A segurança jurídica do brasileiro
A "segurança jurídica" do brasileiro
Atualizado em 05 de janeiro de 2010 às 17:16 | Publicado em 05 de janeiro de 2010 às 16:50
por Luiz Carlos Azenha
Alguns acidentes são meros acidentes. Infortúnios. Falta de sorte. Resultam de uma conjunção de fatores sobre os quais não temos qualquer controle. Mesmo que tivéssemos, talvez não fosse possível evitar a conjunção de todos eles em um dado momento.
Há, porém, acidentes e situações evitáveis. Eu, por exemplo, jamais viajaria com minha família de automóvel pela via Dutra. Sozinho, sim. Se algo acontecer, serei a única vítima. Mas com a família, jamais. Não tem a ver com a rodovia, em si, mas com a combinação de motoristas ruins, motoristas irresponsáveis e caminhões pesados. Em caso de acidente na Dutra o risco de você ser atropelado por uma carreta é muito maior que em outras rodovias onde o trânsito de caminhões é menor. Simples assim.
Já nos casos de desabamento do período de chuvas o risco é muito menor. Sim, uma pousada caiu, mas quantas ficaram em pé?
O problema, em minha opinião, é que as autoridades "responsáveis" frequentemente são as primeiros a burlar a lei. Vejam o caso das usinas de Angra dos Reis, por exemplo, construídas em uma região onde a principal saída de emergência é a Rio-Santos, que mal dá conta de escoar o trânsito de fim de ano. Pergunto: alguém realmente acredita que, em caso de emergência nuclear, existe um plano de fuga e resgate que efetivamente funcione? Pela Rio-Santos? Em não sendo pela rodovia, vai ser de barco? De avião?
Você, caro leitor, deve se dar conta de que o Brasil é o país em que um ponto de ônibus desaba e mata uma pessoa que esperava a condução. Alguém aí acredita que haverá responsabilização cível ou criminal? Aqui na minha rua uma árvore caiu ontem. Poderia muito bem ter matado uma pessoa. Por sorte, não matou.
Não é que faltem leis no Brasil. Elas existem. Mas são "adaptadas" ao gosto do freguês. A lei é uma para o Daniel Dantas, que dispõe dos recursos financeiros para promover todas as chicanas, golpes e campanhas difamatórias em sua defesa. Ele também dispõe de "facilidades". Mas para você a lei é outra. E, sendo assim, a tal "segurança jurídica" de que tanto falam nossos colunistas, quando se trata de garantir os "investidores estrangeiros", é nenhuma para você. Brasileiro não tem segurança jurídica.
Poderíamos, em tese, recorrer à mídia, que ganha seus trocos posando de quarto poder e vendendo o mito da imparcialidade e da neutralidade. Não vamos nem ingressar no debate sobre a mídia como representante de uma classe. Nem é preciso. Fiquemos na miudeza, mesmo. Hoje os grandes patrocinadores da imprensa escrita são as construtoras e seus empreendimentos imobiliários. Não é por acaso, portanto, que não se debate nela a especulação imobiliária -- a não ser de forma etérea, como conceito geral -- nem o tratamento desigual dado às invasões pé-de-chinelo e à grilagem chique, patrocinada pela Kátia Abreu, por exemplo.
Olhem para o adensamento populacional que neste exato instante acontece ao longo da marginal do Tietê, ao mesmo tempo em que pistas são construídas para desafogar o trânsito. Dinheiro público é torrado para promover um projeto eleitoral do governador de São Paulo, uma obra cujo prazo de validade é curto, ao mesmo tempo em que as autoridades locais permitem o adensamento populacional em torno da via que pretendem desafogar!
Assim é, também, nas pousadas de luxo e na ocupação ilegal e criminosa promovida por interesses ligados à especulação imobiliária ao longo do litoral brasileiro, nas ilhas, nas áreas de proteção ambiental e nos santuários ecológicos. Houve uma operação da Polícia Federal ligada à concessão de licenças ambientais em Angra dos Reis. Pessoas foram presas. Mas as obras, de acordo com denúncia de um vereador da cidade, o Antonio Cordeiro, continuaram normalmente. Foi o que ele disse à TV Brasil. Obras, presumo, resultado das licenças fraudulentas. Se confirmado, isso seria uma enormidade.
Vamos esperar para ver se dessa vez a mídia brasileira vai fundo e não fica apenas na superfície de mais uma tragédia brasileira.
PS: Já viram briga de rua nos Estados Unidos? Todo mundo briga com as mãos para trás. Para evitar agressão física, que dá processo e indenização pesada. A justiça é rápida. A isso se chama "segurança jurídica"...
Texto do Luiz Carlos Azenha, no Vi o Mundo.
Marcadores: Brasil, direitos do cidadão
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