terça-feira, outubro 21, 2008

Um país bilíngüe

Um Brasil bilíngüe

Javier Rodríguez Marcos
Em Toledo


"Um político de verdade é o que sabe governar a pólis, a cidade. E o presidente Lula o é. É um homem de Estado extraordinário que tem a energia e o conhecimento para dar a seu país o lugar que o Brasil merece na América Latina e no mundo." Assim falou na segunda-feira o escritor mexicano Carlos Fuentes sobre Luiz Inácio Lula da Silva, com quem compartilha o Prêmio Internacional Dom Quixote. É verdade que, ao ouvi-lo falar, parece que sobram idéias e energia a esse ex-sindicalista nascido em Garanhuns, estado de Pernambuco, há quase 63 anos. Em meio à onda de admiração, ele lembra que perdeu várias vezes as eleições antes de se instalar no Palácio do Planalto em Brasília pela primeira vez, e por maioria avassaladora, em 2002. Quatro anos depois repetiu no que havia sido o primeiro título "universitário" de sua vida, o de presidente.

Lula costuma recordar que de seus anos de experiência sindical ficou uma idéia: ninguém respeita um interlocutor que não respeite a si mesmo. Por isso, para ganhar em prosperidade e em respeito internacional, decidiu estreitar laços com seus vizinhos da América Latina. E assim decidiu promover em seu país a Lei do Espanhol, que obriga todos os centros de ensino secundário do Brasil a oferecer como opcional a língua castelhana. O resultado é que se prevê que o milhão de alunos que atualmente cursam espanhol se transformem em 12 milhões nos próximos quatro anos. Além disso, serão necessários 30 mil professores. Tudo sem contar com os nove centros que o Instituto Cervantes tem espalhados pela geografia de um país de 180 milhões de habitantes e dimensões continentais.

O Brasil bilíngüe, pois, tem hora para decolar, coisa que Lula, longe de ver como uma ameaça, considera uma oportunidade. "Integração" é a palavra que o presidente brasileiro mais repete ao explicar seus planos. "E não pode haver integração sem falar a mesma língua." Ele foi o primeiro a construir uma ponte entre seu país e o Peru. O mesmo fez com a Bolívia. Também gosta de lembrar que o Brasil tem milhares de quilômetros de fronteira com todos os países da América do Sul, menos Equador e Chile. Não tinha sentido viver com os olhos voltados para os EUA, país que, além do mais, acaba de superar a Espanha em número de falantes de espanhol.

Lula só fala português, mas ele entende tudo o que diz. Tem as idéias claras e um velho objetivo: promover a educação e reduzir a pobreza de seus compatriotas. Em vez de se colocar, como tantas vezes, nas mãos da providência, ele se pôs a trabalhar: o Brasil recebe US$ 90 de cada US$ 100 de investimento estrangeiro que chegam à América do Sul. Por acaso, ele costuma dizer que Deus é brasileiro. Isto é, dentro de alguns anos, Deus falará espanhol.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Texto do El País, no UOL.


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