sexta-feira, dezembro 31, 2010

Feliz 2011!

É o meu desejo para todos!

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Ecos da ditadura

Ecos da ditadura

SÃO PAULO - Jorge Videla foi condenado à prisão perpétua na última semana. Aos 85 anos, o ex-presidente militar paga pelo envolvimento na execução de 30 presos políticos em 1976. Videla governou a Argentina durante os cinco primeiros anos da sua última e crudelíssima ditadura (1976-1983).
Estimam-se em torno de 30 mil as vítimas do regime, entre mortos e desaparecidos. Neste ano que agora termina, a Justiça argentina condenou outros 66 militares e civis por crimes cometidos durante a ditadura. Há cerca de 800 réus que ainda aguardam seus julgamentos.
As coisas no Brasil são bem diferentes. Para pior. No mês passado a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o país pelo desaparecimento de 62 guerrilheiros no Araguaia, foco da luta armada entre 1972 e 1975. A sentença exige investigação sobre o paradeiro dos corpos e punição dos responsáveis pelas mortes. Trata-se, no entanto, de uma condenação moral ao Brasil, sem efeitos práticos.
Na prática, o STF chancelou a impunidade dos torturadores ao decidir, em abril, que a Lei da Anistia, de 1979, não seria alterada. Isto é, a corte constitucional do país abdicou de examinar se a lei é compatível com a Constituição de 88. Não é.
Mas o menoscabo pelo Estado de Direito e pelos direitos humanos, neste capítulo, é, na verdade, mais amplo e geral, quase irrestrito.
Além de se recusar a punir os que torturaram, o país reluta, ainda, em trazer à luz os crimes cometidos em nome do Estado. A Comissão da Verdade, criada neste ano, teria, inicialmente, o objetivo de esclarecer o passado e dar satisfação às famílias de 140 vítimas ainda "desaparecidas". Mas nasceu manca, desvirtuada pela pressão obscurantista do ministro Nelson Jobim.
Junto com a faixa, Lula entregará a Dilma essa dívida histórica que não soube (ou não quis) resolver. Dilma manteve Jobim no cargo. Veremos se também manterá fechada a tampa que dá acesso aos porões ainda desconhecidos da ditadura.

Texto de Fernando de Barros e Silva, na Folha de São Paulo, de 27 de dezembro de 2010

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terça-feira, dezembro 28, 2010

O Brasil no banco dos réus

O Brasil no banco dos réus

"Por que vês tu o argueiro no olho do teu irmão, e não vês a trave no teu olho? (...) Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e então verás como hás de tirar o argueiro do olho de teu irmão". Estas frases do Evangelho de Mateus caem como uma luva para as discussões recentes a respeito da posição brasileira a respeito dos direitos humanos.

Durante todo o ano de 2010 ouvimos a indignação de vários setores da sociedade e da imprensa contra posições ambíguas do Brasil sobre problemas de direitos humanos no Irã, em Cuba, entre outros.
Com razão, eles lembravam que o Brasil é hoje um país de ambições geopolíticas internacionais, que exigem que ele seja capaz não apenas de reconhecer, mas de pautar suas ações a partir de princípios presentes no direito internacional resultantes de lutas seculares pela universalização da liberdade. Igualdade entre homens e mulheres, liberdade de opinião e divergência são pontos importantes na pauta do longo processo de racionalização de formas de vida.

No entanto, boa parte destes setores dão a impressão de que direitos humanos é algo que cobramos apenas dos inimigos e desafetos. Pois a voz firme contra as ambiguidades brasileiras deu lugar ao silêncio vergonhoso diante de um fato que demonstra nossa posição aberrante perante do direito internacional. Na semana passada, a Corte Interamericana de Justiça condenou o Brasil pelas mortes de membros da luta armada contra a ditadura militar que desapareceram no Araguaia.

Como se não bastasse o fato das Forças Armadas brasileiras continuarem a perpetrar o crime hediondo de ocultação de cadáveres (o que, por si só, já mereceria punição), a Corte declarou que os dispositivos da Lei da Anistia que "impedem a investigação e sanção de graves violações dos direitos humanos" são incompatíveis com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário.

Neste sentido, a decisão da Corte apenas demonstra que, ao votar a questão sobre a interpretação da Lei da Anistia apelando a um acordo nacional que nunca ocorreu (a lei foi aprovada somente com votos do partido do governo, a antiga Arena), o STF colocou o Brasil na ilegalidade perante o direito internacional. Certamente, outras condenações internacionais virão.

Àqueles que procuram reeditar a "teoria dos dois demônios" e dizer que a luta armada era tão nefasta quanto a ditadura, vale a pena lembrar que mesmo a tradição liberal reconhece que toda ação contra um Estado ilegal é uma ação legal. Contra os que, por sua vez, preferem o simples esquecimento, vale a pena lembrar que nunca haverá perdão enquanto não houver reconhecimento do crime.

Nunca haverá perdão enquanto a trave ainda estiver nos nossos olhos.


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segunda-feira, dezembro 27, 2010

Decisão da OEA é vinculante

Do Terra Magazine

Decisão do Caso Araguaia não é de Corte de repúblicas bananeiras como imagina Jobim. As decisões da Corte Interamericana são vinculantes 

–1. A Corte Interamericana de Direitos Humanos acaba de condenar o Brasil. Isto por ter conferido, — pela sua lei de autoanistia de (Lei n.6683, de 1979)–, um "bill de indenidade" aos responsáveis por assassinatos e desaparecimentos de 62 pessoas, entre 1972 e 1979, na região do Araguaia e em repressão a grupo de contraste à ditadura militar.

Como todos sabem trata-se de uma Corte de Justiça, com jurisdição internacional. Ou melhor, a Corte Interamericana tem competência para declarar, em matéria de direitos humanos, o direito aplicável no âmbito dos estados- membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) que a aceitaram, como é o caso do Brasil.

O Brasil é subscritor da Convenção Americana de Direitos Humanos. Mais ainda, expressamente aceitou a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Essa referida Corte é composta por sete juízes, eleitos e entre "nacionais dos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos" (OEA).

Os seus juízes são eleitos a "título pessoal, dentre os juristas da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos humanos, que reúnam as condições para o exercício das mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos".

Uma comparação. Por força da Convenção de Roma de 18 de julho de 1998 foi constituído o Tribunal Penal Internacional (TPI). Apenas sete (7) Estados membros da Organização das Nações Unidas, como por exemplo Estados Unidos, China, Israel e Índia, não aceitam a jurisdição do TPI.

Como conseqüência da não aceitação, os sete (7) Estados referidos estão fora da jurisdição do TPI. Portanto, o TPI, por falta de legitimação, não pode instaurar processos contra os sete (7) estados. Ainda que tenham sido consumados crimes de genocídio, de guerra, delitos contra a humanidade e crimes de agressões internacionais: esses crimes estão na competência do TPI.

O Brasil aceita a jurisdição internacional do TPI. Portanto, está sujeito à sua jurisdição. O mesmo acontece com a Corte Interamericana de Direitos Humanos.

E a jurisdição internacional, ocorrida a aceitação pelo estado, prevalece sobre a nacional. É hierarquicamente superior. Por exemplo: num caso de genocídio consumado no Brasil e após a instalação do TPI (1998), uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de atipicidade ficará submetida, por força de hierarquia das normas, a entendimento contrário do TPI.

No caso de conflito entre a decisão nacional e a de Corte internacional competente, prevalecerá a internacional: o STF recentemente entendeu legítima a Lei de Anistia de 1979 (uma autoanistia preparada e imposta pelo ilegítimo governo militar). A Corte Interamericana, com relação ao Araguaia, entende diversamente. Assim, prevalece a decisão da Corte Interamericana. Sobre essa obviedade, já cansou de explicar o professor Fábio Conder Comparato.

