sexta-feira, maio 28, 2010

Anistia Internacional critica Brasil sobre dificuldades de investigar a tortura durante a ditadura militar

ONG critica falta de investigação sobre tortura

DE SÃO PAULO

A dificuldade de apurar no Brasil crimes cometidos no período militar foi alvo de crítica do grupo de defesa de direitos humanos Anistia Internacional.
No seu Informe 2010 -uma síntese sobre os direitos humanos em 159 países-, a entidade cita como exemplo as contestações feitas à proposta de se investigar abusos cometidos na ditadura com a criação da Comissão da Verdade.
"Mesmo essa limitada proposta foi duramente criticada pelos militares brasileiros, com o ministro da Defesa tentando enfraquecê-la ainda mais", diz o texto, divulgado ontem.
Proposta pelo 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, lançado em dezembro, a Comissão da Verdade terá como objetivo "examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período de 1946 a 1988".
A expressão "repressão política" foi retirada do texto porque remetia à apuração de excessos cometidos apenas pelos agentes de Estado, o que desagradou ao ministro Nelson Jobim e os comandantes militares.
Segundo o pesquisador britânico da entidade Tim Cahill, para garantir sua liderança regional e internacional, o Brasil precisa resolver o problema dos direitos humanos no país.
Para ele, a decisão do Supremo Tribunal Federal de não rever a Lei da Anistia é "uma mensagem muito forte de negação da implementação de uma lei do direito internacional fortemente reconhecida, que proíbe a anistia a crimes hediondos e contra a humanidade".

Notícia publicada na Folha de São Paulo, de 27 de maio de 2010.


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Alemanha é fonte de desequilíbrio na Europa, diz ex-ministro

Alemanha é fonte de desequilíbrio na Europa, diz ex-ministro


CLAUDIA ANTUNES

DO RIO DE JANEIRO


A Alemanha - e não a Espanha, Portugal ou mesmo a Grécia - é a principal fonte de desequilíbrio estrutural na região do euro, afirma o economista alemão Heiner Flassbeck.


Flassbeck foi vice-ministro das Finanças de seu país em 1998 e 1999, quando foi implantada a moeda única europeia. Hoje, dirige a Divisão de Globalização e Estratégias de Desenvolvimento da Unctad (conferência da ONU para o comércio e o desenvolvimento), em Genebra.


Ele explica: ao praticar arrocho salarial nos últimos dez anos, com aumento real de apenas 4% no período, muito abaixo do crescimento da produtividade, a Alemanha passou a comprar menos e aumentou ainda mais a competitividade de seus produtos em relação aos dos demais países da zona do euro.


Como a moeda única impede que os vizinhos mexam no câmbio para estimular suas exportações, eles passaram a ter deficit comerciais e em conta-corrente (saldo de todo o dinheiro que entra e sai do país), enquanto a Alemanha acumula superavit.


Para Flassbeck, sem um movimento coordenado para sair desse impasse, "não haverá solução a longo prazo" para a união monetária.


Ele também afirma que os cortes de gastos já anunciados por alguns governos da região não podem ser generalizados porque provocarão deflação, maior risco imediato para as economias europeias.


O diretor da Unctad estará em São Paulo no início desta semana. Falará na Unicamp e participará de um debate fechado sobre "novo desenvolvimentismo" organizado pelo economista e ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, colunista da Folha.


Ele falou por telefone, de Genebra. Abaixo, os principais trechos


FOLHA - Por que o pacote de resgate e os cortes de gastos anunciados na Europa nas últimas duas semanas não acalmaram os mercados?

HEINIR FLASSBECK - O que fizeram agora foi atacar o problema de curto prazo, mas o problema de médio e longo prazo na união monetária europeia é a diferença de competitividade entre a Alemanha, de um lado, e os países do sul da Europa.


Há tensões abertas entre a Alemanha e a França porque falta vontade ao governo alemão para resolver essa questão. Sem isso, não haverá solução de longo prazo para a área do euro.


FOLHA - O senhor diz que parte dessa diferença de competitividade vem da compressão dos salários na Alemanha, em comparação com os ganhos no sul. A Espanha cortou salários e congelou aposentadorias. É uma forma de resolver isso?

FLASSBECK - Não é a maneira correta. Se o problema não for atacado de modo coordenado, todo mundo cortará salários e isso levará à deflação, maior risco para a zona do euro, resultado mais provável neste momento e a principal razão da continuidade da inquietação.


¦Enquanto o governo alemão não reconhecer que há um problema, e enquanto não estiver disposto a conversar com seus empresários e sindicatos sobre como resolvê-lo, não haverá uma saída clara da crise.


FOLHA - O senhor defende que a Alemanha reduza a própria competitividade por meio de aumentos de salários?

FLASSBECK - Sim. A Alemanha cortou os salários dramaticamente e violou a meta comum de inflação [de 2% ao ano], praticando uma inflação próxima de zero.


Os dois estão relacionados e o custo unitário do trabalho [salário nominal menos produtividade, por unidade gerada do PIB] está abaixo da meta de inflação. A regra que deveria valer para todo mundo é que esse custo deveria estar sob a linha de 2%. Alguns ficaram acima disso, mas a Alemanha ficou muito abaixo.


Isso leva a uma situação insustentável, no mundo todo. O superavit [comercial] alemão está agora tão grande quanto o chinês.


FOLHA - A OCDE (grupo de 31 países industrializados) divulgou relatório sobre a economia francesa recomendando mais flexibilidade no mercado de trabalho e reforma da Previdência Social. É o oposto do que o senhor prescreve, não?

FLASSBECK - Isso é nonsense. A França é o único país europeu que entendeu as causas da crise. Se todos os países começarem a cortar salários, o resultado líquido e certo será deflação.


Essa recomendação reflete o pensamento econômico convencional, de que ter salários flexíveis, principalmente para baixo, resolve tudo. Foi o dogma que a Alemanha seguiu e que nos trouxe à situação atual.


FOLHA Não é uma contradição que se recomende políticas ortodoxas quando há apenas dois anos, quando a crise começou nos EUA, dizia-se que a ortodoxia estava morta?

FLASSBECK - Claro que não era verdade quando todos se proclamaram keynesianos. Agora começa a verdadeira batalha ideológica, sobre o que vamos fazer com o mercado de trabalho.


FOLHA - Mas o aumento da competição da China e dos EUA, que querem aumentar suas exportações, não é um desafio letal para o Estado de bem-estar europeu?

FLASSBECK - De modo nenhum. Enquanto tivermos aumento de produtividade, os salários podem aumentar. Sempre que fizermos o oposto, mais cedo ou mais tarde nossa taxa de câmbio aumentará, o que também diminui a competitividade.


Você não pode estar sempre ganhando competitividade em relação ao resto do mundo. Mais cedo ou mais tarde a taxa de câmbio vai reagir. Quando um país tem um grande deficit em conta corrente, normalmente deprecia sua moeda, e desse modo toda a competitividade que você ganhou [contra ele] vai embora.


Não há outro modo para o mundo todo aumentar seu bem-estar do que subindo os salários de acordo com a produtividade. Esta será a mensagem do nosso próximo relatório sobre comércio e desenvolvimento, que será divulgado em setembro. Se você quiser ser bem-sucedido, externa e internamente, é o mais importante.


FOLHA - Como responde ao argumento de que Europa tem alto nível de desemprego porque os salários são altos e o mercado de trabalho é pouco flexível?

FLASSBECK - É totalmente errado. No caso da Alemanha, houve só um efeito positivo do "dumping" salarial, que foi encher os vizinhos com suas exportações. Internamente, a política foi um desastre. Não houve aumento dos investimentos nem do consumo.


FOLHA - Antes dos pacotes de estímulo para contornar a crise financeira de 2008, não havia um problema fiscal na maioria dos países europeus. Agora este é apontado como o maior problema. Por quê?

FLASSBECK - Isso é parte da batalha ideológica. As pessoas agora dizem que o governo é o problema, e não que resolveria todos os problemas, como se dizia há dois anos. Mas os que devem ser culpados por toda a confusão em que estamos são os mercados financeiros.


Os neoclássicos querem usar esse argumento [do problema fiscal] para voltar à batalha e talvez serem os vitoriosos no final. Então declaram os governos falidos, o que é falso: nenhum governo neste momento está falido, e todos os problemas podem ser resolvidos.


Os mercados dizerem que não querem dar dinheiro aos governos é ridículo, porque tiveram dinheiro dos governos, através dos bancos centrais, e agora se recusam a pagar.


FOLHA - Como explica o fato de o governo americano, que tem um deficit orçamentário de 10% do PIB, maior do que média europeia de 6,8%, não estar fazendo cortes, como os países europeus?

FLASSBECK - Os americanos têm em mente o cenário japonês de deflação e sabem que é perigoso se você corta muito em pouco tempo. Para mim a mensagem correta é: não corte muito em pouco tempo, e corte com cuidado, de acordo com a situação de cada país. Isso foi reconhecido por Dominique Strauss-Kahn [diretor-gerente do FMI]. Em entrevista à TV francesa, ele disse que nem todos podem cortar [gastos] ao mesmo tempo.


FOLHA - A missão do Fed, o banco central americano, é tanto de manter sob controle a inflação quanto de preservar o emprego. O BCE só tem meta de inflação. O senhor defende mudar isso?

