quinta-feira, abril 24, 2008

Colômbia IV

Analista vê crise institucional inédita no país

DE CARACAS

Especialista no envolvimento dos paramilitares na política, a pesquisadora Laura Bonilla diz que a atual crise é inédita na história do Congresso colombiano e vê o risco de uma solução autoritária ao problema. Bonilla trabalha na Corporação Novo Arco-Íris, ONG pioneira nas investigações acadêmicas sobre a parapolítica, e é co-autora do livro "Parapolítica: a Rota da Expansão Paramilitar e os Acordos Políticos". Leia, a seguir, a entrevista à Folha, por telefone. (FM)

FOLHA - Qual a diferença entre o caso de Mario Uribe e os dos demais parlamentares?
LAURA BONILLA
- Além de ser primo do presidente, foi um grande aliado seu durante toda a carreira política. Talvez seja a pessoa mais próxima à Presidência envolvida nesse tema. De todos os políticos envolvidos, é o que tem o maior peso. É um congressista de altíssimo status, que escolheu ser eleito com votos do paramilitarismo, para manter sua força política.

FOLHA - É uma crise inédita?
BONILLA
- A Colômbia está entrando numa crise institucional nunca antes conhecida. Hoje, são 60 congressistas que estão implicados juridicamente neste processo. É um número muito alto, mais de 35% do total. É uma crise que pode levar a uma dissolução do Congresso pelo presidente, trazendo uma saída autoritária ao problema.

FOLHA - A sra. concorda com a criação de um tribunal apenas para julgar a parapolítica?
BONILLA
- Não, muito menos se o tribunal for no próprio Congresso. Que o Congresso julgue a si mesmo é uma incongruência muito grande. Infelizmente para o país, as investigações estão saindo quase ao pé da letra do que havíamos investigado.

FOLHA - Qual é o grau de envolvimento do próprio Uribe com a parapolítica?
BONILLA
- Os políticos envolvidos foram eleitos com os votos obtidos pela via da coação armada, por via da fraude eleitoral. Esses mesmos votos elegeram o presidente. Pode ser que ele não tenha precisado desses 3 ou 4 milhões de votos. Mas eu penso que não, foram votos necessários para que Uribe fosse hoje quem é. Ele faz alianças com pessoas que têm alianças ilegais. A Presidência tem vícios de ilegalidade também. Não acredito que os paramilitares tenham posto armas nos pescoços das pessoas e dito: "Votem por esses congressistas, e, para presidente, votem livremente". Há muitíssimos indícios, mas o problema é que o presidente só pode ser investigado por uma comissão da Câmara dos Representantes onde 10 dos 15 parlamentares são de sua bancada.

FOLHA - O escândalo, iniciado em 2006, nunca arranhou a imagem do presidente. Por quê?
BONILLA
- Aqui, é mais fácil que se condene alguém moral ou socialmente por temas como o narcotráfico ou seqüestro do que por um massacre. Outro fator é que as Farc ocuparam quase toda a agenda midiática por causa dos seqüestrados. Com os paramilitares, nunca houve uma cobertura desse tipo.

Texto da Folha de São Paulo, de 23 de abril de 2008 (para assinantes).

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