Com efeito. A jurisdição internacional, da Corte Interamericana, é viculante e prevalente. Em outras palavras, vale a decisão da Corte Interamericana relativamente aos 62 desaparecidos do Araguaia.

–2. A Corte Européia de Direitos Humanos, com sede na francesa cidade de Estrasburgo e instituída pela Convenção Européia para a Salvaguarda dos Direitos Humanos, tem jurisdição vinculante em todos os Estados-membros da União Européia.

Cesare Batisti, a propósito, foi a esse Corte Européia para anular os processos condenatórios da Justiça italiana e confirmados pela mais alta corte de Justiça daquele país (Corte de Cassação da Itália).

Caso tivesse a Corte Européia dado razão a Batisti, as decisões da Corte de Cassação (que o Supremo Tribunal da Itália) estariam revogadas.

Como ensinam todos os juristas europeus, sem qualquer divergência e ao interpretarem a Convenção e a força imperativa das decisões da Corte Européia de Direitos Humanos, " as sentenças da Corte Européia dos direitos do homem são diretamente vinculantes para os Estados membros da Convenção".

–3. Para o ministro Nelson Jobim, a decisão da Corte Interamericana, no caso Araguaia, é política e não prevalece sobre o Supremo Tribunal Federal (STF).

Trata-se de um argumento de autoridade e nada mais. Não é jurídico. É um palpite, sem consistência jurídica mínima, de uma autoridade que responde, às vezes com uniforme militar, pelo ministério da Defesa.

O entendimento de Jobim demonstra total desconhecimento do que seja o alcance da jurisdição internacional.

Se Jobim, por exemplo, determinar, como ministro da Defesa, a invasão de comunidades indígenas para perpetração de genocídio, estará, ainda que o STF diga que não, sujeito à jurisdição do Tribunal Penal Internacional e poderá, até, ser preso preventivamente. Ficará, no exemplo dado e caso a Força cumpra uma ilegal e inconstitucional ordem jobianiana, na cela ao lado de Rodovan Karadizic, o carniceiro dos bálcãs.

– Walter Fanganiello Maierovitch–




Texto do Terra Magazine, visto no blog do Luís Nassif.

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Bancos, crimes e contravenção

Bancos, crimes e contravenções


O VEXAME da grande finança mundial não tem fim. Não obstante, o pessoal do dinheiro grosso continua por cima da carne seca, "business as usual". Ou, como escreveu Paul Krugman, que entende um pouquinho mais disso do que quase todos nós: "Os fundamentalistas do livre mercado estavam errados sobre tudo -mas agora dominam completamente a cena política [americana]" ("Quando os zumbis ganham", ontem, no "New York Times").
A começar pelo vexame mais divertido, a China reafirmou seu "compromisso" de ajudar os países quebrados ou semiquebrados da Europa. Os chineses estão comprando e vão comprar mais títulos da dívida de Grécia, Irlanda, Portugal e de outros países que foram para o vinagre ou estão à beira de ir para lá. Ou seja, a China empresta dinheiro para governos falidos da Europa, o que por sua vez ajuda a aliviar a situação de parte da banca europeia, pendurada na dívida desses países.
Por falar nisso, mais ou menos desde maio o Banco Central Europeu (BCE) financia esses bancos e governos quebrados -mais uma vez os bancos transferiram os riscos de sua incompetência para o público.
Note-se que bancos centrais não existem para financiar a dívida de governos, menos ainda de governos quebrados, o que é ainda mais escandaloso em se tratando do BCE, cheio de ares de ortodoxia e autoproclamado juiz da irresponsabilidade fiscal do mundo.
Mas, "princípios, princípios, negócios à parte". Se o BCE deixasse os juros da dívida grega, irlandesa e portuguesa (e espanhola, italiana...) explodirem, governos faliriam de vez, à vera. Haveria tumulto geral, mais bancos quebrados (aqueles que a Europa dizia serem "saudáveis" antes de a Irlanda ir à lona). O euro poderia entrar em colapso.
A novidade agora é a mãozinha interessada do novo império, a China, que ajuda o seu maior freguês. A China, sim, senhor, da heterodoxa economia ditatorial de mercado.

BANCOS DE CRIMES
A promotoria do Estado de Nova York acusa a Ernst & Young de ajudar o Lehman Brothers a cometer "maciça fraude contábil". O Lehman era o quarto maior banco de investimentos dos EUA. Quebrou em 2008 e quase arrastou o mundo com seus negócios ineptos com títulos imobiliários e excesso de endividamento. A promotoria de Nova York diz que a megaempresa de auditoria ajudou o bancão a esconder dívidas de dezenas de bilhões de dólares, enganando o mercado. Uma maquiagem de balanço, mais uma.
Lembre-se de outra onda de fraude sistêmica, a da bolha dos anos 1990, explodida em 2001. Com a ajuda de bancos de investimento, de agências de risco e de auditores (Arthur Andersen), empresas fraudavam o público e contratos. Foi o caso de Enron, WorldCom, Tyco, GlobalCrossing, Lucent e Adelphia, entre muitas outras. A fraude inflou a bolha, que inflou a fraude. Há mais.
O Deutsche Bank, maior banco da Alemanha, vai pagar US$ 553,6 milhões (R$ 935 milhões) a fim de evitar um processo criminal em que é acusado de ajudar americanos ricos a fraudar o Imposto de Renda.
Em fevereiro de 2009, o UBS, o maior banco da Suíça, admitiu que prestava serviços de fraude para clientes americanos e que fazia parte de uma quadrilha com o objetivo de fraudar a Receita dos EUA.

Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo, de 22 de dezembro de 2010.

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A corte da OEA e o STF

Corte da OEA fez o que STF deixou de fazer | Valor Online

Maria Inês Nassif
16/12/2010
 
Fatalmente isso iria acontecer: a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pelo desaparecimento de 62 militantes do PCdoB, durante a repressão à Guerrilha do Araguaia, entre 1972 e 1974. A decisão da Corte faz o que o Supremo Tribunal Federal (STF) não fez, em abril, quando teve oportunidade: reconheceu que os crimes dos agentes de Estado não são políticos, mas contra a humanidade.


A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que questionava a anistia a representantes do Estado acusados de torturar e matar opositores políticos durante o regime militar (1964-1985), foi derrubada, no final de abril, por sete votos a dois. Prevaleceu a opinião do relator da matéria, ministro Eros Grau, de que não cabia ao Judiciário rever um "acordo político" que teria resultado no perdão para "crimes políticos" e "conexos". Os fatos históricos não convalidam a tese de "acordo político", e sequer a de "crime político". Da mesma forma, é possível contestar os argumentos do presidente do Supremo, Cezar Peluso, que falou em "generosidade", no "princípio da igualdade" e da "legitimidade" das partes que fizeram o suposto acordo. O princípio da igualdade é altamente duvidoso: a própria OAB apresentou ao STF o caso de 495 integrantes da FAB que não foram beneficiados pela anistia. Da "legitimidade" mais ainda, pois quem impôs a lei foi o último governo militar, que tinha o poder das armas e uma bancada governista manietada. Aliás, aprovou a lei com os votos de uma maioria obtida artificialmente nas urnas, graças a mudanças na legislação eleitoral e partidária impostas seguidamente pelo regime, à medida em que a oposição ameaçava sua hegemonia no Legislativo.

Com sua decisão, o STF legitimou a anistia à tortura, considerada crime hediondo pela Constituição de 1988 - portanto imprescritível e inafiançável - , mesmo sabendo que os familiares dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia demandavam a condenação do país por esses crimes na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Anteriormente, a Corte havia anulado as auto-anistias dos regimes autoritários do Peru, da Argentina e do Chile. Era inevitável que fizesse o mesmo com o Brasil, na primeira ação relativa à ditadura militar no país julgada no âmbito da OEA. O risco de que uma decisão dessas do STF resultasse num constrangimento diplomático era evidente. O Brasil, afinal, é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos.

