quinta-feira, outubro 30, 2008

Piso para professores: Estados vão ao Supremo contra legislação

ESTADOS VÃO AO SUPREMO CONTRA LEGISLAÇÃO

Os governadores Cid Gomes (CE) e Yeda Crusius (RS) protocolaram ontem no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei do piso do professor, aprovada neste ano. A ação, assinada também pelos governos de PR, MS e SC, diz que os Estados não teriam condições de arcar com o piso de R$ 950. A ação pede uma liminar para suspender a lei.

O texto é da Folha de São Paulo, de 30 de outubro de 2008.

E depois estes políticos dizem que a educação é prioridade. Quando tem uma oportunidade de fazer algo concreto a favor da educação, melhorar os salários dos professores, com um piso que ainda é vergonhoso, em lugar de trabalharem suas administrações para viabilizar o piso em seus estados, resolveram se esconder atrás da dificuldade fiscal, e pedir a suspensão do piso. Sem esquecer que o projeto ficou meses tramitando no Congresso.

Vai ser difícil acreditar quando qualquer desses governadores disser que educação é prioridade, é importante, etc, etc.


Marcadores: , ,

A Volks e o cassino

A Volks e o cassino

SÃO PAULO - Você abre o jornal de manhã e ousa percorrer a coleção sem fim de tragédias que é, hoje, o noticiário econômico. Lá na undécima página, fica sabendo que a Volkswagen vai conceder férias coletivas de dez dias para 1.800 funcionários da unidade de São José dos Pinhais (PR).
Aí, pensa, distraído: "Vixe, essa empresa está indo pro vinagre".
Que nada, companheiro. É justamente o contrário: pelo menos ontem, a Volks (a mundial) tornou-se a companhia de maior valor de capitalização no planeta (ou seja, o valor de todas as suas ações na Bolsa de Valores superou o de qualquer outra instituição, inclusive a portentosa Exxon).
Como é possível, se a indústria automobilística é a segunda maior vítima da crise global, logo atrás da construção/imóveis? Trata-se apenas de um exemplo "das distorções que se produzem hoje em dia nos mercados", diz Juan José Ruiz, o economista-chefe do Santander (na Espanha).
Se, em vez de distorções, falasse em cassino, estaria mais perto da realidade. Acontece que "hedge funds", esses que vão apostando em vários ativos, para defenderem-se de eventuais perdas em um deles, decretaram que as cotações da VW permaneceriam em queda. Aí vem a Porsche e anuncia que quer aumentar a sua fatia na Volks. O pessoal dos "hedge funds" correu desesperado para cobrir suas posições e cada ação da montadora voou dos 210 da sexta-feira para 1.005 em dado ponto de ontem.
Uma coisa, portanto, é a vida real, em que férias coletivas significam queda nas vendas. Outra coisa, bem diferente, é o cassino, em que férias coletivas nada significam. É por isso -entre outras mil razões- que, cada vez que vejo economista fingindo que faz análises lógicas sobre o mercado, levo a mão ao coldre.
Não que tenha um revólver, mas, nessas horas, dá vontade de ter.

Texto de Clóvis Rossi, na Folha de São Paulo, de 29 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , ,

quarta-feira, outubro 29, 2008

O Pró-Tudo de Lula

O Pró-Tudo de Lula

O GOVERNO baixou ontem uma medida provisória que autoriza um banco estritamente estatal, a Caixa, a comprar qualquer empresa. Medida preventiva, pois, como disse o ministro Guido Mantega, "nenhum banco está quebrando"? Pode ser, embora seu anúncio tenha sido um tanto assustador, para dizer o menos. Mas o essencial é: não há mecanismos mais transparente de evitar "riscos sistêmicos"?
Tanto Banco do Brasil (BB) como Caixa (CEF) e suas subsidiárias podem fazer feira de instituições financeiras em estado pré-falimentar.
BB e CEF foram autorizados a comprar seguradora, empresa de previdência privada (que tomaram tombos feios com a crise no mercado) etc. Mas o BB pelo menos tem ações na praça. Seus acionistas minoritários podem chiar, embora os governos tenham o costume de cobrir rombos do bancão federal.
Mas a CEF, além de ser todinha da União, ainda foi autorizada a criar um banco de investimentos, que pode comprar "participações" (parte ou o controle de empresas), entre outras operações típicas do setor. Se não for inócua, a CEF-Par" tem toda a cara de que será o bancão sombra da crise brasileira, o que vai engolir companhias podres, mas sem prestar contas claras (é um banco) e tendo o dinheiro público como o garantidor último de negócios ruins ou de negócios com amigos quebrados.
Em suma, se a CEF fizer mau negócio, a conta cai no Tesouro Nacional.
O Banco do Brasil recebeu ajuda em 1996 e em 2001, no governo FHC. A CEF, o Banco do Nordeste e o Banco da Amazônia entraram também no pacotão de 2001. O colunista não conseguiu fechar as contas precisas dos dois pacotões mas, em valores de hoje, começaram custando R$ 38 bilhões. A conta é difícil porque, além de dinheiro vivo e compra de ações pelo Tesouro, a União agasalhou créditos podres desses bancos (como dívida agrícola, dívida de financiamento imobiliário etc.). Aliás, em geral, os bancos fazem tais negócios ruins porque lobbies pedem, e o governo cede.
Há dois problemas graves e essenciais no Pró-Tudo de Lula. Primeiro é o público simplesmente não vir a saber que risco estará correndo, pois as operações do banco de investimento da CEF não vão aparecer no sistema de contabilidade pública.
Ou melhor, podem aparecer: quando a conta do negócio ruim chegar.
Ou ainda antes: ou a CEF não tem dinheiro para bancar a feira de empresa ruim (e a medida é inócua) ou vai acumular passivos obscuros e/ou receber aporte de recursos do Tesouro desde já. Será essa a próxima medida provisória?
Segundo problema maior: o privilégio. Considere-se que uma empresa ou banco fez negócio ruim e está para quebrar. A CEF então dá uma mãozinha, compra "participação".
Os acionistas ou donos das firmas que fizeram maus negócios ficam com a empresa e com o subsídio público. Impedir que a empresa quebre é bom para os funcionários e para o país? Ok. Mas por que é preciso haver subsídio para o proprietário?
O PT fez aquela chacrinha com o Proer, o programa federal de cobertura de rombos dos bancos privados, criado no governo FHC. Mas o Proer, ainda com algumas obscuridades, parece muito mais claro do que o Pró-Tudo de Lula.

Texto da Folha de São Paulo, de 23 de outubro de 2008. O grifo é do blogueiro. Os lobbies representam os empreendedores privados, muitas vezes os mesmos empreendedores que reclamam da intervenção do estado na economia.

Marcadores: , , , ,

Colômbia: mais indígenas mortos em marcha de oposição à Uribe

Após novas mortes, indígenas obtêm adesões na Colômbia

Dois participantes de marcha anti-Uribe perdem as vidas em confronto com polícia

Estudantes e central sindical declaram apoio a protestos, que demandam mais terras; governo acusa Farc de estar por trás de manifestações

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Dois manifestantes que participariam de uma grande marcha indígena contra a violência e a falta de terras morreram anteontem durante enfrentamentos com a polícia colombiana. O protesto de 10 mil pessoas, iniciado na semana passada, recebeu nas últimas horas o apoio de estudantes e sindicatos e tem provocado uma intensa troca de acusações entre o movimento e o governo do presidente Álvaro Uribe.
Os dois mortos faziam parte de um grupo de 200 indígenas e camponeses que, segundo a Organização Nacional Indígena da Colômbia (Onic), se integrariam à grande marcha na cidade de Villa Rica (sudoeste), amanhã. Eles fecharam a rodovia Panamericana, uma das mais importantes do país, dando início ao confronto com um esquadrão antidistúrbios.
A polícia nega envolvimento nas mortes e diz que podem ter sido provocadas pela explosão de uma bomba caseira.
Até sábado, quando devem chegar a Cali, os indígenas terão percorrido cerca de 100 km desde a cidade de Piendamó. O protesto está sendo feito numa das faixas da Panamericana -eles se comprometeram a não bloqueá-la totalmente.
Em reação às mortes, estudantes entraram em choque com a polícia após bloquear várias ruas na região do aeroporto internacional de Bogotá. Já a Central Unitária dos Trabalhadores (550 mil filiados) prometeu marchas pelo país em apoio aos indígenas e a uma greve de cortadores de cana.
Até o fim de semana, os manifestantes esperam reunir 20 mil pessoas em Cali, onde exigirão a presença de Uribe.
Porta-vozes do governo têm feito duras acusações contra o movimento. O diretor da Polícia Nacional, Oscar Naranjo, disse que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) estão por trás da mobilização, enquanto o ministro de Proteção Social, Diego Palacio, afirmou que o objetivo é "desestabilizar" Uribe.
"Neste país, quem se opõe ao governo é considerado terrorista e conspirador. Diante disso, respondemos com uma marcha pacífica. Nossa mobilização não tem interesses obscuros", disse ontem à Folha Luis Fernando Arias, secretário-geral da Onic, em entrevista por telefone desde Santander de Quilichao, cidade onde se encontrava a marcha.
Segundo a Onic, 1.273 indígenas foram assassinados desde que Uribe assumiu, em 2002. A organização afirma que existem no país 1,35 milhão de indígenas, 3% da população.
Sobre o problema de falta de terras, Arias disse que, dos 27 milhões de hectares destinados aos indígenas na Colômbia, 23 milhões estão sob preservação. "As terras para o cultivo agrícola são muito poucas, porque a maior parte está na mão dos latifundiários deste país."
A Onic também exige a adesão à Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada em 2007. O país foi o único da América Latina a não aprovar o documento.

Texto da Folha de São Paulo, de 23 de outubro de 2008.


Marcadores: , , ,

O Passo

O passo
A visita de Fernando Gabeira ao Clube Militar rendeu um fato positivo. Ao comentá-la para repórteres, o general Gilberto Figueiredo, presidente, definiu-a como "um encontro meio inusitado, um antigo guerrilheiro recebido no Clube Militar".
Desde que no "Jornal do Brasil" foi imposta a falsa denominação de "terroristas" para os adeptos da oposição armada à ditadura, em quase 40 anos é a primeira vez que um militar reconhece-lhes a condição de guerrilheiros.
O general Gilberto não substituiu uma palavra por outra: deu um passo enorme.

Trecho da coluna de Jânio de Freitas, na Folha de São Paulo, de 23 de outubro de 2008. Talvez seja otimismo do jornalista Jânio de Freitas, mas este blogueiro não tinha se dado conta, e, talvez, este aparente “passo enorme” seja de fato relevante.


Marcadores: , , ,

Anistia Internacional denuncia aumento de execuções extrajudiciais na Colômbia

MADRI, 28 Out 2008 (AFP) - A organização de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional (AI) denunciou o aumento de "execuções extrajudiciais pelas forças de ordem na Colômbia e as violações de direitos humanos cometidas por grupos paramilitares", segundo documento publicado nesta terça-feira em Madri.

Em documento obtido pela AFP, a ONG destaca que, segundo o governo colombiano, no país há um "renascimento irreversível de uma paz relativa, um rápido recuo dos índices de violência, a desmobilização com sucesso de milhares de combatentes paramilitares e uma justiça efetiva para as vítimas de abusos".

