terça-feira, abril 07, 2009

Ansiedade dificulta sonho de Israel

Ansiedade dificulta sonho de Israel

Ethan Bronner, do "New York Times", tem feito alguns relatos muito importantes de Israel nas últimas semanas, registrando o senso de isolamento de Israel, seu esforço para renovar sua imagem e o exame de consciência coletivo suscitado pelos relatos de soldados e oficiais sobre o que testemunharam ou atos dos quais participaram durante a matança insensata de civis na faixa de Gaza.
O paradoxo de Israel é este: é uma potência hegemônica na região, próspera e criativa, dotada de armas nucleares e protegida por um muro de alta tecnologia -mas é corroída por dúvidas sobre ela própria, sentimento que parece crescer no mesmo ritmo que sua hegemonia militar.
Como escreveu o cientista político israelense Shlomo Avineri, a ideia original era que Israel não apenas tiraria o povo judeu do exílio, como também que o exílio "seria tirado do povo judeu". Após os milênios de marginalização e de Auschwitz, o Estado deveria criar o que David Ben Gurion descreveu como "um povo autossuficiente", em lugar de um povo "pendurado no ar".
O estado de espírito descrito por Bronner traz amplas evidências de que, 61 anos após a criação do Estado moderno de Israel, a sensação de estar "pendurado no ar" persiste.
Os protestos contra Israel se multiplicam pelo mundo. Dentro do país, crescem as diferenças entre os judeus e a minoria árabe, enquanto nacionalistas religiosos e liberais seculares disputam o controle do Exército. O Ministério da Defesa foi obrigado a repreender o rabino-chefe das Forças Armadas, general Avichai Rontzki, que vive num assentamento na Cisjordânia, quando se constatou que um livreto distribuído aos soldados incluía um edito rabínico contra atos de misericórdia para com o inimigo.
É inegável que pouca misericórdia foi manifestada em Gaza, onde centenas de civis estiveram entre os 1.400 mortos. Ao todo, a operação fez pouco sentido estratégico: o Hamas e seus foguetes seguem presentes, e o prejuízo à imagem de Israel em todo o mundo tem sido devastador. Como observou Avi Shlaim, professor de relações internacionais e ex-soldado israelense, a ofensiva em Gaza seguiu a lógica de "um olho por um cílio", em lugar do tradicional "olho por olho".
Pressenti isso ainda no início da operação em Gaza, ao ler uma declaração do porta-voz do governo israelense, Mark Regev: "Na sala do gabinete, hoje, havia uma energia e a sensação de que, após tanto tempo de contenção, finalmente tínhamos agido". Energia? Mas para que finalidade? Como mostrou a guerra contra o Hiz-bollah no Líbano, em 2006, o uso de força por Israel não ajuda a resolver o dilema existencial do país. Em lugar disso, redobra a ansiedade nacional.
A única possibilidade de avanço requer de Israel um cálculo diferente de sua segurança, que veja a conquista da paz como sua primeiríssima prioridade -não a qualquer preço, claro, mas a algum preço. Será preciso chegar a quatro termos comuns fundamentais, conforme recomenda um novo relatório do influente Council on Foreign Relations, com sede nos EUA: 1) Abandonar quase todos os assentamentos, para chegar à solução de dois Estados baseada nas fronteiras de 4 de junho de 1967, com trocas menores e recíprocas de terra onde necessário.
2) Estabelecer Jerusalém como sede das capitais israelense e palestina, além de arranjos especiais para a Cidade Velha que garantam a todas as comunidades o acesso livre a locais sagrados. 3) Uma compensação financeira ampla aos refugiados palestinos, assistência para seu reassentamento no novo Estado palestino e outras medidas para tentar resolver o sentimento deles de terem sido injustiçados.
4) Concordar com o envio de uma força multinacional, provavelmente liderada pelos EUA, durante um período de transição de segurança. Infelizmente, não prevejo que o premiê israelense designado, Binyamin Netanyahu, siga esse rumo, a não ser que Barack Obama consiga operar milagres. O resultado será apenas o mal-estar e o isolamento ainda maiores de Israel. Renovação de imagem não pode resumir-se a mudanças superficiais.

Texto de Roger Cohen, no The New York Times, reproduzido na Folha de São Paulo, de 30 de março de 2009.


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