Judiciário faz parte do Estado que deve cumprir Convenção

O presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso, disse ontem que a decisão da Corte não obriga o Supremo a rever o seu julgamento. Se não havia a intenção do Estado de cumprir um acordo internacional - e o Judiciário faz parte do Estado -, não existiriam razões para que assinasse a Convenção. Peluso jogou a responsabilidade para outras instâncias: nada impede ao Executivo indenizar ex-presos políticos e familiares de mortos e desaparecidos, como tem feito; também é possível resgatar o passado. De resto, a decisão da Corte é só "sinalização". Não interfere na decisão do STF.

O resgate histórico desse período negro, que é a bandeira de instituições comprometidas com os direitos humanos e familiares de mortos e desaparecidos do regime militar, não é uma questão pessoal. Essa reivindicação tem sido tratada como uma vingança dos opositores da ditadura, contrária à "generosidade" expressa por uma lei de anistia ampla. Não foi por falta de generosidade que países vizinhos abandonaram leis que anistiavam agentes de Estado que torturaram e mataram. Foi pela convicção - expressa pela Corte Interamericana - de que a democracia no continente apenas se consolidará se houver um acerto com o passado. É preciso, no mínimo, consolidar a cultura de que o passado não é um exemplo a ser seguido.

O aparelho policial e militar foi altamente prejudicado pela presença de agentes que se acostumaram a viver à sombra e acima da lei. Quando se fala em abuso policial e do poder das milícias nas favelas do Rio, por exemplo, ninguém se lembra que a origem dessa autonomia policial diante das leis e perante o resto da sociedade remonta ao período em que o aparelho de repressão tinha licença para sequestrar, matar e torturar sem se obrigar sequer a um registro policial. E que a manutenção da tortura como instrumento de investigação policial existe, atinge barbaramente os setores mais vulneráveis da população e continua não sendo punido. A anistia a agentes do Estado tem se estendido, sem parcimônia, até os dias de hoje.


Texto de Maria Ines Nassif, no Valor Online, reproduzido no blog do Luís Nassif

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domingo, dezembro 26, 2010

Dezenas de homens armados atacam igreja batista na Nigéria

Dezenas de homens armados atacaram uma igreja batista em Maiduguri (região central da Nigéria), em mais um episódio da onda de violência contra a população cristã no país, e que durante o Natal teve o seu pior episódio, quando mais de 30 pessoas morreram numa sequência de atentados a edifícios religiosos.

As autoridades relataram que o pastor foi arrastado para fora da igreja e morto a tiros, bem como dois integrantes do coro. "Eu não consigo entender esses ataques. Por que os cristãos? Por que os cristãos? A polícia falhou em nos proteger", disse Danjuma Akawu, secretário da igreja batista, que conseguiu escapar do massacre.

Ainda não há informações se o ataque à igreja batista, ocorrido na véspera do Natal, e os atentados de ontem, estão conectados. As áreas onde ocorreram as tragédias estão separados por uma distância de 520 km.
Por enquanto, um grupo recebeu a culpa por esses ataques: uma facção radical muçulmana conhecida como Boko Haram, baseada em Bauchi, a cerca de 120 km de onde ocorreram os atentados do Natal. O grupo também possui uma sede em Maiduguri, onde ocorreu o ataque à igreja batista.

O presidente nigeriano Goodluck Jonathan afirmou que o governo vai levar os culpados à justiça. "Eu prometo aos nigerianos que o governo vai ir a fundo nessa questão", declarou.


Da Folha.com, com agências internacionais

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sexta-feira, dezembro 24, 2010

Feliz Natal!

Feliz Natal!
Mesmo com todas crises, injustiças e violações de direitos humanos que vimos neste ano...
O nascimento de Jesus é uma maneira de celebrar a esperança de dias melhores!

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quarta-feira, dezembro 22, 2010

Os valores da "era Reagan"

Os valores da "era Reagan" 

Deve ser a regra com todos os presidentes dos Estados Unidos. Mas fiquei espantado com o tempo que levou entre a morte de Ronald Reagan e o seu sepultamento. Os rituais fúnebres tomaram quase uma semana inteira, e o corpo do presidente fez uma peregrinação através de vastas extensões do território norte-americano, numa espécie de última campanha eleitoral -em busca, como se diz, do sufrágio de sua alma.

No fim de um longo parágrafo em que recenseava os fatos da semana, uma publicação anticonservadora americana mal conteve sua satisfação sinistra ao noticiar numa única linha: "O presidente Reagan finalmente morreu". Será?

Os valores da "era Reagan" estão longe de ter perdido o vigor. No princípio, aquilo parecia apenas um delírio reacionário, voltado para recuperar a auto-estima americana, em baixa desde a Guerra do Vietnã e de Watergate. Baseava-se em propostas de duvidosa consistência: o corte de impostos e a criação de um escudo espacial antimísseis, a chamada "Guerra nas Estrelas".

Tudo vinha embrulhado numa máscara sorridente, pronta a expressar simpatias pelo fundamentalismo bíblico, misturando ficção científica dos anos 50 com fitas de caubói e técnicas de relações públicas das mais antiquadas. Lembro-me de como parecia fora de moda, nas primeiras fotos de Reagan presidente, o lencinho branco dobrado que ele usava no bolso do paletó. A imagem que ele projetava, naquele começo da década de 80, era de um passadismo inviável, artificial e mortífero.

O próprio rosto de Ronald Reagan tinha algo de ressurrecto, de empalhado; ator de relativo sucesso em outras décadas, o presidente recém-eleito parecia ter-se levantado subitamente dos abismos da obscuridade, já bastante envelhecido, mas tentando manter o charme dos bons tempos. Um cronista americano referia-se, durante a campanha presidencial, a seus cabelos "precocemente alaranjados"; é como se o uso da tintura capilar não levasse em conta, no ator sexagenário, que os filmes em preto-e-branco eram coisa do passado.

Bem ao contrário, quase tudo em Reagan apontava para o futuro, e seus cabelos tingidos simbolizavam uma intenção de permanência que os tempos atuais pouco fizeram para desmentir. Os yuppies da década de 80 -aquele Mickey Rourke de "Oito Semanas e Meia de Amor", vendo as cotações de Wall Street piscando em fósforo verde na tela do micro, nos lábios um sorriso bailarino, na janela uma Kim Basinger pronta para uma fantasia light- não são diferentes dos de agora.

Nada mais reaganiano (mas durante o governo Reagan isso ainda era um sonho distante, eu acho) do que a imagem do Mc Donald's em Pequim, ou de butiques Prada e Armani na Praça Vermelha. Um mundo de alta tecnologia e consumo de luxo, zunindo de competitividade, entretenimento, dureza e rapidez, foi projetado como o cenário de um filme de George Lucas; uma minoria afortunada passou a viver dentro dele, estivesse na Califórnia, na Espanha, na Índia ou no Brasil.

Esse mundo ilusório, criado durante os anos Reagan, persiste. Persiste há tanto tempo que já se transformou em realidade. Desconfio até que toda a nossa dependência do virtual, dos jogos de computador, da holografia, do encapsulamento em shoppings e condomínios é conseqüência daquele fundamentalismo reaganiano: a confiança absoluta de que se pudesse moldar a realidade a partir de uma ideologia econômica (a famosa "reaganomics") bastante frágil e simplista.

Mas me vejo falando do reaganismo em termos que seriam igualmente apropriados ao desejo marxista de criar uma sociedade a partir de uns poucos princípios incontestáveis. É talvez por isso mesmo que o pensamento de esquerda se viu hipnotizado e rendido diante do conservadorismo dos anos 80: a ideologia yuppie tinha justamente um apelo intelectual, uma aerodinâmica afetiva, um charme de paradoxo e novidade com que os velhos manuais do materialismo dialético não mais conseguiam competir.

