quinta-feira, março 26, 2009

A queda do PIB

A queda do PIB

A PRINCIPAL notícia da semana passada foi a da queda do PIB (Produto Interno Bruto) de 3,6% no último trimestre de 2008 em relação ao trimestre anterior. Os indicadores já disponíveis em relação aos dois primeiros meses de 2009, porém, são ambíguos. As vendas a varejo, por exemplo, apresentaram resultados positivos. Não está ainda definido se já estamos ou não em recessão.
Ninguém pode afirmar que a queda da produção no quarto trimestre era inevitável, mas está claro que poderia ter sido menor se o governo brasileiro, principalmente seu Banco Central, houvesse começado a baixar a taxa de juros antes, e com mais firmeza. Só começou a reduzir a Selic neste ano, mas a boa decisão, que poderia ter sido tomada antes, foi a redução da taxa, na última semana, em 1,5 ponto percentual.
A queda do PIB foi maior do que se esperava, de forma que a reação foi de surpresa e de pessimismo.
Não creio, entretanto, que esse dado altere a avaliação de que a crise econômica global atingirá relativamente menos o Brasil do que a maioria dos demais países. A queda elevada no quarto trimestre ocorreu em relação a um trimestre anterior aquecido, em que a economia cresceu a uma taxa anualizada de 7%. Em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, o quarto trimestre de 2008 apresentou ainda um crescimento de 1,3%. No ano, tivemos um crescimento de 5,1%. Neste ano, o crescimento será muito menor, mas espero que ainda seja positivo.
O desempenho da produção neste ano vai depender muito da política do governo. Até hoje temos sido tímidos em reagir à crise global, mas o único erro grave foi adiar a baixa da taxa de juros. Agora é necessário que o governo aja com maior determinação.
Os jornais noticiam a preocupação do governo com a meta de superávit primário -um problema que, no momento, não faz sentido. O equilíbrio fiscal é sempre um objetivo fundamental, e Keynes nunca propôs déficits públicos crônicos; mas, em momentos de recessão como este, a expansão fiscal torna-se mandatória.
Já mostrei em outros artigos que esta crise representa uma oportunidade para o Brasil, graças, principalmente, ao fato de que ela causou a elevação da taxa de câmbio para um nível mais próximo ao do equilíbrio industrial. Mas, além de representar uma oportunidade para crescimento, a crise representa também uma oportunidade para realizar mudanças institucionais, porque nesses momentos as resistências originadas em ideologias e interesses perdem força. Duas são especialmente necessárias: substituir a meta de superávit primário pela de déficit público e iniciar o processo de desindexação dos contratos firmados pelo governo.
O superávit público é uma meta absurda que serve principalmente para esconder os juros pagos pelo governo. A indexação de contratos com participação do Estado, por sua vez, é um mal. Não há instituição que mais dificulte o controle da inflação do que a indexação. O Brasil foi o país que mais longe foi na indexação, e, em consequência, sofreu 15 anos de alta inflação. No Plano Real, essa indexação foi reduzida, mas não foi eliminada. Cerca de um terço dos preços continuam indexados -e essa é a principal causa da resistência da inflação em cair verticalmente diante da crise.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 74, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

O texto foi publicado na Folha de São Paulo, em 16 de março de 2009.


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