Brasil pode ser condenado em Corte Internacional por anistiar torturadores
A discussão sobre o perdão que a Lei de Anistia brasileira, de 1979, concedeu aos agentes da repressão da Ditadura Militar (1964-1985) pode ter acabado no STF (Supremo Tribunal Federal). Mas o caso está longe de ser encerrado. O Brasil pode ainda ser condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por manter o entendimento de que os sequestros, assassinatos e torturas cometidos por agentes do estado durante o regime militar foram perdoados e esquecidos com a Lei 6.683. Essa condenação, inclusive, pode ocorrer ainda em 2010.
Isso porque a Corte, órgão da OEA (Organização dos Estados Americanos), pode entender que a Lei de Anistia, da forma como vem sendo interpretada, é um obstáculo na busca do direito à verdade e à Justiça —no caso, na tentativa de responsabilizar os torturadores da época. A análise é da diretora no Brasil da organização não-governamental Cejil (Centro pela Justiça e o Direito Internacional), Beatriz Affonso.
Isso porque a Corte, órgão da OEA (Organização dos Estados Americanos), pode entender que a Lei de Anistia, da forma como vem sendo interpretada, é um obstáculo na busca do direito à verdade e à Justiça —no caso, na tentativa de responsabilizar os torturadores da época. A análise é da diretora no Brasil da organização não-governamental Cejil (Centro pela Justiça e o Direito Internacional), Beatriz Affonso.
O caso em tramitação na Corte envolve episódios da Guerrilha do Araguaia (1972-1975), instalada na região onde hoje fica o Estado de Tocantins com o objetivo de combater a ditadura militar. Recentemente, o militar reformado Sebastião Curió Rodrigues de Moura, o major Curió, afirmou que pelo menos 41 pessoas foram executadas pelo Exército na guerrilha.
Quando a ditadura militar ainda estava em curso, os familiares das vítimas procuraram a Justiça Brasileira. Em 1982, uma ação civil pedia, além da apuração sobre os crimes, a localização dos restos mortais dos guerrilheiros. Mais de dez anos depois, em 1996, o caso ainda não tinha saído do trâmite inicial na Justiça.
Com essa denegação de Justiça, foi possível que o Cejil, o grupo Tortura Nunca Mais (do Rio de Janeiro) e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos de São Paulo recorressem ao sistema interamericano, por violação dos direitos humanos. A Corte Interamericana pode ser procurada quando o suposto abuso não teve solução judicial interna e as violações permaneceram.
O caso tramitou por 12 anos na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, primeiro órgão a tomar conhecimento de uma denúncia, até ser então encaminhado à Corte.
Está marcada para os dias 20 e 21 de maio desse ano a audiência do processo. De acordo com Beatriz Affonso, depois desse passo, usualmente leva-se de três a sete meses para que uma sentença seja dada. Assim, o Brasil pode ser condenado ainda nesse ano.
A condenação, segundo exame da jurisprudência da Corte citado por Beatriz Affonso, deverá exigir que o Brasil elimine os obstáculos jurídicos —entre eles a Lei de Anistia— para o pleno acesso à verdade e à Justiça. Isso não significa que a Lei possa ser revogada, mas pode ser alterada a interpretação de que certos crimes foram perdoados e, assim, a busca pela verdade tem sofrido empecilhos.
“Tenho certeza de que a Corte Interamericana vai especificar que a Lei de Anistia está em desacordo com o Pacto de São José da Costa Rica, um tratado que o Brasil assinou de boa fé”, diz a diretora. Mesmo que tal tratado tenha sido assinado pelo Brasil apenas em 1998, Affonso destaca que, de lá pra cá, a Lei de Anistia tem representado um obstáculo na busca da Justiça.
A especialista cita que, no caso do Araguaia, os militares ainda vivos que participaram dos confrontos foram interrogados como testemunhas, e não como réus, o que favorece a impunidade, já que eles não têm a obrigação de responder, por exemplo, onde estão os corpos dos mortos. “Em uma investigação criminal, a verdade judicial seria facilmente alcançada”, diz Beatriz, que afirma que o STF, em sua “lamentável” decisão desta quinta-feira (29/4), se acovardou em rever a questão. “É uma falácia dizer que a interpretação atual da Lei de Anistia não impede o acesso à verdade”, diz.
Outros dois episódios sobre violações de direitos humanos na Ditadura Militar estão em tramitação no sistema Interamericano. Ingressaram no ano passado ações sobre o caso do jornalista Vladimir Herzog, morto em instalações dos órgãos de repressão em 1975, e Luiz José da Cunha, morto a tiros aos 29 anos de idade numa emboscada em São Paulo, em 1973.