FLASSBECK - Minha posição desde o início é a de que o mandato do Fed é mais razoável do que a do BCE. Manter a inflação baixa é relativamente simples, se você não se importa com o resto da economia. Mas, pelo menos nos últimos dias, o BCE mostrou certa flexibilidade [ao começar a comprar dívida dos países em crise].


FOLHA - Como avalia a reação popular ao aperto fiscal na Grécia e em outros países?

FLASSBECK - O sentimento mais disseminado nas ruas é que esses cortes estão errados. Há algo de verdade nisso. Cortes orçamentários, aumento de impostos e redução de salários combinados podem levar ao desastre.


Em médio prazo, deve haver uma mudança de direção nos Orçamentos, mas é preciso dar tempo ao tempo. Não é possível fazer do dia para a noite e têm que haver uma diferenciação entre os países com superavit externo, como a Alemanha, e os outros.


FOLHA - E como vê o argumento de que países como Grécia, Espanha e Portugal têm vivido nos últimos anos acima de seus meios?

FLASSBECK - E um país grande tem vivido abaixo dos seus meios, que é a Alemanha. Se isso for reconhecido, temos uma base para uma discussão razoável.



Entrevista da Folha Online.


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Escândalo de grampos ilegais se aproxima do presidente da Colômbia

Escândalo de grampos ilegais se aproxima do presidente da Colômbia

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quinta-feira, maio 27, 2010

Empresa mais antiga tende a pagar melhores salários e empregar mais, aponta IBGE

Empresa mais antiga tende a pagar melhores salários e empregar mais, aponta IBGE

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Erguer pontes...

É preciso aprender a erguer pontes sobre o abismo

NOVA YORK

A mediação do Brasil e da Turquia em um acordo para retirar do Irã a maior parte do urânio de baixo nível de enriquecimento (LEU, na sigla em inglês) é importante, seja ele implementado ou não. O motivo é que é um presságio do mundo pós-ocidental emergente.
A predominância anglo-saxã ainda não terminou, mas está em declínio. Washington reagiu negativamente, dizendo que havia esboçado um acordo para seguir com uma quarta rodada de sanções contra o Irã no Conselho de Segurança da ONU. Mas as sanções falharam no passado, e a reação levanta a questão de por que um arranjo que parecia aceitável quando negociado por diplomatas americanos em outubro passado já não é mais.
A violência infligida a sua própria população pelo regime iraniano depois da eleição roubada de 12 de junho do ano passado foi inadmissível, mas ainda é verdade que o isolamento e o confronto só beneficiam a ala linha-dura do Irã, que acha fácil contornar a retórica americana do "eixo do mal". Afinal, quanto mais o Irã puder ser retirado de sua atual posição de pária, melhor para as forças reformistas de lá. Elas são jovens e estão famintas por contato com o mundo.
A Turquia e o Brasil são potências regionais emergentes com interesses econômicos em expansão no Irã e crescentes ambições diplomáticas. Seu envolvimento agradou ao governo iraniano, que gosta de se posicionar como líder de uma nova ordem mundial. O posicionamento é um agravante para o Ocidente, mas, neste caso, isso não importa, se o objetivo central puder ser alcançado: criar espaço para o diálogo e a remoção do urânio de 3,5% de pureza que o Irã tem produzido nas centrífugas de Natanz.
O acordo retoma em grande parte um outro negociado pelos EUA em 2009 e que desandou. A única diferença significativa é que agora o Irã tem mais LEU, com o resultado de que os 1.200 kg a serem levados para a Turquia representariam uma proporção menor do estoque, embora ainda mais da metade.
Não acho que isso importe muito porque o Irã, se honrar o acordo, estará demonstrando uma disposição para trabalhar com a comunidade internacional e remover grande parte do LEU necessário para fazer o urânio altamente enriquecido usado em uma bomba.
Diante da antiga duplicidade e da intransigência iranianas, é recomendável prudência. Mas eu sinto no intenso ceticismo inicial do Ocidente um desprezo mal disfarçado pelos esforços do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e do premiê turco, Recep Tayyip Erdogan.
Isso é um erro. Exatamente porque o Irã investiu muito em suas relações com a Turquia e o Brasil, agora relutará em fazer de bobos os dois líderes e recuar.
O presidente dos EUA, Barack Obama, enfrenta uma decisão delicada. Seu coração sempre foi favorável a uma reaproximação com o Irã. Ele vê, acertadamente, que o impasse americano-iraniano de 31 anos é obsoleto e prejudicial. Mas a fúria tem varrido o Congresso, cujos representantes prometeram sanções "esmagadoras" e "paralisantes" contra Teerã.
Grande parte do esforço dos EUA foi dedicado ao lobby para que o CS da ONU produza um acordo sobre sanções de seus cinco membros permanentes, com poder de veto -EUA, Reino Unido, França, Rússia e China-, mais Alemanha. Em vez de dizer que a pressão funcionou, na forma da aparente disposição iraniana a se desfazer do LEU, o governo Obama parece ter optado por uma linha dura. Isso foi tentado sob o governo Bush e não deu em nada.
O Irã demonstrou que, de modo geral, é imune às sanções. Se elas falharem mais uma vez em mudar o comportamento iraniano, Obama enfrentará a pergunta: e agora? Ele sabe que EUA e Ocidente não podem suportar uma terceira guerra com um país muçulmano.
Por isso o acordo brasileiro-turco vale a pena. Obama disse à ONU no ano passado que os EUA queriam terminar com a unilateralidade, mas precisavam que os outros países assumissem responsabilidades. "Os que costumavam censurar os EUA por agirem sozinhos agora não podem ficar de lado e esperar que os EUA solucionem sozinhos os problemas do mundo", ele declarou, acrescentando: "Juntos, devemos construir novas coalizões para superar antigas divisões -coalizões de fés e credos diferentes; de norte e sul, leste, oeste, preto, branco e marrom".
Novas coalizões para superar antigas divisões? Para mim, soa como Brasil e Turquia unindo-se para ajudar o Irã e os EUA a superar o abismo que os separa. Isso, por sua vez, ofereceria a possibilidade de aprofundar a paz no Oriente Médio e a segurança global.

Texto do The New York Times, reproduzido na Folha de São Paulo, de 24 de maio de 2010.


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Ao ignorar o acordo com o Irã, Obama se afunda em mais um fracasso

Ao ignorar o acordo com o Irã, Obama se afunda em mais um fracasso

Roger Cohen
Em Nova York (EUA)

John Limbert, que foi refém em Teerã, agora é responsável por assuntos iranianos no Departamento de Estado. Ele deu uma boa descrição das caricaturas que afligem as não-relações entre os EUA e o Irã.

Os americanos veem os iranianos como “evasivos, falsos, fanáticos, violentos e incompreensíveis”. Os iranianos, por sua vez, veem os americanos como “beligerantes, hipócritas, ateus, imorais, materialistas, calculistas”, sem mencionar provocadores e exploradores.

Esse é o marco zero na relação mais traumatizada da Terra e a mais atormentadora. Atormentadora porque o Irã e os EUA são inimigos não naturais, pois têm tanto onde concordar, se quebrarem o gelo. Limbert, construtor de pontes, passou metade da vida tentando transmitir essa mensagem. Nunca conseguiu. A história venenosa atrapalha. Assim como os que lucram com o veneno.

Como se fosse necessária mais uma ilustração da relação de desconfiança, esta acaba de ser fornecida pelo acordo do Brasil e Turquia sobre o urânio pouco enriquecido do Irã, a reação rabugenta dos EUA e a aparente determinação dos Grandes Poderes, liderados pelo governo Obama, de se afundar mais no fracasso.

Achei que Obama estava disposto a pensar o Irã de forma diferente. Parece que não. Os presidentes precisam liderar as principais iniciativas de política externa, e não serem reativos a considerações políticas internas, neste caso a ira incandescente no Capitólio em relação ao Irã em ano de eleição.

Vou começar pelo último ponto. O Brasil e a Turquia representam o mundo pós-Ocidental emergente, que vai continuar emergindo; a secretária de Estado Hillary Clinton, portanto, deve ser menos rápida no gatilho em matar os “esforços sinceros” de Brasília e Ancara com fracos elogios.

A capacidade do Ocidente de impor soluções às questões globais, como o programa nuclear do Irã, foi erodida. Os EUA, envolvidos em duas guerras em países muçulmanos sem conclusão, não pode arcar com uma terceira. A primeira década do século 21 delineou os limites do poder norte-americano. É grande, porém não é mais determinante.

Muitos americanos, inclusive os radicais do “Tea Party”, ficam revoltados com isso e latem contra os lobos. Eles vão descobrir que os fatos são os fatos.

Falando em fatos, serei meio teatral agora. O Irã vem produzindo, sob inspeção da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), urânio enriquecido a 5% (LEU). Se o Irã quiser produzir uma arma nuclear, esse LEU teria que ser enriquecido para grau de bomba (mais de 90%).

A ideia por trás do acordo americano em Genebra em outubro era levar uma boa parte do LEU para fora do Irã, para reforçar a confiança, criar espaço de negociação e remover o material que pudesse ser subvertido. Em troca, o Irã receberia combustível atômico para o reator de pesquisa médica em Teerã.