"Sem dúvida, é certo que nos últimos anos a incidência de alguns abusos caiu", continua a AI em seu relatório de 85 páginas. "Mas outros, no entanto, aumentaram, particularmente as execuções extrajudiciais cometidas diretamente pelas forças de segurança e os deslocamentos forçados das populações", continua.

"Além disso, o aumento recente da violência contra os defensores dos direitos humanos e os sindicalistas também é motivo de preocupação", enfatizou a AI.

"Os grupos paramilitares continuam ativos e cometendo violações dos direitos humanos, apesar de o governo afirmar o contrário", diz o relatório, insistindo em particular na existência de um conflito que envolve o Exército, os paramilitares e as guerrilhas, e que não é só a guerra contra o terrorismo como afirma o governo do presidente colombiano Alvaro Uribe.

Este conflito custou a vida de mais de 70.000 pessoas em 20 anos, a maioria civis.

Segundo a ONG, entre 15.000 e 30.000 pessoas desapareceram desde o início do conflito, há 40 anos.

A AI denuncia também as guerrilhas de esquerda, em particular as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), pelos seqüestros, deslocamentos forçados da população, entre outros crimes.

O número de seqüestros caiu, de 3.570 em 2000 para 520 em 2007, mas a Colômbia continua sendo um país em que milhões de civis são castigados pelo conflito violento e prolongado, afirma a AI.

Texto do UOL Notícias.

Marcadores: , , , , ,

sexta-feira, outubro 24, 2008

"Espancado"

“Do mesmo modo, me espanta que ninguém tenha vergonha de ver Lindemberg sair sem ferimentos aparentes da cena e depois aparecer com sinais de ter sido espancado, já sob custódia do Estado. E ninguém fala nada. A polícia pode até achar que fez o melhor que pode, mas não dá para se sentir orgulhosa do resultado. Foi um fracasso. Também não imagino que uma emissora saia comemorando o furo jornalístico de entrevistar Lindemberg durante o seqüestro, porque é a história de uma tragédia.”

Do terapeuta Paulo Fernando Pereira de Souza, no UOL Notícias.

Este blogueiro viu umas duas pessoas que se regozijaram com os aparentes sinais de espancamento no rosto do seqüestrador. Pessoas normais, que trabalham duro todo dia, educadas, ...

Marcadores: , , , , ,

quinta-feira, outubro 23, 2008

A Charge da Folha de São Paulo, em 23 de outubro de 2008


O Glauco captou o pensamento de quem acompanha as manchetes sobre bolsas de valores e moedas nas últimas 2 ou 3 semanas.

Da Folha de São Paulo.


Marcadores: , , , ,

Guerra na Favela

Guerra nas favelas
Buscam, capturam e matam. "EL PAÍS" presenciou uma operação da brutal polícia de elite do Rio de Janeiro

Francho Baron
No Rio de Janeiro

Favela do Rebu, 9h30 da manhã. A hélice do helicóptero da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), o eufemismo com que se denomina a tropa de elite da Polícia Civil do Rio de Janeiro, quebra com seu estrondo o silêncio do amanhecer na periferia oeste da cidade. Por terra, um comboio de 30 veículos todo-terreno liderados por um carro blindado (o temido Caveirão, na gíria carioca) ocupa e fecha o principal acesso ao subúrbio. Cento e vinte homens uniformizados de preto e equipados com armamento de guerra (fuzis de assalto M-16 e FAL-762, metralhadoras M-60 e coletes à prova de bala) formam duas colunas que rapidamente se dispersam pelos dois lados da principal artéria da favela.

Os becos estão desertos: alguém deu voz de alerta minutos antes do desembarque da polícia. Começa mais uma operação da Core, um dos dois corpos de elite do Rio, polêmico pela brutalidade com que atua onde a polícia convencional não se atreve a pisar.

Em Rebu a facção criminosa Comando Vermelho acampa à vontade. Os narcotraficantes estabeleceram nas ruelas mais largas da favela várias "bocas de fumo" (pontos de venda de droga) e ditaram leis paralelas para regulamentar a vida de seus moradores: todo mundo é obrigado a colaborar com a "firma" e não se permitem roubos dentro nem nas imediações da comunidade. O Comando Vermelho oferece em troca proteção aos moradores e, com a receita da cocaína, de vez em quando subvenciona pequenos gastos domésticos aos que pedem, como um botijão de gás ou um medicamento de urgência. Hoje, fato incomum, os criminosos não receberam com tiros a chegada da polícia.

A operação, lançada em julho passado, tem como objetivo capturar os chefes do narcotráfico, os donos das bocas de fumo, vivos ou mortos. No Rio se dá por fato que a Core, assim como o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio (Bope), tem carta-branca para quase tudo: pode disparar à queima-roupa, revistar residências sem autorização judicial, submeter a dramáticos interrogatórios qualquer suspeito de ocultar informação sobre pessoas procuradas.

Ronaldo Oliveira, chefe do Grupo Especializado em Roubos e Furtos de Automóveis (DRFA), chefia a coluna direita. Agora o silêncio na favela é quase absoluto, somente rompido pelo leve ruído do cascalho sob as botas dos policiais e pelo choro premonitório de um menino, que instintivamente percebe a violência que se aproxima. Oliveira não se dirige a seus soldados com palavras, mas com um intricado código de gestos que só os homens da Core e do Bope entendem.

O comandante dá ordem e sua coluna abandona a artéria principal, deslocando-se com agilidade por uma ruela adjacente. Começam as revistas. O grupo é encabeçado por um sujeito coberto por um capuz preto e um chapéu de camuflagem; é o condutor da operação, o que se conhece na gíria do crime como um X9, um informante ou desertor do narcotráfico que pretende pagar algum favor à polícia entregando cabeças mais importantes que a sua. O indivíduo indica com o dedo a porta de um casebre.

A Core não costuma bater à porta; diretamente tenta abri-la pelos métodos civilizados e, se não conseguir, a derruba a pontapés ou, como último recurso, recorre aos explosivos. Não sabemos se este é o caso, já que a polícia afirma que foram os traficantes que lançaram uma granada contra a porta, mas a explosão provocou pânico na favela e agora o cheiro de pólvora, a fumaça, a poeira e os estilhaços se misturam aos gritos das mulheres e ao choro compungido das crianças.

Oliveira pede cobertura a seus homens e entra primeiro na casa, apontando um M-16 contra tudo o que parece se mover entre a fumaceira. Sai uma mulher do quarto pedindo entre soluços misericórdia para seu marido. O policial nem se incomoda em responder; simplesmente a afasta de seu caminho com o antebraço e entra no quarto, onde encontra escondido em um armário A.R.M., um dos principais cabeças do tráfico na favela de Rebu, que se entrega sem opor a menor resistência.

O criminoso é levado ao acesso principal da favela, onde fica exposto, como se fosse um troféu de caça, aos jornalistas que cobrem a operação. Junto dele estão algemados outros quatro supostos criminosos, alguns deles com claros sinais de violência no rosto (um olho roxo, um pouco de sangue coagulado nos lábios...). Não são pessoas com aspecto de criminosos perigosos, mas adolescentes sem camisa, com os olhos injetados de sangue de fumar maconha ou crack.

A seus pés também ficaram expostos o abundante material bélico e as drogas apreendidas: três subfuzis Uzi, dois AK47, duas pistolas, várias bombas de fabricação artesanal (cilindros de alumínio cheios de pólvora e fragmentos) e várias centenas de papelotes de cocaína. Esses são os temíveis "soldados" do narcotráfico do Rio: deserdados da terra, em muitos casos sem noção de bem e de mal, drogados e armados até os dentes.

"Os crimes aqui são muito violentos. Normalmente são cometidos por jovens de 17 a 25 anos com capacidade mental muito reduzida, que saem à rua para ganhar um dinheiro rápido e acabam matando sua vítima e cometendo outras atrocidades", explica de maneira bastante gráfica o delegado Oliveira.

Hoje, no Rebu, a Core foi razoavelmente cirúrgica e não houve vítimas fatais, mas a poucos quilômetros daqui, na favela da Coréia, a polícia militar interveio com menos consideração e matou três pessoas.

No Rio de Janeiro, isso deixou de ser notícia há tempo: a imprensa local tem seções fixas nas quais quase todos os dias se narra a guerra nas favelas e se contabilizam os mortos. Segundo os dados da própria Polícia Militar, em 2007 ocorreram 20 baixas de efetivos em choques armados no município do Rio. Em 2008 dez policiais militares morreram. Esses números contrastam de forma suspeita com as baixas contadas do outro lado; segundo o Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, só no primeiro semestre deste ano foram registrados 472 civis mortos no que a polícia considera baixas legítimas, provocadas pela resistência dos criminosos à autoridade. No mesmo período do ano passado, o número de mortos chegou a 509.

"Estamos diante de uma eficácia policial absurda", comenta para este diário o sociólogo espanhol Ignacio Cano, membro do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). "Não conhecemos outra polícia no mundo que cause tantas mortes em suas intervenções como a do Rio. Infelizmente, esta realidade corresponde a uma concepção política da segurança pública", acrescenta.

Segundo Cano, a polícia de operações especiais carioca tem três características próprias que a diferem de qualquer outro corpo policial do planeta. Primeiro, trata-se de uma força militarizada que responde a uma estratégia militar; isto é, os objetivos são eliminar o inimigo e ocupar seu território. Em segundo lugar, conta com um poder de fogo indiscriminado que causa grande número de vítimas inocentes. Por último, e em conseqüência das anteriores, os cidadãos passam para um segundo plano quando se toma a decisão de intervir. "Uma polícia européia que atuasse assim em áreas densamente povoadas como são as favelas seria inaceitável", concluiu o especialista em violência policial.

No último relatório anual da ONG Human Rights Watch, na rubrica dedicada à violência policial no Brasil, afirma-se: "Os policiais que cometem abusos raramente são sancionados e algumas vezes esses abusos são justificados pelas autoridades como uma conseqüência inevitável de seus esforços para combater os altos índices de criminalidade no Brasil".

Na mesma linha, o tarimbado repórter carioca Bartolomeu Brito, com 25 anos de experiência na cobertura de conflitos em favelas (suas reportagens inspiraram o roteiro do filme "Cidade de Deus", do diretor Fernando Meirelles), opina que a polícia "primeiro dispara e depois pergunta". "Existe uma solução em longo prazo: que as autoridades desmantelem as favelas e removam seus moradores para locais decentes. Mas infelizmente os políticos só pisam nesses lugares quando precisam pedir votos. Depois que passam as eleições tornam a desaparecer", denuncia o jornalista.

O comentário vem a propósito, porque no próximo domingo (26) será disputada a prefeitura do Rio de Janeiro, entre várias outras, no segundo turno das eleições municipais brasileiras. Nesses dias os candidatos a prefeito e a vereadores se empenham em tirar fotos, sorridentes, junto com os moradores das favelas, onde se concentram 19% da população carioca.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Texto do El País, no UOL.

Marcadores: , , , ,

quarta-feira, outubro 22, 2008

E a respeito da greve dos bancários neste ano de 2008...

... Creio que ela se encaminha para o seu fim.

Na negociação acontecida na noite do dia 21 para 22 de outubro, a Federação dos Bancos ofereceu 10% de reajuste para os salários até R$ 2.500,00 , e 8,15% para quem ganha acima desta faixa, o que significa aumento real de 2,85% na faixa mais baixa e de 1% para a mais alta, além de outros benefícios. Os dias parados poderão ser compensados.

