadora do Núcleo em Sustentabilidade e Redes Agroalimentares (NISRA).

Em seu artigo, a pesquisadora da UFSC analisa diversas pesquisas sobre percepções de consumidores, produtores, cidadãos em relação ao uso de alimentos transgênicos, estabelecendo comparações entre as desenvolvidas no Brasil, na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos. Segundo ela, "a falta de pesquisas, o seu número limitadíssimo é aqui considerado uma evidência para caracterizar a trajetória da polêmica no Brasil, com uma significativa ausência de participação pública nos debates sobre transgênicos".

O artigo da professora Julia S. Guivant poderia pelo menos servir para arejar as cabeças dos chamados formadores de opinião.


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terça-feira, abril 24, 2007

Novas Evidências Inocentam Homem Que Passou 25 Anos Preso

A notícia veio do UOL. Jerry Miller estava preso há 22 anos. Em 1981, duas testemunhas disseram que o viram fugindo da cena de um estupro. As testemunhas, bem como a vítima o acusaram formalmente, e ele foi condenado em 1982 a 45 anos de prisão. Em liberdade condicional desde o ano passado, era obrigado a usar bracelete eletrônico, bem como a ficar exposto nos saites da justiça dos Estados Unidos, como agressor sexual.
Mas também no ano passado, resíduos de DNA, vindos dos restos de sêmen em roupas da vítima, foram analisados e não batiam com o DNA do condenado, razão pela qual ele foi inocentado, em acordo entre a defesa e a promotoria.
Possivelmente este homem poderá pleitear uma indenização junto ao sistema de justiça dos Estados Unidos. O caso também é ilustrativo do risco da implantação da pena de morte. Se este homem tivesse sido condenado a morte em 1982, não adiantaria nada ser inocentado agora.

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Do Observatório da Imprensa: As Pessoas e As Coisas

Edição 423 de 6/3/2007
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MAIORIDADE PENAL
Quando pessoas são tratadas como coisas

Júlio Henrique Canuto da Silva

O fato foi (e ainda é) amplamente noticiado: a morte desumana de um garoto de 6 anos. Manchete em todos os meios de comunicação e reação imediata da opinião pública. Volta-se a falar sobre a diminuição da maioridade penal, alegando-se que a impunidade é o principal motivo para tais acontecimentos. Será?

É óbvio que os criminosos deverão ser (e, com certeza, serão) punidos - nos rigores da lei -, afinal de contas um crime foi praticado. No entanto, algumas matérias que saem na imprensa - incluindo a capa apelativa da edição 1.995 da revista Veja, onde aparece a foto da vítima seguida da descrição do crime e a exigência de uma atitude de quem a lê - são, no mínimo, perigosas.

O cerne da discussão

Pensar que a diminuição da maioridade penal irá fazer com que crimes como estes não sejam cometidos é uma idéia superficial, simplista e estreita. Ora, a situação carcerária no Brasil é péssima, os presídios estão superlotados e a violência continua aumentando. As FEBEMs, em São Paulo, são a prova de que mesmo os "reformatórios" são muitas vezes piores que os presídios. Ninguém é "reformado" ou ressocializado nestes ambientes, assim como a truculência e violência destes meios não inibem ninguém a cometer crimes pelo simples fato de que quem comete um crime - seja qual for - não está pensando em ser preso ou punido (embora saiba dessa possibilidade), mas apenas em alcançar seu objetivo, que é a motivação para a prática do ato criminoso.

O filósofo Renato Janine Ribeiro, ao falar sobre a violência no país, diz que há "mini-auschwitzes" espalhados pelo território nacional. Pensei num texto do filósofo alemão T.W. Adorno escrito em 1974, intitulado "educação após Auschwitz", no qual que ele analisa as possibilidades da repetição das atrocidades cometidas pelos nazistas no campo de concentração construído na Polônia e questiona como podem ter havido homens capazes de cometer tais atrocidades (desde os projetistas das armas utilizadas no genocídio até os soldados que executavam tais atos). Ou seja, como a sociedade - e quais mecanismos dela - podem ter criado homens assim? Esse questionamento me parece bastante apropriado para o problema aqui discutido.