O Irã, usa uma prática de bazar: diz sim, talvez e não, enfurecendo Obama. O país dos aiatolás agora queria que o LEU fosse armazenado em solo iraniano sob controle da AIEA, que fosse transferido para lá em fases e que a troca de combustível fosse simultânea. Esqueça, disse Obama.

Bem, a Turquia e o Brasil agora restauraram os principais elementos do acordo de outubro: um único carregamento de 1.200 kg de LEU para um ponto fora do Irã (na Turquia) e um prazo de um ano –essencial para o início de maiores negociações- entre este depósito iraniano e a importação do combustível.

E qual foi a resposta dos EUA? Promover “fortes sanções” (talvez não mais “destruidoras”) contra o Irã na ONU, e insistir em uma suspensão do enriquecimento que não estava no acordo de outubro (de fato, este foi o centro da diferença de Obama para a doutrina Bush).

Obama de fato poderia ter dito: “A pressão funciona! O Irã hesitou nas vésperas das sanções da ONU. Voltou para nossa oferta. Precisamos ser prudentes, devido ao passado iraniano de duplicidade, mas isso é um progresso. O isolamento serve aos radicais iranianos.”

Não é de espantar que Ahmet Davutoglu, ministro de relações exteriores turco, esteja com raiva. Acredito nele quando diz que Obama e as autoridades norte-americanas estimularam a Turquia no início do ano a reanimar o acordo: “O que eles queriam que fizéssemos era promover a confiança no Irã para que aceitasse a troca. Fizemos nossa parte.”

Sim, a Turquia fez sua parte. Eu sei, os 1.200 kg agora representam uma proporção menor do LEU do Irã do que em outubro, e não é mais claro que o combustível virá da conversão do LEU depositado. Mas isso não é nada quando você está tentando construir uma frágil ponte entre os iranianos “falsos” e os americanos “provocadores” no interesse da segurança mundial.

As reações da França e da China –de apoio cauteloso- fizeram sentido. Os americanos não fizeram nenhum, ou somente na luz do forte defesa do Congresso por sanções “esmagadoras”. Maiores sanções não vão mudar o comportamento nuclear do Irã; negociações, talvez. Somente posso esperar que a reação americana tenha sido uma jogada de abertura.

No ano passado, na ONU, Obama pediu uma nova era de responsabilidade compartilhada. “Juntos, precisamos construir novas coalizões que superem nossas divisões”, declarou. Turquia e Brasil responderam –e foram esnobados. Obama fez suas próprias palavras iluminadas parecerem vazias.


Texto do International Herald Tribune, republicado no UOL.

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quinta-feira, maio 20, 2010

Corte Interamericana de Direitos Humanos julga Brasil por crimes contra guerrilheiros do Araguaia

A Corte Interamericana de Direitos Humanos começou nesta quinta-feira (20) a audiência pública na qual o Brasil terá que responder pelas acusações de detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de dezenas de pessoas em operações de repressão à Guerrilha do Araguaia, na década de 1970.

Para emitir seu julgamento, o órgão sediado na Costa Rica vai ouvir, entre hoje e amanhã, os depoimentos de representantes das vítimas, as conclusões da comissão interamericana e a defesa do Estado brasileiro, que está a cargo de uma delegação interministerial. O anúncio da sentença está previsto para novembro.

O processo é consequência de uma petição de agosto de 1995 movida por ONGs junto à Comissão Interamericana de Direito Humanos (CIDH). Desde então, organismo analisou o caso e sugeriu ao Brasil uma série de medidas reparatórias. Como o país não concretizou as sugestões, a Comissão encaminhou a denúncia à Corte, que é a última instância para o caso.

De acordo com os documentos da Corte, “a demanda se relaciona com a suposta detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região, resultado de operações do exército brasileiro entre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia, no contexto da ditadura militar do Brasil”.

Para justificar a pertinência do caso, o organismo, acrescenta que “em virtude da Lei da Anistia, o Estado [brasileiro] não realizou uma investigação penal com o objetivo de punir as pessoas responsáveis” e “os recursos judiciais de natureza civil com objetivo de obter informação sobre os fatos não foram efetivos”.

O Brasil alega em sua defesa que não se esgotaram os recursos internos para análise da questão, que não houve violação à legislação internacional e que as sugestões anteriores já foram acatadas.

A demanda original foi apresentada pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL/Brasil) e pela Human Rights Watch/Americas (HRWA). Mais tarde, se apresentaram como co-peticionários o Grupo Tortura Nunca Mais (GTNM) e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos (CFMDP).

Caso particular

Consultado pelo UOL Notícias, um porta-voz da Corte Interamericana declarou que se trata de um caso sem precedentes na história do organismo internacional.

“Cada caso é único, é importante se lembrar disso, mas esse processo é especial, tem uma série de particularidades. A corte já julgou casos de tortura, desaparecimento, mas agora são dezenas pessoas que supostamente foram vítimas [de violações dos direitos humanos]”, explica.

Vai pesar na decisão do organismo o fato de que o Brasil vivia uma ditadura durante o caso? “Não. A corte julga apenas se houve violação dos direitos humanos, independente do governo que estava no poder, essa não é a questão”, respondeu o porta-voz.

Além disso, a corte não busca estabelecer a culpa de indivíduos, mas indicar se um determinado Estado infringiu ou não os artigos da Convenção Interamericana. O resultado, que deve demorar seis meses para ser anunciado, é inapelável e seu acatamento é obrigatório.

“Em caso de condenação, a corte faria duas coisas: estabelecer qual foi a violação cometida pelo Estado brasileiro e depois indicar medidas de reparação às vitimas”, explica o porta-voz.

Essas medidas podem ter caráter econômico, como no caso de indenizações, ou podem ser decididas em função das características do caso. A corte pode decidir, por exemplo, que seja criada ou revogada uma lei para que o país esteja de acordo com os regulamentos internacionais. Em outro caso, envolvendo a Colômbia, a corte chegou a ordenar que os militares do país tivessem formação em direitos humanos.

Representação

Comparecem à audiência na Costa Rica como testemunhas das vítimas Belisário dos Santos Júnior (advogado de militantes), Danilo Carneiro (preso durante as operações no Araguaia). Como testemunha do Estado, Edmundo Teobaldo Müller Neto (advogado da União), e Jaime Antunes da Silva (diretor do Arquivo Nacional).

Como peritos, devem depor pela comissão Damián Miguel Loreti Urba (especialista em leis de sigilo). Pelas vítimas, falarão Paulo Endo (psicólogo, para comentar efeito da falta de informação sobre as famílias) e Hélio Bicudo (jurista, para comentar os obstáculos contra processos a violadores de direitos humanos da ditadura). Pelo Estado, foram convocados Estevão Chaves de Rezende Martins e Alcides Martins (para comentar a Lei da Anistia).

Na condição de supostas vítimas, falarão Laura Petit da Silva (irmã de Maria Lúcia Petit da Silva, executada, e Lúcio e Jaime Petit da Silva, desaparecidos), Criméia Alice Schmidt de Almeida e Elizabeth Silveira e Silva (ambas também familiares de desaparecidos).

Como testemunhas, prestam declaração Marlon Alberto Weichert (procurador da República), e, pelo Estado brasileiro, José Gregori (ex-secretário de Direitos Humanos) e José Paulo Sepúvelda Pertence (ex-presidente do STF).

Também depõem Flávia Piovesan (especialista nas leis de sigilo brasileiras), Rodrigo Uprimny (especialista em Justiça em processos de transição) e Gilson Langaro Dipp (ministro do STJ).


Notícia de Thiago Chaves-Scarelli, no UOL.

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Brasil tem baixa proporção de empregos públicos, mas a custo alto, diz OCDE

Brasil tem baixa proporção de empregos públicos, mas a custo alto, diz OCDE

A proporção de empregos públicos em relação à força total de trabalho no Brasil é relativamente baixa na comparação com os países desenvolvidos, mas seu custo relativo ao PIB é alto, de acordo com um estudo realizado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) com o Banco Mundial e o governo brasileiro.

Segundo o estudo divulgado nesta quinta-feira, centrado no caso do Brasil em comparação com países da OCDE, o total de servidores públicos no Brasil, incluindo os empregados das empresas estatais, representa entre 11% e 12% do total de empregos no país.

Entre os 31 países da OCDE (grupo que reúne os países desenvolvidos), a média das porcentagens de servidores públicos em relação aos empregos totais é de 22%. De todos os países da OCDE, o Japão é o único com uma proporção menor que a brasileira, abaixo dos 10%.

Na comparação entre as proporções das remunerações dos servidores públicos em relação ao PIB, a porcentagem no Brasil é próxima à média da OCDE, em torno de 12%.

Em uma comparação entre 26 países (Brasil e 25 membros da OCDE), a proporção brasileira do custo das remunerações no setor público em relação ao PIB é a 10ª maior.

A Dinamarca, com uma proporção de cerca de 17%, tem a proporção mais alta, enquanto o Japão, com pouco mais de 6%, tem a mais baixa.

Quando considerados ainda em conjunto o custo das remunerações dos servidores públicos e os serviços públicos produzidos pelo setor privado e pagos pelo governo, isso atinge 27% do PIB, deixando o Brasil em quinto na comparação com os países membros da OCDE.

