Câmara deve alterar PEC sobre precatórios
Câmara deve alterar PEC sobre precatórios
Texto aprovado no Senado permite a Estados e municípios retardar pagamento de dívidas de R$ 100 bi com empresas e pessoas físicas
Governantes citam caixas ameaçados pela queda da arrecadação para defender proposta; OAB, contra a PEC, faz hoje marcha em Brasília
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Diante de um impasse que opõe entidades do meio jurídico a um lobby suprapartidário de governadores e prefeitos, a Câmara dos Deputados deverá ser obrigada a alterar uma proposta de emenda à Constituição, já aprovada pelo Senado, que permite a Estados e municípios retardar o pagamento e obter descontos de dívidas estimadas em R$ 100 bilhões com empresas e pessoas físicas.
O texto dá prazo de pelo menos 15 anos para a quitação de dívidas impostas à administração pública por decisões judiciais, conhecidas como precatórios e equivalentes a algo em torno de um quinto das receitas estaduais e municipais. Depois de três anos quase parado, o projeto ganhou impulso com a crise econômica e foi aprovado com três votações em um único dia -o 1º de abril passado.
No entanto, o apoio subitamente recebido de todos os senadores não será suficiente para assegurar a ratificação pelos deputados. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e outras entidades farão hoje uma marcha contra a proposta em Brasília. "Se ficar esse conflito, não vai passar na Câmara", avalia Eduardo Cunha (PMDB-RJ), relator do texto na Comissão de Constituição e Justiça.
Cunha procura negociar um acordo entre os defensores da proposta, que apontam os caixas municipais e estaduais ameaçados pela queda da arrecadação de impostos, e os adversários, para os quais a medida equivale a um calote institucionalizado capaz de enfraquecer o Poder Judiciário.
Para o deputado, há ao menos uma inconstitucionalidade clara no texto: a mudança promovida na correção passada das dívidas, que passa a seguir as taxas da caderneta de poupança, bem abaixo da combinação vigente hoje, de inflação mais juros de 12% ao ano. O deputado também questiona o pagamento por ordem crescente de valor do precatório, em vez da ordem cronológica.
"Extrema gravidade"
Os dois lados concordam que o atual arranjo legal não é suficiente para promover o abatimento regular dos precatórios. A Constituição de 1988 deu prazo de oito anos para a quitação das dívidas e, em 2000, foram concedidos mais dez anos; mesmo ameaçados por sequestro de recursos e intervenções, Estados e municípios ainda protelam pagamentos.
"As dívidas de precatórios têm causado situações de extrema gravidade para muitos governantes, com reflexos diretos para a população", argumenta o relatório da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que estabeleceu a versão aprovada em definitivo na Casa.
Cita-se, entre outros exemplos, o caso do município de Santo Antônio do Pinhal (SP), que teve de suspender temporariamente os serviços de saúde e educação para a população devido ao bloqueio judicial de R$ 4 milhões, ou 40% de seu orçamento, em 2007.
Opções
O texto dá duas opções a governadores e prefeitos: concluir os pagamentos até 2024, melhor alternativa para os menos endividados, ou destinar uma parcela fixa de sua receita aos precatórios até a quitação total, sem limite de prazo. Na segunda opção, os percentuais variam de 0,6% a 1,5%, no caso de municípios, e de 0,6% a 2% para os Estados.
Do valor reservado aos precatórios, 40% serão pagos segundo a ordem crescente de valor da dívida. O restante será destinado a credores que aceitem receber quantias inferiores à dívida original, por meio de leilões. Ficam fora dessa regra os precatórios de pequeno valor, em especial os referentes a salários e aposentadorias, a serem pagos de imediato.
"É uma carta branca para a irresponsabilidade estatal", afirma o presidente da OAB, Cezar Britto, para quem a proposta é inconstitucional e dá excessivo poder ao Executivo, em detrimento do Judiciário. "O governante pode desapropriar imóveis, prejudicar adversários políticos, e o custo vai ficar para o bisneto dele."
Notícia da Folha de São Paulo, de 6 de maio de 2009.
Marcadores: Brasil, Congresso, precatórios
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