Pude ouvir no rádio que o presidente do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre, achava a proposta boa o bastante para que a greve terminasse. Isto disse o narrador sem expor áudio do referido presidente.

Já são mais de 20 dias de greve.


Marcadores: , ,

Voltas em Torno do Umbigo bombou por conta da greve dos bancários

O meu outro blogue, o Voltas em Torno do Umbigo, teve picos de acesso por estes dias por conta de dois “posts” que anunciavam que “a greve dos bancários acabou”. Não conheço as intenções dos leitores, mas acredito que estivessem interessados nas notícias da greve dos bancários que está acontecendo neste ano de 2008. Os “posts” geradores do movimento no Voltas em Torno do Umbigo eram referentes à campanha salarial dos bancários de 2006.

Acontece...


Marcadores: , , , , ,

Fracasso das polícias

O fracasso da polícia é dos políticos

JOSÉ PADILHA e RODRIGO PIMENTEL


No fim, são os políticos os principais responsáveis pela repetição de tragédias como a do ônibus 174 e do seqüestro em Santo André



NÃO SÃO apenas as ocorrências mal administradas, cheias de erros primários e ilegalidades que demonstram a necessidade de uma reforma da segurança pública no Brasil. Os dados indicam essa necessidade faz tempo. E os nossos políticos, apesar de conhecerem os dados, têm se mostrado incapazes de realizar tal reforma. São eles, no final das contas, os principais responsáveis pela repetição cotidiana de tragédias como a ocorrida no evento do ônibus 174 e do seqüestro em Santo André.
Em conversa informal com agentes do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais), descobrimos que eles estão desolados com o desfecho da ocorrência, que custou a vida de uma pessoa e feriu outra, e revoltados com os políticos, devido ao descaso que têm com a unidade, exposta ao ridículo com o fracasso da operação.
Afinal, se o Gate dispusesse do equipamento necessário para administrar uma ocorrência desse tipo, como uma microcâmera de fibra ótica, saberia que o seqüestrador tinha encostado um armário de TV e uma estante na porta de entrada do apartamento. Saberia que seqüestrador e reféns não estavam na sala, mas no quarto. Saberia que uma invasão pela porta da frente daria tempo para o seqüestrador atirar nas reféns. Mas o Gate não sabia de nada disso e perdeu preciosos segundos abrindo a porta.
Se o Gate dispusesse de escada com alcance para que um policial pudesse entrar no apartamento pela janela, poderia ter evitado a tragédia. Mas a escada do Gate, como atestam as filmagens, era curta demais.
Se os policiais do Gate fossem bem treinados, não teriam deixado que uma menina de 15 anos, libertada pelo seqüestrador, voltasse a ser prisioneira. Não teriam demonstrado tamanha incompetência e desconhecimento legal. Mas os policiais do Gate, como os do Bope e do resto do país, não recebem treinamento adequado.
Quando trabalhamos no documentário "Ônibus 174", sentimos a mesma revolta por parte dos policiais do Bope, que, em sua maioria, odeiam os políticos a quem servem.
André Batista, colaborador em "Tropa de Elite" e negociador do Bope na malfadada ocorrência, deu o seguinte depoimento para o documentário: "Naquele momento, a gente viu que faltava muita coisa. As coisas que a gente vivia pedindo, os equipamentos, os cursos, parece que, naquele momento, tudo desabou." Ouvimos, virtualmente, a mesma coisa do Gate.
Chegamos, assim, a uma conclusão absurda. Concluímos, parafraseando Nietzsche, que é preciso defender os nossos policiais dos nossos políticos! Afinal, quem são os nossos policiais? E o que o Estado, administrado pelos políticos eleitos, fornece a eles?
Tomemos como exemplo um policial carioca. É um sujeito mal remunerado, mal treinado, que trabalha em uma corporação corrompida por dentro. Isso é o que o Estado lhe dá. E o que pede em troca? Que mantenha a lei. Em outras palavras, que entre em conflito com os membros corrompidos da sua corporação e com os bandidos fortemente armados da cidade.
Ora, não é à toa que o capitão Nascimento, refletindo um sentimento comum entre os policiais do Bope, tenha dito que "quem quer ser policial no Rio de Janeiro têm que escolher. Ou se corrompe, ou se omite, ou vai pra guerra." Em São Paulo, não parece ser muito diferente.
Não esqueçamos, pois, o ano de 2003, quando o então secretário nacional de Segurança Pública, o sociólogo Luiz Eduardo Soares, estava prestes a conseguir a reforma que nossos policiais sérios tanto pedem.
Ele tinha participado da elaboração de um plano de segurança pública que previa um piso nacional decente para o salário dos policiais, a integração da formação e das plataformas de informação das polícias estaduais, o repasse de recursos federais para os Estados condicionado à reforma de gestão e ao controle externo e a desconstitucionalização da segurança pública, dando autonomia para que os Estados reformassem as polícias de acordo com as realidades locais.
Apresentou o plano ao governo federal com a assinatura de todos os governadores. E o que fez o governo? Desistiu. Nem sequer apresentou o plano ao Congresso. Não o reformulou, optou pela passividade. Segundo nos disse o sociólogo, por considerar que a reforma demoraria a dar resultado e que a opinião pública poderia responsabilizar o governo federal, e não os Estados, se eventuais tragédias ocorressem durante a implantação.
Evidentemente, não estamos culpando os atuais governos federal e estadual pelo desfecho do seqüestro em Santo André. Afinal, governos anteriores poderiam ter tentado reformar a segurança. O governo FHC, por exemplo, prometeu um plano nacional depois do ônibus 174.
Estamos culpando os verdadeiros responsáveis: os nossos políticos como um todo, que há muito tempo sabem que precisam reformar a segurança pública para salvar a vida de milhares de brasileiros e que há muito tempo fracassam ao não levar essa tarefa a cabo. Um fracasso ainda mais vergonhoso do que o dos policiais do Bope e do Gate.


JOSÉ PADILHA, cineasta, é diretor de "Ônibus 174", "Tropa de Elite" e "Garapa", entre outros filmes. RODRIGO PIMENTEL, sociólogo, é ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar) do Rio de Janeiro, um dos roteiristas de "Tropa de Elite" e co-produtor de "Ônibus 174".

Texto da Folha de São Paulo, de 20 de outubro de 2008.


Marcadores: , , , ,

A Era da Modéstia (?)

A era da modéstia

Após a febre consumista dos anos 1990 e 2000 à custa de empréstimos maciços, americanos desaprenderam a viver com poucos recursos, mesmo os de classe mais baixa

KENNETH SERBIN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando eu era criança e jovem, nos EUA, aprendi que cada geração deve conquistar um padrão de vida mais alto que a geração anterior.
Devido à primazia econômica de meu país, atingi a maioridade nos anos 1960 e início dos anos 1970 acreditando em que as necessidades básicas da vida eram garantidas e em que eu poderia automaticamente buscar uma carreira que me desse tanto sucesso financeiro quanto realização pessoal.
Ambos os meus avôs se mudaram da Europa para os EUA, aprenderam inglês e obtiveram empregos trabalhando com as mãos. Um deles era estofador de móveis, e o outro trabalhava numa fábrica.
A vida ficou difícil durante a Grande Depressão, mas, no boom do pós-Segunda Guerra, todos os seus filhos ingressaram na nova maioria formada pela classe média e desfrutaram o maior conforto da história da humanidade. Meu pai não cursou faculdade, mas sempre teve emprego trabalhando com máquinas ou como técnico. Graças aos hábitos econômicos dele e de minha mãe e à ajuda de meus avós, sempre tiveram casa própria sem contrair hipoteca.

O começo do fim
Mas o primeiro choque petrolífero, em 1973, aliado à inflação causada pelos orçamentos federais inchados da era da Guerra do Vietnã e da "grande sociedade" do presidente Lyndon B. Johnson, trouxeram em seu bojo um longo período de estagflação e incerteza. Foi o começo do fim do grande sonho da classe média americana.
Em 1978, ingressei na Universidade Yale, esperando encontrá-la fervilhando com o idealismo e o ativismo que haviam tão notoriamente dinamizado os campi universitários alguns anos antes. Em lugar disso, porém, me deparei com uma ênfase grande sobre o pré-profissionalismo, termo sombrio que refletia a realidade econômica difícil que minha geração começava a enfrentar.
Resumindo, significava que uma educação universitária se tornara algo altamente competitivo e que já não representava garantia de um bom emprego.
Em 1981, enquanto o país se esforçava para recuperar-se dos juros de 20% do final da década anterior, meu pai perdeu seu emprego, depois de 25 anos trabalhando para sua empresa. Em uma economia que iniciara um processo acelerado de desindustrialização e, em alguns setores, se tornara incapaz de competir com países como o Japão, ele foi obrigado a aceitar outro emprego recebendo pouco mais que o salário mínimo -e sem benefícios.
Minha mãe já trabalhava em tempo integral para ajudar a pagar minha educação universitária e esperava poder deixar o emprego depois que eu me formasse, em 1982. Mas teve que continuar trabalhando para ajudar a poupar para a aposentadoria de meus pais. Comparada com o resto do mundo, a economia americana ainda oferecia oportunidades para os jovens e criativos.
Fui viver e estudar no México e no Brasil e contei com apoio sólido para obter um Ph.D em história e conseguir um emprego acadêmico, um privilégio imenso num mundo em que a maioria das pessoas trabalha em empregos estressantes das 9h às 17h. Mas, depois de me casar e virar parte da engrenagem econômica, na casa dos 30 anos, lutei para conquistar os benefícios econômicos que meus avós e meus pais tinham desfrutado no período de 1945 a 1973.
Meu avô materno não chegou a concluir o ensino médio, mas, mesmo assim, na década de 1950, terminou de pagar, em pouco tempo, uma casa própria muito boa localizada num bom bairro.