Segundo o estudo, isso se deve a uma combinação de fatores, como as remunerações excessivamente baixas no setor privado para certas funções, a proporção maior de cargos qualificados no setor público e “a escolha que tem sido feita de pagar relativamente bem os servidores públicos em posições essenciais para motivar seu compromisso e atrair e reter uma força de trabalho altamente qualificada”.

Crescimento acelerado

O documento aponta ainda uma tendência de crescimento acelerado dos empregos públicos desde a década de 1990, apesar da queda, entre 1995 e 2003, no número de funcionários públicos do governo federal (que representam cerca de 15% dos empregos totais no setor público).

De acordo com o estudo, o número de funcionários do governo federal caiu de cerca de 570 mil para cerca de 485 mil durante o governo Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 2003, e aumentou depois nos anos seguintes, durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, para chegar a 540 mil em 2008.

Apesar disso, o ritmo de aumento no total de servidores públicos nos três níveis (municipal, estadual e federal) teria crescido ao mesmo ritmo, de 15% ao ano, entre 1999 e 2003 e de 2003 a 2007.

O relatório observa que “esses aumentos foram justificados pela necessidade reconhecida de melhorar o acesso aos serviços públicos, especialmente na área da saúde e educação, e para superar deficiências pré-existentes na capacidade do governo”, mas ressalta que “a situação deve ser acompanhada de perto”.

“Considerando o importante papel atribuído à ação do governo na economia e na sociedade pelo governo Lula, as tendências relacionadas aos cargos e empregos públicos não são surpreendentes, mas os dados devem encorajar uma atenção específica à evolução da produtividade das ações do governo e, como consequência, na eficiência da gestão de pessoal”, sugere o documento.


Notícia da BBC Brasil.

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Conservadorismo à brasileira...

Manual do bom conservador

COMECEI depressa a ler o livro, que é curto, mas perdi a coragem de continuar. Só depois de uma pausa consegui retomá-lo. Foi escrito por José de Alencar nos anos 1867-68 e nunca mais foi republicado.

Reaparece agora em edição de bolso, à venda até em bancas de jornal. E devia ser leitura obrigatória no currículo do secundário, tal a sua capacidade de sintetizar a mentalidade brasileira no que tem de mais conservador, de mais atrasado, de mais duro.

Trata-se das "Cartas a Favor da Escravidão" (editora Hedra), que o célebre romancista endereçou, sob pseudônimo, ao imperador dom Pedro 2º. É sempre fácil, sem dúvida, acusar de insensibilidade e falta de lucidez um texto escrito em outra época.

Mas o que mais importa é ver de que modo o livro de José de Alencar expressa hábitos de pensamento que, até hoje, fazem parte do arsenal reacionário.

Veja, por exemplo, a crítica de Alencar às pressões de países como Inglaterra e França para que acabasse a escravidão por aqui. “Como assim?”, pergunta Alencar. “Que direito têm as potências estrangeiras de interferir num assunto brasileiro? Filantropia e indignação moral são expedientes hipócritas dos europeus. De resto, não temos culpa pela escravidão.”

"Não fomos nós, povos americanos, que importamos o negro da África para derrubar matas e laborar a terra; mas aqueles que hoje nos lançam o apodo e o estigma por causa do trabalho escravo." Alencar continua: "O filantropo europeu, entre a fumaça do bom tabaco de Havana e da taça do excelente café do Brasil, se enleva em suas utopias humanitárias (...) Em sua teoria, a bebida aromática, a especiaria, o açúcar e o delicioso tabaco são o sangue e a medula do escravo. Não obstante, ele os saboreia".

É típico. Nossa inocência está sempre fora de dúvida. Não se pode exigir de um país tão "jovem" que assuma responsabilidade pelo que faz. O fim da escravidão, diz Alencar, virá a seu tempo. Ainda é cedo para querer isso no Brasil. "A raça africana tem apenas três séculos e meio de cativeiro. Qual foi a raça europeia que fez nesse prazo curto a sua educação?"

Sim, porque a escravidão educa o negro. É nessa "escola de trabalho e sofrimento" que um povo "adquire a têmpera necessária para conquistar o seu direito e usar dele".

Cabe considerar também, diz Alencar, que esse processo educativo é mais lento no Brasil do que, por exemplo, no norte dos Estados Unidos. Lá, graças ao espírito industrioso dos anglo-saxões, o negro rapidamente se transformou num "operário ao qual só faltava o espírito do lucro". Mas nós, brasileiros, somos diferentes. "A raça latina é sobretudo artística (...) Outros elementos, que não o cômodo e o útil, impelem o caráter ardente dessa família do gênero humano: ela aspira sobretudo ao belo e ao ideal."

Como diz a ótima introdução do historiador Tâmis Parron, deve-se fazer uma justiça a José de Alencar: ele não compactua com as teses da época sobre a inferioridade racial dos negros. O problema, como sempre, é "de educação", "despreparo". Mantenha-se, portanto, a escravidão. Aliás, de que escravidão exatamente se está falando? "Um espírito de tolerância e generosidade, próprio do caráter brasileiro, desde muito transforma sensivelmente a instituição. Pode-se afirmar que não temos já a verdadeira escravidão, porém um simples usufruto da liberdade."

As relações entre senhor e escravo "adoçaram" por aqui, diz Alencar, repetindo várias vezes o verbo que faria tanto sucesso na obra de Gilberto Freyre. Seja como for, o escravismo é uma "instituição". E "as instituições dos povos são coisa santa, digna de toda veneração. Nenhum utopista, seja ele um gênio, tem o direito de profaná-las".

Senhores utopistas, fiquem avisados. O que se pretende, ilusoriamente, em nome do progresso, dos direitos humanos etc., contradiz a realidade social. Transformá-la, ainda mais tão cedo, é uma insensatez. Há de preferir-se a realidade, é claro. Desde que se esteja do lado certo do chicote.

Texto de Marcelo Coelho, na Folha de São Paulo, de 28 de abril de 2010.


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terça-feira, maio 11, 2010

ONG questiona proibição de Israel à entrada de produtos em Gaza

A ONG israelense de defesa dos direitos humanos Gisha acusou o governo de Israel de agir de maneira "absurda e arbitrária" em relação à proibição da entrada de produtos para 1,5 milhão de palestinos residentes na Faixa de Gaza.

A ONG, cujo trabalho se concentra na defesa da liberdade de ir e vir, questiona a afirmação do governo israelense de que a ampla proibição à entrada de mercadorias na Faixa de Gaza teria o objetivo de proteger a segurança de Israel.

"O que a entrada de coentro na Faixa de Gaza tem a ver com a segurança de Israel e porque as autoridades proíbem o coentro mas autorizam a entrada de canela?", pergunta a diretora da Gisha, Sari Bashi.

Israel decretou um bloqueio quase total à entrada de mercadorias na Faixa de Gaza desde que o grupo islâmico Hamas tomou à força o controle da região, em junho de 2007.

De acordo com porta-vozes oficiais, o objetivo do bloqueio é pressionar o Hamas. Algumas das mercadorias proibidas, como cimento e ferro, "poderiam ser utilizadas para a fabricação de armamentos".

Exemplos

A ONG divulgou uma lista de produtos cuja entrada em Gaza é autorizada por Israel e daqueles que são proibidos e revelou exemplos do que considera decisões absurdas das autoridades israelenses.

A lista, que inclui 97 produtos autorizados, foi elaborada de acordo com informações obtidas junto a comerciantes palestinos e organizações humanitárias que operam na Faixa de Gaza.

Os produtos autorizados por Israel, como farinha e arroz, são transportados para a região por caminhões da ONU.

Segundo a Gisha, a entrada de agua mineral é permitida, porém a entrada de sucos é proibida. Chá e café são permitidos, mas chocolate é proibido.

"Não entendo como impedir crianças de receber brinquedos, ou fábricas de receber matéria prima, pode responder às necessidades de segurança de Israel", afirmou Bashi.

Decisão da Justiça

Depois de uma decisão da Justiça, que aceitou um recurso movido pela Gisha há um ano, as autoridades israelenses finalmente confirmaram a existência da lista, que haviam negado antes.

No entanto, as autoridades se negaram a revelar a lista exata dos produtos permitidos e proibidos e argumentaram que a publicação desse documento pode "prejudicar a segurança e as relações exteriores do Estado".

O governo israelense também confirmou, diante da Corte do Distrito de Tel Aviv, a existência de um documento que estabelece os limites mínimos de fornecimento de alimentos à Faixa de Gaza, de acordo com parâmetros de necessidades nutricionais mínimas que cada pessoa deve consumir.

Segundo o governo, esse documento, denominado Food Needs in Gaza – Red Lines (em tradução livre, "Necessidades de Alimentação em Gaza – Limites Mínimos") serve "apenas para o trabalho de planejamento interno e não para estabelecer uma política".

A advogada da Gisha, Tamar Feldman, protestou contra a recusa do governo de divulgar o conteúdo dos documentos.

"Não está claro porque, em vez de promover a transparência, Israel opta por investir tantos recursos para encobrir a informação", afirmou a advogada.


Notícia da BBC Brasil.