Claro, podemos dizer que o "rumo da história" (outra frase de sabor marxista) era aquele mesmo e que tudo ia no sentido prenunciado por Reagan. Algumas coisas, contudo, parecem não ter dado certo. Teve pouco futuro, por exemplo, a tentativa de reconstruir os valores religiosos e comportamentais da família wasp americana, com ensino bíblico, puritanismo sexual e boas doses de aversão a quem não fosse branco.

Mesmo a Aids foi incapaz de barrar o processo constante de libertação sexual que vinha dos anos 60; e, por mais que Reagan fosse conservador nesse campo, a geração yuppie não transigiria com essa conquista.
Também já não me parece tão certo o poder do "virtual" sobre o "real". Talvez comece a fazer parte do passado a famosa crença, proveniente dos anos 80, de que a realidade foi substituída por simulacros manipuláveis via computador; entra igualmente em descrédito a sensação correlata de que os inimigos do sistema seriam vencidos de forma "limpa", com a mesma impalpável facilidade com que o mundo comunista desapareceu.

Toquei outro dia nesse assunto; temo ter incorrido no velho clichê de comparar as guerras atuais a videogames. O atual conflito no Iraque, entretanto, é de uma materialidade atroz; corpos despedaçados, corpos nus, corpos torturados se amontoam, numa orgia macabra e real. Tema para outro artigo, quem sabe; e já é tempo de deixar Reagan descansando em paz.




Texto resgatado de uma coluna de Marcelo Coelho em 16 de junho de 2004.

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Justiça de Buenos Aires condena 16 repressores da ditadura militar argentina

Após pouco mais de um ano de julgamento, 16 torturadores da última ditadura militar (1976-83) foram condenados na noite desta terça-feira (21/12) por um tribunal de Buenos Aires. Doze cumprirão prisão perpétua e quatro, 25 anos de prisão. O único a ser absolvido foi Juan Carlos Falcón, conhecido como "Kung Fu" por dar golpes de artes marciais nos prisioneiros.

Acusados de 181 crimes, entre os quais torturas, sequestros, estupros e assassinatos, os réus atuavam nos centros de detenção clandestinos Olimpo, Club Atlético e Banco, na capital argentina, onde um total de 1,5 mil detentos circulou.

Dos réus, dez foram membros da Polícia Federal; um, agente do Serviço Penitenciário Federal; dois, agentes da polícia estrangeira; três, membros do exército e um, agente civil de inteligência. Entre eles está o policial Julio Simón, um dos condenados à prisão perpétua. Conhecido como "El Turco", ele costumava estuprar prisioneiras na frente dos maridos. Simón dizia que “não era um monstro” e cometia a violência sexual "pela pátria".

O policial se definia como "Deus da vida e da morte" e ficou famoso pelo sadismo com que torturava os prisioneiros judeus, empalados com um cabo de vassoura, e deficientes físicos, atirados do alto de escadas. Durante as sessões de tortura, o policial utilizava uma braçadeira com uma suástica, ouvia marchas alemãs e discursos gravados de Adolf Hitler. Ele participou também do sequestro de filhos de prisioneiras políticas, entregues a militares e simpatizantes do regime.

Bastidores

Conforme relatou o jornal El Argentino, no início da noite, quando as condenações começaram a ser anunciadas, Simón se levantou da cadeira, dizendo que "precisava ir ao banheiro", sendo em seguida repreendido pela juíza María Garrigós de Rébori e obrigado a permanecer na sala.

Porém, um dos momentos que mais incomodou as vítimas presentes no tribunal foi quando o ex-policial Oscar Augusto Rolón entrou na sala com as mãos para o alto, saudando com entusiasmo seus familiares e os acompanhantes dos demais acusados. Esses, por sua vez, atiraram-lhe beijos do piso superior, descreveu o jornal argentino Página 12.

O anúncio acontece num momento em que os argentinos estão na expectativa pelo veredicto do ex-general Jorge Rafael Videla, primeiro presidente da ditadura, que deve ser noticiada nesta quarta-feira no tribunal de Córdoba.




Notícia do Opera Mundi.

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Tom Cavalcante, Tiririca e o Congresso

ORGULHO

E o humorista Tom Cavalcante dará uma gravata da Hermès, comprada na Harrods de Londres, para Tiririca usar na posse. "Criaram esse monstro para ele e esqueceram de falar do cara centrado que é o Tiririca, do ser humano generoso e humilde que ele é", afirma Cavalcante. "A gente lutou tanto pela democracia e quando uma pessoa do povo, mais simples, logra êxito, há uma reação contrária. Falaram demais. Ele nunca foi analfabeto. Lê normalmente, decora textos como ninguém", diz.

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Mortos-vivos

A volta dos mortos-vivos
VOCÊ JÁ deve ter ouvido falar na Lei Azeredo. É um projeto de lei para criminalizar a internet, correndo na Câmara dos Deputados.
Pela proposta, quem transferir músicas do iPod para o computador, mesmo que tenha pago por elas, está sujeito a uma pena de três anos de prisão.
O projeto ganhou esse apelido por causa de seu maior defensor, o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG -que, no ano que vem, será deputado).
Essa proposta de lei causou muita revolta na sociedade (e em quem entende e respeita a internet). Por exemplo, um abaixo-assinado contrário conseguiu 157 mil assinaturas (bit.ly/11YwFC). Houve forte mobilização de várias entidades contrárias, da USP ao Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).
Isso fez com que muita gente julgasse o projeto morto. Estavam errados.
Na semana passada, o morto-vivo andou. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara emitiu opinião favorável à aprovação do projeto. Ainda por cima apresentou um novo texto que piora o original, abrindo caminho para o vigilantismo e o desrespeito à privacidade em redes sociais, blogs e até no Twitter.
Se for aprovado, adeus privacidade. Autoridades vão ter o direito de, sem ordem judicial, vigiar pessoas.
Tudo isso ignora o trabalho feito pelo Ministério da Justiça no chamado "Marco Civil da Internet", que passou um ano construindo uma alternativa ao projeto Azeredo, contando com intensa participação pública (bit.ly/1kBQcx).
O objetivo não é criminalizar, mas proteger a rede e os direitos dos internautas.
Vale notar que esse andamento da Lei Azeredo aconteceu em 5 de outubro, logo após as eleições, quando não havia ninguém prestando atenção. Foi assinado por um deputado não reeleito (Regis de Oliveira, do PSC-SP). Tudo leva a crer que se trata de uma estratégia para fugir da opinião pública.
Diferentemente de outros tipos de zumbi, esse parece ter medo de gente.


JÁ ERA
Zumbis dominando apenas o cinema, desde "A Noite dos Mortos-Vivos"

JÁ É
Zumbis chegando à televisão com a série "The Walking Dead", que acaba de estrear

JÁ VEM
Sustos de mais projetos legislativos comoa Lei Azeredo


Na Folha de São Paulo, caderno Folhaten - 25/10/2010: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/folhatee/fm2510201006.htm

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NYT Censurado

"NYT" censurado

O "Wall Street Journal" deu primeiro e depois o "NYT" publicou nota, sem destaque, "Força Aérea bloqueia sites que postaram despachos secretos". No texto, informa-se que, ao lado de "Guardian", "Le Monde" e outros 25, um dos sites censurados pelos militares americanos foi o do próprio "NYT". Repercutiu com mais destaque no estatal "China Daily", "Força Aérea bloqueia "NYT'".



“Freedom at land of free”, ou “liberdade na terra do livre”, como talvez dissesse o outro...

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Maluf segundo José Simão

“E o Maluf? "TJ de São Paulo inocenta Maluf". Ueba! Eu queria ser o Maluf: rouba, mas faz, mente, mas não convence e é culpado, mas ninguém prova. E o Maluf disse que nem Deus o tira da vida pública. Acredito piamente. Rarará! E sabe o que o Maluf disse? Minha vida é uma esfirra aberta!”

