De Abreu e Lima para Lula - Mais um da série "correios eletrônicos do além"
De Abreu.e.Lima@edu para Lula@gov
COMO A MAIORIA dos brasileiros, o senhor deve ter se surpreendido quando soube que os venezuelanos queriam dar o nome do general Abreu e Lima à refinaria que a Petrobras constrói em Pernambuco. Pudera, eu morri em 1869, aos 72 anos, e a história do nosso país está mal contada. Melhor dizendo, está bem contada pelos que gostam de esconder os feitos do povo. Meus inimigos tentaram ridicularizar-me com o apelido de "general das massas". Vi o fuzilamento de meu pai em 1817. Combati ao lado de Simon Bolívar na guerra pela independência da América Espanhola. Fui de capitão a general e voltei ao Brasil só com algumas condecorações, que acabaram roubadas. Os colegas enricaram. Minha última batalha deu-se com o bispo do Recife, dom Cardoso Ayres, que me negou sepultura no cemitério de Santo Amaro. (Outro dia d. Hélder Câmara disse que, por causa da invasão dos protestantes, de vez em quando o Padre Eterno manda para Recife um bispo com parafuso solto.) Escrevo-lhe esta carta a pedido do Barbosa Lima Sobrinho, que sempre fala bem do senhor.
Por favor, não deixe que meu nome seja associado a uma obra que contraria minha fé no progresso e no gênero humano. A refinaria Abreu e Lima foi projetada para custar R$ 9 bilhões. Os fornecedores de obras e equipamentos já estão pedindo R$ 23 bilhões. Uma unidade de coque foi orçada em R$ 15 bilhões. Não vale a quinta parte disso. Felizmente vocês cancelaram essa licitação. Espero que levem adiante a faxina. As grandes empreiteiras engoliram as empresas de engenharia que operavam no setor, juntaram-se e fizeram um cartel, como faziam no Recife os comerciantes portugueses.
Ao contrário do que se presume, não gosto desse coronel Hugo Chávez. Ele acha que porque escrevi um livrinho intitulado "O Socialismo", eu sou aquilo que vocês denominam de socialista. Isso é coisa de quem fala sem ler. Meu socialismo é a visão de uma sociedade de congraçamento, não é ciência, doutrina, religião, seita ou sistema. Tenho horror a confisco de propriedades e abomino os comunistas, gente odiosa. Aliás, nunca li nada desse Karl Marx e acho-o um chato, intratável. Aqui ele só tem um amigo, o Luiz Carlos Prestes.
Quando a Petrobras concordou em me homenagear, interessei-me pelos seus assuntos e tenho conversado com o Getúlio Vargas, que criou a empresa. É um homem discreto, mas outro dia deixou escapar que estão fazendo coisas tão agressivas e primitivas que lhe parecem ideias do Gregório Fortunato, um negro enorme que sempre o acompanha, mas não me parece muito inteligente. Vargas me contou alguns casos de fúria arrecadadora durante a campanha eleitoral em que o senhor se reelegeu. Assustei-me ao saber de presidente de empresa telefonando para fornecedor e ministro pedindo hora. Já lhe contaram que a Petrobras quer o investimento venezuelano, mas não quer dar ao Chávez uma rede de distribuição? Acho até que faz muito bem, mas o coronel não é bobo, haverá de segurar o dinheiro.
Não falo de seus colaboradores, mas devo chamar sua atenção para o grau de exposição a que estão submetendo nosso governo. Daqui podemos ver a campanha presidencial do ano que vem e, pelo que me recordo das baixezas de 2002, ela vai além.
Como pernambucano e meio xará, subscrevo-me,
José Ignácio de Abreu e Lima
Texto de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo, de 25 de março de 2009.
Embora que ache que os textos de Elio Gaspari que copio por aqui se justificam por eles mesmos, no caso deste eu copiei porque achei engraçado. Engraçado com um humor contido.
Marcadores: Elio Gaspari, Governo Lula, Petrobrás, Refinaria Abreu e Lima
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