"Consciente coisificado"

Adorno recorre a autores como Freud, através da sentença "a civilização gera a anti-civilização e a reforça progressivamente", citando os trabalhos Mal-estar na cultura e Psicologia das massas e análise do ego. Não vou entrar aqui neste diálogo com Freud e deixo as obras citadas como uma referência para quem o queira fazer. Quero destacar apenas o que considero fundamental no texto. Diz Adorno:

"Aquilo que exemplificava apenas alguns monstros nazistas poderá ser observado hoje em grande número de pessoas, como delinqüentes juvenis, chefes de quadrilhas e similares, que povoam o noticiário dos jornais, diariamente. Se eu precisasse converter esse caráter manipulativo numa fórmula - talvez não devesse fazê-lo, mas pode contribuir para um melhor entendimento -, eu o chamaria "tipo com consciente coisificado". Em primeiro lugar, as pessoas dessa índole equiparam-se, de certa forma, às coisas. Depois, caso o consigam, elas igualam os outros às coisas."

Valor maior

Aí está a violência em seu estado elementar: tratar o outro como coisa, ou seja, desprovido de sua humanidade. Note-se que a violência não é a agressão física (essa é uma das formas de sua manifestação), mas o modo de perceber o outro e a si próprio.

No dia 13/02, li no sítio Folha Online a notícia de que o menor acusado de participação no assassinato do João Hélio havia assumido a culpa apenas porque o irmão lhe ofereceu um celular em troca. Fiquei perplexo tentando imaginar o que se passa na cabeça de uma pessoa que é capaz de assumir um crime de tamanha crueldade apenas pela promessa de aquisição de um simples aparelho celular. Para aquele sujeito, os objetos - ou seja, as coisas - adquiriram um valor maior que a vida.

Mídia presa ao imediatismo

A proposta de Adorno, no texto citado, está na educação, por meio de dois aspectos: a educação infantil e o esclarecimento geral em que os motivos que levaram ao horror (do genocídio) se tornem conscientes a todos.

Deixo esta proposta de reflexão sobre os motivos originados em nossa sociedade que levam a criarmos personalidades com tais valores, equiparando-se a si próprios e aos outros com as coisas. Acredito que dessa reflexão - questionando o papel e as condições da família, da escola, da mídia etc. na formação das pessoas - poderemos tirar maior proveito para que tantos outros crimes deixem de acontecer, ao invés de ficarmos dando vazão a um desejo de punição que em nada resolve a questão.

É preciso uma tomada de consciência de que o acontecimento de um crime não se resume ao ato de sua execução, mas envolve outras questões que criaram a possibilidade para que ele viesse a acontecer. Será que a mídia é capaz de propor uma maior reflexão ou ficará sempre presa em seu imediatismo?


Leia também
Mini-auschwitzes espalhadas pelo território nacional - Mauro Malin

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Do Observatório da Imprensa: "Mini-Auschwitzes"

Blog Em Cima da Mídia de Mauro Malin em 21/2/2007
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Em Cima da Mídia - "Mini-auschwitzes espalhadas pelo território nacional"

O professor Renato Janine Ribeiro teve, penso, intuição certeira ao concluir seu artigo no caderno Mais! da Folha de S. Paulo de domingo (18/2) com a seguinte frase: "Dizem uns que o Brasil está como o Iraque. Parece, pior que isso, que temos algumas mini-auschwitzes espalhadas pelo território nacional". Explico em seguida por que isso me parece fazer sentido.

Em novembro passado li um livro que, embora publicado originalmente em 1948, ainda não foi traduzido para o português: This Way For The Gas, Ladies And Gentlemen, de Tadeusz Borowski, polonês prisioneiro em Auschwitz. Perto do final, Borowski reproduz uma discussão amarga (em tradução livre):

"O mundo todo é realmente como o campo de concentração; os fracos trabalham para os fortes, e se eles não têm força ou vontade de trabalhar, deixemos que eles roubem, ou que eles morram".

