Gaza recolhe cadáveres e mede destruição
População de Gaza recolhe cadáveres e mede estragos
Moradores retiram corpos soterrados e constatam prejuízos avaliados em US$ 1,4 bi
Ao menos cem mortos são tirados de ruínas sob cheiro de putrefação, e expectativa é que número suba; cenário descrito é de terra arrasada
DA REDAÇÃO
No primeiro dia da trégua unilateral anunciada por Israel, a população da faixa de Gaza foi às ruas para recolher corpos abandonados nas áreas do conflito e medir o estrago causado por três semanas de ataques israelenses.
Pessoas aos prantos recolhiam pedaços de cadáveres enquanto escavadeiras varriam escombros de prédios e casas destruídos na ofensiva, segundo relatos de jornalistas que estão em Gaza.
"Estamos cavando com nossas mãos, e nem sequer sabemos se são pedaços de gente ou de animais, é uma vergonha", disse um médico usando máscara no rosto para amenizar o cheiro de putrefação que paira sobre as áreas mais atingidas.
Pelo menos cem cadáveres haviam sido localizados até o fechamento desta edição, elevando para mais de 1.300 o número de mortos na ofensiva -dos quais ao menos metade é civil. A Cruz Vermelha prevê aumento do balanço de vítimas.
Israel permitiu que alguns feridos saíssem de Gaza para receber tratamento no vizinho Egito e num campo médico israelense na passagem de Erez.
Pessoas percorriam amontoados de entulho com sacos de plásticos nas mãos em busca de objetos pessoais como fotos de família, material escolar e utensílios domésticos.
"Só me resta a roupa do corpo", gritava uma mulher no portão de sua casa, que ficou totalmente destruída.
Algumas pessoas, num misto de cinismo e desespero, recolhiam estilhaços de bombas para ser revendidos como alumínio reciclado. "Com esse pedaço aqui posso conseguir US$ 0,25 [cerca de R$ 0,60]", disse um morador, ostentando um resto de míssil.
Prejuízos
As ruas de Gaza, cheias de crateras abertas pelas bombas e repletas de carcaças de carros retorcidas, lembram um cenário de terra arrasada.
Pelo menos 4.000 casas foram demolidas e 17 mil, danificadas. Os ataques também destruíram 20 mesquitas, 1.500 propriedades comerciais, além dos 16 prédios da Autoridade Nacional Palestina onde funcionava o governo do Hamas.
A ONU diz que 53 de suas instalações em Gaza precisam ser total ou parcialmente reconstruídas.
"Diante de tanta destruição, o material de construção está em falta", diz o dono de uma casa de câmbio que teve a fachada de sua loja danificada.
"Todo mundo em Gaza perdeu, no mínimo, os vidros das janelas de casa", relatava um morador que ontem voltou para seu apartamento, no centro da cidade, após três semanas hospedado por parentes.
Segundo projeção do Escritório Palestino de Estatísticas, o prejuízo material em Gaza supera US$ 1,4 bilhão, agravando a crise econômica que assola a região desde que Israel impôs, há um ano e meio, um cerco para deixar o Hamas isolado -não há previsão de quando o bloqueio será levantado.
Antes mesmo dos ataques, mais de 80% dos 1,5 milhão de habitantes do território já era considerado pobre, e metade da população economicamente ativa não tinha renda fixa.
Os sistemas de energia elétrica e água não voltaram a funcionar plenamente, mas as ruas de Gaza voltaram a ter movimento, e muitos comerciantes abriram suas lojas - mais para avaliar o estrago do que para vender produtos.
Numa demonstração de força, o Hamas encarregou seus homens de voltar a coordenar o trânsito e a patrulhar as ruas de Gaza para prevenir crimes cometidos pelos prisioneiros que fugiram das cadeias destruídas.
Com "Financial Times" e agências internacionais
Texto da Folha de São Paulo, de 19 de janeiro de 2009.
Marcadores: Israel, massacre em Gaza, Palestina
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