Trabalho duro
Minha avó nunca trabalhou nem um dia em sua vida. Agora, mesmo munido de um Ph.D, tive dificuldade em comprar um apartamento próprio e fui obrigado a contrair uma hipoteca de 30 anos. Minha mulher e eu só conseguimos comprar uma casa com quintal depois de ela encontrar um emprego, efetivamente dobrando nossa receita. Contraímos mais uma hipoteca de 30 anos.
A vida de pós-graduando e bolsista no Brasil me preparou bem para um estilo de vida simples, assim como o fez meu casamento com uma brasileira que, na juventude, freqüentemente vivera na quase-pobreza. Nós dois -ela de modo mais visceral do que eu- conhecemos a fragilidade da existência para a maioria dos humanos.
Mas a maioria dos americanos não faz idéia de como é a vida nos países mais pobres. Protegidos e doutrinados por jingles comerciais que promovem o consumismo de maneira suave, eles vivem em um mundo de fantasia, que reforça o desejo de viver melhor do que viveram seus pais.
Como em minha situação, para equiparar-se ao padrão de vida da geração anterior, as famílias americanas passaram a precisar de pelo menos dois assalariados trabalhando em tempo integral.
Mas como superar esse padrão? Os EUA encontraram uma solução em meados dos anos 1990.
Para começar, suas grandes empresas transferiram a produção para a China e outros países em que se pagavam salários miseráveis. Isso manteve baixos os preços nos EUA, mas também acelerou a desindustrialização e enfraqueceu a saúde geral da economia. Em segundo lugar, os EUA reduziram as restrições ao crédito. Depois de me graduar, em 1982, não consegui cumprir as exigências para ter um cartão de crédito. Hoje os americanos possuem mais de 600 milhões de cartões de crédito e carregam trilhões de dólares de dívida pessoal.
Espantosamente, mesmo na esteira do derretimento multitrilionário das hipotecas de alto risco, ofertas de novos cartões de crédito continuam a chegar pelo correio. Com a autorização de seus pais, até mesmo crianças têm cartões de crédito nos EUA.
As gerações de meus avós e de meus pais costumavam economizar antes de fazer compras grandes. Nas décadas de 1990 e 2000, os americanos saciaram sua fome por toda uma gama de bens -televisores de tela grande, restaurantes de alta classe, esportivos utilitários que consomem muito combustível, carros importados de luxo, festas de aniversário luxuosas para seus filhos e grandes residências adquiridas com pequeno ou nenhum pagamento à vista- por meio de empréstimos maciços.
O século americano conquistou grandes vitórias para o mundo, tais como a elevação global da expectativa de vida. Mas o crescimento econômico maciço e a transformação do dinheiro em artigo que é transferido eletronicamente mudaram as percepções humanas do dinheiro e do poupar.
A maneira aleatória, movida pelo pânico em que as autoridades públicas vêm tratando a crise, revela que ninguém compreende realmente o significado de um sistema de múltiplos trilhões de dólares. Lamentavelmente, em colaboração com as próprias pessoas que ajudaram a promover essa "débâcle", as autoridades estão buscando escorar o sistema, em lugar de reformá-lo.

Religião do sucesso
Confortavelmente posicionados no centro dele, muitos americanos pensaram que o crédito fosse ilimitado e abandonaram qualquer senso de responsabilidade pessoal.
Cada vez menos americanos sabem viver modestamente, até mesmo entre as classes mais baixas.
Em termos morais, os norte-americanos substituíram o cristianismo por uma nova religião do sucesso. Essa religião não tem vida após a morte nem consideração pelas gerações futuras, pois seu credo consiste em consumir o máximo possível aqui e agora.

KENNETH SERBIN é professor de história na Universidade de San Diego (Califórnia) e autor de "Padres, Celibato e Conflito Social" (Companhia das Letras), entre outros livros. Tradução de Clara Allain .

Texto do caderno Mais!, da Folha de São Paulo, de 19 de outubro de 2008.


Marcadores: ,

Desindustrialização expulsa esquerda de SP

Desindustrialização expulsa esquerda de SP, diz sociólogo

Francisco de Oliveira diz que trabalhadores do setor informal em geral votam na direita

A desindustrialização de São Paulo empurrou a esquerda para fora da cidade, sustenta o sociólogo Francisco de Oliveira, 74, professor titular aposentado do Departamento de Sociologia da USP. Segundo ele, a fuga das indústrias da capital paulista converteu a cidade num pólo de serviços com um setor informal muito extenso, cujos integrantes não se identificam com o PT: "Em geral eles votam na direita devido ao imediatismo. É gente que quer receber benefícios imediatos, sem esperar por transformações estruturais". Segundo Oliveira, o Bolsa Família é uma "política conformista" que reflete o predomínio desse "exército informal que representa mais de 50% da força de trabalho".

MAURICIO PULS
DA REDAÇÃO

Na entrevista a seguir, concedida na última terça-feira, o sociólogo sustenta ainda que, ao chegar ao poder, "o PT foi engolido pelo atraso", pois trocou uma política de classe por uma política de combate à pobreza.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif

FOLHA - Em novembro de 2004, o sr. publicou um artigo na Folha em que dizia que Marta Suplicy foi derrotada pelo governo Lula, pois sua política econômica era indefensável. Hoje Lula tem mais de 50% de aprovação na cidade de São Paulo. Como o sr. explica a rejeição a Marta? A criação das taxas? As políticas sociais do PT? Críticas moralistas?
FRANCISCO DE OLIVEIRA
- Um pouco de tudo isso. Em primeiro lugar, naquela época o ataque da mídia ao governo Lula era muito intenso, e Lula não transferiu votos para Marta, transferiu a carga negativa. Agora a situação é a seguinte: a administração de Kassab está muito fresca na memória, enquanto a de Marta já tem quase quatro anos de distância. Isso hoje é muito importante devido à imediaticidade da mídia. É ela que faz a nossa consciência: é uma presentificação absoluta. A distância da administração da Marta esbarra na imediaticidade das avaliações positivas de Kassab. O fato de a avaliação do governo federal ser positiva na cidade de São Paulo não dissolve essa distância da Marta. E São Paulo é uma cidade bastante conservadora. Bastante conservadora. Se você retoma a história brasileira, o populismo paulista sempre foi de direita: Adhemar de Barros, Jânio Quadros, Paulo Maluf.

FOLHA - Ignácio Rangel dizia que o latifúndio gaúcho -Getúlio Vargas, João Goulart- conseguiu representar politicamente a indústria nacional, o que deu origem a um populismo de esquerda, progressista. Mas isso não aconteceu em São Paulo.
OLIVEIRA
- Isso nunca aconteceu. Mas não é só isso. Na verdade o que é importante no Rio Grande do Sul é a pequena propriedade, não é o latifúndio: o latifúndio enche nossas mentes, mas não forma... As ideologias populistas nascem no Rio Grande do Sul, mas é importante não esquecer que o Estado conheceu um positivismo muito especial, que é o que influi na legislação trabalhista. Vargas era positivista, a moçada formada nas escolas militares era positivista. Não é a toa que a divisa da bandeira brasileira é "Ordem e Progresso". E São Paulo não teve essa formação.

FOLHA - Mas por que a direita é especialmente forte em São Paulo? Devido à centralidade econômica da cidade, sede de grandes empresas, bancos, associações empresariais?
OLIVEIRA
- De fato, a centralidade econômica de São Paulo leva a cidade para a direita. Não é tautológico, mas é um fato.

FOLHA - Mas o PT continua sendo muito votado na periferia da cidade e nos demais municípios da região metropolitana. O sr. acha que a esquerda foi expulsa para fora da cidade -para a região metropolitana?
OLIVEIRA
- Foi, é verdade. Esse é um fenômeno político da maior importância. As indústrias saíram de São Paulo. São Paulo não é mais uma cidade proletária: é uma cidade de serviços e de um setor informal imenso, cuja identificação de classe é muito ambígua, muito perpassada pelo fenômeno da sobrevivência. É uma situação de classe muito difícil. São Paulo não é mais do proletariado clássico. Moro num bairro, a Vila Romana, que antigamente tinha várias indústrias. Hoje não tem mais nenhuma, todas foram para outros municípios.

FOLHA - Inclusive é uma área de forte investimento imobiliário.
OLIVEIRA
- Forte, muito forte. Não é uma zona rica, comparada a Higienópolis, mas é uma zona de investimentos imobiliários muito altos. E aqui você tinha a Matarazzo, a Saturnia, a Melhoramentos -hoje aqui só ficou o escritório-, a Parmalat... Era uma zona de fábricas, e hoje não tem mais nenhuma. Isso aconteceu com a cidade como um todo. A cidade se desproletarizou na forma clássica e ganhou um enorme exército de trabalhadores informais....

FOLHA - Que em geral não votam na esquerda...
OLIVEIRA
- Em geral eles votam na direita devido ao imediatismo. É gente que quer benefícios imediatos, sem esperar por transformações estruturais.

FOLHA - Apesar de sua provável derrota em São Paulo, o PT continua sendo o partido que mais cresceu no país. Em 2004 o sr. escreveu que isso mostrava o envelhecimento de um partido nascido para reformar o país. O sr. ainda mantém essa opinião: o PT foi engolido pelo atraso ou foi o atraso que se modernizou?
OLIVEIRA
- Eu acho que o PT, como força transformadora, foi engolido pelo atraso. Qual é a modernização que existe aí? É uma modernização de políticas sociais que são políticas de ajustamento, não são políticas sociais transformadoras -elas se ajustam à realidade. O Bolsa Família é uma política de ajuste, uma política conformista. E isso reflete essa situação um tanto ambígua de uma classe que não é classe, desse enorme exército informal que representa mais de 50% da força de trabalho. Então, o PT foi engolido pelo atraso. A modernização das políticas sociais é uma regressão da classe para a pobreza, enquanto o movimento histórico vai da pobreza para a classe. A extensão das políticas sociais focais é uma regressão da classe para a pobreza: elas são políticas para os pobres.

FOLHA - Os partidos social-democratas de tipo clássico se baseavam em seções territoriais, os núcleos de base. Hoje os núcleos do PT praticamente desapareceram. Essa transformação reflete a conversão de um "partido dos trabalhadores" em um "partido dos pobres"? O PT não é mais um partido social-democrata?
FOLHA
- Não, não é. Isso reflete em parte essa mudança e, em parte, é um reflexo da chegada ao poder. Você se profissionaliza porque a gestão do Estado exige a profissionalização. Não é um Estado qualquer: é um Estado capitalista, todo permeado por relações patrimonialistas, mas na maior parte dos casos você tem que gerir dinheiro. E dinheiro não se gere passando a mão na cabeça. O partido profissionalizou-se e burocratizou-se no sentido weberiano -ele tem de tornar a gestão previsível, e por isso se profissionaliza. Isso é em parte o efeito da chegada ao poder, e em parte o efeito da regressão da classe para a pobreza.

FOLHA - Mas o PT ainda tem um vínculo razoavelmente estreito com os sindicatos. O sr. acha que ele se parece hoje mais com o Partido Democrata norte-americano, que ainda está ligado a uma central como a AFL-CIO, do que com os social-democratas europeus, que antes eram estruturados a partir dos sindicatos?
OLIVEIRA
- Não, não é mais o modelo europeu. É mais próximo realmente do modelo norte-americano, com algumas particularidades que a legislação brasileira conferiu, devido ao fato de que a influência do Estado na formação da economia levou à formação desses fundos estatais, que eram mecanismos de acumulação, e que estão na maior parte dos casos sob o controle de sindicalistas. É uma transformação da classe.

FOLHA - É aquilo que o sr. tinha descrito no "Ornitorrinco". O sr. acha que o partido hoje é controlado por uma nova classe social?
OLIVEIRA
- Eu acho. É uma expressão forte, porque os sociólogos têm muito medo de falar em classe social. Mas é uma nova fração de classe que tem um papel muito importante hoje.

FOLHA - O sr. fala de uma aproximação entre PT e PSDB. Mas o que opõe os dois partidos nas eleições? Qual é a fratura que divide os dois?
OLIVEIRA
- A fratura é parecida com a que existe nos Estados Unidos: embora democratas possam ser tão ricos quanto republicanos, essa fratura permanece nos EUA devido a origens históricas diferentes. Isso tem peso. Quem fez a paz no Vietnã foi um conservador. Os democratas não ousavam dar nenhum passo no Vietnã porque apareceriam como traidores. Origens históricas diferentes continuam a pesar, e o fato de que, a partir dessas origens diferentes, eles se inscreveram junto ao eleitorado como alternativas. Mas a aproximação entre eles é tão grande que em Minas tentou-se essa façanha, de eleger um tertius que representasse os dois partidos, PT e PSDB. Essa é a tendência. Mas não ocorrerá de forma absoluta devido a essas raízes históricas diferentes. Mas as diferenças reais são muito pequenas.