Li em seguida Cobras e Lagartos - A vida íntima e perversa nas prisões brasileiras. Quem manda e quem obedece no partido do crime, de Josmar Jozino. Imediatamente fiz a conexão com a leitura anterior. Entre outras passagens, destaco:

"Caveirinha fez um levantamento sobre os assassinatos cometidos por presos na Detenção, no período de janeiro de 1999 a agosto de 2000. Os dados foram publicados nas edições de 20 e 21 de agosto de 2000 do Diário Popular. Foram registrados cinqüenta assassinatos de detentos durante esse período na Casa de Detenção, sendo que a maioria morreu degolada nas brigas entre facções" (pág. 115).

Em CV_PCC - A Irmandade do Crime, Carlos Amorim remete a vinte e poucos anos antes:

"As grades têm a ferrugem de décadas. E muitos lugares ainda exibem cicatrizes das incontáveis rebeliões e incêndios. O Cândido Mendes tem segredos: mortes violentas, estupros, o preso contra o preso, a guarda contra todos. Porque essa é uma cadeia de muitos horrores. É a mais pobre de todo o sistema carcerário do estado do Rio.

Faltam comida, colchões, uniformes para os presos, cobertores para um inverno de ventos frios que vêm do mar. Faltam armas e munições para os soldados - e é comum que eles mesmos as comprem em caráter particular. Papel higiênico, aqui, é coisa de que nunca se ouviu falar.

A cadeia, construída para abrigar 540 presos, está superlotada. Os 1.284 homens encarcerados ali, no ano de 1979, se vestem como mendigos. Lutam por um prato extra de comida. Disputam a facadas um maço de cigarros ou uma ´bagana´ de maconha. Cocaína e armas de fogo podem ser razões para um motim. Eles compram e vendem as ´moças´ como mercadorias de câmbio alto. É fácil identificá-los na prisão: os homossexuais - muitas vezes subjugados pela força - raspam as sobrancelhas e os pêlos das pernas, dos braços, do peito. As ´moças´sempre têm dono. Por ´elas´muita gente já matou e já morreu.

É preciso coragem para andar sozinho e desarmado nesses corredores. A multidão de presidiários está condenada a penas tão longas que seria preciso inventar um novo calendário para somar todas elas" (sétima edição, 2006, págs. 50/1).

No coração do comando, Júlio Ludemir, 2002:

"Na verdade, essa era a razão de ser do próprio Comando, que se formou dentro da Ilha Grande para dar uma ordem àquele mundo caótico, onde os presos viviam sendo roubados, esculachados, currados, esmerdalhados" (pág. 95).

Sindicato do Crime, Percival de Souza, 2006:

"A antropofagia foi uma das derivações do ódio acumulado com acertos de contas entre bandidos rivais ou disputa de lideranças. Tanto que nas rebeliões orquestradas passaram a ser vistas cabeças cortadas exibidas como se fossem troféus. Cabeça jogada sobre uma juíza de Direito na cidade de Taubaté, cuja presença num presídio conhecido como Piranhão era exigência dos rebeldes. A mulher ficou em estado de choque e precisou licenciar-se para tratamento médico. Cabeças espetadas em pontas de ferro nas lajes de presídio. Corações arrancados do peito, fritos e comidos pelos principais inimigos no interior de São Paulo. Olhos extirpados, forçando-se o novo cego a comê-los para, em seguida, decepar-lhe a cabeça e atravessá-la por uma corda fina, entrando por um ouvido e saindo pelo outro, a fim de exibi-la para presos e reféns apavorados" (págs. 38/9).