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Cavalo de Troia na Europa

Cavalo de Troia na Europa

ONTEM FOI dia de brasileiros prestarem atenção à chatíssima crise da dívida grega. Que pode se tornar crise da dívida portuguesa, quiçá irlandesa ou espanhola. O intermitente churrasco grego serviu para impulsionar a "correção" da Bolsa. O Ibovespa fechou ontem 7,4% abaixo do pico do dia 8. A Bolsa estava carinha e, enfim, os juros vão subir, o que não é assim lá tão relevante no caso do mercado brasileiro, mas pega.
A Grécia mergulhara no vinagre na semana passada, quando pediu dinheiro ao FMI e à União Europeia. Como de hábito, as agências de classificação de risco comparecem ao campo de batalha a fim de matar os feridos. Degradaram ontem a nota de crédito do governo grego para "junk", investimento com razoável risco de levar calote. A dívida portuguesa também foi desacreditada.
Apesar de ineptas e cúmplices da bandalha que resultou na crise de 2007-09, as notas das agências são relevantes. Investidores podem ser impedidos, por motivos contratuais, de comprar títulos com nota de crédito "junk".
Se todas as maiores agências rebaixarem a Grécia para "junk", os títulos gregos não serviriam como garantia nem para negócios com o Banco Central Europeu. O problema é que bancos usam títulos gregos como garantia para empréstimos no BCE. Quando os papéis perdem valor, em tese os bancos têm de oferecer mais garantias.
O mercado passou a cobrar taxas de juros cada vez mais altas do governo grego. Cobra quase o dobro da taxa pedida para o Brasil, desde a semana passada. É a espiral da morte: o país já superendividado paga cada vez mais caro para refinanciar a dívida, que cresce mais. O rendimento dos papéis gregos ("juros") de dois anos ultrapassou bem o dos brasileiros e até os argentinos. Excetuado algum país obscuro, são agora os mais altos do mundo.
Se a Alemanha não abrir logo o cofrinho, os gregos terão de "reestruturar" a dívida (pagar mais tarde, quando puderem). Os alemães em tese bancariam 28% do empréstimo europeu à Grécia. Mas o governo alemão adia a decisão sobre a ajuda, muito impopular entre o eleitorado.
E daí?
Se a Grécia "reestrutura", dá um calote, bancos franceses e alemães, entre outros, perdem dinheiro e ficam com menos capital. Isso para não falar do medo -os seguros de crédito ficam mais caros, os juros sobem, e não apenas para os governos europeus. O caldo da economia do mundo rico pode voltar a entornar.
O novo pico da crise pode ser um faniquito do mercado. Pode não ser. Em tese, apenas a promessa de empréstimos tapa-buraco à Grécia deveria ter acalmado o ambiente. Com o dinheiro prometido por FMI e Europa, a Grécia poderia tapar buracos até o início do trimestre final do ano.
Mas rumores e palpites publicados na mídia financeira europeia dão conta de que o mercado quer um remendo de pelo menos ano e meio. O remendo também não garante o fim da novela. O governo grego precisa cortar sua despesa em pelo menos 12% do PIB até 2015. É um massacre. Virá recessão, corte de benefícios sociais e revolta, que já está nas ruas. Além do mais, os gregos vão precisar tomar empréstimos a juros de pai para filho, de modo a não voltar ao buraco. Está difícil.

Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo, de 28 de abril de 2010.

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Na fronteira entre Guatemala e México, imigrantes enfrentam a primeira etapa da busca pelo sonho americano

As águas do rio Suchiate, na fronteira da Guatemala com o México, registram um intenso vai e vem de balsas logo no amanhecer. As embarcações, feitas com pneus e largas tábuas de madeira, saem de Tecún Umán, do lado guatemalteco, em direção a Ciudad Hidalgo, no estado mexicano de Chiapas. Além de carregarem todo tipo de mercadorias, como verduras e frutas, trazem também dezenas de imigrantes em busca do sonho americano.

A odisséia envolve mais de 400 mil centro-americanos todos os anos, de acordo com o INM (Instituto Nacional de Imigração do México), sendo a maioria cidadãos de Honduras, El Salvador, Guatemala e Nicarágua - nessa ordem. Segundo a entidade governamental, somente 150 mil conseguem entrar ilegalmente nos EUA. Os outros recebem destinos distintos: ou são pegos pela polícia imigratória mexicana e enviados de volta a seus países, ou viram vítimas de sequestros, estupros e agressões ao longo dos três mil quilômetros de jornada.

“Os imigrantes saem de seus países por razões diferentes. Em Honduras, o golpe de Estado em junho de 2009 e a crise econômica e social provocaram uma imigração massiva. Desde o ano passado os hondurenhos estão em maior número”, explicou ao Opera Mundi Samuel Arredondo, chefe de comunicação social do INM.

“Os que vêm de El Salvador fogem da violência, agravada pela atuação das gangues, as ‘maras’, que matam muita gente e exigem o pagamento de taxas e impostos para o desenvolvimento de qualquer atividade econômica. Já na Guatemala a pobreza e a falta de trabalho são os fatores que motivam a imigração. Além disso, a criminalidade aumentou no país”, esclareceu Arredondo.

Fronteira: observatório do mundo
“Quando estávamos cruzando o Suchiate a polícia imigratória nos surpreendeu”, contou ao Opera Mundi Hernán, um jovem de 34 anos, abraçado à esposa Laura, de 24 anos. Os dois nasceram em El Salvador. “Obrigaram-nos a pular na água, num trecho muito profundo. Não sabemos nadar e a água entrou pelos nossos narizes. Creio que Deus nos salvou, porque já estávamos perdendo os sentidos. E graças a Deus, que nos acompanha, vamos chegar salvos aos EUA.”

Hernán e Laura descansavam na Casa do Imigrante de Tapachula, coordenada pelo padre Flor Maria Rigoni, da congregação dos missionários Scalabrinianos. Lá, centenas de imigrantes encontram refúgio por até três dias, antes de tentar novamente a travessia para os EUA. De Tapachula percorrem ainda 250 quilômetros até Arriaga, em Chiapas, de onde sai o “trem da morte”, com destino a Ixtepec, no estado mexicano de Oaxaca.

O padre cuida de imigrantes há 25 anos no México, com missões em Tijuana, Ciudad Juárez e Tapachula. “Passei a vida trabalhando com imigrantes, antes na África, depois na Alemanha dividida e desde 1985 no México. E tenho para mim, após essas experiências, que a fronteira é sempre o observatório do mundo. As fronteiras e os fluxos de imigração dizem muito sobre a nossa sociedade, sobre as consequências das decisões políticas, são o outro lado dos processos econômicos”. Para Rigoni, por meio das imigrações é possível medir “as mudanças, erros e dinâmicas humanas” de uma forma clara.

O fluxo imigratório mudou nos últimos anos no México, sobretudo a idade dos imigrantes, contou Rigoni. Há pouco tempo, a idade média media era de 29 anos e agora, é de 21, explicou. Outro dado importante é o aumento da imigração feminina. A porcentagem de mulheres que passa por Tapachula chega a ser 23% do total, e somente 7% delas alcançam a fronteira norte. Muitas são capturadas por grupos criminosos e obrigadas a se prostituir no México e em outros países.

“Hoje, mulheres e jovens imigram por causa do impacto da crise econômica em seus países”, justificou o padre, acrescentando que isso fez com que famílias inteiras tentassem a sorte na fronteira.

Economia da imigração
Há uma economia que se abastece da imigração. De policiais corruptos que, de acordo com os imigrantes, roubam dinheiro e exigem o pagamento de propina, a criminosos envolvidos com a prostituição, tráfico de órgão, sequestros e o comércio na fronteira.

“É um grande negócio”, afirmou Luis, hondurenho de Olancho. “Essa é a terceira vez que tento atravessar e me dei conta que somos tratados como carne. Nos machucam e tratam como bucha de canhão. Até quando morto um imigrante vale dinheiro, pois as funerárias se enfrentam entre si para enviar os cadáveres aos países de origem. Há ainda o cansaço, os perigos ao longo do caminho e a insegurança, para chegarmos aos EUA e vivermos como ilegais.”

“E tudo isso para quê?”, se perguntou Luis. “Para enviar dinheiro às nossas famílias, para que nossos filhos tenham dinheiro para viver, estudar. É preciso entender que enquanto existir tanta injustiça e pobreza, a imigração não acabará. Mesmo que ergam muros, nós vamos transpô-los. Que Deus nos ajude a superar esse caminho”.

Este texto é originário do Operamundi.

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quinta-feira, maio 06, 2010

O acordo da Anistia

Um acordo em que a ditadura resolveu tudo

Maria Inês Nassif
06/05/2010

Era o dia 22 de agosto de 1979. No plenário da Câmara, onde o Congresso se reuniria mais tarde para examinar a proposta de anistia do governo do general João Figueiredo – famoso por ter pedido para ser esquecido, depois de ter deixado o governo, e ter sido obedecido – 800 soldados à paisana ocuparam quase todos os 1200 lugares das galerias. Os manifestantes que ainda tentavam mudanças no projeto de anistia do governo – que perdoou só os crimes de sangue cometidos pelos próprios militares – ganharam os lugares de volta quase aos gritos. Às 14 horas, os soldados bateram em retirada.