FOLHA - Mas, se há uma identidade absoluta, não haveria nenhum fundamento para uma escolha do eleitor. Existiria alguma coisa substantiva além das raízes históricas?
OLIVEIRA
- Existe. Ainda há diferenças. Mas do ponto de vista das políticas decisivas elas são quase irreais -as diferenças reais quanto ao rumo da política nacional são quase irrelevantes. Mas eles jamais vão se unir, porque em política a soma não é maior do que as partes, como o caso de Minas revelou: juntaram duas forças que aparentemente iam aplastar qualquer outra. E não resultou.

Entrevista do sociólogo Francisco de Oliveira à Folha de São Paulo, de 19 de outubro de 2008.


Marcadores: , ,

No longo prazo, Lord Keynes ressuscitou

No longo prazo, Lord Keynes ressuscitou


TERMINOU nas últimas semanas o predomínio intelectual de uma corrente do pensamento econômico que governou o mundo por cerca de 30 anos. Pode-se dizer que ela cabe no rótulo de "liberal", sem que se saiba o que isso quer dizer. Simplificando, ela encarnou a crença de que as forças internas do mercado são o elemento mais eficaz para conduzir os destinos das economias nacionais. Com o leme das nações entregue à "mão invisível", os males seriam corrigidos, e a prosperidade, assegurada. Lorota.
O naufrágio ocorreu de forma humilhante, no governo de um presidente republicano nos Estados Unidos. George Bush tem na Secretaria do Tesouro um fino espécime da banca, o ex-presidente da Goldman Sachs, Henry Paulson. Para salvar a economia mundial dos delírios do mercado, até agora foram necessários uns US$ 3 trilhões coletados nas Bolsas das Viúvas.
Trinta anos de hegemonia produziram arrogância e até maus modos. No Brasil, "desenvolvimento" tornou-se uma palavra maldita e "desenvolvimentista", uma modalidade de insulto. Além das leviandades do governo Collor, da privataria tucana e do colapso cambial de 1999, a onipotência chegou à soberba. Dois diretores do Banco Central (Afonso Beviláqua e Rodrigo da Rocha Azevedo) não se dignaram a colocar suas biografias no portal da instituição pública em que trabalhavam. Conduta semelhante, só nos BCs de Coréia do Norte, Lesoto e Armênia. Noutro exemplo do cotidiano, em 2003 a editora brasileira do economista Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de 2001, teve dificuldade para formar uma mesa de jantar em sua homenagem com 12 convidados de renome. Stiglitz era um crítico daquilo que o professor Delfim Netto chamava de "pensamento único" no debate econômico brasileiro. (Das cabeças coroadas, só Gustavo Franco aceitou o convite.) Em 2000, um concurso do Banco Central valorizava candidatos com formação semelhante à da ekipekonômica tucana.
Viajando-se no tempo e no mundo, percebe-se que a cada 30 anos uma escola de pensamento prevalece e massacra a outra. Na segunda metade do século passado a agenda passou às mãos dos chamados keynesianos. Eram economistas que acompanhavam as idéias do inglês John Maynard Keynes, formulador da conveniência da intervenção do governo na economia. Do outro lado do debate estavam professores como o austríaco Friedrich Hayek e o americano Milton Friedman. Hayek sustentava que o planejamento econômico e a ação dos governos eram o "Caminho da Servidão", título de sua obra-prima, publicada em 1944. Comeu o pão que Asmodeu amassou. Em 1950, o departamento de economia da Universidade de Chicago negou-lhe uma posição de professor. Morava num bairro operário de Salzburgo numa casa comprada com o dinheiro da venda de sua biblioteca. Hayek ganhou o Prêmio Nobel em 1974. Dois anos depois foi a vez de Friedman.
Passados 30 anos de predomínio, os keynesianos saíram de cena. A vitória dos conservadores de Margaret Thatcher na Inglaterra, em 1979, e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, um ano depois, significou um renascimento das idéias de Hayek e Friedman. Em 1980, o professor Robert Lucas (Nobel de 1995) dizia que já não existiam mais bons economistas com menos de 40 anos identificados com o keynesianismo. O neologismo virou palavrão. John Kenneth Galbraith, uma de suas maiores estrelas, tornou-se saco de pancadas para os polemistas conservadores. Seu último livro chamou-se "A Economia das Fraudes Inocentes" e foi um ataque às extravagâncias do papelório.
Numa trapaça da história, foi um governo conservador, educado nas liberdades de Hayek e Friedman, quem conduziu a economia americana à bancarrota. Primeiro liberando as práticas da banca em nome da santidade do mercado. Depois, recorreu à mais elementar das construções keynesianas para evitar o desastre e foi buscar na Bolsa da Viúva o remédio para a intoxicação. Hayek e Friedman dificilmente defenderiam as políticas de seus seguidores. Quem botou fogo no mundo não foram eles, mas a mediocridade prepotente, colocada a serviço de um dinheirinho fácil.

Texto de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo, de 19 de outubro 2008.

Marcadores: , ,

"Capitalismo encurralado"

"Capitalismo encurralado"

"CAPITALISMO encurralado" é o título da capa e do texto de abertura da "Economist" desta semana. Trata-se de um elogio à mais que centenária atitude liberal da revista britânica e ao "capitalismo". E de um panfleto que convoca companheiros de viagem para o bom combate de defender o "capitalismo" nestes tempos de "estatismo". E nós com isso? A "Economist" costumava ser a síntese jornalística mais inteligente e irônica da opinião da elite "liberal anglo-saxã", digamos. Nesta semana, a opinião da revista é uma síntese da vulgaridade intelectual que tem sido a reação do "establishment" à fúria popularesca contra financistas e, ainda, ao que passa por crítica no esquerdismo retrógrado.
Os conservadores se limitam a justificativas grosseiras para o desastre que provocaram e a um "cala-boca". Estão como a dizer: o Estado fará só uma manutenção do "capitalismo", que assim é, sempre o será e beneficia até crioulos, se dêem por felizes, não encham a paciência e levem as gorjetas. Calem a boca e nem lembrem que o economicismo faz água por muitos furos (furos tais como a eficiência dos mercados e a racionalidade dos agentes, que luminares da economia agora dizem ter falhado por "falta de moralidade").
Os conservadores do museu da esquerda, por sua vez, acreditam que se abriu uma janela de oportunidade para reocuparem o Estado, uma chance de restauração estatista e de barragem contra inovações econômicas, não de uma possibilidade de mudanças sociais democráticas.
Por que "capitalismo" entre aspas? "Capitalismo" é conceito grande demais até para livros, que dirá para revistas e modestos artigos de jornal. Mas a revista diz que, na última década, o "capitalismo" deve (sic) ter elevado a renda per capita da humanidade como "nunca antes", o que nem é verdade nem faz muito sentido. A "Economist" comete ainda a imprudência de citar a contribuição da China para tal progresso -a China, que bancou boa parte do descalabro econômico americano e é aquele modelo de liberdade política e econômica.
Enfim, de qual "capitalismo" se trata? Existem, na verdade, mercados mais ou menos livres pelo mundo: EUA, França, Suécia, Coréia, China, Brasil. No que diferem e se parecem tais Estados, sociedades e mercados? A pergunta é crucial, pois revela a possibilidade de alternativas, presentes e futuras, que o "cala-boca" conservador quer reprimir.
A crítica grosseira ao "estatismo", que "tolhe a liberdade", quer é calar a crítica da dominação e da distribuição desigual de poder (e liberdades) em sistemas em que é grande a desigualdade econômica. Centrar o debate na "necessidade de regulação" parece mais uma disputa grupal sobre quem vai mandar, burocratas ou financistas, danem-se as liberdades. Tal atitude tanto menospreza o problema de quão difícil é regular como apaga o conflito sobre distribuição de poder e oportunidades, em sistemas regulados ou não. Enfim, a "Economist" sintetizou a propaganda do status quo: a ideologia do "fim da história" e sua tentativa de reprimir sugestões alternativas de como tornar os indivíduos mais livres diante do poder econômico e do poder do Estado, os quais, aliás, costumam ser a mesma coisa.

Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo de 17 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , ,

"Camarada"

"CAMARADA"
Pelas agências, o presidente venezuelano Hugo Chávez ironizou ontem que o "camarada" George W. Bush "agora está à minha esquerda". Às voltas com a negociação de uma "nacionalização" de banco também na Venezuela, sublinhou como o colega americano "vai comprar ações de bancos privados".

Trecho da coluna Toda Mídia, de Nelson de Sá, na Folha de São Paulo, de 17 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , , , ,

Protesto de índios contra Uribe deixa três mortos na Colômbia

Protesto de índios contra Uribe deixa 3 mortos na Colômbia

Presidente acusa movimento, que cobra terras, de ligação com as Farc e de fazer campanha contra o TLC com os EUA

ONG Human Rights Watch acusa Bogotá de atrapalhar as investigações sobre paramilitares; governo diz que informe é tendencioso


DA REDAÇÃO

A Onic (Organização Nacional de Indígenas da Colômbia) prometeu ontem seguir com ações de protestos em vários pontos da Colômbia até que lideranças da entidade sejam recebidas pelo presidente Álvaro Uribe. Confrontos entre manifestantes e forças de segurança já deixaram três mortos em oito dias de mobilização. Um policial perdeu as mãos pela explosão de uma bomba caseira.
Não há dados completos sobre as vítimas indígenas, todas reportadas pela Onic. Duas das mortes aconteceram no departamento de Cauca (sudoeste), onde os indígenas bloqueavam vários pontos da estrada Panamericana, que liga a Colômbia ao Equador. Policiais liberaram a via anteontem.
A terceira vítima é uma criança que morreu asfixiada por gás lacrimogêneo em um confronto nas cercanias da cidade de Pueblo Rico, no departamento de Risaralda (centro-oeste). Os feridos dos dois lados são quase 200.
Os indígenas colombianos protestam em 16 dos 32 departamentos, em especial no oeste, em repúdio a assassinatos de lideranças -foram 66 só neste ano- e para cobrar compromissos de compras de terras.
Anteontem, o presidente disse ter cumprido mais de dois terços das entregas de terras e atribuiu a mobilização a uma tentativa de barrar o TLC (Tratado de Livre Comércio) com os EUA, parado no Congresso americano. Acusou o movimento de embutir "terroristas", referência às Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), causar violência e depois "denunciar diante da comunidade internacional".
Segundo a revista colombiana "Semana", diplomatas de Espanha, EUA, Canadá e Suécia se reuniram com representantes da ONU na terça-feira para avaliar se Bogotá abusava da força contra os protestos.
São 102 os povos indígenas na Colômbia, 18 sob ameaça de extinção. Os indígenas são 2% da população, e 12% dos deslocados internos, diz a ONU.

Human Rights Watch
Ontem, a ONG Human Rights Watch lançou relatório de 148 páginas no qual acusa o governo Uribe de prejudicar as investigações da máfia paramilitar e seus cúmplices, lançando mão, em especial, de reiterados ataques à Suprema Corte de Justiça e se opondo a reformas do Legislativo para expurgar os políticos ligados aos "paras".
A entidade criticou a extradição de chefes "paras" aos EUA e pediu à Corte Penal Internacional que monitore as investigações. O documento foi assinado pelo chileno José Miguel Vivanco, o mesmo que foi expulso da Venezuela em setembro após lançar relatório crítico ao governo Hugo Chávez. Bogotá disse que o informe é "tendencioso" e contém inverdades.