Todos os autores citados acima são jornalistas. Um ex-detento, Jocenir, publicou em 2001 Diário de um detento: o livro. No primeiro capítulo, chamado Inferno, ele escreve:

"A privação da liberdade, retirar o condenado do convívio social, não representa o maior sofrimento do homem que passa a fazer parte da realidade carcerária do país. A hipocrisia da elite, bem como das instituições públicas, não admite que esta idéia seja propagada: os distritos policiais, cadeias públicas e alguns presídios, antes de restringir a liberdade de um indivíduo, tirá-lo de circulação, são campos de concentração, senão piores, iguais aos que os nazistas usaram para massacrar os judeus na Segunda Guerra Mundial. São verdadeiros depósitos de seres humanos, tratados como animais".

E adiante:

"A fisionomia dos presos é atormentada, faz parte do cenário, não poderia ser diferente. Homens com roupas gastas e bem surradas, despenteados, desdentados ou com dentes em péssimo estado, pálidos em razão da má alimentação e do elevado consumo de drogas e álcool. É triste e degradada a quase totalidade da população carcerária. Tudo o que se possa julgar sobre uma prisão não pode ser fundamentado nos princípios morais, éticos e religiosos da sociedade dos homens livres. Nela os princípios são outros, escritos pelo sofrimento e pela delinqüência do mundo marginal.

Violência física, violência moral, humilhações, extorsões fazem parte do dia-a-dia de um encarcerado, especialmente nos distritos policiais e nas cadeias públicas, onde a superlotação e o consumo exagerado de drogas potencializam a desumanidade.

É pesaroso admitir, mas a verdade é que a grande maioria das pessoas presas é composta de jovens primários viciados no crack. Isso torna tudo muito pior, e dilacerante. O perfil do usuário de crack, ou da pedra, como chamam os presos, é o do garoto com pouco desenvolvimento intelectual, sem base familiaar, sem formação religiosa ou moral. O fim da pírâmide social, gente estragada pela miséria e pela fome. O comportamento desses rapazes é imprevisível, num instante proferem um elogio, em seguida podem desferir uma facada pelas costas. A droga corrói o pouco de humanidade que esses jovens trazem ao chegar da rua. Vendem suas próprias vestes, seus bens de uso pessoal, roubam tudo o que podem, em alguns casos chegam a oferecer a esposa, a mãe e as irmãs para fazer sexo com outros presos com a finalidade de obter dinheiro para pagar o traficante" (págs. 17 a 20).

Fico por aqui. Outros capítulos desses livros e de mais alguns, bem nutridos de informações estarrecedoras, tratam do comportamento de policiais, de agentes carcerários e de outras autoridades. Em alguns casos, comportamento correto. Em muitos, terrível. Todos esses atores sociais fazem parte de um mesmo sistema de "mini-auschwitzes espalhadas pelo território nacional", como escreveu Janine Ribeiro.

[Nota em 24 de fevereiro. O professor Renato Lessa publicou no site Gramsci e o Brasil artigo em que critica o texto de Renato Janine. Uma das falhas do texto acima, assinado por mim, foi não ter manifestado minhas divergências em relação a uma série de aspectos do texto de Janine. Disso já me tinha dado conta dias atrás. Outro problema é o paralelo com o horror nazista, que não tem paralelo. Foi feito, é bom que se destaque, para tirar conclusões de modo geral opostas às que Renato Janine sugere poder aceitar. Mas isso não foi dito, portanto é uma démarche prejudicada. Do texto de Renato Lessa, "Contra Renato Janine Ribeiro", destaco um parágrafo:

"E o que dizer da banalização de Auschwitz? O filósofo vê a imagem do horror por toda parte e a ele atribui um plural de péssimo gosto estilístico: ´auschwitzes´. No mínimo esquecido que o cenário original do campo de extermínio foi propiciado por um Estado que legalizou a tortura e a pena de morte".

Leia aqui o texto de Renato Lessa.

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Do Observatório da Imprensa: Violência, A Omissão da Mídia

Edição 423 de 6/3/2007
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Está matéria foi enviada a você por: Jose/jose_alfredo_rodrigues@banrisul.com.br
Comentário: A ignorância da grande imprensa brasileira a repeito das perifierias do Brasil.

