quinta-feira, outubro 05, 2006

Mais Weisshemer: A Agenda das Privatizações





.
Colunista: Marco Aurélio Weissheimer

04/10/2006

IDÉIAS

A agenda da privatização morreu?

Nestas eleições, candidaturas tucanas tentam fugir do tema das privatizações. Garantem que não pretendem privatizar nada. Declarações gravadas e impressas conspiram contra esse esforço. Um esforço para esconder uma idéia no armário à espera da abertura de uma nova janela de oportunidade.

Data: 04/10/2006

PORTO ALEGRE - Por que os políticos tucanos e de plumagens similares não falam mais abertamente em privatizações, um tema caro ao seu ideário econômico? Há uma resposta óbvia a tal questão e que consiste em lembrar a derrota que sofreram nas urnas em 2002. Isso não significa, porém, que deixaram de pensar no assunto ou que varreram essa proposta de seus programas partidários. Hoje, a palavra “saiu de moda”, mas, volta e meia, algum político ou economista não resiste e abre o seu coração. Isso aconteceu recentemente com o candidato Geraldo Alckmin. Em entrevista ao jornal O Globo (15/01/2006), admitiu que pretende retomar a política de privatizações implementada pelo governo FHC. Alckmin citou os bancos estaduais entre suas prioridades: “A maioria já foi privatizada, mas deveriam ser todos. Tem muita coisa que se pode avançar. Susep, sistema de seguros, tem muita coisa que se pode privatizar”, reconheceu.

Nesta mesma entrevista, Alckmin foi perguntado se os Correios estariam nesta lista de “muita coisa que se pode privatizar”. A resposta foi evasiva, mas deixou a porta aberta para a iniciativa: “Correios acho que teria que amadurecer um pouco”, disse. Amadurecer um pouco, tomando a expressão em seu sentido mais básico, significa dizer que a empresa ainda está “verde” e precisa esperar um pouco para ser “colhida”. É sintomático que, no discurso da campanha eleitoral, essas declarações permanecem no subterrâneo do discurso. Ocorre o mesmo no Rio Grande do Sul, onde a candidata tucana Yeda Crusius não fala em privatizar mas sim em implementar um “novo jeito de governar”. Mas ela escolheu como seu vice de chapa, o empresário Paulo Feijó (PFL), que já defendeu publicamente a privatização do Banrisul e inclusive de escolas estaduais. Assim como a palavra “privatização” não aparece no discurso de Yeda, seu vice permaneceu escondido na propaganda de televisão no primeiro turno.

O Estado perfeito, segundo Paulo Feijó
Alguns partidários e apoiadores das candidaturas tucanas dizem que associá-las ao tema das privatizações é uma mentira e que nada disso está em seus planos. O que conspira contra essa opinião são as declarações dos próprios candidatos. A entrevista de Alckmin ao Globo é clara e sem ambigüidades. Mais ainda as idéias expressas por Paulo Feijó. Logo após assumir a presidência da Federação das Associações Comerciais e de Serviços do RS (Federasul), em 2004, Feijó disparou uma saraivada de críticas contra o governo Rigotto, apresentando sua receita para a gestão do Estado: “o Estado deve deixar de participar de atividades que não dizem respeito a ele. O estado precisa prover à sociedade segurança e liberdade, talvez transporte coletivo, mas não uma Procergs (companhia de Processamento de Dados do RS), não uma CEEE (companhia pública energética). Nós temos iniciativa privada para estas atividades, que podem oferecer ao consumidor e ao público preços mais competitivos via licitação. Não compete ao estado operar nestes casos”, disse Feijó ao jornal Diário Popular (30/05/2004).

Mas o entusiasmo privatista de Feijó não pára por aí. Na mesma entrevista, ele apresentou sua concepção de mundo perfeito: “Eu quero a competição, quero ter a liberdade de optar de quem comprar combustível, de quem comprar energia, de quem comprar telefone, de quem comprar água. Eu quero que seja promovida a competição, a competição é que traz eficiência e menores preços ao mercado. A partir do momento em que você só pode comprar de um não interessa se é do estado ou não, está errado. Interessa é melhor qualidade, menor preço e variedade de oferta”. Ou seja, nem a água escapa de seus planos. O que é sintomático, neste e em outros casos, é o esforço em tentar ocultar seus discursos e seus agentes. Ainda no RS, o deputado federal Eliseu Padilha (PMDB), ex-ministro dos Transportes do governo FHC, partidário das privatizações de longa data e articulador da campanha de Alckmin, condicionou o apoio de seu partido a Yeda Crusius a um compromisso público contra a proposta das privatizações.