José Simão, o Macaco Simão, em sua coluna na Folha de São Paulo, de 15 de dezembro de 2010.

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Corte Interamericana condena Brasil por execuções no Araguaia

Corte condena Brasil por 62 mortes no Araguaia

Lei da Anistia não pode impedir punição de militares, afirma órgão da OEA

Segundo a sentença, como responsável pelo desaparecimento de guerrilheiros, Estado deve investigar caso

BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO

A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil pelo desaparecimento de 62 pessoas na Guerrilha do Araguaia (1972-1975), maior foco da luta armada contra a ditadura militar.
A sentença determina que o Estado identifique e puna os responsáveis pelas mortes e afirma que a Lei de Anistia não pode ser usada para impedir a investigação do caso.
O governo foi notificado ontem da decisão, aprovada por unanimidade no último dia 24. O tribunal é vinculado à OEA (Organização dos Estados Americanos). Em tese, o Brasil é obrigado a acatar suas determinações.
De acordo com a sentença, o Estado brasileiro é "responsável pelo desaparecimento forçado" dos guerrilheiros mortos pelas tropas que sufocaram a guerrilha.
Assim, deve promover uma investigação sobre os desaparecimentos "a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja".
Para a corte, as disposições da Lei da Anistia "carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação", "nem para a identificação e punição dos responsáveis" pelas mortes.

OUTROS CASOS
A decisão afirma ainda que a lei, aprovada em 1979, também não deve valer para "outros casos de graves violações de direitos humanos" durante a ditadura.
Esse trecho pode dar margem a novas condenações do país envolvendo o desaparecimento de opositores políticos do regime militar.
O texto estimula a criação da Comissão da Verdade, uma das propostas mais polêmicas do PNDH-3 (Plano Nacional dos Direitos Humanos), lançado em 2009. Ressalta, no entanto, que a iniciativa não substitui investigações no campo judicial.
O tribunal determinou que o Brasil realize "todos os esforços" para encontrar ossadas dos combatentes e promova um "ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional."
Além disso, ordenou que o governo federal crie "um programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos" dirigido a "todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas".
Esse ponto deve provocar desconforto entre os militares, que travam batalha com militantes de direitos humanos contra o reconhecimento de que o Exército executou presos na guerrilha.
O caso do Araguaia se arrastava na Corte Interamericana desde 1995, quando o país foi denunciado por ONGs de direitos humanos. O julgamento só foi iniciado em maio deste ano.
O texto aprovado pelo órgão contabiliza 62 mortos, mas indica a existência de pelo menos mais oito desaparecidos no confronto.
O Itamaraty confirmou ontem que, pelas regras do direito internacional, o país é obrigado a cumprir a decisão, já que é signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
Apesar do entendimento, o ministro Nelson Jobim (Defesa) sustentou este ano que o país poderia evocar a Lei da Anistia para descumprir eventuais condenações.



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Diplomatas foram enganados por modos "cordiais" de Saddam na Guerra do Golfo

Diplomatas foram enganados por modos "cordiais" de Saddam na Guerra do Golfo

Bernhard Zand

Der Spiegel

Uma declaração inábil da embaixadora americana no Iraque provocou a primeira Guerra no Golfo? Os cabogramas americanos vazados mostram que os diplomatas fracassaram em perceber os sinais de que Saddam Hussein estava se preparando para invadir o Kuait e que pintavam seu regime sob luz consistentemente favorável nos anos que antecederam o conflito.

Na manhã de 25 de julho de 1990, o ditador iraquiano Saddam Hussein telefonou para a embaixadora americana no Iraque, April Glaspie. Foi o primeiro encontro dela com Saddam e durou duas horas. E provavelmente entrará para a história como um dos incidentes mais controversos na diplomacia americana.

Naquela noite, Glaspie enviou por cabograma seu relatório sobre a conversa para Washington. Ela o resumiu sob o título: “Mensagem de amizade de Saddam ao presidente Bush”.

Apenas oito dias depois, estourou a guerra quando as tropas de Saddam invadiram o Kuait. A invasão provocou um conflito que duraria mais de 15 anos e terminaria nem mesmo com a morte de Saddam Hussein.

É o pesadelo de todo diplomata. O que transcorreu exatamente no encontro de Glaspie com o presidente iraquiano?

Saddam estava sob pressão em meados dos anos 90. Ele se queixou à embaixadora americana de que os oito anos de guerra com o Irã tinham deixado seu país esgotado e altamente endividado. Ainda pior, o vizinho Kuait estava deliberadamente mantendo baixos os preços do petróleo –tão baixos, de fato, que seu país tinha sido obrigado a cortar as pensões que pagava às viúvas e órfãos.

“A esta altura”, declarou o relatório de Glaspie, “o intérprete e um dos tomadores de notas começaram a chorar”.

Saddam então passou para a questão da disputa de fronteira do Iraque com o Kuait. A conversa se tornou técnica, e ele até mesmo começou a recitar uma lista de distâncias em quilômetros. “A embaixadora”, Glaspie escreveu falando de si mesma, “disse que tinha servido por 20 anos no Kuait; naquela época, como agora, nós não tomamos nenhuma posição a respeito dessas questões árabes”.

Poucas semanas depois, os iraquianos romperam todo protocolo diplomático divulgando uma transcrição resumida da conversa. Nunca antes os Estados Unidos pesaram tão cuidadosamente as palavras de um de seus diplomatas. Nunca antes uma única sentença foi tão discutida quanto à da embaixadora Glaspie.

Os críticos dizem que a resposta dela “confundiu” Saddam Hussein, que ela foi ambígua e vaga demais. Saddam pode ter pensado que os Estados Unidos não interviriam caso atacasse o Kuait. Assim, eles afirmam, Glaspie teve um papel decisivo no início da guerra. Seus defensores dizem que esta crítica é imprópria. Eles apontam que Glaspie disse a Saddam o que qualquer diplomata em sua posição teria dito.

A controvérsia persiste até hoje. Mas novos despachos diplomáticos, recém divulgados pelo WikiLeaks, agora revelam o que os embaixadores americanos em Bagdá informaram a Washington entre 1985 e 1990. Eles mostram o ambiente político no qual Glaspie atuava, a posição americana a respeito de Saddam Hussein na época e o que levou à sentença fatídica dela.

Os Estados Unidos romperam as relações diplomáticas com o Iraque após o conflito entre árabes e israelenses de 1967. A embaixada americana foi reaberta em 1984 e, desde o início, um assunto dominava os relatos dos diplomatas americanos estacionados em Bagdá: o Irã.

Na época, as tropas de Saddam lutavam contra as dos revolucionários do Irã desde as montanhas do Curdistão até o Rio Shatt al Arab, e era bem óbvio de que lado estava a simpatia americana: Washington queria a vitória de Saddam.

Glaspie chegou ao Iraque no final de 1987. Na época ela tinha 46 anos e tinha vasta experiência nos países árabes. Washington certamente não enviou uma novata para Bagdá.

Visão estreita

Uma das primeiras viagens dela foi para se encontrar com os cristãos no norte, cuja situação ela considerou satisfatória. Qualquer “reassentamento” que tenha ocorrido acabou semanas antes. Ela descreveu o governador de Saddam na província de Mosul como “impecavelmente agradável” e seu chefe de segurança como “prestativo e compassivo”. De fato, para onde quer que olhasse, ela estava surpresa em quanto dinheiro o governo iraquiano tinha gasto com sua minoria cristã. Um mosteiro foi reformado e “vários novos vilarejos” –marcados como “vilarejos modelo Saddam”– foram construídos.

