O cassino e os BCs
PARIS - Os banqueiros centrais do planeta finalmente descobriram a pólvora, embora com fenomenal atraso. O relatório anual do BIS (Bank of International Settlements, mais conhecido como o banco central dos bancos centrais) percebeu que a economia mundial está em situação "crítica". É verdade que os banqueiros dizem "talvez crítica", o que não deixa de ser um tributo que o vício da moderação excessiva presta à virtude de aceitar os fatos como são.
O BIS reconhece também que o que chama de "certas mutações financeiras" tiveram "efeitos secundários lamentáveis". Critica o surgimento de "empréstimos de qualidade cada vez mais medíocres, que depois foram vendidos a investidores crédulos".
Todo esse linguajar meio cifrado é para dizer que o cassino em que se transformou boa parte do jogo financeiro no planeta chegou ao pico com as tais hipotecas "subprime", que estão causando "as turbulências atuais nas principais praças financeiras", e que "não têm precedentes no pós-guerra" (ou seja, desde 1945).
Pergunta o BIS: "Como pôde desenvolver-se um sistema bancário paralelo tão importante sem que as autoridades expressassem claramente suas preocupações?" Como é mesmo? Os bancos centrais não são autoridades? Não cabe a eles, precisamente a eles, supervisionar os bancos? Esse pessoal ficou assistindo da arquibancada todas as apostas no cassino que agora chamam de "sistema bancário paralelo". Quando a banca quebrou ou tomou um baita prejuízo, aí as autoridades, que eram espectadoras, resolvem fazer às vezes de colunistas de jornal e criticar o que não vigiaram quando deveriam fazê-lo.
Não seria mais honesto aceitar que são também culpados e, melhor ainda, pensar em adotar regulações que pelo menos ponham alguma ordem no cassino?
Texto de Clóvis Rossi, na Folha de São Paulo, de 1o. de julho de 2008.
Marcadores: banco central, bancos centrais, capital especulativo, especulação
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