quinta-feira, junho 19, 2008

Podres...

Estados e Estado podres

FORA DO RIO , causou apenas alguma e rápida comoção o fato de um ex-governador do Estado ter sido denunciado por formação de quadrilha armada. O apodrecimento do relativamente civilizado Rio Grande do Sul chamou a atenção nacional apenas pela história sensacional do vice-governador que grampeou um secretário de governo que admitia a corrupção no Estado.
Parece um dado da natureza que Alagoas possa passar mais de meio ano sem polícia, hospitais e escolas enquanto a Assembléia Legislativa se candidata à difícil disputa pelo título de a mais corrupta do Brasil. Alagoas, lembre-se, cujo patrão político é Renan Calheiros.
O comendador Arcanjo, chefe do crime organizado no Centro-Oeste, preso, continua a agir na região, com especial interesse no governo distrital de Brasília e em Mato Grosso, onde ganhou o título (tornou-se "comendador" graças à Câmara de Cuiabá) e tem placa de homenagem no Fórum de Rondonópolis. Governadores e ex-governadores de Alagoas, Maranhão e Sergipe foram denunciados por corrupção. Uma múlti francesa, a Alstom, diz na Europa que corrompeu parte do governo paulista. Etc. Um enorme etc.
O governo federal envolveu-se em outro caso de tráfico de influência -no mínimo. Trata-se da Varig, mas já houve a história da Brasil Telecom. Como o governo Lula mais e mais torna-se negociador e financiador de fusões & aquisições, isso tende a dar em mais besteira.
Segundo uma idiotice que circula na praça, o rolo da Varig decorreria da razia nas agências reguladoras, como se "agências técnicas" fossem imunes à bandalha. A politização dos negócios e a negociata política não derivam daí. O privatista governo FHC politizou a privatização das teles, na prática fechou a Aneel durante o apagão e nunca explicou o rolo da licitação do Sivam.
O Congresso investiga bandalhas, mal e mal, quando o escândalo se presta à picuinha política imediata.
Mas o Legislativo mesmo é parte do problema. Assembléias já têm bancadas do crime organizado ou os deputados eles mesmos organizam o crime. Segundo a Transparência Brasil, mais de 35% do Congresso responde a processos na segunda ou terceira instâncias ou já foram condenados até pelos ausentes Tribunais de Contas. No Rio, mais de metade da Assembléia é caso de polícia.
Em Goiás, três quartos. Em Rondônia e Alagoas, cerca de 60%. Gente como Arcanjo e máfias do jogo já entraram no Parlamento, financiam campanhas e capturam setores dos governos. Nem se mencionem os velhos porém vivos esquemas de corrupção armados pelos grandes fornecedores do governo.
Nas bancadas do crime, tráfico, jogo, contrabando, grupos de extermínio e a corrupção de pagamentos públicos começam a se cruzar, em certos casos com apoios no Judiciário.
O Estado entrou em falência imunológica de justiça. Ainda que Ministério Público e Polícia Federal estejam ativos, os processos redundam em raras condenações, e tais instituições têm mais papel reativo.
O problema principal é que o trânsito da bandalha está livre no núcleo dos Poderes, os quais regulam as demais instituições e deveriam ser quase imunes à expansão criminosa, mas que agora são dela cúmplices.

Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo, de 10 de junho de 2008.

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