sexta-feira, abril 03, 2009

26 de março de 2009: Israel em dois textos do jornal Folha de São Paulo

No primeiro texto, o embaixador de Israel no Brasil, Giora Becher, afirma que Israel está pronto para a paz (lembrando que nesta data se comemoraria o 30º. aniversário da paz entre Israel e Egito, nos acordos de Camp David) “quando o outro lado decidir abandonar o caminho da violência e seguir o caminho das negociações”. Cita que Israel abandonou o sul do Líbano, que ocupava ilegalmente, para receber quatro mil mísseis do Hezbollah, mas esqueceu de dizer que se Israel não tivesse ocupado o sul do Líbano, talvez nem mesmo viesse a existir um Hezbollah. Cita que Israel abandonou Gaza, que também ocupava ilegalmente, e em troca começou a receber os foguetes Qassam nas cidades do sul de Israel. Mas talvez Israel tenha abandonado Gaza, para ocupar com mais tenacidade a Cisjordânia. Cita que Yasser Arafat recusou a oferta “generosa” de Ehud Barak, então primeiro-ministro israelense, em 2000 e iniciou a nova Intifada. Sobre isso a dizer que a oferta de Barak foi uma genérica oferta, nunca devidamente mapeada, e que há dúvida sobre se a Intifada foi iniciada por ordem de Arafat, ou em reação à invasão de Ariel Sharon, então líder do Likud, e seus guarda-costas à Esplanada das Mesquitas em Jerusalém.

O segundo texto é uma notícia. Neste momento, Benjamin Netanyahu, líder do Likud, está em negociações para formar um novo governo em Israel. Em suas negociações aparentemente ele planeja aumentar os assentamentos na Cisjordânia, que são ilegais, e um impedimento de fato à negociação com os palestinos.

A minha impressão é que a notícia desmente o embaixador.

Lições de três décadas de paz

GIORA BECHER


Israel sempre fará a paz quando o outro lado decidir abandonar o caminho da violência e seguir o caminho das negociações




HOJE, 26 de março, comemoramos o 30º aniversário da assinatura do primeiro acordo já assinado entre Israel e um país árabe. Em 1979, os líderes de Israel, Begin, do Egito, Sadat, e dos Estados Unidos, Carter, deram um aperto de mão que prometia mudar o Oriente Médio.
Apesar de essa promessa ainda necessitar ser totalmente cumprida, a data apresenta uma oportunidade de honrar essa realização histórica e examinar alguns princípios que levaram ao sucesso daquele processo de paz. Hoje, quando a paz parece um objetivo difícil de ser alcançado, é importante lembrar o passado.
Os esforços de Israel para obter a paz precederam o próprio estabelecimento de Israel, que, desde seus primeiros dias, sonha em viver em paz com seus vizinhos. Com a visita de Sadat a Jerusalém (1977), essa visão finalmente teve uma chance de se tornar realidade. Para alcançar a paz com o Egito, Israel tomou medidas sem precedentes e devolveu o Sinai, correspondente a 91% da área ganha na Guerra dos Seis Dias, território três vezes maior que sua área atual.
Naquele local, Israel havia construído cidades e aldeias agrícolas com mais de 7.000 habitantes, hotéis, instalações militares e um campo petrolífero, cuja entrega significou o abandono da única chance de se tornar independente no campo da energia. Na era cínica da atualidade, é difícil imaginar a euforia com que Israel saudou a visita de Sadat. Mesmo durante os meses de difíceis negociações, nós nunca perdemos o foco de nosso tão ansiado sonho.
Hoje, a mesma esperança existe, mas experiências amargas têm nos tornado mais cautelosos. Em 2000, nas negociações de Camp David, os palestinos tiveram a chance de finalmente terminar o conflito, mas Arafat rejeitou as propostas e lançou a segunda Intifada, que custou milhares de vidas israelenses e palestinas.
Naquele mesmo ano, Israel saiu completamente do Líbano para ser recompensado, em 2006, com 4.000 mísseis do Hizbollah lançados contra suas cidades no Norte.
Em 2005, fez o desengajamento unilateral de Gaza, mais uma vez retirando famílias israelenses de seus lares. Nós tínhamos a esperança de que esse passo daria aos palestinos uma oportunidade de pacificamente plantar as fundações de seu Estado. Em vez disso, testemunhamos o crescimento do extremismo do Hamas e de disparos de foguetes contra o Sul de Israel.
Apesar desses acontecimentos, o governo de Israel sempre terá o apoio da população para fazer a paz, desde que os israelenses acreditem que o resultado será a paz genuína. Sadat, por ser o primeiro líder árabe a reconhecer Israel, perdeu sua vida. Anos depois, o primeiro-ministro de Israel Rabin deu sua vida pela causa da paz iniciando o processo de Oslo. Esses líderes sabiam que sua responsabilidade em relação ao futuro de seus povos era o mais importante.
Israel sempre fará a paz quando o outro lado decidir abandonar o caminho da violência e seguir o caminho das negociações. Durante o processo de Oslo, apesar de suas promessas, Arafat nunca abandonou a violência. Esse foi o motivo principal pelo qual o processo de paz com os palestinos falhou durante sua liderança e a verdadeira explicação de sua recusa em aceitar as propostas feitas por Israel. Da mesma forma que Sadat foi assassinado por fundamentalistas islâmicos por fazer a paz com Israel, hoje em dia os radicais estão tentando acabar com qualquer chance de paz com os palestinos.
O Hamas, apoiado pelo Irã, rejeita todas as negociações de paz por uma questão de princípios e continua comprometido com seu objetivo de destruir Israel, sendo assim uma barreira para qualquer chance de paz, condenando os palestinos a um futuro de conflito constante e o domínio do fundamentalismo.
As negociações diretas têm provado ser a garantia para o progresso. Os tratados de paz com o Egito e a Jordânia são a prova de que os líderes árabes desejam conversar diretamente com Israel. A paz é possível. A pressão externa não influencia as políticas de Israel em relação à paz. Ainda assim, quando existe uma chance para a paz, a pressão interna é mais do que suficiente. Para uma democracia como Israel, a confiança pública nas negociações de paz é crucial.
Os israelenses acreditam que a paz verdadeira pode ser obtida com os palestinos e outros vizinhos. Apesar das presentes dificuldades, os israelenses sonham que logo outro líder israelense se levantará ante o mundo e repetirá as palavras de Begin na cerimônia de assinatura há 30 anos: "Não mais guerra, não mais derramamento de sangue, não mais luto, paz sobre vocês, "shalom", "salaam", para sempre".