As cadeiras no plenário para assistir ao espetáculo de imposição militar dos termos da anistia – que era mais auto-anistia do que qualquer outra coisa – talvez tenha sido a única conquista efetiva dos movimentos que se mobilizavam para restituir os direitos políticos dos adversários da ditadura. Desde o envio do projeto ao Congresso, em 27 de junho, até sua aprovação, 56 dias depois, imperou o ato de vontade dos militares, acatado pelos civis que formavam, no parlamento, uma maioria destituída de coragem e vontade.

Em tese de doutorado defendida em 2003 no Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), intitulada “Dimensões Fundacionais da Luta pela Anistia”, Heloísa Amélia Greco reconstitui, passo a passo, a aprovação da lei. O texto do projeto do governo foi enviado ao Congresso sem que ninguém da oposição consentida, o MDB, pelo menos oficialmente, tenha sido consultado. Na cerimônia convocada por Figueiredo, no Palácio do Planalto, para oficializar o envio do projeto, estavam presentes todos os ministros e toda a bancada de deputados e senadores do partido do governo, a Arena. O MDB boicotou a cerimônia para marcar uma posição contra um projeto que excluía setores importantes da oposição à ditadura de seus benefícios.

A Comissão Mista do Congresso Nacional que analisou a proposta foi escolhida a dedo. Dos 23 integrantes, 13 eram incondicionalmente fiéis ao governo. O presidente da Comissão, o arenista Teotônio Vilela, dissidente e partidário de uma anistia ampla, somente exerceria o seu voto no caso de empate, o que jamais aconteceu. O relator, Ernâni Satyro, seguiu à risca o roteiro traçado para ele. As emendas aceitas em seu substitutivo foram definidas no Ministério da Justiça, em reuniões com o ministro Petrônio Portela, o líder da maioria no Senado, Jarbas Passarinho, o líder da maioria na Câmara, Nelson Marchezan e o presidente do partido, José Sarney. Todas as votações da comissão cravavam um inevitável placar de 13 a 9.

Por maioria governista, entenda-se um Congresso plenamente constituído pelo Pacote de Abril do governo anterior, do presidente-general Ernesto Geisel. O pacote, baixado por força do AI-5, em 1974, criou os senadores biônicos (o terço do Senado escolhido indiretamente por colegiados estaduais) e redefiniu a composição da Câmara de forma a dar mais peso ao eleitorado do Norte e do Nordeste, regiões onde a Arena mantinha prestígio por meio de lideranças tradicionais de caráter patrimonialista. Produziu seus resultados na eleição de 1978. Em 1979, a Arena tinha 231 deputados, contra 189 do MDB; no Senado, eram 41 senadores arenistas – destes, 22 eram biônicos – e 26 pemedebistas.

O projeto do governo, aprovado pelo Congresso em 22 de agosto, foi uma obra solitária do governo militar, referendada por uma maioria parlamentar bovina, totalmente submissa ao poder. Mesmo o voto final do MDB ao substitutivo de Satyro não pode ser colocado na conta da concordância, ou da negociação – foi apenas o voto naquilo que sobrou. O substitutivo do MDB foi rejeitado no plenário, mesmo com a ajuda de 12 parlamentares arenistas; a emenda do deputado Djalma Matinho (Arena-RN), vista como uma opção menos pior que o projeto do governo, também foi rejeitada, mesmo com a ajuda de 14 dissidentes. O MDB entendeu que antes o substitutivo de Satyro do que nada – ainda assim, com a abstenção de 12 de seus 26 senadores e o voto contrário de 29 dos 189 deputados, que preferiram marcar posição contra a anistia limitada dos militares.

A anistia de agosto, aprovada pelo Congresso, perdoou torturadores. Beneficiou também os adversários do regime que pegaram em armas mas não tiveram sentença transitada em julgado. Os presos políticos condenados por luta armada, no entanto, cumpriram penas – depois reduzidas -, mas não foram anistiados. A ditadura designava os adversários que optaram pela luta armada como “criminosos de sangue”. Não consta que tenham considerado da mesma forma os que torturaram e mataram a mando do Estado.

A anistia foi essa. Na última hora, na promulgação da lei, o general Figueiredo vetou a expressão “e outros diplomas legais” – passaram a ser anistiados só os punidos por atos institucionais. O veto a quatro palavras excluiu do benefício os militares, os sindicalistas e os estudantes punidos por sanções administrativas, pelo decreto 477 e por outras determinações legais impostas pela ditadura.

Este é, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF) em decisão proferida na semana passada, o “acordo histórico” feito pela sociedade brasileira: de um lado, a sociedade civil mobilizada em comitês que pleiteavam anistia ampla, derrotada; de outro, baionetas e maiorias forjadas por atos institucionais e Pacote de Abril. A autora da tese de doutorado cita, a propósito, uma frase do jornalista Aparício Torelly, o Barão de Itararé: “Anistia é um ato pelo qual os governos resolvem perdoar generosamente as injustiças e os crimes que eles mesmos cometeram”. Foi isso.

O Brasil vai sentar no banco dos réus da Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos por conta dos crimes cometidos pela ditadura. A OEA pode condenar o país a anular a sua lei de anistia, a exemplo do que já fez com o Chile e o Peru, para punir os que torturaram e mataram. O STF que explique direitinho para a OEA esse complicado pacto em que a ditadura resolveu tudo sozinha.


Texto do Valor, disponível no blog do Luís Nassif.

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DNA inocenta homem que passou 29 anos preso por estupro

DNA inocenta homem que passou 29 anos preso por estupro

da BBC Brasil

Um homem que passou 29 anos na prisão condenado por rapto e estupro de uma menina de 12 anos e de um menino de 13 anos foi libertado nesta quarta-feira (5), depois que exames de DNA o inocentaram.

Raymond Towler, de 52 anos, tinha sido condenado à prisão perpétua em 1981. O caso levou às lágrimas a juíza que promulgou a libertação do homem, que trabalhava como músico e tinha acabado de fazer 24 anos quando foi condenado.

Em uma audiência rápida, a juíza Eileen A. Gallagher, do tribunal do condado de Cuyahoga, lembrou dos detalhes das acusações apresentadas contra Towler: ele teria atraído as crianças para a reserva de Rocky River, antes de violentá-las.

No entanto, graças à intervenção da organização não-governamental Ohio Innocence Project, que em uma colaboração com o jornal americano Columbus Dispatch investiga centenas de condenações consideradas suspeitas, baseando-se em exames de DNA, ficou comprovado que o homem não é o estuprador das vítimas.

Demora

Towler pediu para ter o DNA testado ainda em 2004, mas isso só veio a acontecer em 2008. Só então, a promotoria aceitou acionar o laboratório estadual para testes criminais de DNA e reexaminar as provas do caso Towler.

A partir da análise do sêmen encontrado nas roupas íntimas de uma das vítimas, um outro laboratório especializado em Cincinnati construiu dois perfis parciais - nenhum deles se encaixa no perfil de Towler.

Em novembro de 2008, foram pedidos mais testes, mas só um ano e meio mais tarde um terceiro laboratório, no Texas, apresentou resultados que provaram que o sêmen não pode ser de Towler.

"Este é o melhor dia da minha vida, é pura alegria. Não sinto ódio por ninguém", afirmou Towler.

Nas últimas décadas, Towler - que perdeu os pais enquanto cumpria pena - pintou centenas de quadros. Ele pretende continuar se dedicando à arte no futuro.

O diretor do Ohio Innocence Project, Mark Godsey, disse que a ONG acreditou no caso desde o início e ressaltou a importância dos testes de DNA na busca por Justiça.


Notícia da BBC, na Folha Online.

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Como a Alemanha fez a Grécia ir à garra...

Como a Alemanha contribuiu para o agravamento da crise grega

Os gregos são basicamente os responsáveis pelos seus problemas atuais. Mas o governo alemão fez com que a situação da Grécia piorasse com os seus sermões e a relutância em fornecer assistência a Atenas. A chanceler Angela Merkel é a principal responsável pelo fato de que agora os contribuintes alemães sofrerão com isso.

“Tudo que tiver uma possibilidade de dar errado, dará errado”. Essa declaração sábia, conhecida como Lei de Murphy, aplica-se nos dias de hoje extraordinariamente bem à política econômica da zona do euro.

De um lado estão os gregos, que sem dúvida alguma não controlam as suas estatísticas financeiras e que apresentam seguidamente relatórios falsos a respeito do déficit orçamentário do país. Do outro lado estão os alemães, que adoram atrapalhar uma resposta rápida e clara para o enfrentamento da crise grega – e que, neste processo, encarecem tremendamente qualquer solução.

Ao mesmo tempo, é surpreendente constatar quantos membros dos partidos que integram a coalizão governamental da Alemanha estão fornecendo conselhos aos gregos, desde reduções drásticas de pagamentos até uma declaração imediata de insolvência e uma retirada rápida da zona do euro. Esses observadores baseiam o seu radicalismo verbal no nobre argumento econômico de que a Grécia precisa tornar-se novamente “apta para os mercados financeiros”. Um outro argumento, menos sofisticado, é que a grande maioria dos alemães não está disposta, após passar anos limitando o próprio consumo, a fazer sacrifícios financeiros para ajudar a Grécia.

