João Sayad: Previdência Sustentável - Folha de São Paulo, 04/11/2006
DIZ-SE QUE ALGO é sustentável quando o que entra é exatamente igual ao que sai. Come, não engorda, nem emagrece; corta árvores e planta tantas quanto cortou; pesca tantos peixes quantos nascem.
Vivemos cada vez mais, por mais tempo. Nossos tetranetos poderão ser advogados até os cinqüenta anos; médicos nos quarenta anos seguintes; e morrer cercados pelo carinho dos próprios tetranetos.
Muito bom, ou muito ruim se ficarem sozinhos, ranzinzas, surdos ou esquecidos na mesma idade em que ficamos hoje.
Até quando tantos velhos cada vez mais velhos podem ser sustentados pelos jovens e adultos que estão trabalhando? A resposta é trivial: a Previdência é sustentável sempre que a renda per capita estiver crescendo. Ou seja, sempre que o trabalho dos aposentados não fizer falta. Se a condição não for atendida, o problema é falta de crescimento e não a Previdência.
Muitas coisas não são sustentáveis. A dívida pública com juro real de 10%, maior do que o crescimento do produto (3%), não é sustentável. A cada ano que se passa nessa situação, transferimos 7% do produto de quem trabalha para quem recebe juros sem trabalhar, os capitalistas aposentados. Em 10 anos, precisaríamos usar todo o PIB para pagar juros. Já passaram quatro anos.
A Previdência é um problema no mundo inteiro porque:
1) O número de aposentados cresce mais do que o número de trabalhadores.
2) Os salários dos ativos que financiam os inativos não crescem tanto quanto a produtividade (o ganho de produtividade gera mais lucros do que salário real).
3) O emprego aumenta pouco por causa das novas tecnologias.
4) A massa salarial (emprego vezes salários) não cresce tanto quanto a despesa com os aposentados. E os lucros não querem financiar aposentadorias.
5) Não adianta aumentar a idade da aposentadoria, pois faltam empregos. Se a idade de aposentadoria for atrasada, aumenta o número de trabalhadores no mercado, cai o salário e o problema se agrava.
No longo prazo, a solução é trabalhar menos e ganhar mais, ou seja, redistribuir os frutos de tantos sucessos. Uma idéia para o futuro, precisa tempo para vingar, se vingar. Enquanto isso, o mundo sofre de fartura.
No Brasil, a Previdência não é sustentável porque a renda per capita não cresce. O caso dos marajás não explica o crescimento das despesas com a Previdência. Mas atrapalha, pois atrai populistas que confundem a discussão. Para o Brasil, a maior parte da solução virá do crescimento, uma idéia do passado que não sabemos se vai vingar.
Marcadores: aposentadoria, desenvolvimento humano, previdência
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