quinta-feira, outubro 09, 2008

Os "Varões de Plutarco"

Os “Varões de Plutarco”


Plutarco foi um filósofo e escritor antigo que viveu no primeiro século da era cristã, e escreveu diversas biografias, normalmente de grandes líderes, como Alexandre, o Grande, e Otávio Augusto.

O jornalista Mino Carta, atual diretor de redação da revista CartaCapital, costuma utilizar o termo “varões de Plutarco” como ironia com relação a pessoas que se querem arautos da moralidade, figuras impolutas, mas que podem praticar atos passíveis de recriminação vez por outra. Creio que entre os varões de Plutarco de Mino Carta, se incluem o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, os donos de grandes grupos de comunicação brasileiros, como Roberto Civita, dono da Editora Abril, que edita a revista Veja, Otávio Frias Filho, diretor de redação do jornal Folha de São Paulo, e do portal de Internet UOL, os irmãos Marinho, herdeiros de Roberto Marinho, donos do grupo Globo, que inclui a Rede Globo de Televisão, o jornal O Globo, a revista semanal Época, o Portal de Internet G1, entre outros veículos. Ainda, alguns membros da família Mesquita, donos do grupo Estado, que publica o jornal O Estado de São Paulo, ou o atual presidente do STF – Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes.

Pois este último, o ministro Gilmar Mendes, tem se tornado foco central da grande mídia desde que foi nomeado ministro do STF, pelo ex-presidente Fernando Henrique. E de forma ainda mais especial, desde que concedeu dois habeas corpus em 48 horas ao banqueiro Daniel Dantas, no decorrer de uma operação da Polícia Federal, chamada de Satiagraha. Os habeas corpus se destinaram a livrar o banqueiro, primeiro de uma prisão provisória, autorizada por juiz de primeira instância, que seguiu todos os ritos jurídicos cabíveis: os advogados do banqueiro haviam percorrido todas as instâncias do judiciário pedindo o documento que liberasse seu cliente da prisão; o segundo para liberá-lo de uma prisão preventiva, sob a acusação de tentativa de suborno de um delegado da Polícia Federal. Neste segundo caso, conforme tem sido noticiado, o ministro Gilmar Mendes atropelou os ritos de instância, e liberou o banqueiro sem que todas as instâncias anteriores tivessem sido vencidas. Estes dois habeas corpus, muito especialmente o segundo, gerou ondas de indignação contra o ministro, por parte da população em geral, policiais, membros da magistratura, procuradores da república e promotores de justiça, e manifestações a favor do ministro, por parte de advogados que atuam nas mais altas cortes do país.

O ministro Gilmar Mendes já era figura polêmica antes de ser nomeado ministro do STF. Como Advogado-Geral da República, do então presidente Fernando Henrique, contrariado com uma decisão da justiça desfavorável ao governo de que fazia parte, chamou o judiciário de “manicômio judiciário”. Entre tantos, este foi um dos fatos que mais causou estranheza quando ele aceitou ser indicado ministro do Supremo. Ele estaria passível de ser o chefe do poder que ele mesmo chamara de “manicômio”.


Tempos depois dos dois habeas corpus, a revista Veja publicou um diálogo entre o ministro Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres, do ex-PFL, informando que o tal diálogo era um transcrição de uma escuta ilegal telefônica da conversa entre os dois, feita pela Abin – Agência Brasileira de Inteligência, órgão responsável por fornecer informações à segurança institucional da Presidência da República. A revista Veja publicou o diálogo, mas não revelou a fonte, o que é direito dela, pois a Constituição Federal protege o sigilo da fonte, no caso de informação jornalística de interesse público, mas a revista também não divulgou a gravação do diálogo, o áudio, que teria gerado a transcrição.


O ministro Gilmar Mendes prontamente deu crédito à declaração da revista, e acreditou que a Abin fosse de fato a autora da “escuta ilegal”, e afirmou que estávamos vivendo em “um estado policial”, possivelmente querendo dizer que o governo federal a todos queria controlar e chantagear, pois, afinal, é para controlar e chantagear que são feitas escutas telefônicas ilegais (as legais, autorizadas pelo judiciário, são feitas para investigação). Cá para nós, eu acredito que estado policial exista para o cidadão médio, que não pode peitar um oficial de polícia que lhe pede documentos sem ter feito nada de errado, dizendo “você sabe com quem está falando?”. Pois se o cidadão reclamar do policial correrá o risco de ser preso por “desacato à autoridade”. A seguir o ministro da Defesa, Nelson Jobim, apareceu com uma versão que a Abin teria adquirido um equipamento de espionagem eletrônica que seria capaz que interceptar conversas telefônicas. Tudo isso acabou gerando o afastamento do diretor da Abin, o delegado aposentado da Polícia Federal Paulo Lacerda. Posteriormente, a Polícia Federal liberou um laudo informando que o “equipamento de espionagem eletrônica”, servia basicamente para perscrutar linhas telefônicas à procura de escutas ilegais, e que poderia ser usado para escutas ambientais, e de aparelhos móveis analógicos, que estão em extinção no Brasil (segundo notícias eram cerca de 0,038% dos aparelhos em uso no país, quando da divulgação do diálogo entre o ministro Mendes e o senador do ex-PFL). Diante do laudo da PF, o ministro Jobim afirmou que foi mal informado por um assessor, e o ministro Mendes disse que um laudo da PF não era suficiente para eliminar a suspeita sobre a Abin.