Tanto os erros de cálculo da Grécia quanto a relutância do governo alemão em ajudar Atenas não passam de convites aos especuladores para que estes apostem na derrocada do país do sul da Europa. Isso também explica por que os prêmios de riscos dos títulos do governo grego pagam juros para o refinanciamento da sua dívida que são tão elevados a ponto de ele não ser mais capaz de funcionar sem assistência estrangeira, apesar do recente aumento das taxas de juros e das reduções maciças de salários.

O papel das agências de classificação de riscos

No decorrer desse processo, e como resultado da assistência ativa do governo alemão, o que aconteceu foi exatamente aquilo que deveria, e poderia, ter sido evitado – ou seja, a Grécia foi de fato obrigada a solicitar auxílio financeiro a outros países europeus.

O problema para o governo alemão é que os seus argumentos não são convincentes. Isso aplica-se antes de mais nada á referência aos mercados financeiros, um argumento que é proferido em tom de total convicção, ao se afirmar que os prêmios sobre riscos presenciados na Grécia representam precisamente riscos reais. É notável que, depois de tudo o que ocorreu nos últimos dois anos, políticos experientes ainda acreditam que os mercados financeiros produzem informações racionais e confiáveis.

Todos sabem que os especuladores não têm acesso a mais informações sobre a Grécia do que os especialistas econômicos dos governos europeus. No entanto, existem muitos protagonistas do mercado, como os fundos de hedge, que obtêm os seus lucros a partir de acontecimentos incertos. Quanto mais caótica estiver a situação, mais alegres ficarão esses protagonistas. A maior inimiga desses indivíduos é a transparência política, e é por isso que eles adoram quando os políticos adotam táticas destinadas a semear o medo. No caso da Grécia, essa disseminação do medo foi muito bem sucedida, conforme demonstram tão bem os altíssimos prêmios de riscos.

O papel desempenhado pelas agências de classificação de riscos também não pode ser esquecido. Foi o fato de elas rebaixarem a classificação da Grécia que desencadeou ondas de especulação. Isso ocorreu em parte porque as agências de classificação, segundo as regulações atuais, e apesar do seu fracasso total durante a crise financeira, ainda possuem bastante poder sobre os mercados – um poder que foi concedido a elas pelos políticos. Cada rebaixamento da classificação da Grécia obriga os bancos a venderem títulos do governo grego. Isso, por sua vez, acelera o declínio do valor desses títulos, resultando em taxas de juros ainda mais elevadas.

O argumento populista de que a maioria da população opõe-se ao apoio financeiro à Grécia também é atribuído ao governo alemão – porque a chanceler Angela Merkel bloqueou a única rota de sucesso que teria impedido o pagamento de bilhões de euros em auxílio àquele país.

Impedindo a especulação

Essa rota seria mais ou menos assim: no início – em outras palavras, semanas atrás –, a União Europeia teria explicado de forma verossímil e clara que assumiria uma responsabilidade compartilhada por um membro do mercado comum interno. Isso teria incluído a disposição, sob certas condições e em uma emergência, de garantir os pagamentos da dívida da Grécia.

Essa declaração teria tornada a especulação mais difícil, e poderia também ter prevenido o colapso associado do valor dos títulos gregos. Isso teria também aumentado as chances de que a Grécia fosse capaz de salvar a si própria. E teria economizado muito dinheiro dos contribuintes alemães. Credibilidade e clareza geram dividendos.

Essa, infelizmente, não é a situação que presenciamos no momento. A submissão do governo alemão aos mercados financeiros e a sua covardia perante a imprensa tabloide (o jornal diário de circulação maciça “Bild”, por exemplo, publicou o seguinte título na sua primeira página: “Ei Gregos, Vocês Não Receberão Nada de Nós”) poderão custar muito caro para os contribuintes. Agora esse auxílio financeiro terá realmente que ser pago. E o barulho que o governo alemão continua fazendo em nada mudará isso.

A única coisa que se obteve foi que os especuladores estão sentido-se ainda mais encorajados a agir. No pior cenário possível, outros países como Espanha, Portugal, Irlanda e Itália afundarão na espiral da especulação. Isso seria o fim da união monetária – e um outro bom exemplo da Lei de Murphy em ação.

Tradução: UOL

Notícia da Der Spiegel, reproduzida no UOL.

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28/04/1965: Os Estados Unidos invadem a República Dominicana

Hoje na História: Tropas dos EUA invadem a República Dominicana

Numa ação para prevenir o que o presidente dos Estados Unidos Lyndon B. Johnson chamou de “implantação de uma ditadura comunista”, Washington decide invadir a República Dominicana em 28 de abril de 1965, enviando 22 mil soldados e pesado armamento para restaurar a ordem. A decisão de Johnson provocou ásperos protestos na América Latina e ceticismo em alguns setores dos EUA.

A instabilidade na República Dominicana teve início em 1961, quando o ditador Rafael Trujillo, que estava no poder há tempos, foi assassinado. Trujillo havia sido um tirano brutal, mas sua fanática postura anti-comunista ajudou-o a garantir o respaldo de Washington.

Sua morte levou à ascensão de um governo reformista chefiado por Juan Bosch, eleito presidente em 1962. A hierarquia militar dominicana, porém, abominava Bosch e suas políticas liberais. Bosch foi derrocado em 1963. O caos político decorrente dominou a cena no país quando vários grupos, inclusive o estamento militar em crescente cisão, lutavam acirradamente pelo poder.

Em 1965, forças populares que exigiam a reinstalação de Bosch no poder passaram a se manifestar nas ruas contra o governo controlado pelos militares. Enquanto isso, em Washington, temia-se por uma “outra Cuba”, supostamente em gestação naquele país. Com efeito, muitos funcionários do governo estadunidense, especialmente no Departamento de Estado e na CIA, suspeitavam que Fidel Castro estivesse por trás das manifestações populares.

Ação prática

Finalmente, em 28 de abril, mais de 22 mil fuzileiros navais, apoiados por forças militares cedidas por alguns dos Estados-membros da OEA (Organização dos Estados Americanos), entre eles o Brasil do regime ditatorial militar comandado então por Castello Branco, desembarcaram na República Dominicana. No curso das semanas que se seguiram, as tropas estrangeiras dominaram a situação e ajudaram a instalar um governo não militar, conservador, fortemente ligado aos EUA.

O presidente Johnson saiu a campo para declarar que foi obrigado a tomar aquelas medidas para evitar a instauração de outra “ditadura comunista” na região. Como evidência de suas acusações, tornou público relatórios que apontavam suspeitos de comunismo de vários ocupantes de cargos-chaves na República Dominicana. Até mesmo revisões superficiais da lista de pessoas revelaram que a evidência era extremamente frágil – algumas pessoas daquela lista haviam morrido há tempos e outras não poderiam ser acusadas de comunismo.

Críticas

Alguns governos latino-americanos e diversas organizações sociais condenaram a invasão, denunciando-a como um retorno à “diplomacia das canhoneiras” do começo do século 20, quando os ‘marines’ dos EUA, ao mais leve pretexto, invadiam e ocupavam nações latino-americanas.

Nos EUA, setores políticos liberais, céticos e desconfiados em relação à política de Washington no Vietnã, desdenharam das declarações de Johnson acerca do “perigo comunista” na República Dominicana. Tal crítica tornou-se cada vez mais frequente contra o governo Johnson à medida que os EUA se envolviam mais profundamente na Guerra do Vietnã.


Texto do Operamundi.

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Nova lei de direitos autorais

Direitos autorais e acesso ao conhecimento

GUILHERME CARBONI, PABLO ORTELLADO e CAROLINA ROSSINI

O Ministério da Cultura vem, ao longo dos últimos quatro anos, promovendo com a sociedade amplo debate sobre a reforma da lei de direitos autorais (lei nº 9.610/ 98).
Esse debate, que incluiu a realização de seminários temáticos, reuniões setoriais e que, em breve, passará por ampla consulta pública, deve ser saudado como a mais participativa reforma de uma lei de direito autoral de que se tem notícia.
As propostas de alteração da atual lei são muitas, mas aqui destacamos as que visam um melhor balanceamento entre o interesse privado dos titulares de direitos autorais e o interesse público pelo livre acesso ao conhecimento.
O projeto de reforma da lei, divulgado parcialmente em um dos debates promovidos pelo Ministério da Cultura, diz claramente que "a proteção dos direitos autorais deve ser aplicada em harmonia com os princípios e normas relativos à livre iniciativa, à defesa da concorrência e à defesa do consumidor".
Além disso, regula expressamente a sua função social, ao dizer que a lei terá que atender "às finalidades de estimular a criação artística e a diversidade cultural e garantir a liberdade de expressão e o acesso à cultura, à educação, à informação e ao conhecimento, harmonizando-se os interesses dos titulares de direitos autorais e os da sociedade".
O objetivo visto acima pressupõe alargamento das atuais limitações e exceções aos direitos autorais -hipóteses em que as obras protegidas podem ser livremente usadas, sem necessidade de autorização prévia ou pagamento aos titulares de direitos.
Na atual lei, essas hipóteses são restritivas, com a proibição, por exemplo, da "cópia privada", da mudança de suporte e da cópia feita para fins de preservação do patrimônio cultural.
A cópia privada é aquela feita em um único exemplar, sem fins lucrativos, para uso do próprio copista, e é um recurso que permite, por exemplo, que alguém copie um CD legitimamente adquirido para escutar no carro, sem risco de estragar o original.
Além de autorizar a cópia privada, o projeto de lei autoriza também a livre cópia quando há mudança de suporte -ou seja, quando o dono do CD copia suas músicas para um iPod. Por fim, o projeto permite ainda que qualquer obra possa ser copiada para fins de preservação do patrimônio cultural.
Embora todas essas possibilidades sejam de bom senso, hoje não são permitidas pela lei atual. Por esse motivo, em recente comparação entre 16 países, a lei brasileira foi considerada a quarta pior no que diz respeito ao acesso ao conhecimento.
Apesar de o projeto modernizar a nossa lei, buscando torná-la compatível com o mundo digital, ele fica a dever em pelo menos dois pontos: ao onerar a fotocópia de livros nas universidades e ao não reduzir o prazo de proteção dos direitos autorais.
Embora no projeto de lei a cópia feita pelo copista sem fins lucrativos seja livre e sem ônus financeiro, a cópia de livros passa a ser onerada.
Isso não apenas cria distorção injustificada entre a cópia de livros e a cópia de CDs ou fotos como onera desnecessariamente o estudante brasileiro que faz uso de fotocópias simplesmente porque não tem os meios econômicos para adquirir livros ou então porque alguns livros estão esgotados no mercado.
O projeto também não reduz o prazo de proteção dos direitos autorais. A reprodução das obras permanece, assim, monopólio dos detentores de direitos por 70 anos após a morte do autor (embora o direito internacional só obrigue a 50 anos após a morte).
Estamos vivendo uma oportunidade única para reverter essa situação da atual legislação de direitos autorais, que cria barreiras ao acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento nacional.