VIOLÊNCIA EM DEBATE
Desinteresse da imprensa é maior que o preconceito

Luciano Martins Costa

Os debates sobre a violência que parece recrudescer nas grandes cidades brasileiras neste início de ano - a se considerar o noticiário do período - trazem à luz certa característica da sociedade brasileira que deveria preocupar agentes públicos e formadores de opinião: o Brasil está perdendo vastas porções de território, com seus habitantes, para as instituições paralelas do crime organizado, da mesma forma como nos habituamos a considerar que havia ocorrido com a maioria das favelas do Rio de Janeiro (que o cinismo politicamente correto recomenda chamar de "comunidades").

Comentando artigo postado neste Observatório, sob o título "Crime na senzala a casa-grande não vê", o vendedor Rogério Barreto Brasiliense, de Santos, destacava que a imprensa é porta-voz de uma parcela da população que vive dentro de uma bolha. "Por dever de ofício, visito diariamente empresas em bairros de periferia e noto uma pujança que não aparece nas páginas de jornais ou revistas de negócios", dizia Rogério, notando também que, não sabendo lidar com a diversidade brasileira, a imprensa tende a tratar os fatos de fora dessa "bolha" com viés preconceituoso.

"O Brazil não conhece o Brasil"

A falta de interesse que a mídia demonstra em relação a esse mundo externo aos ambientes do seu "mercado" induz à conclusão de que, mais do que preconceito, o que se depreende desse viés é que a "bolha" mediada pelos meios tradicionais simplesmente ignora a parcela da sociedade que ela exclui - exceto quando, pela violência ou pelas manifestações de carência, essa sociedade marginalizada exibe suas misérias na tela da TV, nas páginas dos jornais ou à janela do carro.

Não se pode acusar a imprensa de ser responsável por esse abismo social, mas pode-se, sim, afirmar que ela tem oferecido pouca contribuição à necessária integração entre esses dois Brasis. Ao optar por uma visão que reduz a sociedade ao conceito de mercado, a imprensa também encolhe o porte moral do cidadão ao seu status de consumidor. Quanto menos ele é capaz de consumir, menor sua importância social.

Essa interpretação não está escrita nos manuais de redação, mas pode ser lida na prática geral da imprensa. Quantos mortos precisa ter uma tragédia (ou uma chacina) na periferia de uma metrópole brasileira para merecer uma chamada de primeira página? Da mesma forma que se utiliza o critério da distância proporcionalmente inversa ao valor da notícia, nos fatos internacionais - refletido, por exemplo, no fato de um descarrilamento de trem na Índia só ganhar destaque na mídia nacional quando o número de vítimas é muito elevado - estamos aplicando semelhante medição de impacto com relação aos acontecimentos daqueles Brasis periféricos, que não compram jornais e revistas.

Ou seja, para a "bolha" na qual a imprensa se isolou, a parcela da sociedade que não consome os produtos que ela anuncia é quase estrangeira. A música que melhor representa esse país recortado ao meio não tem o ufanismo piegas da Aquarela do Brasil, de Ari Barroso, mas a constatação feita por Aldir Blanc e Maurício Tapajós em Querelas do Brasil, interpretada por Elis Regina: "O Brazil não conhece o Brasil; o Brazil nunca foi ao Brasil..."

Amnésia temporária

É possível, até, que essa alienação, quase desprezo, da grande imprensa brasileira por essa parcela de brasileiros que a "bolha" arrasta como peso morto - e cujas demandas repudia explicitamente, a julgar pelas persistentes tentativas de desacreditar políticas sociais, não só as do atual governo, mas as de todas a épocas anteriores - tenha como origem apenas uma visão de mercado. Mas também é possível que essa recusa à aceitação do Brasil periférico tenha as mesmas causas que levavam os senhores da casa-grande a ignorar seus bastardos da senzala.

De qualquer modo, se partirmos do pressuposto de que a imprensa brasileira é, ainda hoje, instrumento de poder das parcelas mais favorecidas da população, ou se concluirmos que a imprensa apenas padece de amnésia temporária em relação a suas filiações sociais em função de estratégias de negócio, convém lembrar que numa sociedade como a nossa não há blindagem absoluta.