Condenações
Até hoje, o Brasil sofreu apenas duas condenações na Corte Interamericana. A primeira ocorreu em 2006, no caso de Damião Ximenes Lopes, um deficiente mental torturado e assassinado em um hospital psiquiátrico em Sobral, no Ceará.
A segunda foi no ano passado. A Corte condenou o Estado brasileiro por grampear ilegalmente o telefone de líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), divulgar as gravações e não penalizar autoridades responsáveis pela quebra do sigilo telefônico. Os cinco membros do movimento receberão, cada um, US$ 22 mil.
O Brasil não tem histórico de descumprimento de determinações da Corte ou da OEA. E, como signatário da Corte, tem obrigação de acatar. A Corte supervisiona o cumprimento da sentença e só dará por concluído o caso quando o Estado cumprir integralmente a decisão.
Quando a ditadura militar ainda estava em curso, os familiares das vítimas procuraram a Justiça Brasileira. Em 1982, uma ação civil pedia, além da apuração sobre os crimes, a localização dos restos mortais dos guerrilheiros. Mais de dez anos depois, em 1996, o caso ainda não tinha saído do trâmite inicial na Justiça.
Com essa denegação de Justiça, foi possível que o Cejil, o grupo Tortura Nunca Mais (do Rio de Janeiro) e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos de São Paulo recorressem ao sistema interamericano, por violação dos direitos humanos. A Corte Interamericana pode ser procurada quando o suposto abuso não teve solução judicial interna e as violações permaneceram.
O caso tramitou por 12 anos na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, primeiro órgão a tomar conhecimento de uma denúncia, até ser então encaminhado à Corte.
Está marcada para os dias 20 e 21 de maio desse ano a audiência do processo. De acordo com Beatriz Affonso, depois desse passo, usualmente leva-se de três a sete meses para que uma sentença seja dada. Assim, o Brasil pode ser condenado ainda nesse ano.
A condenação, segundo exame da jurisprudência da Corte citado por Beatriz Affonso, deverá exigir que o Brasil elimine os obstáculos jurídicos —entre eles a Lei de Anistia— para o pleno acesso à verdade e à Justiça. Isso não significa que a Lei possa ser revogada, mas pode ser alterada a interpretação de que certos crimes foram perdoados e, assim, a busca pela verdade tem sofrido empecilhos.
“Tenho certeza de que a Corte Interamericana vai especificar que a Lei de Anistia está em desacordo com o Pacto de São José da Costa Rica, um tratado que o Brasil assinou de boa fé”, diz a diretora. Mesmo que tal tratado tenha sido assinado pelo Brasil apenas em 1998, Affonso destaca que, de lá pra cá, a Lei de Anistia tem representado um obstáculo na busca da Justiça.
A especialista cita que, no caso do Araguaia, os militares ainda vivos que participaram dos confrontos foram interrogados como testemunhas, e não como réus, o que favorece a impunidade, já que eles não têm a obrigação de responder, por exemplo, onde estão os corpos dos mortos. “Em uma investigação criminal, a verdade judicial seria facilmente alcançada”, diz Beatriz, que afirma que o STF, em sua “lamentável” decisão desta quinta-feira (29/4), se acovardou em rever a questão. “É uma falácia dizer que a interpretação atual da Lei de Anistia não impede o acesso à verdade”, diz.
Outros dois episódios sobre violações de direitos humanos na Ditadura Militar estão em tramitação no sistema Interamericano. Ingressaram no ano passado ações sobre o caso do jornalista Vladimir Herzog, morto em instalações dos órgãos de repressão em 1975, e Luiz José da Cunha, morto a tiros aos 29 anos de idade numa emboscada em São Paulo, em 1973.
Condenações
Até hoje, o Brasil sofreu apenas duas condenações na Corte Interamericana. A primeira ocorreu em 2006, no caso de Damião Ximenes Lopes, um deficiente mental torturado e assassinado em um hospital psiquiátrico em Sobral, no Ceará.
A segunda foi no ano passado. A Corte condenou o Estado brasileiro por grampear ilegalmente o telefone de líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), divulgar as gravações e não penalizar autoridades responsáveis pela quebra do sigilo telefônico. Os cinco membros do movimento receberão, cada um, US$ 22 mil.
O Brasil não tem histórico de descumprimento de determinações da Corte ou da OEA. E, como signatário da Corte, tem obrigação de acatar. A Corte supervisiona o cumprimento da sentença e só dará por concluído o caso quando o Estado cumprir integralmente a decisão.
Este texto é originário do Operamundi.
Marcadores: Brasil, ditadura militar, Golpe de 1964, justiça, Poder Judiciário, tortura, torturadores
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home