terça-feira, outubro 21, 2008

Pânico inútil

Pânico inútil

É CADA VEZ mais evidente que Paulson e Bernanke cometeram um erro catastrófico na sua avaliação das conseqüências da quebra do Lehman Brothers.
Supondo que a violação do princípio do "grande demais para falir" interromperia a cadeia de desconfiança que se instalara nos mercados, eles puseram em marcha um processo que está longe de poderem controlar. Sua propagação está cobrando um preço gigantesco, que será pago pela economia real de todos os países do mundo. Graças aos abusos, à fértil imaginação que dispensa a moralidade e aos equívocos da política monetária (que durante longos anos não teve a humildade de conformar-se com a teoria), o sistema financeiro, que deveria servir à economia real (a do PIB e do emprego), ameaça destruí-la.
Os agentes financeiros estavam desconfiados com a crise do "subprime". E os cidadãos estavam assustados com a queda dos preços dos imóveis (que representam 1/3 de sua "riqueza"). Nesse quadro de profunda ansiedade, a quebra do Lehman promovida pela autoridade foi o epicentro de um terremoto financeiro mundial, que, na escala logarítmica Richter, foi superior a 9, ou seja, altamente destrutivo.
A história vai julgar duramente a competência de Bernanke, um excelente economista e historiador da crise de 1929, e a argúcia de Paulson, um profissional treinado que presidiu durante anos a Goldman Sachs. Vai ser muito difícil entender como a "boa" teoria somada à "boa" prática terminou em tal desastre.
Por outro lado, é fácil entender o comportamento aleatório (não irracional, como dizem alguns economistas) dos aplicadores. Ele lembra os estouros das boiadas quando assustadas por um estalo.
O mesmo acontece com os violentos terremotos: não sabendo onde encontrar abrigo, corre-se em qualquer direção. Trata-se pura e simplesmente de um estado de pânico. Todos querem sair e descobrem que a ampla porta de entrada (a ilusão vendida pela "ciência" dos bancos de investimento, que haviam descoberto como medir o risco e oferecer retorno garantido) é agora uma minúscula abertura de saída, onde vão amargar o custo de terem acreditado no milagre do máximo lucro com o mínimo de risco.
Não existe abrigo seguro. Todos vão pagar um preço pela irresponsabilidade de poucos, e uns poucos, de sangue frio e financeiramente líquidos, vão ficar ainda mais ricos.
Se você não tem nem sangue-frio nem liqüidez, fique quieto e espere.
Um dia a confiança voltará, como voltou depois das dezenas de crises do passado. Não fuja de casa para morrer na rua...

Texto de Delfim Netto, na Folha de São Paulo, de 15 de outubro de 2008.


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