quinta-feira, janeiro 21, 2010

Cuba e Alemanha

Revolução Cubana e Alemanha reunificada

DOIS LIVROS do historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira acabam de ter nova edição: "A Reunificação da Alemanha" e "De Marti a Fidel". O título do primeiro livro é autoexplicativo; o do segundo é uma análise da Revolução Cubana até hoje.
O que há de comum entre os livros é o fato de os dois países terem vivido a experiência do estatismo ou do socialismo real; o que há de diferente é o fato de que, na antiga Alemanha Oriental, como nos demais países do Leste Europeu, não há mais comunismo, enquanto em Cuba o regime autoritário continua forte. Como explicar esse fato?
Moniz Bandeira naturalmente não se coloca essa questão, mas é possível perceber sua atitude favorável a Cuba e contrária à experiência comunista na Alemanha. No prefácio à segunda edição de "De Marti a Fidel", ele ressalta a violência dos EUA em relação ao regime cubano, as tentativas explícitas de sua desestabilização e, depois que Fidel Castro, doente, se afastou do governo, o número de vezes que a diplomacia e o sistema de inteligência americano "mataram" Fidel e o regime. Por que essa diferença de atitude?
Há uma diferença fundamental entre os países do Leste Europeu e Cuba. Naqueles países, inclusive na Alemanha Oriental, não houve uma revolução de independência nacional após a Segunda Guerra Mundial, mas sua submissão forçada ao imperialismo da União Soviética, enquanto, em Cuba, o imperialismo anterior e posterior à revolução foi sempre dos EUA, e a Revolução Cubana foi uma revolução de libertação nacional, que, depois, buscou se associar à União Soviética.
Isso faz uma imensa diferença, porque os europeus, ao se livrarem do comunismo, estavam se livrando também de uma potência imperial vizinha, enquanto os cubanos, se decidirem terminar sua experiência de socialismo real, provavelmente alienarão sua independência real aos Estados Unidos. A "democracia" significará o retorno ao poder das elites anticastristas de Miami.
Entretanto o fracasso do sistema comunista na Europa oriental, como o colapso da União Soviética, foi também um fracasso econômico. O sistema planejado revelou-se incapaz de coordenar com eficiência sistemas econômicos que já haviam ultrapassado o estágio da industrialização pesada e requeriam a criatividade e a inovação que só os mercados garantem. Conforme afirma Moniz Bandeira no final de seu livro sobre Cuba, "o que a Revolução Cubana promoveu, não obstante alguns dos seus feitos, como a melhoria dos níveis de saúde, baixando significativamente a mortalidade infantil, e a eliminação do analfabetismo, foi a socialização da pobreza".
Não será esse fato que levará também a experiência cubana ao fracasso? É possível. No momento, os cubanos estão apostando na via chinesa, ou seja, na abertura para o capitalismo antes da abertura para a democracia. Na China, a estratégia foi bem-sucedida; em Cuba, as condições são muito diferentes e as resistências ao aumento das desigualdades que essa opção representará são grandes, mas é preciso aguardar.
O que é certo é que os cubanos não querem novamente se subordinar aos EUA e às elites cubanas corruptas e autoritárias que os americanos apoiam. Querem o desenvolvimento econômico e a democracia e sabem que a dependência em relação ao vizinho não é o melhor caminho nessa direção. Será o chinês? Ou haverá uma alternativa de desenvolvimento independente, mas democrática? Apenas os próprios cubanos poderão responder a tais perguntas.

Texto de Luiz Carlos Bresser-Pereira, na Folha de São Paulo, de 18 de janeiro de 2010.


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