Israel e o Lobo
Israel grita: “Lobo!”
“Irã é o centro do terrorismo, fundamentalismo e subversão, e, em minha opinião, é mais perigoso que o nazismo, porque Hitler não possuía uma bomba atômica, enquanto os iranianos estão tentando aperfeiçoar a opção nuclear.”
Benjamin Netanyahu em 2009? Tente de novo. De fato estas palavras foram expressas por outro primeiro-ministro israelense (e atualmente presidente de Israel), Shimon Peres, em 1996. Quatro anos antes, em 1992, ele previra que o Irã teria uma bomba atômica por volta de 1999.
Você não pode acusar os israelenses de não alertarem sobre o lobo. Ehud Barak, atual ministro da defesa, disse em 1996 que o Irã estaria produzindo armas nucleares por volta de 2004.
Agora vem Netanyahu, em uma entrevista a seu fiel taquígrafo Jeffrey Goldberg do The Atlantic, retomando a mais recente tentativa da parte de Israel de retratar o Irã como uma encarnação do mal semelhante ao nazismo:
“Você não quer um culto messiânico e apocalíptico controlando bombas atômicas. Quando um crente de olhos arregalados consegue acesso ao poder e armas de destruição de massa, o mundo inteiro deveria começar a se preocupar, e isto está acontecendo no Irã”.
Eu devo dizer que quando eu leio estas palavras sobre “crente de olhos arregalados” minha mente vagueia para um recentemente despacho “definidor”. Mas alto lá.
O foco hoje é o Irã e, mais precisamente, o que o presidente Barack Obama fará com a prescrição de Netanyahu de que, ao lado da economia, a grande missão de Obama é “evitar que o Irã obtenha armas nucleares” - uma eventualidade novamente definida no calendário israelense como “daqui a alguns meses”.
Eu voltarei ao constantemente adiado dia do juízo final em seguida, mas antes voltemos àquela entrevista de Netanyahu.
Este “culto messiânico e apocalíptico” em Teerã é, obviamente, aquele mesmo com o qual Israel fazia negócios nos anos 1980, quando seu interesse (o interesse de Israel) era enfraquecer o Iraque de Saddam Hussein; Aqueles negócios – incluindo a venda de armas e tecnologia – era uma extensão da política israelense com relação ao Irã do Xá.
É também o mesmo “culto messiânico e apocalíptico” que sobreviveu 30 anos, que conduziu o país sob a penúria da guerra com Iraque entre 1980 e 1988, e que de maneira sagaz estendeu seu poder e influência, que cooperou com os Estados Unidos no Afeganistão antes de ser incluído do “eixo do mal”, e que manteve seu país em paz no século XXI enquanto conflitos sangrentos engolfaram seus vizinhos a leste (Afeganistão) e oeste (Iraque), e enquanto Israel lutou em duas guerras.
Eu não creio na ideia, conforme Netanyahu disse a Goldberg, que o Irã é “um regime fanático que coloca o zelo doutrinário acima de seu auto-interesse”. Cada pedacinho de evidência sugere, ao contrário, que o auto-interesse e a sobrevivência é o que conduz os mulás.
Mas Netanyahu insiste (por demais) que o Irã é “um país que glorifica sangue e morte, incluindo sua auto-imolação”. Hein?
Ainda de olho neste assunto, Netanyahu diz que a “liderança composta” do Irã tem “elementos de evidente fanatismo que não existe em nenhum outro virtual poder nuclear no mundo”. Não, na verdade eles existem em uma potência nuclear de fato, o Paquistão.
As ogivas nucelares de Israel, cuja presumível função é precisamente dissuadir potências como o Irã, não são mencionadas, é claro.
Netanyahu também faz a acusação grotesca que a terrível perda de vidas na Guerra Irã-Iraque (iniciada pelo Iraque) “não marcou uma terrível ferida na consciência dos iranianos”. Se isto acontece, é porque a nova geração do Irã busca reformas, não rebelião; e porque o país em geral preza mais a estabilidade que a aventura militar.
Os estados árabes, sugere Netanyahu, “ardentemente esperam” que os Estados Unidos, se necessário, usarão “força militar” para parar a nuclearização do Irã. Minhas conversas mais recentes, com membros de estados árabes, que incluem membros do governo saudita, sugerem que a equivocada e longa tentativa israelense de convencer os árabes que o Irã, e não Israel, é seu verdadeiro inimigo (o inimigo dos árabes) vai falhar novamente.
O que acontece aqui? Israel, como tem feito por quase duas décadas, está tentando manter apoio americano e evitar qualquer mudança desvantajosa no equilíbrio de poder no Oriente Médio, até agora sobremaneira inclinado a favor de Tel Aviv, retratando o Irã como um monstruoso estado pária, inclinado a uma eminente guerra nuclear.
Uma aparência de equilíbrio de poder é frequentemente uma pré-condição para a paz. O Irã foi deixado de fora dos acordos de Madri e de Oslo, com resultados desastrosos. Mas este é um assunto para outro dia.
O que é crítico neste momento é que Obama veja os boatos medrosos de Netanyahu com o apropriado ceticismo, assuma o controle, e continue a perseguir o reconhecimento do regime de Teerã, como ele fez quarta-feira dizendo que os Estados Unidos pela primeira vez iriam se juntar ás conversações sobre sobre o projeto nuclear iraniano. O presidente deveria ler o excelente livro “Treacherous Alliance” (“Aliança Traiçoeira”) de Trita Parsi como preparação.
A mudança estratégica central da presidência de Obama tem sido se afastar da retórica do “conosco ou contra nós” da guerra contra o terror, em direção a uma reaproximação do mundo muçulmano como base para isolar o terrorismo.
É insustentável que os Estados Unidos ou Israel se encontrem em guerra contra os muçulmanos persas, assim como contra os muçulmanos árabes, e que a tentativa de Netanyahu de prender os Estados Unidos na perpetuação do pensamento da guerra ao terror prevaleça.
O único jeito de parar a nuclearização do Irã, e encorajar a reforma de um regime repressor, é a mesa de negociação. Há tempo. Aqueles “meses” ainda são para daqui a alguns anos. O que o Irã acumulou é urânio pouco enriquecido. É necessário urânio altamente enriquecido para uma bomba. Daí é um salto.
A hegemonia de Israel está se provando um tipo de escravidão. A passagem para a Terra Prometida envolve repensar o Oriente Médio, começando pelo Irã.
Este artigo é uma tradução feita pelo blogueiro sobre um texto de Roger Cohen publicado no The New York Times, de 8 de abril de 2009.
Marcadores: Irã, Israel, Palestina, tradução jar
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