A onda de assaltos a bancos que ocorre em São Paulo nos últimos dias tem apresentado como uma das características comuns o fato de seguranças terem facilitado o trabalho dos criminosos. Se os bancos não conseguem reduzir minimamente a ação dos criminosos, pode-se imaginar a vulnerabilidade dos cidadãos comuns. O que acontecer com a sociedade brasileira nessa escalada de violências acabará afetando todos os seus cidadãos, não importando quantos seguranças o dinheiro possa pagar.

Políticas efetivas

Os filhos da classe média vão ao sopé e às bordas da "comunidade" comprar drogas. Os serviçais nas casas mais abastadas, na copa e nos banheiros das empresas, têm suas vidas fora da "bolha", mas ganham seu pão no Brasil mediado. Submetidos ao poder das quadrilhas, são a parte mais vulnerável da sociedade e, no entanto, suas penas estão rotineiramente fora do círculo de preocupações preferenciais da mídia.

Há cerca de dois anos, algumas reuniões na sede da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio, tiveram que ser suspensas porque as funcionárias da copa avisaram que a "comunidade" ia fazer uma manifestação contra a violência policial. A Fiocruz, em Manguinhos, fica cercada por favelas - a sede da mais importante instituição de pesquisa biomédica da América Latina é conhecida como "Faixa de Gaza". A realidade violenta da vizinhança prejudica as pesquisas.

Embora seja - com exceção do rádio e da TV - uma instituição excludente e seletiva, a imprensa não pode ser acusada de ser responsável pela exclusão social que criou e mantém o abismo entre os dois Brasis. Mas a imprensa poderia ser um fator de integração social se seus mentores fizessem um esforço para entender e valorizar a diversidade social.

Quando as estatísticas sobre as mortes violentas de brasileiros jovens forem noticiadas em sua absoluta clareza e com referências lúcidas sobre o contexto em que esse jovens tentam sobreviver, e isso merecer campanhas da imprensa por políticas de segurança mais efetivas e realmente universais - e não apenas quando ocorre uma morte violenta no interior da "bolha" -, a imprensa estará trabalhando para costurar esses dois Brasis no tecido de uma nação.


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sexta-feira, abril 20, 2007

IDH Brasileiro

Pouca gente deve ler o Terra Magazine. Só isto pode explicar o silêncio a respeito do recálculo que a revista eletrônica fez para o Índice de Desenvolvimento Humano, IDH, do Brasil, partindo do recálculo que o IBGE fez para o PIB brasileiro. O recálculo do IBGE nos fez nos sentirmos cerca de 10% mais ricos, como todos sabemos.
Pois, com base neste recálculo do PIB, o Terra Magazine fez um recálculo do IDH brasileiro. Antes do recálculo, o Brasil possuía um IDH de 0,792, o que significava um desenvolvimento humano médio. O Brasil ficava abaixo de Dominica (uma pequena ilha do Caribe - 0,793) acima da Colômbia (0,790). Vizinho também de Belarus (antiga Bielo-Rússia, que fez parte do território da União Soviética durante a maior parte do século XX - 0,794) e da Venezuela (0,784). Claro que é complicado comparar o Brasil com Martinica, mas, enfim, era o ranking.
Com base apenas no aumento do PIB (os outros indicadores são acesso à saúde, à educação, a expectativa de vida, etc), uma equipe do Terra Magazine recalculou o IDH brasileiro, e ele foi para 0,800, na rabeira dos países com alto desenvolvimento humano, cujo índice fecha exatamente em 0,800. Ficamos junto com Ilhas Maurício (um arquipélago africano a leste de Madagascar) e Bósnia-Herzegovina. Mas abaixo dos países mais desenvolvidos da América Latina, como Argentina (a melhor colocação latino-americana - 0,863), Chile (0,859), Uruguai (0,851), Costa Rica (0,841), Cuba (0,826), México (0,821) e Panamá (0,809). A tendência é que os próximos indicadores de educação e saúdo de Brasil façam o índice do país avançar.
Já comentei isto, em outro lugar. Comparar jaca com maçã é complicado. Brasil é uma coisa, Costa Rica é outra. E se pensarmos em capitais brasileiras, o IDH de Porto Alegre será diferente do de São Paulo, que será diferente do de Recife, que será diferente do de Manaus, que por sua vez será diferente do de Cuiabá. Mas, pelo menos, dá a idéia de um avanço. Não é um avanço apenas do governo Lula, mas do povo brasileiro, uma vez que o IDH brasileiro vem aumentando continuamente desde a década de 1970.
Mas este comentário saiu aqui por causa do silêncio a respeito do assunto. Quase ninguém deve ler o Terra Magazine.