Este texto é do caderno do opinião da Folha de São Paulo, de 26 de março de 2009.

Netanyahu cita paz, mas pactua expansão de colônia

Novos assentamentos devem isolar setor palestino de Jerusalém da Cisjordânia

Colega de partido do futuro premiê, prefeito de colônia que crescerá com aplicação do plano diz ter garantias de viabilização das casas


DA REDAÇÃO

Um dia depois de atrair o Partido Trabalhista e selar a maioria parlamentar necessária para governar Israel, o linha-dura Binyamin Netanyahu, afirmou que irá negociar a paz com a Autoridade Nacional Palestina. Em contraste com a declaração, foi divulgado ontem que ele firmou um acordo secreto para expandir um assentamento israelense num setor estratégico da Cisjordânia.
Os sinais contraditórios refletem a tentativa do líder do Likud (direita) de contemplar agendas de seus principais aliados, na medida em que se prepara para assumir o posto de premiê na próxima semana.
Enquanto o compromisso firmado para contar com o respaldo dos trabalhistas prevê respeito aos acordos de paz firmados anteriormente por Israel, a expansão da colônia é uma das bandeiras do ultra direitista Israel Beitenu.
Em uma conferência sobre economia, Netanyahu afirmou ontem que a paz "é uma meta comum de todos israelenses e seus governos, o que significa que eu negociarei com a Autoridade Palestina pela paz".
A seguir, ele voltou a defender a tese de obtenção da paz por meio do desenvolvimento da economia palestina - ideia defendida durante a campanha eleitoral, como contraponto ao tradicional conceito de concessões territoriais, que pautou as tratativas pela paz desde os Acordos de Oslo (1993).

Verbal e secreto
Mais tarde, a rádio do Exército israelense noticiou que Netanyahu concluiu com o líder do Israel Beitenu, Avigdor Liberman, um acordo -verbal e secreto, para não irritar Washington- para expandir assentamentos numa área vizinha de Jerusalém Oriental (árabe).
Conhecida por setor E1, a área de 12 km2, seria incorporada à colônia de Maale Adumim, a segunda maior construída por Israel na Cisjordânia, com 33 mil habitantes.
Seu prefeito desde 1992, Benny Kashriel, é um antigo quadro do Likud e ontem afirmou ter recebido de Liberman a garantia de que o Israel Beitenu "fará o que for necessário para viabilizar as moradias".
Atualmente congelados, os planos de expansão preveem a construção de 3.500 residências (para 15 mil habitantes), um complexo comercial e a transferência da sede da polícia da região para o E1.
Há cerca de um ano, a chanceler, Tzipi Livni, e o premiê, Ehud Olmert (ambos do Kadima, que Netanyahu ainda tem esperança em cooptar para sua coalizão governista), trataram do E1. Eles foram enfáticos ao afirmar que a eventual retomada da construção na região só aconteceria mediante anuência expressa americana.
Os EUA e os palestinos são contra tal expansão, que isolaria o setor oriental de Jerusalém do restante da Cisjordânia - o que deve sepultar a meta da Autoridade Nacional Palestina de ter sua capital lá.
Em mais de uma oportunidade, o governo de Barack Obama já se manifestou contrário à ampliação dos assentamentos israelenses, por entender que prejudicam o processo de paz.

Com agências internacionais

Este texto é do caderno de notícias do mundo, na Folha de São Paulo, de 26 de março de 2009.


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