Ego (IV): O Brasil discute Obama: Lula é o cara?
Brasil discute Obama: Lula é o cara?
Claudio Leal
Lula é o cara. O chapa de Obama. Obama, o cara. "This is my man, right here, I love this guy", jorrou o presidente dos Estados Unidos na cúpula do G-20, ontem, em Londres. E ainda completou: "É o político mais popular da Terra."
(Por ora, sem o ronco da cuíca).
Na tradução da BBC, Lula é o cara. Subindo o tom, cheio de chinfra, Barack Obama alardeou a "boa-pinta" do colega.
(Agora, sim, a cuíca).
Mais tarde, Lula brincou: Obama bem que podia ser "baiano". Jogados assim, com charme, os confetes maltrataram o coração dos opositores do pernambucano de Garanhuns. Como na marchinha de Mário Lago, o mundo debate a sinceridade de "Aurora". De Obama, o chapa.
O deputado federal ACM Neto (DEM-BA) não acha que Lula é o cara. Afina o discurso e vê com naturalidade, ham-hum, o elogio internacional.
- Eu acho que, primeiro, dentro de um ambiente daquele, do G-20, onde os presidentes discutiram as saídas para a crise, é natural esse tipo de declaração, não tem nada demais. Acho natural.
Frasista afiado, o senador Arthur Virgilio (PSDB-AM) está longe de chamar o presidente de "my man", mas reconhece:
- Foi simpático.
Não, Virgilio não foi sintético. Depois de reconhecer a simpatia, recuperou o fel.
- Se ele estabelece uma relação pessoal com o presidente Obama, levando adiante a boa relação que tinha com Bush, semelhante à que o presidente Fernando Henrique Cardoso tinha com o Clinton, é bom pro Brasil. Mas, eu precisava conhecer melhor o presidente Obama. Não sei o tom, o que está em jogo... Não é um concurso pra ver quem fica popular. A crise transforma todos eles em impopulares. Ninguém é candidato a Xuxa nem a Roberto Carlos.
Epa, epa. Há divergência no terreiro. Convidada a opinar, do alto do edifício Chopin, no Rio de Janeiro, a socialite Narcisa Tamborindeguy rebate:
- O que ele quer dizer com isso? É de Xuxa pra cima! Claro que é. Política é popularidade. Você nunca vai ganhar nada sem popularidade. Eles têm inveja.
Lula conquistou Obama, que encantou Narcisa, que se enamorou por Lula.
- Super-simpático. Amei o elogio de Obama. E são os dois bem diferentes, um negro e um outro que não fez faculdade. Simpatizo mais depois que o Barack simpatizou. São os dois mais diferentes do mundo. Ele é o cara. Se Obama falou, é o cara. Sou Lula.
Para a socialite, o presidente americano dá um show de "elegância e poder". E, olhaí rapaziada, começa a ver charme em Lula:
- Adorei ele dizer que é chique emprestar ao FMI - confessa Narcisa.
De volta a ACM Neto, rápido. O congressista democrata elenca ponderações. Como se entrasse num saloon, saca um argumento de descabelar petistas. FHC é o cara.
- Quem primeiro posicionou o Brasil, internacionalmente, foi o presidente FHC. Lula desfruta desse esforço do passado, recebe os louros de decisões que foram tomadas no passado. Deve-se essa posição à força do País, da sua economia, ao esforço de anos.
Na caixa de comentários do blog "Obra em Progresso", o compositor Caetano Veloso, que traduziu um artigo de Maureen Dowd, do New York Times, sobre Lula e os "olhos azuis" da crise, fez questão de registrar:
- Publiquei o texto de Maureen Dowd porque me interessa muito o fato de Lula estar bombando. Gosto muito disso. Somos espirituais.
"Tem algum melhor?"
"Amigo demais" de Lula, Damião Macedo reside num bairro popular de Salvador e trabalha como contínuo num jornal local. Damião não tem dúvida:
- Lula é o cara mesmo. Tem algum melhor? Antes de ser presidente, ele ia sempre lá na minha rua - garante. Não tenho nada contra Lula, tenho contra quem faz as coisas erradas e não assume. Zé Dirceu fez merda, Genoíno fez merda, Delúbio foi na usura demais...
Em 2002, o então candidato Lula abraçou o "amigo baiano", ao encontrá-lo pela primeira e única vez na redação do jornal A Tarde. Damião gritou:
- Lula, se eu já votava em você quando perdia, imagina agora que você vai ganhar!
Guarda uma queixa dos assessores do "cara":
- Eu sou o cara junto com ele. Tenho acesso a Lula em tudo que é canto. Anotei os números dele. Já liguei muitas vezes. O problema é que não passam a ligação...
Via das dúvidas, pediu ao jornalista Levi Vasconcelos pra escrever um bilhete ao presidente da República, em recente visita à Bahia: "Lula, aqui é seu amigo Damião. Preciso falar urgente com você. Se estiver em Salvador, me ligue nesses números..." O assunto é pessoal.
"Vértice do mundo"
Opositor de Lula, o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) acredita em resultados diplomáticos positivos após as juras de amizade dos dois presidentes.
- Acho que é muito positivo, ambos são pessoas muito simpáticas. A amizade deles pode fortalecer as relações entre Brasil e Estados Unidos.
OK, mas Obama foi sincero?
- A gente faz saudações de simpatia... Ele não fez uma pesquisa de simpatia no planeta pra ver quem é popular. Mas, nem sempre quando você é simpático, você é sincero. É a vontade de agradar - avalia Gabeira.
O tropicalista Jorge Mautner guarda uma interpretação histórica do fortalecimento da liderança do Brasil no mundo. Mautner curtiu o gesto de Obama e recebe "com a maior felicidade a realização do sempre falado papel do presidente Lula como o maior estadista do século 21, de um Brasil universal". O autor de "Maracatu atômico" e "O Vampiro" analisa as origens dessa vocação universalista:
- A importância vem de muitos fatores, do que se fabricou aqui. José Bonifácio de Andrada e Silva ("Patriarca da Independência") falava de nossa "amálgama" tão difícil de ser feita, em relação a outros povos. Temos essa amálgama, os outros têm diversidade. Amálgama é miscigenação, é mistura. Mas, além de mistura, é a capacidade do brasileiro de interpretar tudo num instante, admitir nessa interpretação os pensamentos contrários e abrir a possibilidade do caminho do meio.
Mautner lembra que o poeta americano Walt Whitman ("uma mistura de Olavo Bilac e Castro Alves") já anunciava: "o vértice da humanidade será o Brasil".
- Essa proximidade de Lula e Obama é Walt Whitman. Ontem estive com (Gilberto) Gil e ele me contou como é impressionante o desejo do mundo de ser brasileiro, de seguir esse caminho do meio, dominando a emoção, e não abstrações mecânicas.
Os avisos da história não param aí, alerta Mautner. Uma sessão de cinema estava fincada na palma da mão de Stanley Ann Duham, a mãe do cara de lá.
- Antes de conceber Obama, ela assistiu ao filme "Orfeu Negro" (de Marcel Camus), baseado em Vinicius de Moraes. Ela ficou enlouquecida. Uma história da Grécia adaptada a um morro brasileiro. Ficou encantada com a beleza da negritude. Pouco depois, ela se apaixona pelo homem que seria o pai de Obama, um negro do Quênia - conta o tropicalista.
Vinicius de Moraes é o cara.
Texto do Terra Magazine.
Marcadores: Barack Obama, Luis Inácio Lula da Silva, Lula
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