Para saber mais:

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quinta-feira, abril 19, 2007

Charge do Santiago, no Jornal do Comércio de segunda-feira, 16/04/2007

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Do Observatório da Imprensa: Rádio Digital, Sem Debate

Edição 423 de 6/3/2007
www.observatoriodaimprensa.com.br
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RÁDIO DIGITAL
Padrão adotado sem debate

Laura Schenkel

A empresa responsável pelo padrão de rádio digital IBOC (In Band on Channel) anunciou aumento da taxa de licenciamento das emissoras para junho deste ano. A medida deve apressar a adoção do padrão pelas rádios no Brasil, o que aumentaria a pressão do mercado pela adoção do IBOC como padrão a ser utilizado no país, sem haver antes um debate sobre o tema.

A iBiquity Digital, responsável pelo padrão IBOC, anunciou em fevereiro um novo programa de incentivo de licenciamento para as emissoras de rádio. O novo valor é de US$10 mil por estação, com pagamento de US$ 2 mil até 30 de setembro de 2007 e o restante quando o sistema for implementado. Para aproveitar a "promoção", segundo a publicação Radio Magazine (leia aqui), é necessário que as emissoras mudem sua transmissão para o padrão em pelo menos uma estação da rede até 31 de dezembro de 2007. Em junho deste ano, a taxa aumenta para US$ 15 mil por estação e US$ 25 mil julho de 2008. A escolha do sistema americano para o rádio digital pode inviabilizar as rádios comunitárias e pequenas rádios comerciais existentes no país, posto que o IBOC exige pagamento permanente de royalties à iBiquity.

O avanço do IBOC

Em 2005, sem qualquer estudo mais profundo da Anatel ou do Ministério das Comunicações, o ministro Hélio Costa autorizou que algumas emissoras utilizassem o padrão em transmissões-piloto. Até 13 de novembro do ano passado, apenas sete das 15 emissoras haviam entregue o relatório inicial com informações completas pedido pela agência. Outras sete emissoras têm que apresentar os resultados em 2007, de acordo com matéria do Tele.Síntese (leia aqui).

Em outubro do ano passado, Costa defendeu abertamente a adoção do padrão americano (leia matéria), favorecendo os objetivos da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). O ministro declarou estar "absolutamente convencido" que sistema americano para o rádio digital é o melhor. "Da mesma forma que decidimos pela técnica e eficiência do padrão japonês, nós começamos a entender que a melhor solução para o sistema de rádio é o americano", afirmou.

Na trilha da TV Digital

O que se observa no processo da digitalização do rádio, segue o rumo da escolha de padrão para a TV digital no país. Observa-se a força do lobby das empresas de radiodifusão, representadas pela Abert, sem haver um debate com entidades do setor e da sociedade. No ano passado, o Comitê Consultivo do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD), do qual participavam entidades da sociedade civil, foi esvaziado (leia matéria). Anunciou-se a escolha do modelo japonês ISDB-T, que privilegia a transmissão em alta definição. Em janeiro, o Fórum Brasileiro de TV Digital apresentou detalhes do Sistema Brasileiro de TV Digital, agora chamado de ISDTV (veja detalhes).