Com agências internacionais

Texto da Folha de São Paulo, de 17 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , ,

Herói da Democratização

O herói da redemocratização

CEZAR BRITTO

OS 30 ANOS DA revogação do AI-5, celebrados neste 17 de outubro, trazem à lembrança a figura exponencial de Raymundo Faoro e o papel exercido pela OAB, que ele então presidia, no processo de redemocratização do Brasil.
Nosso país costuma ser negligente na evocação de seus heróis, a ponto de supor que não os tenha. Trata-se de desvio cultural que gera baixa auto-estima e dificulta a superação de complexos de inferioridade e a afirmação e a crença nos valores da nacionalidade.
Em 1977, vivia o Brasil momento delicado. A ditadura militar, diante da derrota eleitoral acachapante em 1974 para o MDB -que elegeu 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado e ampliou suas bancadas na Câmara dos Deputados e Assembléias Legislativas-, fechou o Congresso e editou um pacote de medidas que, entre outras anomalias, criou a figura bizarra do senador biônico.
O objetivo era manter maioria no colégio eleitoral e garantir a eleição do sucessor do general-presidente Ernesto Geisel. O expediente funcionou. No final de 1978, seria "eleito" o general João Batista Figueiredo. O desgaste político, porém, foi enorme.
O fim do milagre econômico, decorrente do quadro econômico internacional, com a primeira crise do petróleo, teve o efeito de mobilizar a sociedade civil contra o autoritarismo. A ânsia pela redemocratização já se fazia notar, com seguidas manifestações em prol de eleições diretas para governadores e presidente da República, anistia e convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte.
O general Geisel e seu principal assessor, o general Golbery do Couto e Silva, sofriam dupla pressão: de um lado, a linha dura do regime queria manter inalterado o status quo do regime; de outro, a sociedade civil mostrava-se cada vez mais eloqüente em seus pleitos. A tensão crescia e, se nada se fizesse, o confronto seria inevitável.
Eis que o general Geisel decide lançar um movimento que, a princípio, batizou de distensão política e que depois se chamaria abertura, que, segundo ele, teria que ser lenta e gradual para ser segura. E, como o alvo era a sociedade civil, chamou a OAB para exercer a indispensável interlocução.
Faoro a presidia. E a instituição refletia o inconformismo da sociedade com o quadro político vigente, marcado pela presença do Ato Institucional número 5 -um instrumento totalitário, que permitia ao governante, em nome da segurança nacional, fazer o que quisesse: prender sem mandado judicial, expropriar, negar habeas corpus etc. Em nome da segurança nacional, o AI-5 permitiria até a revogação da Lei Áurea, se assim o entendessem os governantes.
O interlocutor do regime era o então presidente do Senado, Petrônio Portella, um político hábil, que era também advogado e que sabia da representatividade da OAB.
Faoro, abordado, pediu tempo para pensar. Portella lhe disse que não se tratava de mera proposta, mas da única saída pacífica viável para o país.
Faoro encontrou em sua retaguarda descrença e até revolta. Mas endossou o diagnóstico de seu interlocutor e partiu para o cumprimento de sua missão, que não era simples: auscultar a sociedade civil e dela recolher os pleitos fundamentais e encaminhá-los ao presidente da República.
E assim o fez. Quando o general Geisel perguntou-lhe o que queria de seu governo, foi claro e objetivo: "Quero muito pouco, senhor presidente: apenas a restauração do habeas corpus, a extinção dos atos institucionais e o fim das torturas no DOI-Codi, quanto mais não seja para que V. Excia não entre na história como um ditador sanguinário, mas, sim, como o presidente da abertura, "lenta, gradual e segura'".
De cara, conseguiu o restabelecimento do habeas corpus, o que equivalia a pôr fim às torturas. Pleiteou também eleições diretas em todos os níveis, e obteve inicialmente o compromisso de adotá-las para as eleições de governador em 1982, o que de fato ocorreria.
O desfecho fundamental, que criaria as condições para a redemocratização e tudo o que veio com elas -anistia, liberdade de organização partidária, fim da censura e, depois, eleições diretas para presidente-, deu-se no dia 17 de outubro de 1978, com a revogação do AI-5. E é esta data e este personagem, que faleceu em 2003, aos 78 anos, que ora evocamos, num dos capítulos mais densos e significativos da nossa história contemporânea.
O Brasil não pode esquecer o dia de hoje nem o nome de seu principal protagonista, Raymundo Faoro, um dos heróis da redemocratização -e figura máxima entre os que presidiram a OAB.


CEZAR BRITTO, 46, é presidente nacional da OAB (Ordem Dos Advogados do Brasil).

Texto da Folha de São Paulo, de 17 de outubro de 2008.


Marcadores: ,

Lula na Índia, segundo o José Simão

Lula na Índia, segundo o José Simão

E o Lula na Índia? Diz que ele abraçou o hinduísmo. Tá sempre indo pra algum lugar. Adepto do INDOÍSMO! Rarará! E o que Lula foi fazer na Índia? Churrasco de vaca sagrada. Avisa pro Lula que vaca na Índia é sagrada! Aliás, diz que ele chegou com um protesto de vacas: "Abaixo a carnificina na Granja do Torto". "Coma frango" e "COMA LULA!". Rarará!
Então, nada de churrasco. Churrasco na Índia é espetinho de gato! E diz que Viagra indiano é encantador de serpente. Levanta até corda! E se contar os dias que o Lula passa no Brasil, o mandato dele seria menor do que o do Jânio Quadros! A semelhança entre Brasil e Índia é que os miseráveis são todos iguais, a diferença tá no turbante. E sabe por que o Lula gosta de viajar pra país pobre? Porque quando ele chega aqui no Brasil acha que tá tudo maravilhoso!

O texto acima é parte da coluna de José Simão, na Folha de São Paulo, de 16 de outubro de 2008.

Marcadores: , , ,

Crise expõe perigo de fortalecimento da direita, diz Hobsbawm

O britânico Eric Hobsbawm, considerado um dos historiadores mais influentes do século 20, disse à BBC nesta terça-feira que o maior perigo da atual crise financeira mundial é o fortalecimento da direita.

“A esquerda está virtualmente ausente. Assim, me parece que o principal beneficiário deste descontentamento atual, com uma possível exceção – pelo menos eu espero – nos Estados Unidos, será a direita”, disse Hobsbawn, em entrevista à Rádio 4.

O historiador marxista comparou o atual momento “ao dramático colapso da União Soviética” e ao fim de “uma era específica”.

“Agora sabemos que estamos no fim de uma era e não se sabe o que virá pela frente.”

Hobsbawn diz não acreditar que a linguagem marxista, que lhe serviu de norte ao longo de toda sua carreira, será proeminente politicamente, mas intelectualmente, “a análise marxista sobre a forma com a qual o capitalismo opera será verdadeiramente importante”.

Abaixo, os principais trechos da entrevista.

Muitos consideram o que está acontecendo como uma volta ao estadismo e até do socialismo. O senhor concorda?

Bem, certamente estamos vivendo a crise mais grave do capitalismo desde a década de 30. Lembro-me de um título recente do Financial Times que dizia: O capitalismo em convulsão. Há muito tempo não lia um título como esse no FT.

Agora, acredito que esta crise está sendo mais dramática por causa dos mais de 30 anos de uma certa ideologia “teológica” do livre mercado, que todos os governos do Ocidente seguiram.

Porque como Marx, Engels e Schumpter previram, a globalização - que está implícita no capitalismo -, não apenas destrói uma herança de tradição como também é incrivelmente instável: opera por meio de uma série de crises.

E o que está acontecendo agora está sendo reconhecido como o fim de uma era específica. Sem dúvida, a partir de agora falaremos mais de (John Maynard) Keynes e menos de (Milton) Friedman e (Friedrich) Hayek.

Todos concordam que, de uma forma ou de outra, o Estado terá um papel maior na economia daqui por diante.

Qualquer que seja o papel que os governos venham a assumir, será um empreendimento público de ação e iniciativa, que será algo que orientará, organizará e dirigirá também a economia privada. Será muito mais uma economia mista do que tem sido até agora.

E em relação ao Estado como redistribuidor? O que tem sido feito até agora parece mais pragmático do que ideológico...

Acho que continuará sendo pragmático. O que tem acontecido nos últimos 30 anos é que o capitalismo global vem operando de uma forma incrivelmente instável, exceto, por várias razões, nos países ocidentais desenvolvidos.

No Brasil, nos anos 80, no México, nos 90, no sudeste asiático e Rússia nos anos 90, e na Argentina em 2000: todos sabiam que estas coisas poderia levar a catástrofes a curto prazo. E para nós isto implicava quedas tremendas do FTSE (índice da bolsa de Londres), mas seis meses depois, recomeçávamos de novo.

Agora, temos os mesmos incentivos que tínhamos nos anos 30: se não fizermos nada, o perigo político e social será profundo e ainda mais depois de tudo, da forma com a qual o capitalismo se reformou durante e depois da guerra sob o princípio de “nunca mais” aos riscos dos anos 30.

O senhor viu esses riscos se tornarem realidade: estava na Alemanha quando Adolf Hitler chegou ao poder. O senhor acredita que algo parecido poderia acontecer como conseqüência dos problemas atuais?

Nos anos 30, o claro efeito político da Grande Depressão a curto prazo foi o fortalecimento da direita. A esquerda não foi forte até a chegada da guerra. Então, eu acredito que este é o principal perigo.

Depois da guerra, a esquerda esteve presente em várias partes da Europa, inclusive na Inglaterra, com o Partido Trabalhista, mas hoje isso já não acontece.

A esquerda está virtualmente ausente, Assim, me parece que o principal beneficiário deste descontentamento atual, com uma possível exceção – pelo menos eu espero – nos Estados Unidos, será a direita.

O que vemos agora não é o equivalente à queda da União Soviética para a direita? Os desafios intelectuais que isto implica para o capitalismo e o livre mercado são tão profundos como os desafios enfrentados pela direita em 1989?

Sim, concordo. Acredito que esta crise é equivalente ao dramático colapso da União Soviética. Agora sabemos que acabou uma era. Não sabemos o que virá pela frente.

Temos um problema intelectual: estávamos acostumados a pensar até então que havia apenas duas alternativas: ou o livre mercado ou o socialismo. Mas, na realidade, há muito poucos exemplos de um caso completo de laboratório de cada uma dessas ideologias.

Então eu acho que teremos de deixar de pensar em uma ou em outra e devemos pensar na natureza da mescla. E principalmente até que ponto esta mistura será motivada pela consciência do modelo socialista e das conseqüências sociais do que está acontecendo.

O senhor acredita que regressaremos à linguagem do marxismo?

Desde a crise dos anos 90, são os homens de negócio que começaram a falar assim: “Bem, Marx predisse esta globalização e podemos pensar que este capitalismo está fundamentado em uma série de crises”.

Não acredito que a linguagem marxista será proeminente politicamente, mas intelectualmente a natureza da análise marxista sobre a forma com a qual o capitalismo opera será verdadeiramente importante.

O senhor sente um pouco recuperado depois de anos em que a opinião intelectual ia de encontro ao que o senhor pensava?

Bem, obviamente há um pouco a sensação de schadenfreude (regozijo pela desgraça alheia).

