Marinilda Carvalho: Jornalista não faz isso. Então, isso não é jornalismo
ELEIÇÕES 2006
Seria muitíssimo doloroso para a imprensa, e mereceria desmentido oficial urgente de repórteres e entidades de classe, o boato sobre a cumplicidade da mídia na divulgação de fotografias dos dinheiros levantados pelo PT para comprar um dossiê contra o PSDB. "Diz-se" que um delegado de polícia convocou repórteres, ofereceu-lhes determinadas imagens e acertou um acordo com o grupo: a divulgação seria anunciada como "roubo". Os repórteres teriam aceitado a trampa.
Isso não pode, absolutamente, ser verdadeiro. Repórteres - repórteres! - que testemunhassem episódio tão grave chegariam à redação cheios de adrenalina e contariam tudo aos borbotões ao editor! Nas redações que cultivam o jornalismo, o editor informaria imediatamente ao editor-executivo de sua área e haveria um alvoroço instantâneo nos aquários das chefias. Reunião de emergência seria convocada. Numa daquelas demonstrações não raras de altivez da imprensa, haveria um só resultado: o repórter deveria escrever tudinho o que aconteceu.
Na verdade, por conta do profissionalismo de seu chefe imediato, a matéria já estaria sendo escrita (e o repórter não evitaria um ou outro olhar ansioso ao aquário-mor):
O delegado Fulano de Tal, da Polícia Federal, convocou a imprensa na manhã de ontem para divulgar fotografias da montanha de dinheiro que funcionários do PT usaram para comprar um dossiê contra o candidato ao governo de São Paulo, José Serra (PSDB). A Polícia Federal, subordinada ao Ministério da Justiça, não estava autorizada a divulgar as fotos, mas o delegado, que pediu anonimato, disse que assim agia "para ferrar de vez esse governo e o PT". Ele propôs um acordo aos repórteres, pelo qual a divulgação das fotos seria anunciada pela imprensa como "roubo".
Pronto. Jornalismo bem-feito (um lide normal, claro, que não segue as regras de miniparágrafos do manual de redação da Folha, por exemplo, que subestima a inteligência do leitor). Os olhares receosos do repórter às paredes de vidro dos aquários continuariam. Bobagem dele: os profissionais da chefia obviamente decidiriam pela publicação das fotos - e da matéria revelando tudo, com manchete de página e chamada de destaque na Primeira! Como não?
Não, é impossível
Parece, contudo, que as linhas acima são pura teatralização. Os críticos da mídia asseguram que, na realidade, jamais ocorreram. Segundo esses detratores, a imprensa brasileira - repórter, editor, aquário - escondeu tudo do leitor.
Jornalistas veteranos hoje afastados das grandes redações se recusam a acreditar nessas fofocas. Para eles, esta situação demonstraria que a imprensa brasileira - repórter, editor, aquário - não saberia mais o que é jornalismo. Não seria questão de falta de ética na profissão, como apontado pela leitora Rosane Serro em mensagem a artigo do Observatório; nem mesmo questão de partidarização da imprensa, como acusou o leitor Cid Elias, em comentário ao mesmo texto.
Seria simplesmente ausência de jornalismo. De repórteres, redações, aquários, imprensa. Quem conhece a imprensa de verdade sabe que a imprensa de verdade não faz acordo com polícia. Não, é impossível.
Edição 401 de 2/10/2006
www.observatoriodaimprensa.com.br
Seria muitíssimo doloroso para a imprensa, e mereceria desmentido oficial urgente de repórteres e entidades de classe, o boato sobre a cumplicidade da mídia na divulgação de fotografias dos dinheiros levantados pelo PT para comprar um dossiê contra o PSDB. "Diz-se" que um delegado de polícia convocou repórteres, ofereceu-lhes determinadas imagens e acertou um acordo com o grupo: a divulgação seria anunciada como "roubo". Os repórteres teriam aceitado a trampa.
Isso não pode, absolutamente, ser verdadeiro. Repórteres - repórteres! - que testemunhassem episódio tão grave chegariam à redação cheios de adrenalina e contariam tudo aos borbotões ao editor! Nas redações que cultivam o jornalismo, o editor informaria imediatamente ao editor-executivo de sua área e haveria um alvoroço instantâneo nos aquários das chefias. Reunião de emergência seria convocada. Numa daquelas demonstrações não raras de altivez da imprensa, haveria um só resultado: o repórter deveria escrever tudinho o que aconteceu.
Na verdade, por conta do profissionalismo de seu chefe imediato, a matéria já estaria sendo escrita (e o repórter não evitaria um ou outro olhar ansioso ao aquário-mor):
O delegado Fulano de Tal, da Polícia Federal, convocou a imprensa na manhã de ontem para divulgar fotografias da montanha de dinheiro que funcionários do PT usaram para comprar um dossiê contra o candidato ao governo de São Paulo, José Serra (PSDB). A Polícia Federal, subordinada ao Ministério da Justiça, não estava autorizada a divulgar as fotos, mas o delegado, que pediu anonimato, disse que assim agia "para ferrar de vez esse governo e o PT". Ele propôs um acordo aos repórteres, pelo qual a divulgação das fotos seria anunciada pela imprensa como "roubo".
Pronto. Jornalismo bem-feito (um lide normal, claro, que não segue as regras de miniparágrafos do manual de redação da Folha, por exemplo, que subestima a inteligência do leitor). Os olhares receosos do repórter às paredes de vidro dos aquários continuariam. Bobagem dele: os profissionais da chefia obviamente decidiriam pela publicação das fotos - e da matéria revelando tudo, com manchete de página e chamada de destaque na Primeira! Como não?
Não, é impossível
Parece, contudo, que as linhas acima são pura teatralização. Os críticos da mídia asseguram que, na realidade, jamais ocorreram. Segundo esses detratores, a imprensa brasileira - repórter, editor, aquário - escondeu tudo do leitor.
Jornalistas veteranos hoje afastados das grandes redações se recusam a acreditar nessas fofocas. Para eles, esta situação demonstraria que a imprensa brasileira - repórter, editor, aquário - não saberia mais o que é jornalismo. Não seria questão de falta de ética na profissão, como apontado pela leitora Rosane Serro em mensagem a artigo do Observatório; nem mesmo questão de partidarização da imprensa, como acusou o leitor Cid Elias, em comentário ao mesmo texto.
Seria simplesmente ausência de jornalismo. De repórteres, redações, aquários, imprensa. Quem conhece a imprensa de verdade sabe que a imprensa de verdade não faz acordo com polícia. Não, é impossível.
Edição 401 de 2/10/2006
www.observatoriodaimprensa.com.br
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