Tudo aquilo poderia ser verdade, mas representava uma visão deliberadamente estreita do Iraque no início de 1988. Pois enquanto a embaixadora Glaspie estava visitando Mosul, o primo de Saddam, Ali Hassan al Majid (que viria a ser conhecido como “Ali Químico”), bombardeava os curdos no norte do Iraque, a apenas 250 quilômetros de distância, com gás venenoso. Em 16 e 17 de março de 1988, 10 semanas após a visita, um destino semelhante ocorreu à cidade de Halabja. Cerca de 5 mil pessoas foram mortas ali nesses dois dias, com mais centenas morrendo posteriormente de modo doloroso, devido aos efeitos das armas químicas usadas contra elas.

Não é que a embaixada americana em Bagdá não sabia nada desses ataques. Em meados de fevereiro, Abd al Rahman Qassemlu, um líder curdo iraniano que ficou ao lado de Saddam contra Teerã, foi a Bagdá. Após uma reunião com o ditador, ele também passou na embaixada americana. Ele avisou que não queria nem dinheiro e nem armas. “É claro que sempre é possível ter mais, mas temos o suficiente”, ele disse, segundo um despacho da embaixada.

Ele então narrou o que estava se passando no norte. O relatório disse que o chefe de seu departamento político “perguntou a Qassemlu qual era sua reação diante da campanha iraquiana de destruição das aldeias curdas. Qassemlu reconheceu que a ‘maioria’ das aldeias foi destruída, mas parecia sem nenhuma emoção sobre o assunto”, notou o relatório.

Qassemlu disse aos americanos precisamente quem culpava pelos ataques assassinos ocorridos no norte: “Saddam. Ele está encarregado de tudo”.

Desde cedo, os relatórios americanos começaram a mencionar os temores iraquianos de que os Estados Unidos poderiam abandonar o Iraque por laços mais estreitos com Teerã. Em um cabograma para Washington, escreveu Glaspie: “Nós tranquilizamos os iraquianos no alto escalão e por diferentes canais de que não contemplamos uma ‘inclinação’ em qualquer direção”.

Colaboração excelente

Perto do fim da guerra Irã-Iraque, no segundo trimestre de 1988, os cabogramas da embaixada americana falavam de um crescente otimismo dentro do Iraque. Os diplomatas informaram uma colaboração excelente nos bastidores.

Quando a guerra Irã-Iraque finalmente acabou após oito anos e quase meio milhão de mortos, Glaspie colocou a palavra “vitória” entre aspas; mas assim que a celebração passou, os relatos novamente passaram a se concentrar na ameaça iraniana que criou o elo primário entre o regime de Saddam e os Estados Unidos –passando por cima de todas as queixas sobre assassinatos, armas químicas e violações de direitos humanos. “Nós duvidamos que os iraquianos sejam ingênuos a ponto de acreditarem que qualquer regime clerical no Irã, mesmo após a morte de Khomeini, renunciará à revolução ou a seus elementos integrais, o expansionismo e a interferência nos assuntos internos de outros países, principalmente do Iraque.”

Mas então, no início dos anos 90, “nuvens escuras” se formaram sobre o relacionamento do Iraque com os Estados Unidos, nas palavras do próprio Saddam, falando em uma coletiva de imprensa após uma visita do presidente do Egito, Hosni Mubarak. Saddam atribuiu a deterioração a uma suposta interferência de um “lobby sionista” na política americana. Isso preocupou a embaixadora americana? Ela se preocupou com a escolha de palavras do ditador iraquiano?

Não. Ela apenas enviou para casa um relatório intitulado “Saddam explica e defende”. No despacho, Glaspie falou sobre a posição de Saddam como “talvez derivando de seu antigo esforço para promover um senso de identidade para os ‘iraquianos’ –um senso que ele frequentemente se lembra de carecer quando era menino”. Sua avaliação do presidente iraquiano em abril de 1990 foi a seguinte: “Saddam não está fazendo pose. Ele está genuinamente preocupado com Israel e com o Irã”.

Em maio daquele ano, os chefes de Estado da Liga Árabe se reuniram em Bagdá, tendo como fundo as ameaças de Saddam contra o Kuait e os Emirados Árabes Unidos. De novo, Glaspie elogiou os esforços de Saddam. Ela disse que ele “deu um passo à frente” e reuniu os árabes, apesar de que no “menor denominador comum”.

Liderança intelectual’

Ela realmente não viu as nuvens de tempestade se formando no horizonte? No início de junho, Glaspie enviou um cabograma a Washington com o título –aparentemente sem ironia– “Liderança Intelectual”. Ela disse que Saddam tinha passado recentemente muitas horas com um grupo de seis homens finalizando uma nova Constituição. A embaixadora pediu ao Departamento de Estado para anotar os nomes dos homens, porque esse projeto era “importante”, como se Saddam estivesse seriamente pensando na Constituição iraquiano apenas dois meses antes de suas tropas invadirem o Kuait, se de fato esse notório conspirador e mestre da espionagem alguma vez tenha levado uma Constituição a sério em sua vida.

A julgar por seus memorandos, a embaixadora sabia muito pouco sobre as dúvidas perturbadoras que alguns membros do círculo interno de Saddam tinham a respeito de seus planos de invasão cada vez mais concretos. Os rumores de que ele estava sob pressão internamente foram desprezados por Glaspie como meras invenções por parte do Irã e dos exilados iraquianos. E ela rejeitou explicitamente um relatório da embaixada americana no Kuait, que dizia que o comportamento errático de Saddam sugeria “pressões internas e instabilidade de seu regime” –o que, olhando para trás, parece altamente provável. O embaixador em Bagdá insistiu que Saddam era motivado por muitas coisas, mas rumores de golpe não eram um deles.

Isso foi seguido por dois parágrafos que levantam sérias dúvidas a respeito da objetividade de Glaspie em relação ao regime de Saddam: “Nós não estamos sugerindo”, ela escreve, “que não existam algumas ‘ações disciplinares’ ocasionais aqui. Por exemplo, o adc (nota do editor: o ajudante de ordens) curdo de longa data do presidente, Sabah Mizra, sem dúvida rasurou seu livro de notas neste ano. Ele foi preso e pode estar morto”.

E de qualquer forma, ela acrescentou, Saddam está apenas tentando “melhorar o bem-estar dos cidadãos. O partido não tem dificuldade em mobilizar milhares de árabes (não curdos) iraquianos para saudar seu presidente”.

Em junho de 1990, a emissora de televisão americana “ABC” transmitiu uma entrevista que a jornalista Diane Sawyer fez com Saddam Hussein, após mediação da embaixada americana. Os iraquianos ficaram furiosos, porque a conversa de três horas foi editada para 20 minutos. De novo, Glaspie pediu pela compreensão tanto do secretário pessoal de Saddam quanto de Washington. Ela disse que Saddam não estava “jogando a toalha”. Ele estava defendendo sua “nova política de disponibilidade à imprensa ocidental (‘Le Figaro’ é o próximo) e sua disposição de permitir que o público iraquiano o visse e ouvisse sem cortes e sem retoques”.

A entrevista de Sawyer também apareceu na conversa contenciosa de Glaspie com Saddam, em 25 de julho. Glaspie escreveu, se referindo a si mesma, “a embaixadora disse que assistiu ao programa de Diane Sawyer e o considerou barato e injusto. Mas a imprensa americana trata todos os políticos sem gentileza –este é o nosso modo”.

Saddam “cordial, razoável e até mesmo caloroso”

Se o seu comentário sobre a neutralidade americana nas disputas de fronteira árabes fizeram Saddam decidir invadir o Kuait é uma pergunta que talvez apenas o próprio Saddam poderia responder com certeza. Mas os despachos diplomáticos que vazaram mostram que Glaspie e seu antecessor viam o regime de forma extremamente favorável desde o início, fizeram vista grossa para os crimes amplamente conhecidos de Saddam e foram tão influenciados pela inimizade mútua com o Irã a ponto de serem negligentemente não críticos. Essa atitude certamente influenciou a reunião fatídica de Glaspie com Saddam.

