Argentina III
O que você faz quando uma inflação de preços internacionais faz o valor daquilo que você produz triplicar? Se você é uma pessoa, provavelmente você vai tentar desfrutar da melhor maneira possível este dinheiro extra que você recebeu.
O preço de produtos primários sofreu uma verdadeira inflação no mundo nos últimos anos. O petróleo, por exemplo, passou de cerca US$ 10, em 1998, para mais de US$ 100, nestes últimos dias. A Rússia, grande produtora de petróleo, usou o dinheiro decorrente deste aumento de preços para a criação de um fundo soberano para administrar esta riqueza. No caso da Rússia, isto é possível porque há poucas empresas produtoras trabalhando em território russo, e é relativamente fácil tributá-las.
Mas e se o que você produz é trigo, soja e carne, e quem produz estes artigos são centenas, talvez milhares de produtores? Me parece que é o que acontece com a Argentina atualmente. Preços dos produtos alimentícios também aumentaram muito ultimamente. Isto levou uma enxurrada de dólares para o país. Esta enxurrada de dólares, em tese, deveria levar a uma apreciação da moeda argentina, fazendo com que, afinal, os preços dos produtos acabassem maiores, mais difíceis de vender, tornando a atividade econômica argentina mais lenta. Para deter esta apreciação do peso, o governo argentino está usando de taxas de juros abaixo da inflação, e taxando a exportação. Segundo os produtores rurais, taxando muito a exportação. Com isso tenta evitar a escassez de alimentos na Argentina, e, ao mesmo tempo, deter a apreciação do peso.
Os produtores rurais não estão gostando e fazendo locaute. Um locaute que vem desde o final de março, se não estou enganado, com uma breve interrupção. Afinal, estão sendo taxados em até quase 50% do valor de suas rendas decorrentes da venda dos produtos agrícolas.
O governo argentino, por sua vez, alega que está evitando o aumento da desigualdade social no país, e evitando com que o aumento da entrada de divisas produza apreciação do peso, o que dificultaria a venda dos produtos argentinos no exterior.
O que fazer?
Estive conversando sobre isso com colegas de trabalho. Não que alguém vivendo na província de São Pedro tenha o poder de influenciar o governo federal da Argentina, mas concluímos que a situação não é fácil de ser resolvida. Não se sabe se este dinheiro extra vai durar por muito tempo, ou se a situação é conjuntural, é logo vai acabar. Dar um punhado de pesos a cada argentino? Criar um fundo, para administrar esta arrecadação fiscal maior? Aplicar simplesmente em melhorar a infra-estrutura do país (por exemplo, duplicar uma estrada, que melhore o escoamento de novas safras)?
As respostas são difíceis.
Espero sinceramente que a disputa entre a presidenta Cristina Fernández e os ruralistas argentinos não descambe para soluções inconstitucionais. Na Argentina soluções deste tipo costumam ser sangrentas.
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