Morre embaixador americano que apoiou o golpe de 1964 no Brasil
Morre embaixador dos EUA que apoiou o golpe de 1964
Lincoln Gordon propôs envio de frota para ajudar militares que derrubaram Jango
Presidente brasileiro caiu antes da chegada dos navios norte-americanos; depois, diplomata passou a negar seu envolvimento no golpe
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Morreu no sábado, aos 96 anos, o diplomata e acadêmico Lincoln Gordon, embaixador dos Estados Unidos no Brasil durante o golpe militar de 1964, na véspera do qual propôs ao governo norte-americano a formação de uma força-tarefa naval que, se preciso fosse, zarparia para a costa brasileira para ajudar as forças que acabariam por derrubar o governo de João Goulart (1961-1964).
A ação foi aprovada pela Casa Branca de Lyndon Johnson (1963-1969) e ganhou o nome de Operação Brother Sam. Goulart caiu antes que os navios -um porta-aviões e seis contratorpedeiros- chegassem. Gordon foi embaixador no Brasil por mais dois anos, até 1966, quando regressou a Washington e assumiu a reitoria da Universidade Johns Hopkins.
O diplomata passaria a próxima década negando a participação no golpe, mas seria desmentido pelas evidências históricas -pelos documentos então sigilosos que foram sendo tornados públicos pelos EUA, pelo trabalho de repórteres como Marcos Sá Corrêa, que em 1976 descobriu a papelada que comprovava a operação naval, e pela reconstrução minuciosa de Elio Gaspari em seus livros sobre a ditadura no Brasil.
Nos últimos anos, ficou-se sabendo que, no próprio dia 1º de abril de 1964, o então embaixador mandou recados de Washington a governadores e militares rebelados; seis meses antes, tinha sido autor de "Um Plano de Contingência", no qual de certa maneira já antecipava a Operação Brother Sam.
Segundo escreve Gaspari no livro "A Ditadura Envergonhada", "a costura militar do embaixador era antiga. Era anterior ao plebiscito [de janeiro de 1963] que devolvera os poderes presidenciais a Jango e se baseava no receio de que se estivesse caminhando para uma ditadura "pessoal e populista"." Segundo o relato, Gordon e o presidente John F. Kennedy (1961-1963) falaram sobre o assunto já em 30 de julho de 1962.
Ele fora apontado para o cargo no Brasil por JFK em 1961, recusando outro hierarquicamente superior. Vinha de ajudar o novo governo na formação da Aliança para o Progresso, programa assistencialista do presidente democrata para dissuadir países da América Latina a passar para a órbita de influência da União Soviética.
Abraham Lincoln Gordon nasceu em 10 de setembro de 1913 em Nova York. Professor de economia de Harvard, estava ligado no fim da vida ao instituto Brookings. Viúvo, deixa quatro filhos. Em 2001, lançou um livro em que fala da passagem pelo Brasil, "A Segunda Chance do Brasil" (Senac).
Notícia da Folha de São Paulo, de 22 de dezembro de 2009.
Marcadores: Brasil, ditadura militar, Estados Unidos, Golpe de 1964, política externa dos Estados Unidos
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