A postura do presidente foi “cordial, razoável e até mesmo calorosa”, começa seu relato da reunião. Ele termina concluindo que ele sem dúvida era sincero ao “buscar um acordo pacífico” para o conflito com o vizinho Kuait. Entre eles se encontra parágrafo após parágrafo listando o suposto egoísmo do Kuait e os sacrifícios e intenções pacíficas dos iraquianos.

Saddam Hussein sem dúvida enganou a embaixadora americana, apesar de que também em seu próprio detrimento. Mas ela particularmente não dificultou para ele.

A embaixada enviou mais quatro despachos para Washington antes do início da guerra. Um começa com a crença equivocada de que Saddam estava realmente respondendo às tentativas de mediação mais recentes tentadas pelo presidente do Egito, Hosni Mubarak, mas termina com a análise etnológica que diz mais a respeito dos motivos para a guerra do que muitas avaliações posteriores:

“É difícil exagerar a profundidade do sentimento antikuaitiano no Iraque. Este é um fundo extremamente importante para as tensões atuais. E a antipatia é velha e profunda –não algo estimulado pela mídia para a ocasião.”

“Os kuaitianos que chegam ao Iraque com bolsos cheios de dinares iraquianos (comprados com cotação do mercado negro que é menos que um décimo da taxa de câmbio oficial) e que gastam ostentosamente, não são de classe média educada –estes vão para a Europa. O Iraque recebe o equivalente ao ‘lixo branco pobre’, a classe média baixa, que pode ser vista em grande número em Basra na sexta-feira e nos resorts de verão do norte, frequentemente bêbada, às vezes desordeira, e geralmente apostando em cassinos fora isso vazios. Ela também vai para Bagdá em grande número, fornecendo clientela para as boates baratas e para as garotas de programa.”

“Os iraquianos sentem profundamente que os kuaitianos são grandes sovinas vivendo ostentosamente enquanto o Iraque, que fez sacrifícios terríveis durante a guerra, ainda está sofrendo.”

Quatro dias depois, a embaixadora Glaspie voou para Washington. Sete dias depois, em 2 de agosto de 1990, as tropas iraquianas invadiram o Kuait.

Naquele dia, o vice de Glaspie, Joseph Wilson, que ficou famoso 13 anos depois como o marido da espiã desmascarada da CIA, Valerie Plame, enviou ao Departamento de Estado a mensagem mais breve que a embaixada em Bagdá já tinha enviado: “Nós tentamos repetidamente, desde 0630 local, contatar os altos funcionários diplomáticos, incluindo o ministro Aziz. O subsecretário Hamdun aparentemente não está em casa, já que ninguém atende seu telefone de casa (...) A embaixada enviou uma equipe de gestão de crise”.

Saddam tinha atacado. E da noite para o dia, ele passou de aliado americano por quase 10 anos a inimigo mortal. Tudo o que antes parecia certo, repentinamente estava errado.

Tradução: George El Khouri Andolfato



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sexta-feira, dezembro 17, 2010

Artigo: 2011, o ano em que poderemos dar adeus à liberdade na internet


Cada vez mais governos e instituições parecem controlar o uso da web, caso de países como China e Estados Unidos.

Este artigo de final de ano é, acima de tudo, um modesto olhar sobre o que vejo e imagino para o futuro. Afinal, estamos prestes a começar 2011, e ao que tudo indica, será um ano decisivo para a Internet e para todo o seu grande potencial livre.

Ao longo de sua história, a Internet tem sido essencialmente livre de regulamentação governamental. Embora existam exceções - alguns países estão trabalhando bastante para controlar o conteúdo online.  

Mas, sem dúvida, tem sido profundo o impacto da Internet sobre a indústria da música e do cinema, jornais, entretenimento, privacidade, transparência de governo (voluntária ou não) e educação.

Claro, existem muitas pessoas que não estão felizes com estas mudanças, muitas vezes, impostas pela web. Por alguns anos, a indústria dos direitos autorais protestou bastante contra a Internet.  Ainda que alguns indivíduos tenham realmente tido dores de cabeça, nada realmente mudou para a maioria, pelo menos até o momento. 

Entretanto, os esforços para controlar a rede de outras maneiras estão começando a crescer.

Governos x Internet

Um exemplo recente foi o evento ITU Plenipotentiary Conference, em Guadalajara, no México, onde ocorreu uma grande discussão sobre a possibilidade de extender à Internet o regime regulatório dos sistemas mundiais de telefonia. Mas, no final, o encontro terminou sem a conclusão de um regulamento global.

Uma outra tentativa surgiu com a Comissão para Ciência e Tecnologia das Nações Unidas, que votou no sentido de estabelecer um comando único, nas mãos do Fórum para Governança da Internet - um grupo responsável por discutir questões na web relacionadas, principalmente, a direito de imagens.

Agora, um grupo, constituído por países integrantes da ONU, investigará como ajustar a IGF para este comando. Sinceramente, não é preciso muita imaginação para prever o provável resultado. 

Afinal, os governos, em geral não gostam muito da internet ou pelo menos de atividades online que eles não controlam. Alguns, como a chinês, por exemplo, estabeleceram inúmeras restrições aos websites de seus próprios países. Um caso recente é a Venezuela. 

Uma possível reestruturação da Internet permitiria a cada país gerenciar o conteúdo de tal forma que se tornaria difícil descobrir o que está acontecendo ao redor do mundo.

Mas não temos de esperar a ONU para refletirmos sobre o futuro. Recentemente, o governo dos EUA tirou do ar uma série de domínios, sem qualquer notificação oficial aos proprietários. 

Caso semelhante pode ter ocorrido caso o governo dos EUA tenha realmente pressionado o PayPal e a Amazon para interromper seus serviços ao WikiLeaks, novamente, sem a utilização de nenhum meio legal. 

Você não tem de ser um fã do WikiLeaks para entender que deixar o governo dos EUA decidir sozinho, sem nenhum processo jurídico como o definido pela Constituição, não é um caminho para a liberdade. Além disso, a FCC votará um novo marco regulatório para a internet no dia 21 de dezembro – e o conteúdo está sendo mantido longe dos holofotes.

Posso estar sendo um pouco alarmista, mas os sinais indicam que a Internet do futuro não será igual àquela que um dia conhecemos, a não ser no nome. Feliz Ano Novo.
(Scott Bradner)

Artigo do IDGNow!

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quarta-feira, dezembro 15, 2010

O homem e o boi


O homem e o boi

Depois da crise econômica, a Europa agora conhece a crise social. Um após o outro, os países europeus caem.
Antigos modelos de desenvolvimento até então vendidos como exemplo de sucesso, como a Irlanda (o "tigre celta"), expõem a olhos nus o apodrecimento de seu sistema financeiro. Outros, como Portugal, mostram claramente como não tinham nenhuma margem de manobra para se contrapor à "desconfiança do mercado". Países como o Reino Unido anunciam a supressão de 400 mil empregos no serviço público e o fim efetivo da educação pública universitária. A França parte para a milésima reforma da sua previdência social.
Diante de tal situação de catástrofe que parece nunca terminar, todos os países europeus conhecem só uma resposta: "plano de austeridade". A escolha da palavra é uma pérola. Afinal, quem poderia ser contra a retidão moral da austeridade a não ser crianças mimadas, acostumadas ao desperdício e àquilo que um ministro britânico teve a coragem de chamar de "cultura da dependência", produzida, segundo ele, pelo Estado do bem-estar social?
Mas é engraçado ver como nos escondemos atrás das palavras. Se quiséssemos realmente respeitá-las, "austeridade" deveria significar ser austero e duro contra aqueles que produziram tal crise, ou seja, o sistema financeiro.
Significaria não instaurar um verdadeiro "capitalismo de espoliação", no interior do qual o sistema financeiro espolia o Estado chantageando-o com a ameaça da propagação de uma crise que, no fundo, já se propagou. Significaria não pegar dinheiro do povo para pagar "stock-options" de executivos especialistas em maquiar balanços. Melhor seria decretar moratória, controle estrito de capitais e, se necessário, quebra de contratos.
Mas os governos europeus preferem transformar a "austeridade" em uma cortina de fumaça que visa esconder o mais brutal processo de pauperização social e de desmantelamento de redes de assistência que o continente conheceu. Tudo isso embalado em uma xenofobia cínica, que tenta fazer acreditar que o problema está na fronteira, quando ele está no coração da City.
Contra isso, vemos as populações europeias radicalizando sua insatisfação através de greves gerais e manifestações constantes.
Certamente, este é apenas o começo. A era das mobilizações volta paulatinamente.
Porque logo os europeus aprenderão a beleza da poesia de Torquato Neto, o mesmo que escreveu: "Leve um homem e um boi ao matadouro; aquele que berrar é o homem.
Mesmo que seja o boi".
O que faz do homem um homem é sua capacidade de gritar quando quem o governa lhe oferece a pura e simples imagem do matadouro.



