Dias da (de) História
Dias da história
A PROMETIDA reunião do Conselho de Defesa Nacional na quinta 11, já para dar por aprovado o Plano Estratégico de Defesa, confere a esta semana uma coerência só comparável à do Carnaval.
Foi providencial, assim, a inserção do novo evento entre a quarta 10, dedicada aos 60 anos da Declaração dos Direitos Humanos e à decisão judicial sobre ou contra as reservas indígenas, e o sábado 13, dos 40 anos do Ato Institucional nº 5, o AI-5 que se iguala ao DOI-Codi como criações maiores da ditadura militar.
Eis, pois, uma semana de grandes temas do segmento militar e, portanto, dele estendidos ao país.
Nada a estranhar na presença da Declaração dos Direitos Humanos entre esses temas. Em qualquer parte do mundo, militares são os maiores especialistas em direitos humanos. Tal como, por exemplo, os médicos e os bombeiros são especialistas no que combatem.
Há quem atribua a prioridade às polícias, também em todo o mundo, mas é um equívoco de visão parcial. Polícias, quando reprimem parte da criminalidade, servem a uma outra concepção de direitos humanos, não policial nem militar.
Quase incompreensível, sim, é o anti-indigenismo tão difundido entre militares do Exército à proporção em que ostentam mais estrelas. Por aí se entende a ausência, na memória militar brasileira, dos tributos devidos a Cândido Rondon, o mais brasileiro e de vida mais heróica entre os militares históricos. Jamais lembrado para a merecida altitude de patrono, atribuída aos que comandaram outros em lutas de morte.
O anti-indigenismo brotado do pós-Segunda Guerra, ou nos últimos 60 anos, é um confuso coquetel. Em doses variáveis, é feito de preconceito étnico, concepções primárias de segurança nacional, interesses mal percebidos do capital internacional dedicado à exploração de riquezas naturais, idem em relação a grandes explorações agrícolas e, como tempero, os subprodutos da Guerra Fria. Bem apropriado, portanto, a uma regra da história: o indígena paga sempre.
Servidor da ditadura no cerne mesmo em que foi elaborada e conduzida, seu ex-ministro Rondon Pacheco abriu as esperadas memórias pelo aniversário do AI-5. Com o destaque de uma revelação: o general Médici, tão logo assumiu o poder, quis revogar o AI-5, faltando-lhe apoio militar para fazê-lo.
A história é flexível e amaciável, e a hora é oportuna para os que se têm dedicado a fazê-lo sobre seu percurso pela ditadura. Se Médici, chefe do SNI convocado para a Presidência, considerasse as monstruosidades do AI-5 dispensáveis, bastaria incluir a revogação nas condições apresentadas à junta militar, que nele encontrava a opacidade aceita por todos os gostos das casernas. Além de não o fazer, como general-presidente foi autor, co-autor ou avalista em tudo o que compôs o crescente despotismo baseado no AI-5.
É uma semana muito proveitosa, esta.
Coluna de Jânio de Freitas, na Folha de São Paulo, de 9 de dezembro de 2008.
Marcadores: AI-5, Brasil, ditadura, ditadura militar, Golpe de 1964, golpe de estado, Médici, regime militar
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