As mentiras de Bush têm até carta falsa
As mentiras de Bush têm até carta falsa
FALTAM 76 DIAS para George Bush deixar a Casa Branca, levando para a história seu legado de mediocridade, mentiras e mandraquices. Seus oito anos de governo serão material para estudo dos fracassos. Uma coisa triste como visita a mina abandonada.
A campanha eleitoral e a crise financeira abafaram as revelações de um livro devastador, capaz de surpreender até os conspiromaníacos do antiamericanismo. É "The Way of the World" ("O Mundo como ele é"), de Ron Suskind, ex-repórter do "The Wall Street Journal".
Suskind conta que em março de 2003, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque, a Casa Branca recebera de duas fontes a informação de que Saddam Hussein não tinha armas de destruição em massa. A primeira viera de um ex-chanceler iraquiano que estava na folha de pagamento da Central Intelligence Agency (CIA). A segunda foi levada a Washington em fevereiro pelo chefe do Serviço Secreto inglês, sir Richard Dearlove. Essa informação era conhecida, mas não se sabiam as circunstâncias em que ela fora obtida. Suskind revelou que a fonte de Dearlove fora Michael Shipster, um dos melhores agentes do Serviço britânico, mistura de Peter O'Toole na estampa e de Lawrence da Arábia no gosto por motocicletas. Ele a obtivera de Tahir Habbush, chefe do Serviço de Segurança de Saddam.
Dearlove contou a Suskind que Bush poderia ter parado a máquina da guerra, mas até aí, por que alguém deve confiar numa história contada pelo chefe da polícia de Saddam?
Habbush entrou na lista dos criminosos de guerra procurados pelo governo americano. Era o valete de ouros no baralho com que Bush gostava de brincar. Cadê ele? Teria morrido. De qualquer forma, o Departamento de Estado informa que paga uma recompensa de US$ 1 milhão a quem souber do seu paradeiro.
O meganha voltou a ser notícia em dezembro de 2003, nove meses depois da ocupação do Iraque. Apareceu uma carta, datada de julho 2001, na qual Habbush contou a Saddam que o terrorista Mohammed Ata, da Al Qaeda, treinara num aparelho de Bagdá para "atacar alvos que desejamos destruir". De fato, em setembro, Ata comandou o ataque às torres gêmeas do World Trade Center.
Sempre se suspeitou que essa carta fosse uma fraude. Suskind revela que ela foi fabricada em 2003 com a ajuda da CIA, a partir de uma sugestão escrita em papel timbrado da Casa Branca. Pode ter sido escrita por Habbush, pois ele não morreu, assim como os americanos não o estão procurando. Pelo contrário, mora em Amã, meio recluso, depois de ter embolsado US$ 5 milhões pagos pelo governo americano por serviços prestados.
Mohammed Atta não esteve no Iraque no inicio de 2001. Quem esteve em Washington pouco tempo antes do aparecimento da carta num jornal inglês foi Ayad Allawi, um político iraquiano que comia no coxo da CIA. É provável que ele tenha sido o propagador da patranha.
Numa visão benevolente, a fraude destinava-se a influenciar a opinião pública iraquiana, mas ela acabou intoxicando os contribuintes americanos, e isso é crime.
Faltam 76 dias para que George Bush tenha que prestar contas, pelo mundo afora, às pessoas que, por acreditar na palavra do presidente dos Estados Unidos e de seu dispositivo de propaganda, botaram suas reputações no pano verde de um jogo trapaceado.
Texto de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo, de 5 de novembro de 2008.
Marcadores: Elio Gaspari, Estados Unidos, George W. Bush
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