sexta-feira, julho 03, 2009

O enigma Argentina

O argentino gosta de rompantes; o brasileiro, da conciliação. Há quem veja no estilo brasileiro a contemporização excessiva, como comprova as relações de Fernando Henrique Cardoso e de Lula com o coronelismo e com os diversos segmentos empresariais e sociais.

Mas em todos os episódios relevantes na vida de ambos os países, a radicalização argentina sempre foi mais perniciosa que a contemporização brasileira.

O populismo peronista foi infinitamente pior do que o de Vargas; o neoliberalismo de Martinez de Hoz um desastre, em contraposição à visão institucional de Campos e Bulhões; o militarismo argentino uma tragédia, enquanto o militarismo brasileiro permitia consolidar o processo de substituição de importações; o pacto mercadista de Domingo Cavallo um desastre amplo, o de FHC um sucesso; a reação dos Kirchner um conflito permanente, enquanto Lula procurava amenizar resistências.

O que seria essa tragédia argentina, que faz o país continuar sacando em cima do capital acumulado nos últimos 15 anos do século 19 - onde pela única vez surgiu uma geração na elite argentina capaz de pensar o futuro?

O que seria? O predomínio excesso de Buenos Aires sobre as demais províncias? O fato das elites argentinas terem cortado muito cedo as raízes culturais com o país? A diferença estaria em um homem - Vargas construindo o futuro, Peron pensando apenas o poder? Como o Brasil semi-rural dos anos 40 e 50, sem muitos quadros técnicos, conseguiu criar uma visão de futuro que passou ao largo da sociedade muito mais sofisticada do vizinho? Eram meia dúzia de técnicos participando das Comissões MIstas, do Encontro de Chanceleres, montando Planos Salte e outros que ajudaram a diagnosticar a economia.

Nos anos 40, os judeus financistas, expulsos pela Guerra, procuravam abrigo no Brasil; mas deixavam seus recursos na Argentina. Certamente por contar com um mercado financeiro mais sofisticado. Estaria nessa possibilidade ampla, de tirar e colocar recursos no país, nesse rentismo antecipado, nessa possibilidade fácil para a internacionalização do capital local, a explicação para a Argentina ter perdido o bonde?

Naqueles anos, após a moratória do início dos anos 30, o grande capital brasileiro veio para a economia real; o da Argentina se internacionalizou.

Eis aí um dos grandes enigmas para começar a entender melhor processos de desenvolvimento na América Latina.

Do blog do Luís Nassif.

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