GUILHERME CARBONI , mestre e doutor em direito civil pela USP, com pós-doutorado na Escola de Comunicações e Artes da USP, é advogado, professor universitário e autor do livro "Função Social do Direito de Autor". E-mail: carboni@gcarboni.com.br.
PABLO ORTELLADO , doutor em filosofia, é professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, onde coordena o Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação.
CAROLINA ROSSINI , advogada e professora de propriedade intelectual, é "fellow" no Berkman Center for Internet and Society (centro Berkman para internet e sociedade) da Universidade Harvard e coordenadora do projeto Recursos Educacionais no Brasil: Desafios e Perspectivas.

Texto publicado na Folha de São Paulo, de 27 de abril de 2010.


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terça-feira, maio 04, 2010

Homem é preso após pregar na rua que homossexualismo é pecado


Um pregador britânico foi preso depois de ter dito durante sermão na rua que homossexualismo é um pecado.

Dale McAlpine foi acusado de causar "alarme, intimidação e angústia" depois que um policial comunitário ouviu o pastor batista mencionar vários "pecados" citados na Bíblia, inclusive blasfêmia, embriaguez e relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, de acordo com o jornal britânico The Daily Telegraph.

Dale McAlpine, de 42 anos, prega nas ruas de Wokington, na região de Cumbria, no noroeste da Inglaterra há anos, e disse que não mencionou homossexualismo quando fazia o sermão do alto de uma pequena escada, mas admitiu ter dito a uma pessoa que passava que acreditava que a prática era contrária aos ensinamentos de Deus.

Segundo o jornal britânico Daily Mail, o policial Sam Adams identificou-se como o agente de ligação entre a polícia e a comunidade gay e transsexual e avisou o pregador, que distribuía folhetos e conversava com as pessoas nas ruas, que ele estava violando a lei. Mas ele continuou pregando e foi levado para a prisão, onde permaneceu por sete horas.

O pregador disse que o incidente foi "humilhante", segundo o Daily Telegraph. "Eu me sinto profundamente chocado e humilhado por ter sido preso em minha própria cidade e tratado como um criminoso comum na frente de pessoas que eu conheço."

"Minha liberdade foi tolhida por rumores vindos de alguém que não gostou do que eu disse, e fui acusado usando-se uma lei que não se aplica", afirmou Dale.

O processo contra McAlpine por supostas declarações públicas contra gays ocorre semanas depois que um juiz britânico disse que não há proteção especial na lei para crenças cristãs.

O juiz decidiu favoravelmente a uma organização que demitiu um terapeuta de casais por se recusar a atender casais gays alegando que isso seria contra seus princípios cristãos.


Notícia da BBC Brasil.


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Brasil pode ser condenado em Corte Internacional por anistiar torturadores

A discussão sobre o perdão que a Lei de Anistia brasileira, de 1979, concedeu aos agentes da repressão da Ditadura Militar (1964-1985) pode ter acabado no STF (Supremo Tribunal Federal). Mas o caso está longe de ser encerrado. O Brasil pode ainda ser condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por manter o entendimento de que os sequestros, assassinatos e torturas cometidos por agentes do estado durante o regime militar foram perdoados e esquecidos com a Lei 6.683. Essa condenação, inclusive, pode ocorrer ainda em 2010.

Isso porque a Corte, órgão da OEA (Organização dos Estados Americanos), pode entender que a Lei de Anistia, da forma como vem sendo interpretada, é um obstáculo na busca do direito à verdade e à Justiça —no caso, na tentativa de responsabilizar os torturadores da época. A análise é da diretora no Brasil da organização não-governamental Cejil (Centro pela Justiça e o Direito Internacional), Beatriz Affonso.

O caso em tramitação na Corte envolve episódios da Guerrilha do Araguaia (1972-1975), instalada na região onde hoje fica o Estado de Tocantins com o objetivo de combater a ditadura militar. Recentemente, o militar reformado Sebastião Curió Rodrigues de Moura, o major Curió, afirmou que pelo menos 41 pessoas foram executadas pelo Exército na guerrilha.

Quando a ditadura militar ainda estava em curso, os familiares das vítimas procuraram a Justiça Brasileira. Em 1982, uma ação civil pedia, além da apuração sobre os crimes, a localização dos restos mortais dos guerrilheiros. Mais de dez anos depois, em 1996, o caso ainda não tinha saído do trâmite inicial na Justiça.

Com essa denegação de Justiça, foi possível que o Cejil, o grupo Tortura Nunca Mais (do Rio de Janeiro) e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos de São Paulo recorressem ao sistema interamericano, por violação dos direitos humanos. A Corte Interamericana pode ser procurada quando o suposto abuso não teve solução judicial interna e as violações permaneceram.

O caso tramitou por 12 anos na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, primeiro órgão a tomar conhecimento de uma denúncia, até ser então encaminhado à Corte.

Está marcada para os dias 20 e 21 de maio desse ano a audiência do processo. De acordo com Beatriz Affonso, depois desse passo, usualmente leva-se de três a sete meses para que uma sentença seja dada. Assim, o Brasil pode ser condenado ainda nesse ano.

A condenação, segundo exame da jurisprudência da Corte citado por Beatriz Affonso, deverá exigir que o Brasil elimine os obstáculos jurídicos —entre eles a Lei de Anistia— para o pleno acesso à verdade e à Justiça. Isso não significa que a Lei possa ser revogada, mas pode ser alterada a interpretação de que certos crimes foram perdoados e, assim, a busca pela verdade tem sofrido empecilhos.

“Tenho certeza de que a Corte Interamericana vai especificar que a Lei de Anistia está em desacordo com o Pacto de São José da Costa Rica, um tratado que o Brasil assinou de boa fé”, diz a diretora. Mesmo que tal tratado tenha sido assinado pelo Brasil apenas em 1998, Affonso destaca que, de lá pra cá, a Lei de Anistia tem representado um obstáculo na busca da Justiça.

A especialista cita que, no caso do Araguaia, os militares ainda vivos que participaram dos confrontos foram interrogados como testemunhas, e não como réus, o que favorece a impunidade, já que eles não têm a obrigação de responder, por exemplo, onde estão os corpos dos mortos. “Em uma investigação criminal, a verdade judicial seria facilmente alcançada”, diz Beatriz, que afirma que o STF, em sua “lamentável” decisão desta quinta-feira (29/4), se acovardou em rever a questão. “É uma falácia dizer que a interpretação atual da Lei de Anistia não impede o acesso à verdade”, diz.

Outros dois episódios sobre violações de direitos humanos na Ditadura Militar estão em tramitação no sistema Interamericano. Ingressaram no ano passado ações sobre o caso do jornalista Vladimir Herzog, morto em instalações dos órgãos de repressão em 1975, e Luiz José da Cunha, morto a tiros aos 29 anos de idade numa emboscada em São Paulo, em 1973.

Condenações

Até hoje, o Brasil sofreu apenas duas condenações na Corte Interamericana. A primeira ocorreu em 2006, no caso de Damião Ximenes Lopes, um deficiente mental torturado e assassinado em um hospital psiquiátrico em Sobral, no Ceará.

A segunda foi no ano passado. A Corte condenou o Estado brasileiro por grampear ilegalmente o telefone de líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), divulgar as gravações e não penalizar autoridades responsáveis pela quebra do sigilo telefônico. Os cinco membros do movimento receberão, cada um, US$ 22 mil.

O Brasil não tem histórico de descumprimento de determinações da Corte ou da OEA. E, como signatário da Corte, tem obrigação de acatar. A Corte supervisiona o cumprimento da sentença e só dará por concluído o caso quando o Estado cumprir integralmente a decisão.

Este texto é originário do Operamundi.

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