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Do Observatório da Imprensa: Ator Excluído do Debate Sobre Comunicação

Edição 423 de 6/3/2007
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POLÍTICAS PÚBLICAS
O ator excluído do debate da comunicação

Venício A. de Lima

Uma questão recorrente no debate sobre as políticas públicas do setor de comunicações no Brasil é a exclusão histórica da sociedade civil como ator significativo na sua formulação. Salvo raras exceções - e, mesmo assim, contraditórias e questionáveis - o principal interessado na existência de uma comunicação democrática tem sido um não-ator, sistematicamente excluído por aqueles que de fato exercem o poder no setor, vale dizer, os grupos privados de mídia e o Estado.

Existem, claro, várias razões para essa exclusão histórica. Ao contrário de setores de políticas públicas que envolvem direitos consolidados como a saúde, o salário mínimo, o emprego, a educação ou a moradia, o direito à comunicação não está positivado legalmente e a consciência de sua existência ainda é difusa e reduzida na grande maioria da população brasileira.

Reside aí, aliás, um dos principais nós da questão. Nas comunicações, são os atores cujos interesses predominam - os grupos privados de mídia - os responsáveis principais pela colocação dos temas em discussão na agenda pública. E mais: são esses atores que têm o maior poder de influenciar, direta e/ou indiretamente, na formação da consciência pública sobre o problema.

Um complicador adicional, como qualquer estudioso da sociologia da cultura sabe, é que os hábitos no consumo do entretenimento e da informação são construídos no longo prazo. E quando não se tem uma alternativa de referência, dificilmente o modelo cultural hegemônico será questionado. (Daí, no caso da televisão, a maldosa falácia do "argumento do controle remoto" ou do "basta desligar o aparelho".)

Modelo oligopolista

Essas questões vêm a propósito de decisões que certamente serão tomadas em futuro próximo na regulação das comunicações. E tudo indica que, mais uma vez, sem a participação do principal ator interessado. Refiro-me à inadiável Lei Geral de Comunicação Eletrônica de Massa (LGCEM), que deverá não só regular o mercado de comunicação eletrônica mas o mercado de comunicações como um todo.

A elaboração de uma LGCEM, que vinha sendo postergada há anos, passou nos últimos meses a interessar aos mais poderosos atores do setor, isto é, à "velha" mídia e às teles. O modelo de negócios que vai prevalecer no mundo da convergência tecnológica digital deverá ser definido. Essa decisão terá repercussões imensas na economia política do setor, inclusive nos muitos ramos industriais vinculados às comunicações - elétrico, eletroeletrônico, informática. Não é pouca coisa que está em jogo.

Exatamente por isso, os grandes atores já se mobilizaram e atuam abertamente, pelo menos em dois sentidos: consultores especializados trabalham na elaboração de propostas de LGCEM que servirão de referência de negociação política com o governo e o Legislativo; e seus representantes apresentam projetos de lei que necessariamente terão que ser levados em conta quando um projeto de LGCEM começar a tramitar no Congresso Nacional.

Para a sociedade civil, o que está em jogo é a manutenção de um modelo oligopolista que não contempla o direito à comunicação e não atende à maioria da população brasileira. Convenhamos, também não é pouca coisa.

Papel central

Quando a Federal Communications Commission - a agência reguladora das comunicações nos Estados Unidos - tentou "flexibilizar" as regras da propriedade cruzada dos meios, em 2003, uma imensa e inesperada reação da população junto ao Congresso impediu que a medida fosse consumada. Milhões de e-mails entupiram as caixas de correio eletrônico de deputados e senadores mostrando o desserviço à democracia do que lá se chama "controle corporativo da mídia".

A reação popular nos Estados Unidos foi conseqüência de um trabalho de "formiguinha" que dezenas de entidades de observação e crítica da mídia vêm fazendo ao longo do tempo. No Brasil, ainda falta muito para que o direito à comunicação se consolide junto à maioria de nossa população.

Estamos avançando, todavia. Partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais e observadores estão cada vez mais ativos no trabalho de mostrar à população o papel central que a mídia exerce nas democracias contemporâneas - e, portanto, no cotidiano da vida de cada um de nós.

Não há outro caminho.


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