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segunda-feira, dezembro 13, 2010

Israel não respeita direitos do povo palestino

Israel não respeita direitos do povo palestino

ARLENE CLEMESHA e BERNADETTE SIQUEIRA ABRÃO

Em artigo nesta Folha ("Direitos humanos em mãos erradas", "Tendências/Debates", 10/10), o embaixador israelense queixou-se do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU, em que relatórios têm sido aprovados, denunciando graves violações de direitos humanos por parte do governo israelense nos territórios palestinos ocupados da Cisjordânia e da faixa de Gaza.

De fato, apenas nos primeiros seis meses de 2010, foram registradas na Cisjordânia a demolição de 223 edifícios e a expulsão de 338 palestinos de suas casas.
Quinhentas e cinco barreiras violam o direito de ir e vir, impedindo o acesso da população a escolas, a locais de trabalho e a hospitais, para procedimentos vitais como diálise, cirurgias do coração e cuidado neonatal intensivo.
Seguindo a lógica de anexar o máximo de terras com o mínimo de palestinos, o trajeto tortuoso do muro enclausurou Belém e Qalqilia, expulsou 50 mil palestinos de Jerusalém Oriental e anexou 10% das terras mais férteis da Cisjordânia. As colônias israelenses, também ilegais, expandem-se a todo vapor sobre territórios palestinos.
A justificativa de Israel para a violação de direitos humanos -zelar pela "segurança" de seus cidadãos- não se sustenta, sendo tais atos a própria origem da revolta palestina.
Os "mísseis" citados pelo artigo do embaixador são armas de fabricação caseira, usadas em desespero por um povo sem Estado, que sofre a mais longa ocupação militar da história moderna, submetido a bombardeios, a incursões militares, a assassinatos dirigidos e a toques de recolher.
O artigo também cita um prisioneiro militar israelense, omitindo o fato de que Israel tem em seus presídios mais de 6.000 civis palestinos (incluindo crianças), a maioria deles sem acusação formal, processo judicial ou direito de defesa.
Alega-se que Israel estaria sendo alvo de injustiças por parte do CDH em consequência do relatório do juiz Richard Goldstone sobre os crimes de guerra cometidos durante o bombardeio que massacrou 1.397 pessoas em Gaza (incluindo 320 crianças e 109 mulheres).
Assim, deturpa-se o caráter heroico da flotilha de ativistas humanitários do mundo todo, incluindo israelenses e uma mulher sobrevivente do Holocausto, que arriscaram suas vidas para quebrar o bloqueio ilegal a Gaza.
O objetivo da flotilha era chamar a atenção do mundo para o problema? Sim. Era e continuará sendo uma provocação? Apenas se considerarmos o termo um desafio aberto, para que a humanidade impeça a continuidade do cerco a Gaza, onde 80% da população sofre de má nutrição crônica, as crianças apresentam estresse e distúrbios psicológicos causados pelos ataques, pelo sofrimento e pelas constantes bombas sonoras lançadas por Israel sobre a pequena faixa costeira.
O mesmo governo israelense que se queixa do CDH emitiu, no dia 10/ 10, um projeto de lei que, se aprovado, exigirá de todo não judeu de Israel um juramento de "lealdade ao caráter judeu do Estado".
Cerca de 20% da população, de origem palestina cristã, muçulmana ou outra, terá de aceitar o caráter judeu do Estado de Israel ou emigrar, aumentando o número de refugiados, que ultrapassa 9 milhões. As consequências disso, para a Palestina e para o mundo, não valem um debate no Conselho de Direitos Humanos da ONU?


ARLENE CLEMESHA, professora de história árabe na USP e diretora do Centro de Estudos Árabes da mesma universidade, é representante da sociedade civil do Brasil no Comitê da ONU pelos Direitos do Povo Palestino.
BERNADETTE SIQUEIRA ABRÃO, jornalista, formada em filosofia pela USP, é pesquisadora da questão palestina, ativista de direitos humanos e autora, entre outros livros, de "História da Filosofia" editora Moderna).



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segunda-feira, dezembro 06, 2010

Corte civil dos EUA absolve suspeito de atacar embaixadas

Corte civil dos EUA absolve suspeito de atacar embaixadas
Tanzaniano foi o primeiro ex-detento de Guantánamo a ser julgado por corte civil

DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS

O primeiro ex-detento da prisão militar de Guantánamo submetido a um julgamento civil nos EUA foi absolvido ontem do crime de terrorismo. Ele escapou de 280 acusações e responderá apenas por danificar propriedade americana.
 
O tanzaniano Ahmed Khalfan Ghailani, 36, suposto guarda-costas de Osama Bin Laden, foi acusado de ter fornecido um veículo e componentes usados nas bombas que explodiram as embaixadas dos EUA no Quênia e na Tanzânia em 1998. Os atentados, realizados pela rede extremista Al Qaeda mataram 224 pessoas.
 
Ele foi preso em 2004 no Paquistão e passou cinco anos detido sem julgamento formal em uma prisão ilegal da CIA (agência de inteligência americana) e depois em na base militar de Guantánamo, em Cuba -para onde eram mandados os suspeitos de terrorismo.
A transferência de Ghailani para Nova York faz parte dos esforços do presidente Barack Obama de fechar a prisão de Guantánamo, após diversas denúncias de abusos contra os direitos humanos ocorridos na instalação.
 
Ghailani foi julgado em uma corte federal civil que, após quase uma semana de deliberação dos jurados, decidiu que ele é culpado apenas de conspirar para danificar ou destruir patrimônio dos EUA -uma acusação considerada branda.
 
Mesmo assim, a pena do tanzaniano pode superar 20 anos de prisão. Há até a possibilidade de sentença à prisão perpétua.

TORTURA
 
Promotores de Nova York não conseguiram a condenação dele por terrorismo e assassinatos devido a torturas e uma série de irregularidades praticadas contra ele no período em que estava preso.
O depoimento da principal testemunha de acusação, Hussein Abebe, foi descartado depois que a corte descobriu que sua identidade havia sido descoberta a partir de declarações do réu obtidas por meio de tortura.
 
Se seu depoimento tivesse sido aceito, Abebe possivelmente confessaria ter vendido a Ghailani grande parte do explosivo usado nos atentados em 1998.


Comentário: O sistema legal que existe é desse jeito. Estranho mesmo foi o presidente George W. Bush criar o conceito de “combatente inimigo ilegal”, liberar a prática de tortura, e jogar prisioneiros num limbo legal. Quem acompanha a indústria cultural americana já deve ter visto muitos filmes em que um criminoso é conhecido, mas a polícia não consegue estabelecer a sua culpa em um tribunal. Mesmo que o suspeito tenha cometido mais de um assassinato, ele é solto se um tribunal não julgá-lo culpado e o condenar.

No caso do suspeito da notícia acima, muitas das acusações se tornaram inválidas porque as evidências foram obtidas mediante tortura. Inaceitável em um tribunal civil dos Estados Unidos.

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