Idéias no armário
O esforço em esconder esse tema no armário leva algumas lideranças inclusive a jurar de pés juntos que nunca falaram em privatização. É o caso do próprio Feijó que, em entrevista à rádio Bandeirantes, de Porto Alegre (04/10/2006) afirmou que nunca falou em privatizar, desafiando alguém a encontrar algo gravado sobre isso. Pois há. Não só gravado como impresso. Em um debate realizado na TV COM (RBS), durante o governo Rigotto, chegou a defender a privatização de escolas estaduais, provocando protestos por parte do secretário estadual de Planejamento do governo Rigotto, João Carlos Brum Torres. Mas o caso de Feijó não é isolado. No plano nacional, a candidatura Alckmin segue o mesmo padrão. Um de seus formuladores na área econômica, o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros (ex-ministro das Comunicações do governo FHC e um dos principais articuladores do processo de privatizações no setor) também permanece à sombra na campanha tucana. Alckmin diz que não vai privatizar. Vejamos o que diz Mendonça de Barros:

''O governo já deveria pensar na privatização da Petrobras, seguindo a mesma lógica adotada no sistema Telebrás'' (em palestra proferida na Abamec, em São Paulo, no final do segundo governo FHC). ''Há muita coisa ainda (a privatizar), como os serviços portuários, as estradas de rodagem, o setor elétrico, a Petrobras'' (em recente entrevista à revista Exame). “...se eu estivesse no próximo governo, trabalharia forte na privatização da Petrobras. Esse não é um projeto simples. Tem de ser muito bem estudado, muito bem planejado. Mas acho que deveríamos quebrar esse monopólio que hoje não se justifica. Privatizar ou não é uma questão que tem de ser avaliada de maneira objetiva, não ideológica. Não tenho nada contra a empresa pública, mas quando a empresa pública não tem mais razão de existir, ela precisa ser extinta, e o negócio, vendido para a iniciativa privada''. Se esse é o ideário tucano para o Estado, por que tanto esforço em escondê-lo?

Uma agenda à procura de uma janela
Uma boa parte da resposta consiste em afirmar que não há ambiente político para isso hoje no Brasil. As conseqüências desastrosas do modelo de Estado mínimo ainda estão vivas na memória da população de vários países da América Latina. Nunca é demais lembrar que, não faz muito tempo, alguns dos principais países do continente eram governador por Carlos Menem, FHC e Fujimori. Essas forças políticas permanecem aí, sofreram uma derrota política, mas não desapareceram. Tampouco suas idéias desapareceram. E menos ainda essa agenda saiu de cena do cenário internacional. Nos debates sobre acordos comerciais envolvendo a Organização Mundial do Comércio (OMC), a União Européia e o Mercosul, a privatização de serviços públicos como saúde, educação e abastecimento de água, permanece uma agenda vivíssima. O fato de ter sofrido uma derrota política no Brasil não significa que ela (essa agenda) não esteja à espera da abertura de uma nova janela para voltar com força. Ela permanece mais viva e assanhadíssima.

Uma pequena nota publicada terça-feira (03/10/2006)e na Folha de São Paulo afirma que o governo inglês, por meio de David Miliband, secretário de Meio Ambiente britânico, divulgou na semana passada no México um plano para transformar a floresta amazônica em uma grande área privada. O anúncio foi feito em um encontro realizado na cidade de Monterrey, segundo informou o jornal Daily Telegraph. Um encontro que reuniu os governos dos 20 países mais poluidores do mundo. A proposta inglesa, que contaria com o apoio do primeiro-ministro Tony Blair, teria por objetivo “proteger a floresta”. Miliband admitiu que a idéia está em seu estágio inicial e que será preciso “discutir as questões de soberania” da região com o Brasil. O plano, segundo ele, prevê que uma grande área da Amazônia passaria a ser administrada por um consórcio internacional. Grupos ou mesmo pessoas físicas poderiam então comprar árvores da floresta. E há quem diga que agenda das privatizações saiu de moda !!!

http://cartamaior.uol.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=3335