Tentações de uma boa inspiração
Tentações de uma boa inspiração
OSLO - Adotar o modelo norueguês como inspiração para definir as novas regras de exploração do petróleo no Brasil faz todo o sentido. Basta dar uma circulada pelo país para entender.
Baseado na criação de uma estatal totalmente controlada pelo governo, aliado à adoção de medidas para incentivar a indústria naval local, o modelo deu certo na Noruega.
País com um nível de desemprego superbaixo, na casa dos 2%, a Noruega conseguiu criar com a riqueza do petróleo toda uma cadeia de empresas no setor, evitando ficar refém unicamente da exploração do ouro negro.
Exemplo: visitando uma pequena cidade do interior, descobre-se que famílias de pescadores foram incentivadas a trocar de ramo. Passaram a construir navios para operar nas plataformas de petróleo.
Um empresário do setor entrou no negócio aos 19 anos. Recebeu do pai, um pescador, ajuda de US$ 12 mil. Hoje, controla uma empresa que vale mais de US$ 1 bilhão, desenvolvendo tecnologia de ponta própria na área.
Mas não podemos imaginar que tudo o que deu certo aqui dará também no Brasil. Na Noruega, o governo tem a última palavra para definir que companhias petroleiras vão explorar os campos na sua costa. Define inclusive em qual sua estatal vai participar.
Tenho sérias dúvidas se um esquema assim funcionaria no Brasil. País acostumado a conviver com escândalo atrás de escândalo, deixar com políticos ou tecnocratas a palavra final sobre quem vai ganhar uma mina de ouro negro é fazer um convite à tentação -para dizer o mínimo.
O fato é que, se está no caminho certo ao decidir mudar as regras de um jogo que se mostrou muito lucrativo, buscando defender os interesses do país, o governo Lula não pode a esse pretexto criar novos e perigosos privilégios.
Até aqui, não sinalizou que pretende correr tal risco. Um debate público e aberto ajudará ainda mais a afastar tais tentações.
Texto de Valdo Cruz, na Folha de São Paulo, de 21 de agosto de 2008.
Marcadores: Brasil, Governo Lula, petróleo, pré-sal
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