Sempre dissemos que o capitalismo iria se chocar com suas próprias dificuldades, mas não me sinto recuperado.

O que é certo é que as pessoas descobrirão que de fato o que estava sendo feito não produziu os resultados esperados.

Durante 30 anos os ideólogos disseram que tudo ia dar certo: o livre mercado é lógico e produz crescimento máximo. Sim, diziam que produzia um pouco de desigualdade aqui e ali, mas também não importava muito porque os pobres estavam um pouco mais prósperos.

Agora sabemos que o que aconteceu é que se criaram condições de instabilidades enormes, que criaram condições nas quais a desigualdade afeta não apenas os mais pobres, como também cada vez mais uma grande parte de classe média.

Sobretudo, nos últimos 30 anos, os benefíciários deste grande crescimento têm sido nós, no Ocidente, que vivemos uma vida imensuravelmente superior a qualquer outro lugar do mundo.

E me surpreende muito que o Financial Times diga que o que se espera que aconteça agora é que este novo tipo de globalização controlada beneficie a quem realmente precisa, que se reduza a enorme diferença entre nós, que vivemos como príncipes, e a enorme maioria dos pobres.

Texto da BBC Brasil.

Marcadores: , , , , , , ,

Argentina planeja estatizar fundos de pensão privados

A presidente argentina, Cristina Kirchner, enviará nesta terça-feira ao Congresso um projeto de lei para nacionalizar todos os fundos de pensão privados diante das perdas que o setor vem sofrendo com a crise financeira global.

As chamadas Administradoras de Fundos de Aposentadorias e Pensões (AFJP, na sigla em espanhol) investiram grande parte do dinheiro dos pensionistas principalmente em ações, bônus do Estado e depósitos bancários como forma de multiplicar seu capital.

Mas com o colapso das bolsas e do mercado de crédito em todo o mundo, as contribuições de milhões de argentinos se desvalorizaram ainda mais após registrarem perdas nos últimos 12 meses.

Segundo o governo, desde o ano passado, as AFJP acumularam perdas de 20% e, no futuro, poderão enfrentar dificuldades para arcar com os pagamentos mínimos dos pensionistas.

“A atual crise põe em evidência que o sistema privado é conceitualmente inadequado”, disse um comunicado da Administração Nacional de Previdência Social (Anses, na sigla em espanhol).

“A desvalorização dos ativos financeiros deixa claro que o Estado terá de resgatar de uma forma ou de outra os futuros pensionistas”.

Fontes oficiais estão comparando a medida ao plano de resgate lançado pelos Estados Unidos para socorrer o sistema financeiro.

Se o projeto de lei passar, todos os trabalhadores passarão ao sistema de previdência público, mas quem desejar poderá continuar contribuindo com as AFJP para ter uma pensão complementar ao do Estado, em um esquema similar ao do Brasil, Espanha e Grã-Bretanha.

Fim de uma era

As AFJP foram criadas na Argentina em 1994 à semelhança das chilenas (Administradoras de Fundos de Pensão) e convivem atualmente com o sistema de previdência estatal.

O esquema privado soma 9,5 milhões de afiliados, enquanto o público reúne apenas 445 mil.

Segundo dados oficiais, os atuais 10 fundos de pensão privados em funcionamento arrecadam mais de US$ 300 milhões por mês e administram cerca de US$ 30 bilhões distribuídos em diferentes investimentos.

Diante da desvalorização dos fundos de pensão pela crise financeira global, cerca de 500 mil pensionistas argentinos já estão recebendo menos dinheiro do que o esperado.

Os fundos privados disseram ainda não ter uma posição definida sobre as ambições do governo.

A União das AFJP, que reúne todos os fundos de pensão privados do país, afirmou que o desabamento atual de seus rendimentos é um fenômeno “conjuntural”.

E acrescentou que as perdas atuais causaram apenas “um tropeço” em meio a um longo período de crescimento das pensões privadas, que, desde 1994, acumularam rentabilidade de mais de 7% (considerando a inflação).

Nacionalização

Especialistas e críticos da presidente Kirchner expressam suas dúvidas sobre os planos do governo.

Para Martín Krause e outros economistas independentes, a grande pergunta gira em torno do que acontecerá no futuro com as contribuições administradas pelas AFJP, levando em conta que, no passado, a gestão estatal das pensões “esteve longe de ser ótima”.

A oposição acredita que, com a medida, o governo quer dar um novo passo em sua política de nacionalizações.

O fim das AFJP, tal como foram concebidas, se somaria a uma série de reestatizações que vêm sendo efetuadas nos últimos anos pelos governos Kirchner com a intenção de aumentar o papel do Estado na economia.

Muitas empresas argentinas passaram para o controle privado durante a gestão de Carlos Menem (1989-1999). Desta época, data a criação dos fundos privados de pensão.

Entre as companhias que foram recuperadas pelo Estado estão os Correios, em 2005, e Águas Argentinas, em 2006. Recentemente, Cristina Kirchner decidiu voltar a nacionalizar a companhia aérea Aerolíneas Argentinas, também privatizada nos anos 90.

Texto da BBC Brasil.


Marcadores: , ,

terça-feira, outubro 21, 2008

Um país bilíngüe

Um Brasil bilíngüe

Javier Rodríguez Marcos
Em Toledo


"Um político de verdade é o que sabe governar a pólis, a cidade. E o presidente Lula o é. É um homem de Estado extraordinário que tem a energia e o conhecimento para dar a seu país o lugar que o Brasil merece na América Latina e no mundo." Assim falou na segunda-feira o escritor mexicano Carlos Fuentes sobre Luiz Inácio Lula da Silva, com quem compartilha o Prêmio Internacional Dom Quixote. É verdade que, ao ouvi-lo falar, parece que sobram idéias e energia a esse ex-sindicalista nascido em Garanhuns, estado de Pernambuco, há quase 63 anos. Em meio à onda de admiração, ele lembra que perdeu várias vezes as eleições antes de se instalar no Palácio do Planalto em Brasília pela primeira vez, e por maioria avassaladora, em 2002. Quatro anos depois repetiu no que havia sido o primeiro título "universitário" de sua vida, o de presidente.

Lula costuma recordar que de seus anos de experiência sindical ficou uma idéia: ninguém respeita um interlocutor que não respeite a si mesmo. Por isso, para ganhar em prosperidade e em respeito internacional, decidiu estreitar laços com seus vizinhos da América Latina. E assim decidiu promover em seu país a Lei do Espanhol, que obriga todos os centros de ensino secundário do Brasil a oferecer como opcional a língua castelhana. O resultado é que se prevê que o milhão de alunos que atualmente cursam espanhol se transformem em 12 milhões nos próximos quatro anos. Além disso, serão necessários 30 mil professores. Tudo sem contar com os nove centros que o Instituto Cervantes tem espalhados pela geografia de um país de 180 milhões de habitantes e dimensões continentais.

O Brasil bilíngüe, pois, tem hora para decolar, coisa que Lula, longe de ver como uma ameaça, considera uma oportunidade. "Integração" é a palavra que o presidente brasileiro mais repete ao explicar seus planos. "E não pode haver integração sem falar a mesma língua." Ele foi o primeiro a construir uma ponte entre seu país e o Peru. O mesmo fez com a Bolívia. Também gosta de lembrar que o Brasil tem milhares de quilômetros de fronteira com todos os países da América do Sul, menos Equador e Chile. Não tinha sentido viver com os olhos voltados para os EUA, país que, além do mais, acaba de superar a Espanha em número de falantes de espanhol.

Lula só fala português, mas ele entende tudo o que diz. Tem as idéias claras e um velho objetivo: promover a educação e reduzir a pobreza de seus compatriotas. Em vez de se colocar, como tantas vezes, nas mãos da providência, ele se pôs a trabalhar: o Brasil recebe US$ 90 de cada US$ 100 de investimento estrangeiro que chegam à América do Sul. Por acaso, ele costuma dizer que Deus é brasileiro. Isto é, dentro de alguns anos, Deus falará espanhol.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Texto do El País, no UOL.


Marcadores: , ,

Vigilância

VIGILÂNCIA
O governo da Coréia do Sul planeja medidas para vigiar debates virtuais e acabar com o anonimato na rede. Em novembro, entrará em vigor uma lei controlando comentários. Nas escolas infantis haverá aulas de ética e etiqueta na rede.

Notinha tirada do Caderno de Informática da Folha de São Paulo.


Marcadores: , ,

Pânico inútil

Pânico inútil

É CADA VEZ mais evidente que Paulson e Bernanke cometeram um erro catastrófico na sua avaliação das conseqüências da quebra do Lehman Brothers.
Supondo que a violação do princípio do "grande demais para falir" interromperia a cadeia de desconfiança que se instalara nos mercados, eles puseram em marcha um processo que está longe de poderem controlar. Sua propagação está cobrando um preço gigantesco, que será pago pela economia real de todos os países do mundo. Graças aos abusos, à fértil imaginação que dispensa a moralidade e aos equívocos da política monetária (que durante longos anos não teve a humildade de conformar-se com a teoria), o sistema financeiro, que deveria servir à economia real (a do PIB e do emprego), ameaça destruí-la.
Os agentes financeiros estavam desconfiados com a crise do "subprime". E os cidadãos estavam assustados com a queda dos preços dos imóveis (que representam 1/3 de sua "riqueza"). Nesse quadro de profunda ansiedade, a quebra do Lehman promovida pela autoridade foi o epicentro de um terremoto financeiro mundial, que, na escala logarítmica Richter, foi superior a 9, ou seja, altamente destrutivo.
A história vai julgar duramente a competência de Bernanke, um excelente economista e historiador da crise de 1929, e a argúcia de Paulson, um profissional treinado que presidiu durante anos a Goldman Sachs. Vai ser muito difícil entender como a "boa" teoria somada à "boa" prática terminou em tal desastre.
Por outro lado, é fácil entender o comportamento aleatório (não irracional, como dizem alguns economistas) dos aplicadores. Ele lembra os estouros das boiadas quando assustadas por um estalo.
O mesmo acontece com os violentos terremotos: não sabendo onde encontrar abrigo, corre-se em qualquer direção. Trata-se pura e simplesmente de um estado de pânico. Todos querem sair e descobrem que a ampla porta de entrada (a ilusão vendida pela "ciência" dos bancos de investimento, que haviam descoberto como medir o risco e oferecer retorno garantido) é agora uma minúscula abertura de saída, onde vão amargar o custo de terem acreditado no milagre do máximo lucro com o mínimo de risco.
Não existe abrigo seguro. Todos vão pagar um preço pela irresponsabilidade de poucos, e uns poucos, de sangue frio e financeiramente líquidos, vão ficar ainda mais ricos.
Se você não tem nem sangue-frio nem liqüidez, fique quieto e espere.
Um dia a confiança voltará, como voltou depois das dezenas de crises do passado. Não fuja de casa para morrer na rua...

Texto de Delfim Netto, na Folha de São Paulo, de 15 de outubro de 2008.


