Ocidentais se defrontam com oposição na ONU
Na ONU, os Ocidentais se defrontam com a oposição das potências emergentes
Natalie Nougayrède e Philippe Bolopion
Em Nova York
A Assembléia Geral da ONU, que foi aberta nesta segunda-feira, 22 de setembro, apresenta um contexto difícil para os ocidentais, confrontados a um recrudescimento das resistências das potências emergentes. Estas estão decididas a defenderem sua visão dos direitos humanos e sua concepção da soberania dos Estados. Em relação a países como Mianmar e o Zimbábue, ou a uma região como o Darfur, que enfrentam uma situação de crise, a política defendida pelos Ocidentais andou esbarrando, no decorrer deste último ano, em oposições fortes, articuladas por diversos países do Sul. Para fazerem valer seus pontos de vista, estes contam com o apoio da Rússia e da China, dois membros do Conselho de segurança que se tornaram os campeões do exercício do direito de veto.
Esta polarização que, segundo alguns observadores, se resume a um enfrentamento sistemático entre "o Oeste" e "o restante" do mundo, foi evidenciada em relação à questão do Kosovo e, mais recentemente, à crise na região do Cáucaso. O endurecimento da Rússia, que parece querer posicionar-se como a principal liderança dos críticos dos Estados Unidos no mundo, desponta como um dos elementos da nova configuração das relações internacionais.
"Na ONU, nós tivemos de adotar uma posição defensiva", constata um diplomata ocidental. "Estamos enfrentando um verdadeiro problema para transmitir nossa mensagem e defender nosso ponto de vista". Ele constata que está havendo "um retorno a uma forma de terceiro-mundismo que lembra muito os anos 1970, um contexto no qual os países não-alinhados se tornam cada vez mais ativos, com países com a Índia, o Brasil e a África do Sul que querem ocupar um espaço condizente com o status de novas potências e que se sentem frustrados diante da inexistência de uma reforma do Conselho de Segurança".
Em julho, um projeto de resolução da ONU que contava com o apoio dos ocidentais e que se destinava a solucionar a crise política no Zimbábue foi contestado e acabou descartado por um duplo veto russo e chinês. Este veto contou com a aprovação, entre outros, da África do Sul e da Indonésia. O Sudão encontrou no decorrer deste ano apoios importantes no âmbito da União Africana e da Liga Árabe, em particular em relação à questão de uma possível inculpação do presidente Omar Al-Bachir pela Corte Penal Internacional por conta dos crimes perpetrados no Darfur.
"Os países não-alinhados estão afirmando seus pontos de vista com maior afinco", comemora o embaixador da África do Sul na ONU, Dumisani Kumalo. "Durante certo tempo, nós acreditamos que os países desenvolvidos respeitariam políticas de parceria com os países em desenvolvimento. Contudo, as ajudas que foram prometidas nunca se concretizaram", diz. "Diante disso, a melhor solução é erguermos a cabeça e nos posicionarmos em defesa dos países em desenvolvimento, principalmente aqueles em relação aos quais nós pensamos que eles são injustamente tratados, tais como o Zimbábue e Mianmar".
Preocupada com a diminuição da capacidade de convencimento dos ocidentais dentro do contexto da ONU, a diplomacia francesa elaborou uma estratégia que consiste em tentar valorizar, por ocasião desta Assembléia Geral, tudo aquilo que a União Européia (UE) proporciona para o sistema das Nações Unidas. Contudo, as capacidades da UE (que é o mais importante contribuinte para o orçamento da ONU e o principal doador de ajudas para o desenvolvimento) deixaram de produzir efeitos em termos de apoios políticos.
Um relatório elaborado pelo grupo de análise European Council on Foreign Relations (ECFR - Conselho Europeu de Estudos das Relações Internacionais), que foi publicado recentemente, calculou que em 2007 e 2008, por ocasião das votações da Assembléia Geral da ONU, a UE conseguiu obter um consenso em torno das suas posições em apenas 48% e 55% dos casos, respectivamente, contra uma média de 72% durante os anos 1990.
Enquanto isso, as posições da China e da Rússia foram encontrando um número crescente de aliados, passando de menos de 50% dos votos no âmbito da ONU no decorrer da década de 1990, para 74% em 2007-2008. A Rússia e a China "andaram assumindo por sua conta as frustrações dos não-alinhados", constata um diplomata ocidental.
A noção de universalidade dos direitos humanos, tal como é concebida pelos ocidentais, tem sido contestada por blocos de países. Neste terreno, a Organização da Conferência Islâmica, que reúne 56 Estados no âmbito da ONU, tem se mostrado a mais virulenta. "Apenas três países de predominância muçulmana, o Afeganistão, a Bósnia e a Turquia, figuram entre os aliados firmes dos europeus por ocasião das votações" na ONU, constata o estudo do ECFR.
O episódio da guerra no Iraque provocou um tipo de desconfiança que passou a predominar entre todos os países não-alinhados, em relação às ingerências e aos questionamentos da soberania dos Estados em nome da democratização. O reconhecimento, neste ano, da independência do Kosovo pelos Estados Unidos e por diversos países europeus consolidou um sentimento de que essas nações praticam uma política de dois pesos, duas medidas. "Existe também a nuvem negra que paira sobre a questão palestina", constata um diplomata ocidental. "Esta é uma ilustração, aos olhos de muitos países do Sul, de uma hipocrisia dos ocidentais".
"Atualmente, o Conselho de Segurança está paralisado", observa o embaixador sul-africano, Dumisani Kumalo. "No final das contas, isso está acontecendo por culpa dos ocidentais, da França, do Reino Unido, dos Estados Unidos". "Essa tendência tem a sua origem na questão do Kosovo; nós havíamos alertado esses países para não abrirem esta porta, mas, eles insistiram, o que resultou naquilo que os russos fizeram na Geórgia. E agora, nós estamos às voltas com essa grande bagunça".
Tradução: Jean-Yves de Neufville
Texto do Le Monde, no UOL.
Marcadores: colonialismo, imperialismo, imperialismos, Nações Unidas, ONU, politica, política, visão de mundo
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