Agora, em sua mais recente edição, a revista CartaCapital informa que o ministro Gilmar Mendes é sócio de uma empresa educacional, especializada em Direito. E que esta empresa está crescendo, baseada, em grande parte, prestando serviços a órgãos estatais. Felizmente a reportagem está aberta no saite da revista eletrônica Terra Magazine. Legalmente não há nada de errado no caso do ministro Mendes ser cotista de uma empresa privada, mas na cabeça de qualquer um há de pairar dúvidas sobre um ministro do STF ser cotista de uma empresa que presta serviços a outras instâncias do judiciário, como o STJ – Superior Tribunal de Justiça, à Força Aérea Brasileira, à Controladoria-Geral da República, entre outros órgãos do Estado Brasileiro, e que contrata para dar cursos, justamente advogados que atuam junto ao STF.

E aqui passamos à nossa “grande mídia”. O jornalista criou o acrônimo PIG, para Partido da Imprensa Golpista (e para quem gosta de trocadilhos, “pig”, em inglês significa “porco”), onde ele denuncia que a grande imprensa atua como um partido político da grande burguesia brasileira, e que, por atuar como um partido, ela procura dificultar o governo do presidente Lula. Raramente ele nomeia explicitamente quem seriam os membros do PIG, mas eu normalmente associo a sigla à editora Abril, ao grupo Estado, ao jornal Folha de São Paulo, e aos veículos da família Marinho. Pois justamente, nesses veículos, há um estrondoso silêncio sobre a denúncia da revista CartaCapital. Não encontrei nada na Folha de São Paulo, ou na Folha Online, nem no Estado de São Paulo, nem na revista Veja, nem na revista Época. O jornal O Globo dá uma pequena nota, reproduzindo texto da Agência Brasil. Na Internet, nem o UOL, nem o G1, nem o IG comentaram a reportagem. Só o Terra, o fez dando chamada na primeira página, para texto de Bob Fernandes, do Terra Magazine. Ou seja, ao manter o foco quando o ministro Gilmar Mendes fala contra o Governo Federal, e manter silêncio quando o comportamento dele, ministro Mendes, é questionável, a grande imprensa parece mesmo agir como um partido político. E no interesse da grande burguesia brasileira.

O texto da Agência Brasil é onde se pode ver uma resposta do ministro Gilmar Mendes. Aparentemente sem ter lido a reportagem, afirmou que a reportagem era “um fenômeno de pistolagem jornalística”, e que tomaria as “providências ‘necessárias e cabíveis’” no caso. Este texto da Agência Brasil termina com o seguinte parágrafo: “Gilmar Mendes fez as afirmações ao deixar a cerimônia de encerramento do 11º Congresso Brasiliense de Direito Constitucional, promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público.”

Pois é. É o Instituto Brasiliense de Direito Público a empresa da qual o ministro Mendes é sócio.

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4 Comments:

Blogger Carlos Eduardo da Maia said...

Zé, a própria ABin e a PF NUNCA foram contundentes quando essa informação saiu na Veja. Se o grampo não foi feito e isso foi invenção, nem a ABIN e nem a PF alegaram isso. A ABIN é o antigo e tenebroso SNI. Alguém coloca a mão no fogo pela ABIN/SNI?

4:45 PM  
Blogger José Elesbán said...

Caro Maia,
Primeiro de tudo: o grampo existiu? Onde estão as gravações que originaram a denúncia da Veja? Se as gravações não aparecerem, como não apareceram até agora, talvez seja o caso da denúncia ser semelhante aos dólares bêbados de Cuba, ou os US$ 32 mil do presidente na Suiça ( a propósito, a denúncia do dinheiro no exterior foi atribuída a Daniel Dantas).
Então, vamos lá. O delegado Paulo Lacerda, superintendente da Abin disse perante o presidente, e perante o Congresso, que o grampo não foi feito pela Abin. O general Félix, superior hierárquico de Paulo Lacerda, disse ao presidente e ao Congresso, que o grampo não foi feito pela Abin. O Delegado Correa, superintendente da Polícia Federal, disse que a Polícia Federal não fez o grampo. O delegado Diógenes, disse que não grampeou.
Tu queres que estas autoridades venham à tua casa para te dizer que não fizeram tal coisa. Para haver veemência suficiente para ti?

11:47 PM  
Blogger José Elesbán said...

De qualquer maneira, a questão maior deste "post" é sobre o fato do defensor da república, ministro Gilmar Mendes, ser cotista de uma empresa de capital fechado, que presta serviços a diversas entidades do estado sem licitação.

11:50 PM  
Blogger José Elesbán said...

A Abin, desde os tempos de FHC não é mais o antigo SNI, tanto que nos seus áureos tempos, o SNI sempre foi dirigido por militares, o que não tem sido o caso, já faz bastante tempo.
Se podem haver meliantes lá. Talvez. Assim como vez por outra a Polícia Federal prende alguns de seus próprios agentes. Assim, como policiais civis podem ser corruptos, assim como certamente há juízes corruptos, e por aí vai.

11:53 PM  

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