Marcadores: , , , , ,

Lamentações

"Nós lamentamos"

NOVA YORK - O momento mais simbólico e patético da atual crise até agora foi a aparição pública ontem, logo cedo, do presidente dos EUA, George W. Bush, e de seu secretário do Tesouro (ministro da Fazenda), Henry Paulson.
Constrangidos, envergonhados e em posição explícita de genuflexão ideológica, os dois admitiram a necessidade de usar dinheiro público para comprar ações de bancos privados. O governo norte-americano torrará US$ 250 bilhões, só para começar, na compra de participação acionária em grandes instituições financeiras do país.
Mas as falas de Bush e Paulson foram além da capitulação. Ambos fizeram questão de reafirmar a crença no capitalismo. Por mais paradoxal que possa soar, essas declarações de fidelidade ao modelo liberal têm grande relevância: impedem a conclusão epidérmica, já presente aqui e ali, sobre uma possível falência inexorável ou reforma completa do sistema monetário e financeiro internacional. Não há indicações de uma coisa nem de outra num horizonte próximo.
Duas frases são úteis para guardar na parede da memória. Bush afirmou não haver a "intenção de tomar o lugar do livre mercado, mas de preservar o livre mercado". Paulson veio depois, compungido e explícito sobre seus atos: "Nós lamentamos por tomar essas medidas. As medidas de hoje não são as que nós gostaríamos de tomar, mas as medidas de hoje são as que nós devemos adotar para restaurar a confiança no nosso sistema financeiro".
Em resumo, os governos dão agora, mas cobrarão de volta mais tarde. Os banqueiros ficarão mais ricos? Possivelmente. Haverá regras novas? Algumas, sempre preservando a liberdade para o sistema bancário descobrir brechas e aumentar seus lucros. E daqui a alguns anos enfrentaremos todos outra crise parecida. Ou pior.

Texto de Fernando Rodrigues, na Folha de São Paulo, de 15 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , , ,

sexta-feira, outubro 17, 2008

Pernambuco: Assassinados terão os nomes lidos em missas

Assassinados terão os nomes lidos em missas

DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

A Igreja Católica vai divulgar nas missas dominicais em 20 municípios da região metropolitana de Recife e no interior de Pernambuco os nomes das pessoas assassinadas no Estado durante a semana.
A iniciativa faz parte de uma campanha do site contador de homicídios "PEbodycount", em parceria com a pastoral da saúde da Arquidiocese de Olinda e Recife. Batizado de "Não Matarás", o projeto tem como objetivo "conscientizar a população sobre as causas e conseqüências da violência", disse Eduardo Machado, um dos criadores do site.
Segundo o governo do Estado, de janeiro a agosto ocorreram 3.032 homicídios em Pernambuco. Na apuração do "PEbodycount", 3.429 pessoas foram mortas de 1º de janeiro até as 12h de ontem.
A campanha será lançada na sexta e encerrada em 16 de novembro. Para a Secretaria Estadual da Defesa Social, "toda contribuição é sempre bem-vinda, pois a segurança é dever do Estado e responsabilidade de todos".

Texto da Folha de São Paulo, de 14 de outubro de 2008.


Marcadores: , , ,

Câmara dos Lordes rejeita aumento do período de prisão preventiva no Reino Unido

Câmara dos Lordes derrota projeto contra o terrorismo

DA REDAÇÃO

A Câmara dos Lordes rejeitou ontem, por 309 votos a 118, o projeto do primeiro-ministro Gordon Brown que ampliava de 28 para 42 dias a prisão preventiva de suspeitos de terrorismo. O texto havia sido aprovado em junho pela Câmara dos Comuns pela estreita margem de nove votos.
Por meio da ministra do Interior, Jacqui Smith, o governo anunciou que redigirá um novo projeto, com maiores garantias aos suspeitos já presos.
O texto ontem rejeitado centralizava todos os poderes nas mãos da polícia. O novo texto, diz a Associated Press, obrigará que o prolongamento da prisão seja pedido por um promotor e aprovado por um juiz. Uma comissão parlamentar daria ao caso a palavra final.
A Câmara dos Lordes é no Reino Unido uma espécie de Senado, integrado apenas por cidadãos nobilitados e que têm mandatos vitalícios.
A derrota de Brown foi apressada pela oposição maciça dos nobres próximos ao Partido Trabalhista, ao qual pertence o premiê. Foi o caso sobretudo da baronesa Eliza Manninghanm-Buller, ex-chefe do MI5, serviço interno de inteligência.
Ela argumentou que o projeto era desnecessário e ameaçava as liberdades civis.
A ministra Jacqui Smith disse que a maior liberdade de um cidadão consiste em circular livremente por qualquer cidade britânica sem ser estraçalhado por um atentado. Também afirmou que as redes terroristas se tornaram complexas, o que impede o indiciamento de um suspeito num prazo mais curto.
Antes do 11 de Setembro, a prisão preventiva era no Reino Unido de 48 horas. O então premiê, Tony Blair, tentou ampliá-la para 90 dias, mas foi estrondosamente derrotado pela Câmara dos Comuns. O atual prazo de 28 dias foi aprovado após os atentados terroristas de 2005, que mataram em Londres 52 pessoas.
Atualmente, depois de 28 dias preso, o suspeito deve ser indiciado, se existirem provas contra ele. Caso contrário ele é posto em liberdade. O governo não divulgou durante o debate parlamentar casos concretos de complôs que tenham terminado com a libertação dos envolvidos por falta de provas para o indiciamento.
Estudo comparativo do grupo britânico de defesa das liberdades civis Liberty, feito em 15 países democráticos, mostra que o Reino Unido, com 28 dias, tem hoje o período mais longo de prisão preventiva.
"A Câmara dos Lordes demonstrou a razão pela qual o Reino Unido continua a ser a mais antiga democracia no mundo", declarou Shami Chakrabarti, diretor do Liberty.

Com agências internacionais

Texto da Folha de São Paulo, de 14 de outubro de 2008.


Marcadores: , , ,

quinta-feira, outubro 16, 2008

José Simão: Kassab vai casar com o Serra!

Ueba! Kassab vai casar com o Serra!

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente, Urgentíssimo!
Babado! Acaba de sair o novo apelido da Marta: Maisena, só engrossa. Marta Maisena. Rarará! E a campanha homofóbica dela na televisão insinuando que o Kassab é gay? "Ele é casado? Tem filhos? Tem mais coisa a esconder." Cospe no chão? Coça o saco? Come abelha?
A campanha da Marta tá sendo chamada de Campanha Moral de Jegue! JUSTO A MARTA! E sabe como ela tá sendo chamada entre a bibarada: Traidora do Movimento! Agora de castigo, ela vai ter que varrer a Paulista depois da Parada Gay!
E olha o que um leitor me escreveu: "É muito legal a Marta trazer a público se o Kassab é ou não é! Pelo menos ele não vai chutar o marido depois da eleição e casar com um argentino". Rarará. Tá vendo? Preconceito gera preconceito!
E como me disse aquela biba: "Ele é casado? Tem filhos? Me deixa o seu telefone?". Rarará! E pra acabar com isso o Blogdobonitão tem a melhor sugestão: o Kassab casa com o Serra.
E enSERRA o assunto! Rarará!

Parte da Coluna de José Simão, o Macaco Simão, na Folha de São Paulo, de 15 de outubro de 2008.


Marcadores: , , , , ,

terça-feira, outubro 14, 2008

Greve dos Bancários 2008: Engrossando o caldo

Segundo notícias do saite do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre, os funcionários do banco estadual, o Banrisul, decidiram em assembléia manter a greve por tempo indeterminado. A paralisação na Caixa Federal continua.

Assim, parece que só os funcionários do Banco do Brasil resistem à paralisação.

Até o momento a Federação dos Bancos não avançou além do 0,5% de produtividade, em sua proposta, mais a reposição da inflação do período, de 7,15% .


Marcadores: , , ,

Plano "socialista" britânico salvará o capitalismo?

Plano "socialista" britânico pode salvar o capitalismo

Imprensa britânica aplaude pacote do primeiro-ministro Gordon Brown

Jornais dizem que plano é "bem desenhado", "atinge o coração do problema" e que, diante da crise, "faz sentido recapitalizar os bancos"

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

Como nos velhos tempos em que os anticomunistas viscerais enxergavam comunistas até debaixo da cama, Simon Heffer, o ultraliberal colunista do jornal britânico "The Daily Telegraph", disparou ontem todos os sinais de alarme depois do pacote do primeiro-ministro Gordon Brown de socorro e semi-estatização dos bancos:
"Todos somos socialistas agora", começou, em artigo de página inteira. E fechou: "A intervenção, ou melhor, interferência, do Estado em assuntos financeiros e econômicos só pode levar à esclerose, à supressão da livre empresa, ao aumento dos impostos, à inanição em investimentos, à falta de inovação, ao atraso tecnológico e ao aumento do poder do trabalho organizado".
Antigas paranóias à parte, Heffer tem alguma razão quando diz que "todos somos socialistas agora". Dois professores norte-americanos -Laurence Kotlikoff, da Boston University, e Perry Mehrling, da Columbia, em artigo para o "Washington Post"- até ironizam: "Tio Sam se tornou nosso novo banco. Ele também se tornou nossa nova companhia de seguros com a compra, na prática, da maior seguradora do mundo, a AIG".
Pior, pelo menos para os que, como Heffer, vêem na ação dos governos na presente crise a ante-sala do comunismo e, por extensão, do fim do mundo: há um coro de aplausos, da direita à esquerda, em especial ao pacote de Brown, que, na manchete de ontem do "Guardian", "arrisca 500 bilhões de libras [R$ 1,866 trilhão) do dinheiro público no pacote de resgate dos bancos".
Até o "The Wall Street Journal", uma das mais potentes vozes pró-livre mercado, diz, em editorial: "A mexida de Londres vai ao coração do problema, que é a falta de capital no sistema financeiro -o combustível para o pânico global".
O "Guardian", mais à esquerda, segue o mesmo caminho: chama o plano Brown de "bem desenhado" e completa: "Enfrenta os três grandes problemas dos bancos -capital, liquidez e financiamento. Sob esse aspecto, é melhor que o plano Paulson [Hank Paulson, secretário do Tesouro americano]".
Concorda a colunista Gillian Tett, no "Financial Times", outro baluarte do livre mercado: "Quando uma crise bancária é séria a esse ponto, faz mais sentido recapitalizar os bancos comprando ações preferenciais do que seus ativos sem valor".
Em tese, comprar os ativos sem valor é o eixo do plano Paulson, mas Kotlikoff e Mehrling chamam a atenção para uma distração da mídia, que não teria notado que "a seção 113 da lei [Paulson] autoriza injeção de capital do governo no sistema bancário quando necessário -algo que o governo britânico está fazendo agora e o governo sueco fez com sucesso no passado recente".
Os hiperliberais norte-americanos ficariam horrorizados como ficou o britânico Heffer, mas Kotlikoff e Mehrling festejam: "Isso significa que [o governo] não deixará falir nenhum banco que seja viável só porque ele está temporariamente subcapitalizado". Eles reduzem a intervenção ao que de fato é: "Pode parecer socialismo ou capitalismo de Estado, mas é simplesmente o rearranjo do mobiliário financeiro".
Ou é algo bem mais prosaico, segundo Felipe González, ex-presidente do governo espanhol. Na sua opinião, a economia chegou a funcionar como um "cassino global", mas com uma fundamental diferença: "Nos cassinos, o que arrisca e perde não reclama que papai-Estado lhe devolva o dinheiro".
Só falta agora que o dinheiro de papai-Estado ponha fim ao pânico, o que ainda não estava demonstrado até o começo da noite de ontem (na Europa).

Texto da Folha de São Paulo, de 10 de outubro de 2008.

Marcadores: , , , ,